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Projeto

PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS
ON-LIME

Apostolado Veritatis Spiendor


com autorizagáo de
Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb
(in memoriam)
APRESENTAQÁO
DA EDigÁO ON-LINE
Diz Sao Pedro que devemos
estar preparados para dar a razáo da
nossa esperanga a todo aquele que no-la
pedir (1 Pedro 3,15).

Esta necessidade de darmos


conta da nossa esperanga e da nossa fé
hoje é mais premente do que outrora,
' visto que somos bombardeados por
numerosas correntes filosóficas e
religiosas contrarias á fé católica. Somos
assim incitados a procurar consolidar
nossa crenca católica mediante um
aprofundamento do nosso estudo.

Eis o que neste site Pergunte e


Responderemos propóe aos seus leitores:
aborda questóes da atualidade
controvertidas, elucidando-as do ponto de
vista cristáo a fim de que as dúvidas se
dissipem e a vivencia católica se fortaleca
no Brasil e no mundo. Queira Deus
abengoar este trabalho assim como a
equipe de Veritatis Splendor que se
encarrega do respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.

Pe. Esteváo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR

Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e


passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e
Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicagáo.
A d. Esteváo Bettencourt agradecemos a confiaga
depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e
zelo pastoral assim demonstrados.
/ MdñáÁ I

ANO 116 AGOSTO 196


ÍNDICE

I. CIENCIA E RELIGIAO

1) "Ültimamente a mseminac&o artificial tem progredido:


„...
em Cambridge já se conseguiu a fecundagáo humana em proveta.
A imprensa (muncia -novas e maravilhosas experiencias.

Qtto pensar a respcito, á luz da filosofía e da sá consciénaa?" 317

n. VIDA MODERNA E RELIGIAO

2) "Pódese explicar por que é táo forte o surto de supers-


e correntes de ocultismo nestes dios, em que há tanto ra
cionalismo e ateísmo ?

Que significado pode ter ésse pulular de 'sobrenatural' ?" .. 32!)

UI. DOUTRINA

S) "Como se pode entender o cancelamento das ¡estas de


Santos que estavam no calendario da Igreja ?

Os Santos foram cassados ou confinados ?" Sil

TV. EDUCAQAO

/,) "Que dizer, do ponto de vista criatño, sobre a intrtiducño


da educacao sexual ñas escolas ?

Nao será tima exigencia de nossa época ?" 354

COM APROVACAO ECLESIÁSTICA


PERGUNTE E
Ano X — N« 116 — Agosto de 1969

I. CIENCIA E RELIGIÁO

1) «íntimamente a inseminagátf artificial tem progredido:


cm Cambridge já se conscguiu a fecundacáo humana em pr«-
veta. A imprensa anuncia novas e maravilíiosas experiencias.
Que pensar a respeito, a luz da. filosofía e da sá cons-
ciéncia?»

Resumo da resposta: Em fevereiro de 1969, a imprensa divulgou


a realizacáo de novas experiencias relativas á fecund?.cáo artificial.
Deve-se xeconhecer que tais experiencias eram movidas por fina-
lidadc muito louvável ou por intencóes terapéuticas. Todavía nao
deixam de ser urna modalidade de inseminacáo artificial. Ora esta é
moralmcnlc rcprovável. Com efeito, o processo de fecundacüo artificial
reduz a funcjio generativa do ser humano a um processo meramente
fisico-quimico, equivalente ao que se realiza nos animáis irracionais.
Na verdade, a funcüo biológica do homem tem características pró-
prias: participa da espiritualidade do homem, supondo doac&o cons
ciente e amorosa de duas personalidades entre si, de modo a formar
um lar estável.
A doutrina ácima é corroborada pela verificacáo das graves con-
seqüéncias que da fecundacáo artificial decorrem para a sociedade:
desordens moráis, fraudes, filhos destituidos da devida educacáo...

Resposta: As experiencias de fecundacáo artificial foram


iniciadas em 1780 pelo Professor da Universidade de Pavia
P. Spallanzani, que retirou de um cao algo dos respectivos
espermatozoides e os injetou na vagina de urna cadela; esta,
sessenta e dois dias mais tarde, deu á luz tres cáezinhos de
todo normáis.
As experiencias continuaram a ser efetuadas entre ani
máis. Assim tem-se produzido a fecundacáo no útero de urna
vaca de boa raca, fazendo-se pouco depois o transplante do
embriáo para o útero de urna vaca menos qualificada; des-
tarte o animal de boa raga se torna livre para poder sem
demora ser de novo fecundado em semelhantes condigóes. Por
tal via consegue-se aumentar extraordinariamente o número
de cabegas de gado seleto.

— 317 —
2 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969. qu. 1

A inseminagáo artificial passou a ser praticada tarnbém


entre seres humanos, provocando certa perplexidade: as mu-
lheres tém sido fecundadas com sementes de doadores anóni
mos? Em 1941, os médicos americanos Kerner e Seymour,
pioneiros da inseminagáo artificial, comunicaran! ao mundo
os resultados das experiencias que haviam feito em 9.580
casos humanos; tinham obtido 9.489 partos felizes!
Ültimamente, em fevereiro de 1969, obteve-se mesmo a
fecundacáo fora do seio materno, isto é, em tubo de ensaio.
Tres dentistas británicos — os módicos Dombert Edward,
Barry Bunister e Patrick Steptoe — extraíram cinqüenta e
seis óvulos de doadoras voluntarias e os colocaram em am
biente fisiológico adequado; trinta e quatro déles conseguiram
chegar 'as condigóes de maturaeáo necessárias para ser sub-
metidos a inseminacáo artificial em proveta. Feita a experi
encia, verificaram em exame de microscopio que sete óvulos
haviam sido realmente fecundados. Outros onze, embora pene
trados por um espermatozoide, nao aceitaram a fecundagáo.
Dos sete óvulos fecundados, cinco imediatamente apreseritaram
anomalías. Finalmente todos os embrióes obtidos foram des
truidos depois de um dia de vida.
Os jomáis, ao darem a noticia, anunciaran! que os den
tistas de Cambridge continuariam suas experiéndas, implan
tando óvulos de mulheres cm úteros de cocinas. As prospecti
vas que assim se abriam, foram altamente divulgadas por re
vistas ilustradas, as vézes em estilo um tanto fantasista.
Assim tem-se dito:
— a mulheres que nao possam procriar por ter suas trompas
fechadas, se poderáo retirar os óvulos do ovario; estes seráo fecun
dados com espermatozoides (do marido, se quiserem, ou de outrem)
e implantados dlretamente no útero;
— as mulheres que nao tém útero, poderáo transplmntnr scus óvu
los, depois de fecundados artificialmente, para os úteros de outras
mulheres, que atuaráo como máes de criacáo;
—■ mulheres que nao tenham ovario, poderáo comprar ou obter
por doacáo óvulos, que seráo fecundados artificialmente e implantados
em seu próprio útero. Com isso daráo á luz.
Fala-se conseqüentemente de «bebés de retorta», «bancos de óvu
los», «máes de aluguel»... Cf. «Mánchete» 22/3/1969, págs. 131-135.

Todo ésse noticiario suscita, como se compreende, nume


rosas questóes, das quais algumas se referem á consciéncia
crista.
Abaixo procuraremos propor a posigáo do cristáo diante
de tais experiencias e prognósticos, analisando: 1) a fecun-

— 318 —
HOMEM EM TUBO DE ENSAIO?

dagáo humana em geral, do ponto de vista antropológico; 2) a


fecundagáo artificial, do poní» de vista dos genitores; 3) a
fecundagáo artificial, do ponto de vista da prole; 4) a voz da
Igreja; 5) as conseqüéncias da inseminacáo artificial.

1. Fecunda;ao humana e antropología

As experiencias de Cambridge, que tentaram a fecun-


dar.fio «in vitro», sao algo de muito recente na historia da
medicina e da humanidade. Todavía, ainda que nao se conhe-
gam bem os particulares e os métodos de tais operagóes, é
certo que elas se enquadram dentro do conjunto de opera
góes que se chama «fecundagáo artificial». Por conseguinte,
o juízo que a consciéncia profere sobre a fecundagáo artificial,
estende-se naturalmente as experiencias de fecundagáo em
tubo de ensaio.

Ora a propósito note-se o seguinte:

Nao se pode equiparar a fungáo. generativa do homem


á do animal, irracional. Éste, animado como é por principio
vital material, nao transcende a materia nem as leis fisico-
-químicas e biológicas que a regem. Por conseguinte, no to
cante a mulliplicacño da especie, pode ser tratado exclusiva
mente á luz dos criterios de selecáo ou aperfeigoamento das
ragas, rendimento económico, corregáo da esterilidade, etc.
— Diverso, porém, é o caso do ser humano: a fecundagáo, no
homem, é fungáo nao apenas da materia, mas de um mundo
interior, psíquico, espiritual; ela assume urna característica
típicamente humana. Com efeito, a natureza fez que no ser
humano a fusáo do esperma e do óvulo seja normalmente a
expressáo derradeira da fusáo de duas personalidades que
comegam a se unir no plano psíquico e que sao movidas por
conhecimento e amor. Em outros termos: a fecundagáo é a
consumagáo normal do amor consciente e recíproco de dois
seres humanos que se consociam para se tornar primeiramente
esposo e esposa e, conseqüentemente, pai e máe. A fecunda
gáo biológica ou a paternidade e a maternidade jamáis podem
ser separadas do amor consciente e estável que as deve ante
ceder; os filhos nao sao apenas produtos de leis biológicas
ou mecánicas, más constituem o fruto e a expressáo do amor
dos genitores entre si. Ao invés, no animal irracional, a fe
cundagáo, nao supondo amor nem entrega de personalidade,
pode ser tratada artificialmente como mero processo físico-
-químico.

— 319 —
4 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969, qu. 1

Embora o matrimonio seja por si ordenado 'á procriagáo,


os cónjuges nao podem esquecer que a procriagáo é regida
por leis naturais, ... leis naturais que nao é lícito ao homem
burlar nem mesmo em vista de urna finaüdade boa, como
seria a obtengáo de prole por parte de um casal estéril.

Na verdade, os filhos desempenham papel importante na


consolidacáo do matrimonio e no aperfeigoamento da perso-
nalidade dos cónjuges; um casal infecundo vem a ser, por
vézes, um casal infeliz ou desalentado; o amor dos cónjuges
que deseja prolongar-se e ultrapassar-se nos filhos, carece
entáo de filhos e, por isto, recai sobre si mesmo; o egocen
trismo pode assim tomar o lugar do espirito de doacáo gene
rosa entre os esposos. O desejo insatisfeito da paternidade ou
da maternidade é experimentado como sacrificio penoso para
os cónjuges animados de sentimentos nobres. Mais: a esteri-
lidade involuntaria de um casal -pode tornar-se serio perigo
para a própria estabilidade da familia. — Todavia é muito
importante notar-se que o fim nao, justifica os meios, de sorte
que fica sendo reprovável a obtenqáo da prole por processos
que reduzam o ser humano a mero conjunto de elementos
materiais; a fecundagáo humana nao pode ser equiparada a
um processo de laboratorio, pois ela é, por sua natureza
mesma, dependente do conhecimento e do amor mutuos dos
genitores.
Em outros termos, pode-se dizer: verdade é que a prole
constitui urna das finalidades do matrimonio... Todavia o
contrato matrimonial nao dá direito ao «filho» ou á prole
como tal, mas, sim, aos atos naturais capazes de induzir a
geragáo de urna nova vida e a tanto destinados. Por isto a
fecundagáo artificial transcende os limites dos direitos que os
esposos adquirem um sobre o outro mediante o contrato ma
trimonial. Por conseguinte, ela viola nao sómente a lei natu
ral, mas também o direito conjugal.
Urna vez propostas estas consideracóes gerais, passemos
a suas aplicagóes concretas.

2. Fecundacao artificial e genitores

Váo compendiados em tres pontos os ensinamentos da sá


moral a propósito:

1) A inseminagáo artificial fora do matrimonio é evi


dentemente tida como imoral. Com efeito, segundo a lei natu-

— 320 —
HOMEM EM TUBO DE ENSAIO?

ral e a lei de Deus positiva, a procriagáo de nova vida nao


pode ser fruto senáo do matrimonio. Com efeito, a tarefa de
procriar está inseparávelmente associada á de educar; ora,
para que haja educagáo, é preciso que haja lar e estável
colaboragáo dos genitores — o que nao se obtém sem casa
mento.
Ademáis a figura da máe solteira é algo que, em vez de
honrar a sociedade, depóe freqüentemente contra ela. A digni-
dade humana é assim vilipendiada.

2) Dentro do matrimonio, pode-se conceber que a fecun-


dagáo artificial seja obtida mediante o elemento ativo de um
terceiro' ou de um «doador» (geralmente anónimo e desco-
nhecido). Ainda que tal processo se realize com o consenti-
mento do legítimo esposo, o tratamento assim concebido me
rece reprovagáo por dois motivos:
— sómente os esposos possuem direito recíproco sobre os
corpos em vista da procriaeáo de nova vida, direito exclusivo
e inalienável, de sorte que a intervencáo (embora discreta) de
terceiro viola os direitos do casal e é jurídicamente considerada
como adulterio;
— ademáis volta á consideragáo o principio segundo o
qual quem gera tem a obrigacáo de conservar e educar a prole.
É a própria natureza quem instituí tal ordem. Ora um mero
e longinquo doador de sementé torna-se incapaz de satisfazer
a tal dever. A prole concebida por intervengáo de um terceiro
é prole sem pai, sem o seu primeiro e mais qualificado edu
cador. O esposo legitimo poderá interessar-se pela crianca con
cebida em tais condigóes; fará entáo as vézes de educador,
nunca, porém, as de auténtico genitor (que está sempre vin
culado a prole por um laco natural de origem). A natureza
será conseqüentemente violada.
Eis sabias palavras de E. Tesson no artigo «Maternité
artificielle» de «Études», margo 1961, pág. 41:

«A familia é necessária ao novo ser chamado á existencia. Ele


tem necessidade vital nao sómente de protecao, mas, ainda mais, de
amor. As pesquisas da psicología contemporánea inculcam esta ver-
dade. As leis da moral nao sao senáo as exigencias do desabrochar
hierarquizado do ser humano.
A familia só pode ser constituida pelo homem e pela mulher que
denam origem á crianca. Sem dúvida, o pai e a máe transmitem urna
vida que os ultrapassa. Mas, já que sao constituidos pelos mesmos
elementos que se encontram na prole, há entre éles e esta um paren
tesco biológico, que é a base do parentesco psicológico e moral que
se deve criar e desenvolver no decorrer dos anos. Há ai urna alianca

— 321 —
6 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969, qu. 1 '

misteriosa entre os elementos biológicos e as zonas mais elevadas


da pessoa, alianca que quase nao foi estudada até agora.
£ verdade que há meios de suprir a paternidade e a maternidade
— meios possíveis e, ás vézes, necessários —, mas pode-se julgar que
devem ser multiplicados tais casos?»

3) Talvez pareca mais justificável a fecundacáo artificial


dentro do próprio matrimonio, quando, por exemplo, se retira
o elemento ativo do marido para injetá-lo artificialmente na
vagina da esposa. Todavía também esta hipótese tem sido re-
jeitada pelos moralistas cristáos. O argumento clássicamente
aduzido para recusá-la é o seguinte:

O meio pelo qual se obteria o esperma masculino para


fecundar a mulher, seria

ou a masturbacáo voluntariamente provocada

ou a prática do onanismo (derramamento da sementé íora do ór-


gáo feminino durante a cópula)
ou a cópula com recurso a instrumentos artificiáis (pessário, es
ponja...)
ou a puneáo do organismo masculino...

Ora qualquer déstes expedientes constitui intervencáo ilí


cita do homem no setor da natureza. A prole é naturalmente
.o fruto do amor ativo e fecundo dos genitores, e nao o resul
tado de processo em que marido e mulher se comportam mais
passivamente do que ativamente, processo sujeito por vézes á
ihtervencáo de um médico.
Eis o que tém dito os moralistas cristáos a respeito da
inseminacáo artificial homologa ou dentro do próprio casal.
Nao é impossível, porém, que se reconsidere tal sentenga, visto
que a inseminacáo artificial em tais casos nao consiste senáo
em auxiliar a natureza na consecugáo de urna finalidade legi
tima dentro de um quadro de vida legítimo (casal devidamente
constituido).

É certo, porém, que a Moral crista nao rejeita o emprego


de meios artificiáis que se destinem únicamente a facilitar o
ato natural de cópula ou a levar ao fim devido a cópula efe-
- tuada segundo as leis da natureza. Em particular, a Moral nao
recusa o seguinte tratamento: dado que a vagina feminina
seja demasiado estreita, é licito ao marido ou ao médico pro
curar dilatar artificialmente tal órgáo (mediante algum anel
ou outro instrumento), a fim de que possa receber a sementé
masculina. Tal operagáo deve anteceder a cópula, de tal modo

— 322 —
HOMEM EM TUBO DE ENSAIO?

que esta se faga posteriormente sem qualquer intervengáo ar


tificial.

3. Fecundajao artificial e prole

A fecundagáo artificial é repelida nao sómente em nome


da dignidade dos genitores, mas também em nome da própria
prole. Em verdade, esta tem direito a devida educagáo, minis
trada por pai e máe num matrimonio estável; ... tem direito
a' urna filiagáo legítima, que a incorpore de maneira clara e
definida a urna familia e a sociedade.
Mais ainda: no caso das experiencias praticadas na Ingla
terra (em 1969), deve-se dizer que a extingáo do feto posto
em desenvolvimento orgánico é equivalente a um infanticidio.
Todo embriáo normalmente concebido tem direito á vida desde
o primeiro instante de sua existencia. Em outros termos: a
nova vida, cuja origem artificial os dentistas vém procurando
obter, possui valor transcendente; nao é mero produto de
corpos químicos a reagir entre si. Ao contrario, em todo em
briáo real há urna alma espiritual, há um ser humano em
principio, que já goza dos direitos da pessoa, dos quais o pri
meiro é o direito á vida. Por isto, a consciéncia nao pode
aceitar que se extinga um feto, porque ésse feto nao interessa
mais ao cientista ou porque toma características defectuosas;
nao é a regularidade ou a deformidade do organismo que jus
tifica a conservagáo ou a extingáo de um embriáo humano.
Ainda que defeituoso, éste é portador de urna alma colocada
por Deus em tal corpo a fim de que por ele volte ao seu
Criador. O ser humano nao pode ser assemelhado a urna
cobaia.

Verdade é que os médicos e moralistas nao podem dizer qual o


momento preciso em que a alma humana entra no respectivo em
briáo. A teoría mais antiga admite um intervalo de quarenta ou
oitenta días entre a fecundacáo e a iníusao da alma. Ao contrario,
os autores modernos, com mais razáo, admitem seja a alma criada e
iníundida no momento da fecundacáo. Como quer que seja, a Moral
crista rejeita qualquer tipo de destruicao de um feto humano, pois
vem a ser atentado contra a vida humana iniciada, e, conseqüente-
mente, um homicidio.

Por isto as experiencias de inseminagáo artificial, como


tém sido praticadas até agora, «in vitro» ou fora do seio ma
terno, sao reprováveis a duplo titulo: intervém indevidamente
no processo da natureza e desrespeitam o direito a vida, nao
levando em conta o fato de que o ser humano (tanto o dos

— 323 —
8 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969, qu. 1

genitores como o da prole) nao é mero agregado de materia


biológica.

4. Voz da Igreja

A Igreja tem-se pronunciado repetidamente contra a inse-


minagáo artificial.

Assim o Santo Oficio, em 24/111/1897, foi interrogado nos


seguintes termos: «Será licito recorrer á fecundagáo artificial
da mulher?» Ao que respondeu: «Após exame e consideragáo
muito diligente de todos os aspectos do tema, e depois de
ouvidos os consultores, a resposta é negativa».
A masturbagáo voluntaria, mesmo por motivos medicináis,
foi rejeitada também pelo Santo Oficio aos 2/VTII/1929. Cf.
«P.R.» 110/1969, pág. 75 (31).
O Santo Padre Pió XII corroborou as declaragóes do
Santo Oficio em discursos proferidos respectivamente
em 29/IX/1949, ao IV Oongresso Internacional dos
Médicos Católicos (discurso transcrito em grande parte em
«P.R.» 4/1957, pág. 7-9),
em 19/V/1956, ao II Congresso Mundial da Fertili-
dade e da Esterilidade (discurso do qual as principáis propo-
sigóes foram incorporadas a éste artigo).
Em conseqüéncia de tais pronunciamentos, assim como
em vista das consideragóes anteriores, poderia alguém julgar
que o cristáo, por imposigáo de suas convicgóes religiosas, tem
de ser um individuo retrógrado em relagáo em ciencia, se nao
mesmo um adversario desta. Haverá também quem pergunte:
que tém que ver a Religiáo e a Moral com os empreendimentos
da ciencia? Esta parece pertencer a um setor autónomo.
Em resposta, deve-se afirmar que o cristáo de modo
nenhum é infenso ao desenvolvimento da ciencia. Contudo ele
sabe claramente que a ciencia por si só nao o sacia; nao sa
tisfaz plenamente á sede que o homem tem de verdade e de
felicidade. Em outros termos: a ciencia torna o homem um
bom médico, um bom engenheiro, um bom matemático; ela
nao o torna, porém, um bom homem; dá-lhe determinadas
perfeicóes, nao, porém, a perfeic&o toda de que é capaz. Em
conseqüéncia, o saber humano terá sempre que ser subordi
nado a um ideal ulterior: a posse do Bem Infinito, ou seja,
de Deus e da vida eterna. Isto quer dizer que, por cima dos
interésses da ciencia, fica ainda a Lei de Deus, Lei que é

— 324 —
HOMEM EM TUBO DE ENSAIO?

expressa no íntimo de cada individuo pela coíisciéncia moral.


Qualquer atividade ou pesquisa, portante, há de ser subordi
nada aos ditames da moralidade; a ciencia que pretende ser
independente, deforma o homem, pois desenvolve apenas um
aspecto de sua personalidade.
Diz o Papa Pió XII:

«A moral natural e crista conserva em toda parte os seus direitos


imprescritiveis; déstes, e nao de consideraeoes de sensibilidade, filan
tropía materialista e naturalista, se derivam os principios cssenciais
da deontologia médica: dignidade do corpo humano preeminencia da
alma sobre o corpo, íraternidade de todos os homens, dominio sobe
rano de Deus sobre a vida e sobre o destino» (discurso de 29/IX/1949).

Subordinando a ciencia á moralidade, o homem nao deve


recear detrimento para a cultura. Ao contrario, a historia
comprova que esta sempre foi incentivada pela consciencia
religiosa da humanidade; cf. «P.R.» 19/1959, págs. 267-277.

5. Csnseqüéncias sociais da inseminacao artificial

1. O estudioso Jacques Lubin escreyeu na revista


«Constellation» (maio de 1959) um artigo intitulado «Les
150.000 enfants de i'insémination artificielle» (os 150.000 fi-
lhos da inseminagáo artificial). Abaixo váo resumidos os inte-
ressantes tópicos désse escrito.
Em 1959 já havia nos E.U.A. 150.000 «bebés-proveta»
(tal era a designagáo usual). Em Nova Iorque nasciam anual
mente 2.000 criangas nessas condigóes. Na Europa, registra-
vam-se 15.000 casos de nascimentos artificiáis por ano: 10.000
na Inglaterra, alguns milhares na Franga, cérea de mil na
Aiemanha e na Italia. Certos ginecologistas apregoavam que
as autoridades públicas se encarregassem das despesas exigi
das por tais procedimentos médicos: além da taxa devida ao
médico, fóssem dados na Franga 20.000 francos ao «doador»,
tambem chamado «pai biológico»!
Eis algumas das dolorosas conseqüéncias que na vida
concreta decorrem de tal comportamento:
a) Geralmente a máe que, com ou sem o consentimento
do marido, quis ter um filho por fecundagáo artificial, mostra-
-se ansiosa por saber quem é o «pai biológico» da crianga, ao
passo que o médico recusa dizer-lho. Em principio de 1959,
os jornais norte-americanos anunciaram com letras aparatosas:
«O roubo mais sensacional do século!» Tratava-se de um furto

— 325 —
10 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969, qu. 1

cometido no laboratorio de um grande especialista de inse-


minagáo, o Dr. E. Georgett, de Los Angeles, a quem hayiam
sido roubados os respectivos arquivos. As fichas désse médico
traziam os nomes de mais de 500 atrizes ou vedetes de ci
nema. Em breve, tornou-se público que a instigadora do furto
fóra urna das próprias clientes do médico, Mrs. Jeanne Eagle,
impelida a tanto pela curiosidade de saber o nome do «doador»
de quem ela concebera um filho!

b) Urna das grandes angustias causadas pela fecundacáo


artificial resulta do fato de que o doador fica no -anonimato.
Nem ele pode saber a quem se destina o material doado nem
a mulher destinatária e seu marido tém o direito de saber o
nome do doador.

Para defender-se da curiosidade dos interessados, os mé


dicos norte-americanos em 1959 exigiam que o casal desejoso
de fecundacáo artificial assinasse a declaragáo seguinte:

«Comprometemo-nos, & risca de nossa honra, a nunca pergirntar


ao médico o nome do doador e a nao lhe pedir qualquer informagáo
sobre a raca, a Jiacionalidade, os sinais particulares, o temperamento
do mesmo. Consentimos em que, após a inseminacáo, se destruam
todas as informacóes e todos os documentos relativos & sua origem.
O doador deve permanecer ignorado para sempre».

c) Na verdade, verificava-se em 1959 que varios mari


dos, após ter dado o seu consentimento la fecundagáo artificial,
lamentavam o gesto e, em 50 % dos casos, suplicavam ao
médico interrompesse a gravidez táo custosamente obtida!
Assim o aborto ou o desejo de abortar sobrevinha ao proce-
dimento anterior. Cita-se mesmo o caso de um esposo que
clamava ao ginecologista: «Deverias ser enforeado, tu, o doa
dor e todos aqueles da vossa especie!»
Narram-se também alguns episodios desconcertantes dos
quais merece especial atengáo o seguinte:
Um marido que nao pudera dar fílhos á sua esposa, con-
sentiu, a rogos déla, em que se fizesse a inseminagáo artifi
cial. Nasceu assim urna crianga que o esposo adotou, dando-
-lhe o nome de Gerard. Tempos mais tarde, porém, marido e
mulher tiveram um filhp legítimo, que chamaram John. Entáo
o genitor desinteressou-se pelo filho mais velho, que nao era
déle e que só viera ao mundo porque a mulher alegava que
ele nao podia ter filho. Sendo tal pai um rico industrial de
petróleo no Texas, resolveu deserdar Gerard, a fim de guardar
todos os seus haveres para John. — Pergunta-se entáo: qual
HOMEM EM TUBO DE ENSAIO? 11

a sorte que caberia a Gerard, o qual nao tinha culpa de haver


nascido em tais circunstancias?
2. A «Enciclopedia Bloch», em seu número de setembro
1968, publica o artigo «Inseminacáo artificial: pecado ou so-
lugáo?», que, embora seja de divulgagáo para o grande público,
dá a ver, ao menos, como é delicado e complexo o assunto.
A titulo de ilustracáo, extraímos désse escrito os seguintes
tópicos:

«A inseminacáo artificial é praticada também no Brasil, apesar


da enorme controversia que desperta. Pouquissimos médicos admitem
comentar públicamente o assunto, nao só devido á repercussáo nega
tiva do processo entre as classes, mas também pela inexistencia de
legislagáo sobre a materia, o que da á prática da inseminacáo arti
ficial um caráter de semiclandestinidade. Além disso, o Código de
Ética, de 1965, proibe a inseminacáo com semen de doador, emboba
autorize a realizada com esperma do marido.
No Rio, contam-se nos dedos os médicos que fazem a inseminacáo
artificial com semen de doador. Um déles, famoso ginecologista. pro-
fessor de urna das Facultades de Medicina da cidade, afirma já haver
realizado em seu consultorio, na Zona Sul, mais de 180 fecundacSes
com doador.
... Para isso, segué as recomendacSes do Dr. Edmond J. Farris,
do Instituto de Anatomía e Biología de Filadélfia, em seu estudo
'Fertilidade Humana': jamáis agir de motu proprio; aconselhar o
casal a conformar-se com a situacáo em que se encontram; sugerir
a marido e mulher a adocáo de urna criamca; marcar novas consultas,
com sucessivos adiamentos, para apurar até que ponto o casal esta
certo do que pretende.
Se. cumpridas essas etapas, o casal insiste ainda em que a mulher
se submeta á inseminacáo com doador, o Dr. A.L.M. marca o dia da
fecumdacáo artificial. Antes, porém, exige que o marido, com a confir-
macáo de sua esposa, assine urna declaracáo que, embora sem efeito
legal, tira parte de sua responsabilidade e, em última análise, serve
como prova de que um e outro queriam mesmo a inseminacáo. Ésse
documento, cm geral, segué o seguinte modelo:
'Eu, N.N., profissao, residencia, estado civil, de minha livre e
espontánea vontade venho pedir ao Dr. N. para proceder á vnsemi-
macáo artificial em minha mulher com semen de um doador selecto-
nado pelo próprio Dr. N. Éste pedido foi feito com pleno consentimento
déla, cuja autorizacáo val também anexa.
Declaro que recorrí a éste extremo parque estou incapacitado
para a procriagao e porque tanto eu como minha mulher temos
imenso desejo de ter um filho e está dependendo disso nossa feli-
cidade'.
A grande maioria dos médicos é contra a inseminacáo artificial
por entender que jamáis se poderá estar absolutamente certo de que
o casal foi sincero em suas declaracdes. É difícil acreditar que, nas-
cida a crianca, nao haverá problemas de ordem emocional entre
marido e mulher. Segundo ésses médicos, há necessidade de apurar-se,
com a máxima exatidao, se a mulher só aceita ter um filho se puder
gerá-lo.

— 327 —
12 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969, qu. 1

Ao contrario dos adeptos da fecundacao com doador, o ginecolo-


gista Jean-Claude Nahoum, especialista em reproducáo humana, acha
que, se um dos cónjuges está incapacitado de procriar. melhor será
que o casal adote urna crianca, ao invés de criar um meio-filho.
Observa o Dr. Jean-Claude Nahoum que sao diversos os proble
mas possiveis de surgir após o nascimento da crianca. Eles váo da
perda da confianza na mulher <'Se ola aceitou ser fecundada por
outro homem, quem me garante que um dia noa acabará me traindo?')
ao ciúme da mulhcr I'Será que ela está pensando no pai do filho que
teve?'), do filho ('Eu nao pude lhe dar um filho') e até ao odio entre
o casal, ainda com o marido a julgar: 'Isso foi traieao e csse filho
nao é meu'.
Ao mesmo tempo, o marido poderá interpretar a presenca do filho
de sua mulher como urna prova de sua limitacáo, impossível de ser
esquecida, pois a todo instante terá diante de si a crianca que nao
pode criar. A partir dai, o marido será tentado a descobrir quem é
o pai do íilho de sua mulher e isso o levará a desconfiar dos vizinhos-
dos amigos, até mesmo de um desconhecido na rúa.
O desenvolvimento do trauma, imprevisível e difícilmente contro-
lável, segundo o Dr. JeanClaude Nahoum, poderá levar o casal á
separacáo. Por tudo isso. defende a adocao como solueüo para a infer-
tilidade do marido» ipgs. 21.23.26).

Tais conseqüéncias sociais da inseminagáo artificial mani-


festam eloqüentemente que tal praxe deveria ser profligada
da sociedade humana c reservada apenas aos animáis irracio-
nais, entre os quais nao há amor consciente nem responsabi-
lidade conjugal. Os números, a propósito, sao surpreendentes;
um médico americano que se prestou aos servicos de «doador»,
tornou-se genitor de 75 filhos! Os especialistas chegaram a
afirmar que um homem medio pode assim tornar-se pai de
20.000 filhos!
No plano jurídico, pergunta-se: Qual é o pai, segundo a
lei, de urna crianca gerada por inseminaeño artificial? Com
que direito se pode considerar o pai aparento como verdadeiro
genitor, já que nao o é nem adotou legal mente a crianca que
nao nasceu déle? — Qual o responsável pelas taras heredita
rias que possam aparecer na crianca? — Por fim, qual a
situacáo da «crianqa-proveta» do ponto do vista da heranga
legal?

Em suma, as conseqüéncias desastrosas e os problemas


deixados abertos pela fecundagáo artificial bradam suficiente
mente claro contra tal praxe.

Bibliografía:

Pió XII, Discurso de 29/IX/1949. em «Acta Apostolicae Sedis»


XXXXI (1949) p. 559s.
SUPERSTICOES E OCULTISMO HOJE 13

Pió XII, Discurso de 19/W1956, em «Revista Eclesiástica Brasi


lera» 16 (1956i), pp. 741-746.
E. Tesson, «Maternité artificielle», em «Études», mars 1961,
pp. 416-418.
«Les méfaits de l'insémination artiíicielle», em «L'Ami du clergé»
69 (1959), p. 354s.
A. Amanicu, «.L'insémination artiíicielle», cm «L'Ami du Clergé»
57 (1947), pp. 813ss e 58 (1948), pp. 97-109.
Cahiers Laennec II, 1946: «L'insémination artificielle».
Blot, «Offensives contre la personne». Ed. Spes.
Caries, «La fécondation». Presses Universitaires de Franco.
«Heresias do jiosso tempo», por um grupo de filósofos e cientis-
tas italianos. Porto 1965, pp. 229-232.
«Pergunte e Responderemos» 4/1957, pp. 610; 40/1961, pp. 135-140.

II. VIDA MODERNA E RELIGIÁO

2) «Pode-se explicar por que é táo foTte o surto, de su-


persticóes e correntes de ocultismo nestes días, em que há tanto
racionalismo o ateísmo?
Que significaido pode ter ésse pulular de 'sobrenatural'?»

Resumo da resposta: O artigo apresenta urna serie de fatos mo


dernos que mostram a extraordinaria voga da superstigáo e do ocul
tismo em nossos dias: artistas de cinema e teatro, campeoes do esporte-
políticos, intelectuais... fácilmente aderem a crengas supersticiosas,
atributado efeitos maravilhosos a causas que absolutamente nao sao
capazes de os produzir.

Tal fenómeno é explicado par quatro principáis causas:


1) A ignorancia o. em especial, a ignorancia religiosa. No homem
é indelével a estrutura religiosa ou a sede do transcendental. Quando
essa sede nao é saciada em fontes auténticas, ela procura apaziguar-.se
no culto de falsos «deuses», ... falsos deuses devidamente enverniza-
dos em nossos dias.
Muito significativa é a etimología das palavras «desejo», «desas
tre» e «considenacüo».
2) A supersticao também nasce do médo. Donde se vé a Impor
tancia de se combaterem temares desarrazoados e injustificados, que
acometem muitas pessoas.
3) Outro fator de superstigáo é a miseria. O homem miserável
procura um pouco de consoló na promessas e mensagens das cren-
dices.
4) Ainda se pode assinalar, neste catálogo, o charlatanismo ou o
interésse comercial de pessoas pouco escrupulosas.

— 329 —
14 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969, qu. 2

O panorama assim propasto há de ser um estimulo para que os


cristáos mais e mais se interessem por atender ás aspiragdes religiosas
do homem moderno.

Resposta: «Superstigáo» vem do vocábulo latino «su-


perstitio», que significa «o excesso» ou «o que resta e sobre
vive de épocas passadas». Na linguagem religiosa dos romanos
pagaos, designava as observancias de culto arcaicas populares
nao mais condizentes com as normas da religiáo oficial do
Imperio.

Na linguagem moderna, «superstigáo» ver a ser «desvio


ou deterioragáo no sentimento religioso»; consiste geralmente
em atribuir a certos objetos (bentinhos, amuletos, talismás...)
ou atos (ritos) efeitos extraordinarios (beneficios ou malefi
cios). A superstigáo nao prova suas afirmagóes, mas supóe,
por parte dos adeptos, piedosa credulidade. A superstigáo
apresenta varias facetas: magia, adivinhagáo, astrologia, ne-
cromancia, quiromancia, cartomancia, crendices da vida co
tidiana. ..

«Ocultismo» é um conjunto de doutrinas reservadas a pou-


cos iniciados. Essas doutrinas revelam a existencia de fórgas
ocultas no mundo, e dáo a conhecer os meios aptos para que
os homens captem o favor das fórgas boas e evitem os male
ficios dos maus poderes. O ocultismo, portante, procura ex
plicar aos que o merecem, as proposigóes ensinadas pela
superstigáo.

Em «P.R.» 27/1960, págs. 91-99, já se encontra um


artigo sobre superstigáo. Evitando repetir, ñas páginas que
se seguem, apuntaremos alguns dos tópicos mais salientes das
superstigóes contemporáneas; a seguir, tentaremos entender o
fenómeno e seu significado.

1. Aspectos da supersticao contemporánea

Em pleno século de luzes, nos ambientes mesmos em que


a cultura é mais evoluida e os homens mais parecem dis-
pensar-se (ou poder dispensar-se) de Deus, observam-se curio
sas manifestacóes de supersticáo. Sejam aqui enumeradas
algumas das mais significativas.

— 330 —
SUPERSTIC6ES E OCULTISMO HOJE 15

1) As estrélas («stars»)

O artista ou a artista de teatro ou cinema que se distinga,


recebe fácilmente o apelativo de «estréla». Tais pessoas, a
quem a sorte mais parece favorecer aqui na térra, sao por
vézes estranhamente dadas a crendices e superstigóes.

a) Assim, por ocasiáo do Terceiro Grande Premio da


Cadeia Européia «Eurovisáo», a imprensa divulgou largamente
os gestos e feitos de uma cantora que se apresentava em
Gannes (Franca), trazendo sobre o ombro um papagaio, cuja
finalidade confessada era «conjurar o azar ou a sorte infeliz».

b) Há anos, dois atores americanos nao cristáos casaram-


-se e ornamentaran! o seu quarto nupcial com bela imagem
de Sao Cristóváo. A esposa (cujo anterior marido perecerá
havia poucos meses num desastre de aviáo) convertera-se ao
judaismo justamente para se casar com seu novo esposo, que
era israelita. Que sentido podia ter Sao Cristóváo para ésse
casal? — A quanto parece, o de uma especie de talismá, e
nao o de um servo de Deus a quem se pede interceda pelos
homens na térra.

c) Certo público estima as «reliquias» das estrélas.


Aos autógrafos dos grandes artistas os fas atribuem
(consciente ou inconscientemente) valor quase mágico: ésses
autógrafos sao assemelhados a pedacos da própria personali-
dade dos artistas, pedacos que comunicam algo da felicidad©
em que estáo imersas as estrélas.
As fotografías sao também muito apreciadas, assim como
os botóes das vestes e outros objetos surpreendentes: Edgar
Morin apresenta uma lista de «recordares» solicitadas a duas
artistas de Hollywood: papel para limpar os labios pintados
de «batom», uma fólha da relva da casa da «estréla», «um
pedaco de chewing-gum que tenhas mastigado».. . Cf. Edgar
Morin, «Les Stars». Éditions du Seuil. Paris 1957, pág. 91.

d) Entre outros, é particularmente famoso o caso de


James Deán. Éste ator americano morreu aos 30 de setembro
de 1955, vitima de desastre automobilístico (guiava a 140
km/h). Tinha entáo vinte e quatro anos de idade.

As circunstancias dessa morte trágica muito aumentaram o pres


tigio de que já gozava o ator. Criou-se um quase culto a James Deán,
acompanhado de catecismo próprio, do qual váo aqui extraídas algu-
mas perguntas:

«A morte de Jimmy é um íim ou um coméco?»

— 331 —
16 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969, qu. 2

«O destino de Jimmy íoi fatal?»


«Encontrou Jimmy na morte urna resposta secreta?...»
Na maioria das cidades americanas constituiram-se clubes Jimmy
Deán. Um ano após a sua morte, todos os días cinqüenta dos fas do
artista aínda iam levar flores ao túmulo do falecido, trazendo ao
pescoco ou na lapela urna medalha comemorativa de Jimmy; aos
domingos, tal homenagem era prestada por duzentas pessoas. Ñas
escolas secundarias, erguiam-se pequeños altares com velas acesas á
memoria do artista.
Enquanto o carro de Jimmy permaneceu no local do desastre, os
curiosos puderam inspeccioná-lo pagando US $ 0,25 (para sentar-se ao
volante, ,requeriam-se outros US S 0,25). Ésse carro foi, depois, levado
como troféu a diversas cidades dos E.U.A., e, finalmente, vendido
em pedacos, dos quais cada um custava ao menos US $ 25,00. Nao é
difícil compreender que posteriormente se tenham descoberto nume
rosas falsas «reliquias» désse veiculo.

O culto de James Deán assumiu ainda outras formas. Propagou-se


o rumor de que o artista voltava ou do além enviava sinais e men-
sagens.

Houve mesmo quem afirmasse que Deán nao morrera: escapara,


sim, milagrosamente ao perigo de morte; quem morrera, era um
jovem que viajava com Deán em carona. Os fas acreditaran!, pois, que
James se enoontrava, desfigurado e irreconhecível, em um abrigo de
loucos ou num hospital.
A propósito apareceram dois artigos de Raymond, de Becker, com
o titulo «James Deán ou l'aliénation signifiante», na revista «La Tour
Saint-Jacques» ais. 9 e 10 de 1957.

Alias, sempre se notou entre os homens a tendencia a


recusar a morte dos que se destacaram extraordinariamente
por sua fama, sua gloria, seu poder político ou sua riqueza:
tal foi o caso de Frederico Barbarroxa, Carlos o Temerario,
D. Sebastiáo de Portugal, Napoleáo, Adolf Hitler...

e) Também se deve registrar a figura de Mike Hawthorn,


inglés, campeáo mundial de corridas automobilísticas, o quál
pereceu em desastre aos 22 de Janeiro de 1959, perto de
Guildford, com 29 anos de idade.

Hawthorn faleceu no dia em que devia assinar um con


trato que lhe atribuía as fungóes de diretor técnico da «York
Noble Cars», com o rendimento anual de dez milhóes de
libras. A gloria maravilhosa conquistada pelo jovem e táo
imprevistamente desfeita deu ensejo a que se instaurasse um
culto a Hawthorn: desde o dia 23 de Janeiro, os peregrinos
afluiram a estrada de Guildford; todavía os ingleses nao se
deixaram empolgar pelo «herói» ñas proporgóes em que os
americanos se entusiasmaran! por Jimmy.
SUPERSTICOES E OCULTISMO HOJE 17

2) Os sonhos

A crenga em sonhos proféticos é táo antiga quanto a


literatura primitiva. Artemidoro de Éfeso (séc. II d.C.) pu-
blicou a obra «Onirocríticon» (chave para interpretar sonhos),
que recentemente fbi traduzida para línguas modernas e re
editada.

Em nossos tempos multiplicam-se as «Chaves de sonhos».


Ainda em 1961 as edigóes Garnier, de París, publicaram a obra
«O Grande Intérprete de Sonhos. Guia infalível para explicar
sonhos e visóes, com a indicacáo dos números de lotería para
cada sonho». O autor se dissimulou sob a rubrica «O Último
Descendente de Cagliostro». Eis algumas das explicagóes for-
necidas:

Ajudante (visto em sonho) Aborrecimento próximo 41


Adulterio Alegria e satisfacáo 10,36
«Se tu o cometes» Beneficio cesrto 45,54
«Se tua esposa o comete» Grande beneficio para vos 63,78,91
Alemanha, visitá-la Boa informacáo 29
Ver um alemáo comer repolho Viagem agradável 32,51
Dois alemñes que se abracam DedicacSo a toda prova 29.31
Asno Ciencia e coragem 32.61

Arcebispo Perigo noturno 63,83


Chocolate Casal feliz 6,40
Incesto Progresso das artes 1,14,41
Insultar um juiz Afabilidade, aumento de bens 1.22.
Judeu O sonhador se enriquecerá 1,29
Médico Marte 12,13
Salsicha Desonra 22 81
Uísquc Desagrado 27.
Zinco Inquietacáo seguida de paz 8

Por mais irrisorias que paregam tais interpretagóes, elas


foram realmente dadas ao público em obra que pretende ser
seria. Pergunta-se: que podem ter de atraente e sensato tais
explicagóes? Por que suscitam tanto interésse por parte dos
leitores?... Por provirem de ambiente europeu, onde a cul
tura geral é mais sólida e elevada do que no Terceiro Mundo,
as chaves de sonhos sao mais surpreendentes e também mais
significativas da estranha situagáo em que se encontra a
humanidade contemporánea. Note-se que essas chaves nada
tém que ver com os principios da psicanálise (que até certo
ponto goza de base científica e experimental); devem-se a
mera superstigáo.

— 333 —
18 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969, qu. 2

Verdade é que a Biblia refere sonhos auténticamente ins


pirados por Deus (cf. «P.R.» 19/1959, págs. 294-299). O fato,
porém, de que o Senhor algumas vézes se tenha servido de
sonhos e visóes noturnas para se comunicar ao homem, está
longe de significar que todo sonho tenha sua mensagem divina.
Esta tem de ser comprovada caso por caso, e nao pode ser
suposta de maneira geral.

3) Ocultismo na Rússia Soviética

Como se sabe, a alma russa é profundamente mística.


Nem sempre foi preservada de ilusóes neste setor; a corte dos
czares foi freqüentada por magos e taumaturgos, entre os quais
sobressai Rasputine (cf. «P.R.» 53/1962, pág. 163-170, onde
a figura déste místico é apresentada).
O regime comunista implantado na Rússia é visceralmente
oposto á crenga no espirito, no misterio religioso e, conseqüen-
temente, no ocultismo. Seria, pois, para crer que, após mais
de cinqüenta anos de marxismo, estivesse extinta toda e qual-
quer forma de ocultismo em territorio soviético.
Os fatos, porém, revelam o contrario.
A «Revue Spirite» (1967, n" 3, pág. 116), de Franca,
transmite a seguinte noticia:
Alex Votogov apresentou ao público no hebdomadario
moscovita «Nedelya» urna comunicagáo que tinha foros de
ciencia ou, melhor, de ciencia de ficgáo: Vologov concebera,
sim, um aparelho chamado «arqueovideofone», semelhante a
urna estaca© de radio; tal aparelho, afirmava o inventor, per
mitiría «conversar oom um antepassado da geragáo presente».
Tratava-se de urna máquina eletrónica, em cuja «memoria»
o operador colocaría os seus tragos físicos, as notas de seu
caráter ou temperamento, e os seus dotes de inteligencia; além
do que, colocaría a historia de sua familia, cartas e fotogra
fías dos respectivos parentes, e outras informagóes.. . Assim
preparado, ésse aparelho eletrónico reconstituiría urna imagem
dos ancestrais do operador, com os quais seria possível con
versar. Dilatando o seu olhar, Alex Vologov terminava o
artigo exprimindo a esperanga de que «urna programagáo
adequada poderia colocar até mesmo Aristóteles no apaj'elho
eletrónico». 4
Em seu número 5 do mesmo ano de 1967, a «Revue
Spirite» voltou a falar de Vologov; éste estudioso anunciara
ter concebido urna máquina de cálculo que possibilitaria co-
nhecer a opiniáo de Beethoven sobre a música contemporánea!

334
SUPERSTICOES E OCULTISMO HOJE

L. Fourcade, o articulista espirita da «Revue Spirite» assim


comenta a noticia:
«Vologov nao fala de espíritos nem de médiuns; indica o
calculador eletrónico como fator principal do maravilhoso fe
nómeno. Todavia essa omissáo (da referencia a espirito) é
compreensível na Rússia soviética».
Em conclusáo, o escritor L. Fourcade se regozijava por
verificar que na Rússia reaparecía a crenca na sobrevivencia
da alma, ainda que dissimuladamente sob o anuncio de «expe
riencias científicas». Os aparelhos eletrónicos de Vologov justi-
ficavam o otimismo dos ocultistas franceses!
Na verdade, Vologov, sob a aparéncia de proclamar des-
cobertas científicas (aparéncia necessária na Rússia), nao
fazia senáo dar expansáo ao misticismo eslavo; o ocultismo
nao podia, em país comunista, renascer sob a forma de espl
ritualismo puro; era-lhe necessário o revestimento pseudo-
-científico ácima descrito.

4) Astrológica e horóscopo

A astrologia ó a arte de predizer o futuro de alguém a


partir da posicáo ocupada pelos astros por ocasiáo do nasci-
mento dessa pessoa. Já praticada por caldeus e outros povos
pré-cristáos, a astrologia foi constantemente cultivada no
decorrer dos sáculos. Embora muito combatida, até nossos
dias a astrologia está em voga, logrando extraordinario su-
cesso nao sómente entre os simples, mas também entre pessoas
intelectuais e cultas.
Durante a segunda guerra mundial (1939-1945), a baro-
neza Irene von Weldegg fez sucesso e escola na Alemanha
(desde 1933 anunciava urna era de hegemonía alema grasas
ao genio do «Führer» Hitler); os astrólogos se multiplicaran!
entáo no «Reich», favorecidos pelo terceiro homem do regime
nacional-socialista: Rudof Hess. Quando éste fugiu para a In
glaterra, o furor de Hitler desencadeou-se contra os astrólo
gos, que encheram os campos de concentracáo (o famoso
astrólogo Karl Ernst Krafft morreu em Buchenwald); alias,
os déspotas orientáis outrora, quando decepcionados por astró
logos, vingavam-se de modo semelhante, infligindo duros su
plicios a ésses seus servidores. Em 1939, as livrarias da Franca
tinham suas vitrinas cheias de livros de autores (cuja recor-
dagáo se esvaeceu rápidamente) que anunciavam a vitória
francesa para breve. Nos Estados Unidos da América, os
horóscopos prediziam a morte do «Führer» todos os dias; do
20 ' ^«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969, qu. 2
lado alemáo, porém, Goebbels zombeteava através do radio,
dando a entender que também os nazistas tinham usado o
horóscopo como meio de propaganda e sugestionamento em
seu favor!

Na Franga, tém sido defendidas teses de doutorado em


medicina que se inspiram da astrologia. Assim em 1964 Claude
Michelot confeccionen a obra «L'Étude du theme de naissance
dans la psychoso périodique», tese aceita pela Faculdade de
Medicina de Lyon.

Inegávelmente, a astrologia carece de bases científicas


(note-se que nenhum astrónomo é astrólogo); ela se apoia
exclusivamente sobre crendices e postulados gratuitos. Os
cientistas reconhecem, sim, as influencias reais do sol, da lúa
e dos planetas sobre a térra; estudam os mares, os raios cós
micos, a zona de Van Alien e a magnetosfera que envolvem
a térra, as emissóes rádio-elétricas enviadas á térra pelo sol,
por Júpiter, pela Vía Láctea, os raios gama e x provenientes
de certas estrélas, etc. Todavía um homcm de ciencia nao
pode aceitar que essas influencias gerais dos astros sejam
causas do temperamento, dos tragos físicos ou moráis ou dos
acontecimentos da vida de Pedro, Paulo, Josefina, Antonia...;
as causas seriam demasiado vagas para tao precisos efeitos.
É sómente na base de imaginagáo e de coincidencias gratuitas
que se pode cultivar a astrologia. Nao obstante — seja licito
repetir , ela goza de elevado prestigio ainda neste sáculo
de luzes.

5) Talismñs

Eis um dos casos niais frisantes que no setor de talismás


se registraram recentemente:

Urna revista de astrologia «Ici Paris» publicou recente-


mente o anuncio de urna estatueta hindú que representava a
deusa Lakshmi, esposa de Vichnu. O titulo da comunicagáo
era o seguinte: «Ésse talismá nao ó como os outros. É um
ídolo». Os interessados poderiam receber documentagáo sobre
a estatueta mediante o envió de tres selos á redagáo da re
vista. Tal documentacáo enviada aos correspondentes, entre
outras coisas, exibia a profissáo de fé em Lakshmi, redigida
por tres campeóes ciclistas da Franga altamente conhecidos.
Eis o teor dessas confissóes de fé:

a) Na revista «Ici Paris» de 1" de agosto de 1967,


escreve Roger Pingeon, vencedor do «Tour de France»:
! SUPERSTICOES E OCULTISMO HOJE 21

«Há cérea de dois meses encontrava-me em casa de um amigo,


quando, entrando em seu escritorio, lancei o olhar para encantadora
estatueta. Movido por fórea invencível, tomei ésse objeto ñas maos e
perguntei ao amigo o que representava.

Foi com entusiasmo que ele me contou a historia dessa estatueta,


assim como a feliz transformacao de vida que ele atribuí sem hesi-
tacáo á presenca, sob o seu teto, da deusa Lakshmi.
Nao sou fetichista...; todavía as palavras persuasivas de meu
amigo decidiram-me a procurar ter para mim urna das efigies da sua
deusa. Na verdade. quantos atletas, apesar de suas possibilidades,
suas qualidados, sua coragem, viram sua Vitoria comprometida pelo
infortunio, a fatalidade. um acídente estúpido mecánico ou pessoal?
Devo dizer com toda a franqueza que, no que me concerne, desde
que tive Lakshmi em meu poder, experimentei a certeza de que ga-
nharia o Giro de Franga. Durante o esfórco, senti-me sustentado e
protegido contra todos os perigos.
Minha confianca na deusa foi largamente recompensada.
HOJE O FATO ESTA CONSUMADO. GANHEI O GIRO! MINHA
VITORIA É TAMBÉM UMA VITORIA DA DEUSA LAKSHMI!
Minha derrota no Campeonato Mundial só contribuiu para refor
jar minha confianza no poder extraordinario de Lakshmi. Na febre
da partida, esqueci o medalhSo (de Lakshmi), o que me fez compre-
ender que, de entáo por diante, eu nao me deveria mais separar déle
desde que eu quisesse preservarme de todas as desgraoas e ter sorte
favorável».

b) A mesma revista «Ici Paris» publicou a 12/IX/67 o


testemunho de Eddy Merckx, campeáo mundial de ciclismo,
testemunho amplamente divulgado:

«A continua boa sorte que acompanhou Pingeon ao longo do


Giro de Franca, e o comportamento déste amigo em cada etapa cons-
tituiam para todos um misterio.
Foi Pingeon mosmo quem, com franqueza, me revelou o seu
segr&do. Por minha vez, resolví adquirir urna das efigies da miste
riosa deusa.
Confesso que, logo que entrei na posse de Lakshmi, tive urna
impressáo muito nitida de seguranza, bem-estar e extraordinaria des-
preocupagáo.
Desde entüo obtive a certeza de que nada de mau me poderia
acontecer no futuro.
Naquele momento também compreendi que eu seria o ditoso ven
cedor do Campeonato do mundo.
Como Pingean, proclamo a minha vitória e, igualmente, urna
Vitoria da deusa Lakshmi ! ! ! »

c) Ainda o periódico «Ici Paris», aos 10/X/67, publicou


o terceiro testemunho, da pena de Jacques Anquetil, teste
munho depois propagado sob a seguinte forma:

— 337 —
22 <rPERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969, qu. 2

Unía revelagáo -estarrecertora

«Os maiores campeóes do mundo sao todos unánimes em atribuir


sua Vitoria á deusa Lakshmi.
Anquetil revela ! Minha Vitoria ! ! ! Mais um milagre da deusa
Lakshmi! ! !
Todos estáo estupefatos com as últimas e extraordinarias perfor
mances de Anquetil !
Os homens se admiram. por vczes criticam, reícrcm historias
imaginarias!
É Anquetil mesmo quem vos revela aqui o quo vos ignoráis.
Deixai-o íalar:
Em torno de mim. muito se discutía a respeito de um talisma
que. a quanto parece, nao era como os outros.
Fiquei sabendo que Pingeon e Merckx lhe atribuiam, em grande
parte, as suas brilhantes Vitorias. Essas revelagñes me perturbaram
profundamente.
Resolví, também eu, tomar conhecimento mais exato désse famoso
talismá e de seu poder, que me diziam ser extraordinario.
O que íiquei sabendo, moveu-me a procurar obter quanto antes
urna efigie da deusa; e confesso que, desde que entrei em posse da
mesma, urna fórca desconhecida se apoderou de mim.
Desde aquéle momento, persuadi-me de que nem pessoa nem
ooisa alguma poderia agir contra mim. e de que Lakshmi, por sua
preseaica e seu podor, me levaría cm toda e qualquer hipótesi;
á Vitoria final, que eu desejava mais do que nunca e com todas as
minhas fórcas.
Essa Vitoria, eu a obtive, e devoa. em grande parte, á deusa
Lakshmi. Durante a corrida, e apesar de todos os ataques dirigidos
e sustentados contra mim, bastava-me, para me restaurar na confianza
e crer na minha Vitoria, pensar em Lakshmi, que eu trazia eomigo.
Obrigado, Lakshmi !
Jacques Anquetil»

Poder-se-iam multiplicar os oxcmplos da grande voga do


que gozam talismás e outros objetos de superstigáo. Os dados,
muito recentes, mencionados ñas páginas anteriores sao sufi
cientes para suscitar a pergunta:

2. Que significado tem -a supersticao moderna ?

O fenómeno paradoxal das numerosas superstigócs moder


nas leva o estudioso a procurar saber o sentido que possa ter.
Eis o que a propósito se pode dizer:
As superstigóes modernas sao, em última análise, um
«Ersatz» ou substitutivo da verdadeira fé e da genuina ati-

— 338 —
SUPERSTICOES E OCULTISMO HOJE 23

tude religiosa. O homem contemporáneo pode pretender que


nao precisa mais de Deus; pode julgar que dispensa o Senhor
para ser feliz e honesto. Nao obstante, tais afirmagóes nao
conseguem destruir a estrutura essencialmente religiosa do ser
humano: nao crendo no verdadeiro Deus e nao O cultuando,
o homem é levado a cultuar, sob variadíssimas formas (adap
tadas ao temperamento de cada uní), ídolos e crendices.
Em outros termos: a consciéncia do misterio e a sede do
sobrenatural se manifestam descontroladamente ñas supersti-
góes, como também se manifestavam nos mitos dos antigos
povos; cf. «P.R.» 112/1969, págs. 141-147.
Em particular, no tocante á astrologia, a pertinacia com
que muitos e muitos homens lhe aderem (apesar das conquis
tas da astronáutica), explica-se de maneira muito interessante,
mediante observares filológicas. Estas mostram que interro
gar os astros e as misteriosas configuragóes das estrélas pro
porciona ao homem, de certo modo, o apaziguamento de urna
angustia. Com efeito, o Dr. B.-J. Logre no seu tratado «Psy-
chiatrie clinique» (pág. 139) propóe as seguintes considerac,6es
de etimología:

A palavra «dese.jo* (muito comum no vocabulario dos adivinhos


c da humanidadc cni gei-alt vom do latim «dcsideriuin». Ora «deside-
rium» se compoe do preíixo latino de*, que significa afastamento,
priva;áo. e sidus, sideris, palavra que em latim designa «astro».
O «desiderium», portanto, é a decepcáo ou a angustia que alguém
experimenta por «nao ver um astro», astro que o interessado esperava
ansiosamente avistar. Donde se pode dizer que o desejo primordial,
no homem, é o desejo dos valores misteriosos transcendentais. Quem
nSo sabe satisfazer auténticamente a tal desejo do «misterio», procura
urna pseudo-resposta na contemplaeáo dos astros.
Mais aínda: a palavra «desastre» (des-astre), em seu sentido pri-
milivo, designava a triste situacao em que alguóm se achava julgando
que Jora abandonado pela influencia benéfica dos astros.
O verbo «considerar» provém igualmente de «sidus. sjderis»; sig
nifica originariamente «observar os astros», tomando depois o sentido
de «examinar atentamente qualquer ooisa».
A palavra «sideracáo» significava um brusco golpe infligido a
determinada pessoa por maligna influencia dos astros; principalmente
o sol era temido, de modo que «insolacáo» designava qualquer mal
grave.

Note-se também que a palavra «contemplar» vem de «templum»


(templo, em latim). «Templum» indicava um espaco limitado e livre
no céu, espaco que os adivinhos circunscreviam e subdividiam, tra-
cando sinais no ar com urna vara, para ai observar o vóo dos pássaros.

O sentido primitivo de tais palavras fornece valiosa ex-


plicacáo para a tenacidade da astrologia: dá a ver que urna

— 339 —
24 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969, qu. 2

das aspirares mais fundamentáis do homem está associada á


idéia de observar o céu e os astros, pois estes parecem ser
símbolos qualificados do transcendental e infinito, ao qual
todo ser humano espontáneamente aspira.
Impóe-se agora urna reflexáo final.

3. Causas da superstigáo e antídotos

Como se compreende, o fenómeno «superstigáo» é favo


recido por fatores varios, dos quais quatro parecem ser os
principáis:

1) A superstigáo, como foi dito, c o substitutivo da ver-


dadeira fé. Isto significa que ela decorre da ignorancia, e da
ignorancia religoisa Verdade é que muitas das pessoas que
cedem á superstigáo, possuem instrugáo e cultura; a sua cul
tura, porém, é nao raro incompleta, meramente técnica, nao
equilibrada por claras nogóes de filosofía e religiáo. Falta-lhes
urna auténtica cultura gcral.

Vé-se, pois, que importante remedio para deter a onda


das .superstigóes consisto orn promover a cultura Reral, e, de
modo especial, a boa formagüo religiosa dos jovens e adultos
de hoje. De todas as formas de ignorancia, a mais prejudicial
é, sem dúvida, a ignorancia religiosa. Na verdade, o senso
religioso é inato e incoercível no ser humano; caso nao seja
devidamente orientado para o vordadeiro Deus, dirige-se na
tural e inevitávelmente para falsos deuses ou Ídolos camuflados
sob os títulos mais envernizados e ilusorios que possam ocorrer
na vida moderna.

2) A superstigáo provem também do médo. Ela é apre-


sentada com acertó pelo Dicionário «Larousse du XX« siecle»
nos segtrintes termos:

«Supersticáo: desvio do sentimento religioso fundado sobre


o médo ou a ignorancia, de modo a se atribuir caráter sagrado
a crencas vas...»

A superstigáo é, sim, «Filha do Médo».


Será oportuno, pois, que os cristáos esclarecidos lutem
contra todos os temores excessivos, injustificados e desarrazoa-
dos, que muitas vézes afligem os homens em fases depressivas
da vida. Quando alguém sofre alguma calamidade. é propenso
a crer que a salvagáo ou o alivio Ihe viráo de qualquer fonte
SANTOS «CASSADOS» E «CONFINADOS»? 25

que lhe seja hábilmente apresentada. Tenham-se em vista cer


tas pessoas doentes e sua inclinagáo para crendices.
3) A superstigáo origina-se outrossim da miseria. Esta
tende a privar o homem de seu bom senso, «bestializando-o»
em certo grau. O homem miserável fácilmente tende a pro
curar suas consolac,óes e seus momentos de felicidade aderindo
ao «maravilhoso» que as práticas e teorías supersticiosas lhe
proporcionam.
4) O charlatanismo é outro fator que alimenta a supers-
tigáo entre os homens. Comerciantes interessados em ganhar
dinheiro nao hesitam em propagar as mais falsas idéias entre
os seus concidadáos, suscitando a compra e a propaganda de
objetos «pseudo-religiosos».
Em conclusa©: deve-se dizer que, enquanto houver homens
sobre a térra, existirá a procura do sobrenatural. Ora a au
téntica resposta a tal procura só se encontra na Palavra de
Deus transmitida pela revelacáo judeo-cristá. Quem ignora
essa auténtica resposta ou a ela se subtrai, arrisca-se
a sofrer tremendas decepgóes na vida. Por conseguinte, o surto
de superstigóes contemporáneas vem a ser um veemente apelo
dirigido aos gemimos arautos do Evangelho, a finí de que váo
ao encontró dos honions que procuram a Deus sein saber onde
O encontrar!

Na coníeccáo déste artigo, valemo-nos do copioso material forne-


cido pelos livros seguintes:
Alee Mellor, -Catholiques d'aujourd'hui et sciences oceultes».
París 1968.
«La Supcrstition, ersatz de la fob, eolecüo «Je sais-Je crois».
n' 147.

III. DOUTRINA

3) «Gomo se pode entender !o cancelamento das festas


de Santos que estavam no calendario da Igreja?
Os Santos foram eassados ou confinados?»

Resumo da resposta: A Igreja reformou recentemente o seu


calendario litúrgico diminuindo o número de festas de Santos, a fim
de permitir ao povo cristáo celebrar mais atenta e profundamente
as diversas fases da obra redentora de Cristo, desde o Advento até
Pentecostés. Tal reforma foi preconizada pelo Concilio do Vaticano II
e só pode ser tida como benéfica para a piedade.
26 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969. qu. 3

Retirando (ou tornando facultativas) certas festas, a Igreja nao


cassou Santo algum. A santidade nao é título que a Igreja atribua
e retire a seu bel-prazer, mas é urna realidade que caracteriza o seu
sujeito indepejidentemente do conceito dos homens. Todo santo que
esteja na gloria de Dcus, mas tenha sido retirado do calendario pode
continuar a sor invocado pelos fiéis; Deus nao priva o seu povo dos
seus intercessores celestes.
Verdade é que na revisño do calendario eclesiástico os estudiosos
verificaran! que varias historias transmitidas a respeito de Santos
eram espurias. A Igreja o declaren lcalmonte, sem se i-ontradizer,
pois o magisterio da Igreja nunca definiu a veracidade de alguma
historia concernente a Santos. Acontecía apenas que o povo de Deus,
com seus bispos, dava crédito a documentos espurios forjados em
épocas remotas, segundo o gósto dos antigos; ... davam crédito,
porque, dada a falta de senso critico dos historiadores de outrora, «nao
viam motivo para duvidar da autenticidade de tais documentos.
Nisto nao houve fraude nem engaño formalmente ditos, mas
apenas expressáo da limitacao humana, da qual Deus so isenta a sua
Igreja quando se trata dos artigos do Credo e dos principios da Moral
crista.

Resposta: Causou perplexidade nos círculos católicos e


nao católicos a recente reforma do calendario litúrgico, em
conseqüéncia da qual varios sanios deixaram de ter seu dia
de festa oficial.
Houve quem falasse de «cassacáo de santos» ou atribuisse
á Igreja atitudes incoerentes. Na verdade, o gesto da Santa
Sé se explica muito fácilmente. Por conseguinte, para dissipar
as dúvidas, seguir-se-á abaixo uma síntese do documento
(Motu proprio «Mysterii paschalis») em que o Santo Padre
Paulo VI, aos 14/IT'1969, apresentou a reforma do calendario
litúrgico.

1. Os porqués e o teor da reforma

A piedade crista tem por objeto principal o «misterio


pascal», ou seja, o misterio da Paixáo, da Morte e da Ressur-
reicáo do Senhor. Com efeito, o Cristianismo trouxe ao mundo
a Boa-Nova de que o Filho de Deus tomou a miseria e a
morte do homem, a fim de lhes dar sentido novo: fez délas
a passagem para a ressurreicáo e a vida eterna. Esta Boa-Nova
nao é apenas mensagem para a inteligencia de quem a ouve,
mas^ torna-se fermento regenerador, germen de eternidade
gloriosa, mediante a S. Eucaristía. Na verdade, a Eucaristía
perpetua sobre os altares a Paixáo, a Morte e a Ressurreicáo
de Cristo, ou seja, o misterio de Páscoa, para que os fiéis
SANTOS «CASSADOS» E «CONFINADOS»? 27

participem désse misterio e recebam na S. Comunháo o penhor


da Vitoria sobre o sofrimento e a morte.

A Liturgia, celebrando a S. Eucaristía, apresenta através


dos sucessivos domingos do ano as diversas facetas da Reden-
Oáo obtida por Cristo: nascimento, vida oculta, vida pública,
paixáo, morte, ressurreigáo, ascensáo de Jesús e Pentecostés.
No decorrer de cada ano litúrgico, os fiéis tém assim a oca-
siáo de contemplar as diversas fases da obra redentora, glori
ficando o Salvador e pedindo-lhe as gracas deoorrentes de
sua vitória.

Acontece, porém, que através dos tempos Deus suscitou


cristáos de santidade notável em meio ao seu povo. Após a
morte, ésses justos foram considerados amigos do Senhor e
irmáos dos fiéis peregrinos na térra; conseqüentemente foram
tidos como intercessores junto a Deus na gloria celeste. Tal
modo de ver explica que o povo cristáo, desde remota época,
se tenha habituado a celebrar anualmente o aniversario da
morte dos grandes santos que tém marcado a historia do Cris
tianismo. A conseqüéncia desta praxe é que o calendario litúr
gico foi assinalando para cada dia urna ou mais festas de
sanios, das quais algumas cram precedidas de vigilia e seguidas
de oitava. A devo?áo dos fiéis era assim mais e mais atraída
para os santos, enquanto as celebragóes da obra redentora de
Cristo ficavam na penumbra.

Observa o Santo Padre Paulo VI:

«No decorrer dos séculos, a multiplicado das festas, das vigilias


e das oitavas. como também a complicac.áo progressiva das diversas
partes do ano litúrgico, muitas vézes levaram os fiéis a devocoes par
ticulares, afastando os um pouco dos misterios fundamentáis da nossa
Rctlcncfio» (Motu proprio «Mysterii paschalis»).

Em vista disto, esbocou-se nos tempos recentes urna ten


dencia reformadora. Já o Papa S. Pío X (1903-1914) empre-
endeu certa simplificacáo do calendario litúrgico. Pió XII e
Joáo XXIII continuaram a reestruturacáo da Liturgia. Final
mente o Concilio do Vaticano II, em sua Constituicáo sobre a
S. Liturgia, decretou:

«Para que as festas dos santos nao prevalegam sobre as- que
comemoram os misterios da salvagáo, muitas dessas festas serño
deixadas á celebracáo de provincias eclesiásticas, nag5es ou famil.as
religiosas em particular. Ao contrario, seráo celebradas na Igreja
inteira apenas as festas de Santos que tenham importancia universal»
(n' 111).

— 343 —
28 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969, qu. 3

Ora, foi para executar tal decreto do Concilio do Vati


cano II que a S. Congregacáo dos Ritos, com a aprovagáo do
Papa Paulo VI, publicou recentemente o novo calendario cris-
táo. Éste suprime algumas festas de Santos antigos, torna
facultativas outras festas antigás (outrora obrigatórias) e
introduz algumas festas de Santos recentes. Estas celebragóes
novas se referem a Santos de continentes evangelizados tardía
mente, como a África, a América, a Oceania, e certas regióes
da Asia (Japáo). Destarte o calendario cristáo, em sua sim-
plicidade nova, tornou-se mais eloqüente: lembra aos fiéis de
hoje que a santidade nao é o privilegio dos primeiros séculos
ou de regióes européias, mas é um dom que o Espirito Santo
concede aos cristáos de todos os tempos e de todas as nagóes.
Nestes termos, o novo calendario pode ser calorosa ligáo para
o povo cristáo e viva exortagáo á procura da santidade nos
dias que correm; os modelos de santidade estáo muito perto
de nos!

2. Os criterios da reforma do calendario

Pergunta-se: quais os grandes principios que nortearam a


renovagáo do ciclo santoral da Igreja?
— Sao cinco:

1) Revisño meticulosa dos documentos hagiográficos


A Santa Sé procedeu a urna análise crítica dos documentos
históricos que constituem a base de cada festa de Santo.
Éste é um dos pontos que mais se prestaram a mal-enten
didos. Eis conu* se devem entender os fatos:
Até o século XII nao se realizavam processos de canoniza-
gáo na Igreja. O povo cristáo, consciente das virtudes déste
ou daquele justo, passava a venerá-lo como santo após a morte.
Os bispos zelavam para que sámente auténticos mártires ou
confessores da fé fóssem venerados pelo povo de Deus; cris
táos idóneos eram encarregados pelos bispos de consignar por
escrito o que se dizia a respeito das virtudes de tal justo e
dos milagres obtidos por sua intercessáo. Diversos concilios
da antiguidade e do inicio da Idade Media tiveram que proibir
o culto público tributado a servos de Deus antes que a auto-
ridade eclesiástica se tivesse oficialmente pronunciado a seu
respeito; também promulgaram cánones que mandavam can
celar das listas dos Santos nomes ai prematuramente inseridos
pelo fervor popular. Os nomes de Santos venerados em deter-

— 344 —
SANTOS «CASSADOS» E «CONFINADOS» ? 29

minada diocese eram comunicados a outras dioceses, de sorte


que havia Santos unánimemente cultuados em toda a Igreja,
enquanto outros gozavam apenas de culto local.
Deve-se, porém, registrar que até o fim da Idade Media
a imaginacáo popular se deleitava em narrativas maravilhosas
(julgava-se que todo Santo devia ser taumaturgo), de modo
que naqueles séculos recuados foram escritas «Atas de marti
rio» e biografías de Santos que exageravam o prodigioso.
Note-se também que naquelas épocas distantes os homens nao
possuiam o senso da crítica historiográfica nem tinham meios
de controlar a autenticidade de documentos pretensamente
históricos, de sorte que se propalavam sem dificuldade tais
«Vidas de Santos»; tanto os bispos como os fiéis as acatavam
de boa fé e com edificagáo espiritual, a menos que houvesse
evidente indicio de náo-historicidade dessas biografías porten
tosas.

Ora em nossos dias, com o despertar dos conhecimentos


históricos, a Santa Sé verificou que nao poucos documentos
concernentes aos Santos antigos nao sao rigorosamente fide
dignos. Compreende-se entáo que as autoridades da Igreja
tenham lealmente comunicado aos fiéis os resultados das pes
quisas historiográficas, pois a piedade nao se deve nutrir em
fontes espurias. Neste gesto da Santa Sé nada há de repro-
vável ou vergonhoso; com efeito, a Igreja nunca definiu a
historicidade das «Vidas de Santos» nem impós aos fiéis a
crenca nos portentos atribuidos aos taumaturgos populares
nem sequer obrigou os cristáos a ter devocáo a tal ou tal
Santo.
Verdade é que as autoridades eclesiásticas aceitaram como
auténticos certos documentos que eram espurios, baseando-
-se niles para confeccionar o calendario litúrgico. Note-se,
porém: ... aceitaram-nos de boa fé, ou seja, porque nao havia
motivos para nao os aceitar ou para duvidar de sua genuinidade.
Nisto — é certo — se manifestam as contingencias e limita-
c5es humanas das quais Deus nao quer preservar a sua Igreja,
desde que nao estejam em perigo os artigos da fé e os principios
da Moral crista (as noticias, verdadeiras ou falsas, concernen-
tes aos Santos nunca foram objeto de dogma católico).

Em outros termos: a veneracáo aos Santos como tal pertence


indiscutlvelmente ao patrimonio da fé católica. Todavia o modo como
se há de realizar o culto dos Santos está associado ao modo humano
de conhecer a historia e a hagiografía; por isto é passlvel de re
forma sempre que as pesquisas dos historiadores a recomendem ou
exijam.

— 345 —
30 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969, qü. 3

Os resultados das pesquisas historiográficas revelaram o


seguinte:

1) Há Santos cuja biografía é espuria ou incerta, mas


cuja existencia real nao se pode por em dúvida. — A Igreja
ou retirou do calendario ésses Santos (assim S. Catarina de
Alexandria, S. Plácido e seus companheiros, S. Prisca, Santo
Aleixo...) ou permitiu seja sua respectiva festa celebrada
facultativamente (S. Jorge, S. Pancrácio, S. Brás...).
2) Há Santos que realmente nunca existiram. Tais sao,
por exemplo, os casos de

S. Pudemciana (outrora, a 19 de maio). O adjetivo «pudenciana»


era atribuido á casa do Senador romano Pudendo; foi, porém, poste
riormente entendido como nome próprio de urna: virgem e mártir
antiga.
S. Sabina (outrora, a 29 de agosto). Sabina deve ter sido urna
dama de Roma que transformou sua casa, no Aventino, em igreja
nos sáculos ni ou IV. Tal igreja era, como se dizia. no sáculo V «o
titulo (a igreja) de Sabina». Ño sáculo VI, porém, os documentos
já falam do «titulo de Santa Sabina», pois que tdda igreja costuma
ter um Santo ou urna Santa como titular. As atas do martirio atri
buido a S. Sabina referem-se a urna outra Sabina, que, na verdade,
padeceu a 50 km de Roma, na úmbria; houve confusáo entre dama
Sabina do Aventino e Santa Sabina mártir da úmbria!
S. CristóvSo (outrora, a 25 de julho), a respeito do qual existem
duas biografías:
Urna, de origem grega, assevera que ésse santo era um bárbaro
antropófago, da tribo dos cinecéfalos (homens de cabeca de cao).
. Converteu-se, e entrou no exército do Imperador. Certa vez, recusou-
-se a abjurar a fé crista, sofrendo em conseqüéncia suplicios inima-
gináveis.
No Ocidente, a narrativa é diferente. Cristóváo terá sido um
gigante que tinha a manía de servir grandes personagens. Servia a
um írei, que ele julgava ser o maior rei do mundo. Disseram-lhe,
porém, que Satanás era. multo mais poderoso; por consegulnte, passou
para o servico de Satanás. Foi, todavía, informado de que Cristo ainda
era" mais poderoso; um eremita comunicou-lhe também que Cristo
apr'eclava os homens de acordó com a caridade com que tratavam o
próximo. Etntáo Cristóváo féz-se portador de pessoas que queriam
atrayessar um rio; tal foi a sua nova proíissao. Certa noite. um
menino Ihe pediu que o transportasse. O gigante tomou-o sobre os
ombros, e entrou nagua. Notou, porém, que a travessia se tornara
penoslsslma, n&o por causa da corxente ou da escuridáo. mas por
causa do mentnlnho, que pesava tanto quanto o mundo. Nao obstante,
o gigante, apoiando-se sobre o seu cajado, avancava, embora receasse
ealr. 'Chegou ao outro lado do rio, depositou o menino por térra e
Ihe disse que era tSo pesado quanto o mundo. Respondeu-lhe entao
a crianca: «Tiveste contigo mais do que o mundo inteiro; canregaste
o Criador do mundo. Sou o Cristo, a quem tu serves!» — O Senhor
pagou-lhe tal servigo, concedendo-lhe posteriormente a coroa do mar
tirio!

— 346 —
SANTOS «CASSADOS» E «CONFINADOS»? 31

Visto que sao estes os únicos dados biográficos que se tém a


respeito de S. Cristóváo, pode-se admitir que a sua existencia seja
problemática.

S. Félix de Valols (outrora, a 20 de novembro), tido como compa-


nheiro de S. Joáo da Matha na íundacáo da Ordem dos Trinitarios
no século XIL — Acontece que até o século XV ésse Santo jamáis
foi mencionado; as primeiras noticias que déle se tém. identificam-no
com Hugo de Valois, neto do rei Henrique I da Franca; ter-se-á dissi
mulado sob o nome de Félix — o que nao quadra absolutamente com
dados seguros da historia eclesiástica e profana.
S. Praxedes (outrora, a 21 de julho), que terá sido irma de Santa
Pudenciana e filha de Pudendo. Possivelmente foi urna dama de
Roma que também transformou sua casa em igreja: ... igreja «do
titulo de Praxedes», que depois se tornou «do titulo de Santa Prá
xedes».

As onze mil virgens companheiras de S. Úrsula (21 de outubro


outrora) devem sua origem provávelmente ao seguinte: em Colonia
(Alemanha) celebravam-se no século IV algumas virgens que haviam
padecido conjuntamente o martirio. No século X, porém, oomecaram
os cronistas a falar de 11.000 virgens mártires de Colonia. Por que?
— Possivelmente, porque certas inscricSes arqueológicas mencionavam
XI virgens mártires. Ora, os romanos e medievais costumavam colo
car um traco horizontal ácima de suas letras ou para indicar que se
tratava de números ou para transformar unidades em milhares; por
conseguinte, XI podia significar 11 ou 11.000. Pois bem; um cristSo
devoto terá .lido 11.000 em lugar de 11, com toda a boa fé, e haverá
propalado esta interpretagáo. A noticia de que 11.000 virgens have-
riam sido martirizadas em Colonia estava longe de despertar criticas
ou dúvidas na mentalidade de um cristáo medieval? ao contrario
éste estava pronto a se regozijar pela coragem heroica de tantas
virgens!

2) Calendario que exprima a universalidade da santidade no


tempo e no espajo

O calendario antigo compunha-se principalmente de San


tos dos primeiros séculos e das regióes européias. Ora tais
amigos de Deus sao pouco conhecidos e significativos para o
cristáo contemporáneo. Oompreende-se entáo que a Santa Sé
tenha intencionado confeccionar um calendario que mostré
melhor que a santidade é um dom de Deus concedido a todos
os homens. Por isto é que foram retirados do calendario litúr
gico Santos antigos, para serem ai inseridos outros mais pró
ximos de nos.

Em suma, o novo calendario aprésenla 64 Santos dos dez pri


meiros séculos, e 79 dos dez últimos. Os séculos mais representados
sao o 4* (com 25 Santos), o 12* (com 12 Santos), o 16» (com 17 San
tos), o 18» (com 17 Santos).

— 347 —
32 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969, qu. 3

Do ponto de vista geográfico, 126 testas se referem a Santos da


Europa; S a Santos da África; 14 a Santos da Asia; 4 a Santos da
América; 1 a um Santo da Oceania. Foram assim introduzidos no
calendario: os mártires de Nagasaki (Extremo Oriente), aos 6 de
fevereiro; ós mártires de Uganda (África), aos 3 de junho; os már
tires canadenses S. Isaque Jogues e seus companheiros (América do
Norte), aos 19 de outubro; S. Turlbio de Mongrovejo e S. Martinho
de Lima (América do Sul), aos 23 de marco e 3 de novembro respecti
vamente; S. Pedro Chanel (Oceania), aos 28 de abril.

3) Santos de significado relevante para a Igreja inteira

Havia no calendario Santos celebrados no mundo inteiro,


mas pouco conhecidos fora da regiáo onde haviam nascido ou
trabalhado. Ora o novo calendario procura evitar a mengáo
de Santos que nao tenham alcance realmente «universal. É,
porém, permitido que tais Santos sejam festejados nos países,
ñas regióes ou ñas dioceses onde sejam conhecidos e tradlcio-
nalmente venerados. É o que se dará com S. Januário em
Ñapóles e S. Nioolau em Bari (Italia).

4) Caráter facultativo de certas festas de Santos

Mesmo os Santos mencionados pelo novo calendario nao


devem ser todos obrigatóriamente festejados pela Igreja in
teira. Há, sim, alguns cuja data festiva se impóe já por si
mesma á veneragáo dos fiéis de todas as partes do mundo;
tais sao a Virgem SS., os Apostólos, S. Joáo Batista, S. Fran
cisco, S. Domingos, S. Bento, S. Inácio de Loiola, S. Tomás
de Aquino... Outros, porém, poderáo ou nao ser celebrados, de
acordó com os costumes e a orientacáo da piedade de cada
país ou cada diocese: tais sao, por exemplo, S. Henrique, Im
perador da Alemanha (973-1024), aos 13 de julho; S. Estéváo;
rei da Hungría (975-1038), aos 16 de agosto; S. Elisabete,
rainha de Portugal (1271-1376), aos 4 de julho; S. Luís, rei
de Franca (1226-1270), aos 25 de agosto; S. Jorge (23 de
abril), S. Cosme e S. Damiáo (26 de setembro), S. Sebastiáo
(20 de Janeiro).

Em suma, há um total de 58 festas obrigatórias e 92


facultativas.

5) Cetebrac.áo das festas dos Santos no aniversario da res


pectiva marte

O día da morte de um Santo é classicamente considerado


o seu natalicio («dies natalis») para a eternidade. Nao há,
SANTOS «CASSADOS» E «CONFINADOS»? 33

pois, data mais adequada para festejar um justo do que o


aniversario do seu falecimento. Por conseguinte, o novo calen
dario deslocou a festa de alguns Santos que, por um motivo
acidental, vinham sendo celebradas fora do seu dia próprio.
Tais sao os casos de

S. Joáo da Cruz, que passou de 24 de novembro para 14 de


dezembro;
S. Romualdo, que de 7 de fevereiro passou para 19 de junho;
S. Vicente de Paulo, que de 19 de julho passou para 27 de se-
tembro;
S. Leáo Magno transferido de 11 de abril para 10 de novembro;
S. Catarina de Sena, deslocada de 30 para 29 de abril.
Todavía nao íoi sempre possível seguir o criterio do «dia. nata
licio», visto que dois ou mais Santos, seriam, por vézes. obligatoria
mente celebrados no mesmo dia. Em conseqüéncia,
S. Tomás de Aquino (t 1274) passou para o dia 28 de Janeiro
(dia da trasladacáo de suas reliquias para Tolosa). defecando o dia 7
de margo para as santas Perpetua e Felicidade (t 203), que sao ante
riores na historia da Igreja;
S. Teresa de Llsieux (t 1897) passou para o dia I9 de outubro,
já que o día de sua morte, 30 de setembro, já assinala a festa de
S. Jerónimo (t 420).
S. Domingos de Gusmáo (t 1221). falecido aos 6 de agosto^ passou
para o dia 7 seguinte, pois a data de 6/VTII está solenemente consa
grada pela Transfiguracáo do Senhor.

Eis os cinco principios que nortearam a revisáo do calen


dario da Igreja.

Quanto as festas do Senhor, ficaram as que sao tradi-


cionais, exceto as. do SS. Nome de Jesús (1« de Janeiro) e do
Preciosíssimo Sangue (1* de julho). A festa de Cristo Rei é
transferida do último domingo de outubro para o último do
mingo do ano litúrgico.

As festas da Virgem SS. ficam sendo

— para a Igreja universal: Assungáo, Imaculada Concei-


cáo (dia santo de guarda), Natividade, Anunciagáo, Materni-
dade Divina (1* de Janeiro), Purifícagáo, Apresentagáo, Visl-
tagáo, María Raínha (22 de agosto), Sete Dores (15 de se
tembro), Sto. Rosario (7 de outubro);
— facultativas: Nossa Senbora de Lourdes (11 de feve-
reiro), N. S* do Carmo (16 de julho), N. S» das Neves (5 de
agosto), Cora-jáo Imaculado de María (sábado após a festa
do Sagrado Coracáo de Jesús).

— 349 —
34 «rPERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969, qu. 3

3. Ulteriores oonsrderasóes

A reforma do calendario cristáo deu lugar a que se falasse


públicamente de «cassagáo» e «confinagáo» de santos. Tais ex-
pressóes, infelizes como sao, necessitam de esclarecimento.

1) «Cassacóo de santos»

Cassacáo é a punigáo que consiste na quebra ou no can-


celamento de títulos e direitos de algum cidadáo.

Ora a recente reforma do calendario nao retirou a algum


justo falécido o título de «santo». Note-se, alias, que a santi-
dade nao é mero título, mas urna realidade interior, que sub
siste no seu sujeito independentemente do reconhecimento que
os homens lhe tributem; os Santos continuam a ser santos
depois, como antes, da reforma do calendario. Nem a Igreja
cancelou aos Santos o direito de ser invocados como interces-
sores; de resto, é Deus, e nao a Igreja, quem possibilita e esta-
belece o intercambio entre os membros da Igreja celeste e os
da Igreja terrestre, peregrina (cf. Constituicáo «Lumen Gen-
tium» c. 7). Qualquer Santo real, por conseguinte, pode ser
invocado como advogado de seus irmáos na térra.

Em sua reforma, a Igreja apenas houve por bem retirar


do calendario (ou ao menos tornar facultativa) a festa de
determinados Santos. A razáo disto nao foi o menosprézo ou
a aversáo em relacáo a tais amigos de Deus, mas foi simples-
mente o desejo de concentrar mais a atengáo dos fiéis sobre
a obra redentora de Cristo e sobre os Santos que, para um
homem do sáculo XX, mais eloqüentemente exprimam a vitória
do Redentor sobre o pecado.
É, portante, erróneo falar de «santos que deixaram de
ser santos»; na verdade, nerihum Santo real ou histórico dei-
xou de ser tal. Nao era para desejar, porém, que a piedade
do povo de Deus se dirigisse a pseudo-Santos, ou seja, a pre
sumidos Santos, que outrora eram, de boa fé (por falta de
esclarecimento dos historiadores), tidos como reais, mas que
hoje sao comprovados como inexistentes.

2) «Sanios confinados»

O fato de que o culto de certos Santos se tenha tornado


facultativo para certas regióes ou dioceses sugeriu a maliciosa
expressáo ácima.

— 350 —
SANTOS «CASSADOS» E «CONFINADOS» ? 35

Pergunta-se: com que razáo? — Confinamento significa


«limitacáo da liberdade de agáo e locomogáo». Ora nao foi
isto em absoluto que a Igreja efetuou em relagáo a determi
nados Santos.. Qualquer Santo pode ser invocado por quem
quer que seja, em qualquer parte do mundo; Deus permitirá
que o orante na térra seja assim beneficiado. Apenas a Igreja
julga que deve diminuir o número de festas de Santos. Daí
tornar-se facultativa a solene celebracáo de algumas festas.
Nao há quem nao veja que tal atitude nao tem sombra de
semelhanca com comportamentos políticos.

3) «Quando a Igreja errou: outrora eu agora ?

Afírma-se que a Igreja, no tocante aos Santos, cometeu


grave erro:

— ou outrora, favorecendo o culto de certos Santos,

— ou atualmente, cancelando a festa de tais Santos.

Em nossa resposta, notemos de inicio que o magisterio


oficial e infalivel da Igreja nao se empenhou na determinagao
do calendario litúrgico; éste nao constituí objeto de fé, mas
de disciplina; nem a Igreja proferiu jamáis alguma definicáo
«ex cathedra» a respeito das narrativas hoje depreendidas
como nao auténticas.

Deve-se, porém, reconhecer que o povo cristao com seus


bispos (inclusive o Papa) deu crédito a «estórias» concern-ín-
tes aos Santos, por nao terem documentos que fizessem sus-
peitar da índole espuria de tais narrativas. O erro cometido
foi inculpado, erro devido a relativo atraso da historiografía
durante numerosos séculos. Hoje em dia a Igreja faz questáo
de corrigir ésse erro incorrido em boa fé — o que só pode
redundar em abono da veracidade da S. Igreja. Ninguém ignora
que Deus permite que seus fiéis caminh'em a passos humanos
em tudo que nao diz respeito estritamente á fé e á moraH-
dade crista.
No quadro segirinte, vé-se a configuracáo do novo calen
dario da Igreja. — Note-se, porém, que éste aínda nao vigo
rará no ano de 1970, pois que, para que possa ser devidamente,
aplicado, áe aguarda a edicáo dos novos livros litúrgicos (Missal
e Breviario) que estáo sendo preparados pela Santa Sé.
A celebragáo dos Santos cutos nomes se acham em negrito,
será facultativa.'

— 351 —
36 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969, qu. 3

. JANEIRO 21 S. Anselmo
23 S. Jorge
1 Santa María, Máe de Deus 24 S. Fidelis de Sigmaringen
2 S. Basilio e S. Gregorio 25 S. Marcos
. . de Nazianzo
28 S. Pedro Chanel
6 Epiíania do Senhor 29 S. Catarina de Sena
7 S. Raimundo de Penaforte 30 S. Pió V
13 S. Hilario
17 S. Antáo do Egito MAJO
20 S. Fabiano
1 S. José Operario
S. Sebastiáo
2 S. Atanásio
21 S. Inés
22 S. Vicente
3 S. Filipe e S. Tiago
24 S. Francisco de Sales 12 S. Nereu e S. Aquilcs
25 Conversáo de S. Paulo S. Pancrácio
14 S. Matías
26) S. Timoteo e S. Tito
27 S. Angela Merici 18 S. Joáo I
28 S. Tomás de Aquino 20 S. Bernardino de Sena
31 S. Joao Bosco
25 S. Beda
S. Gregorio VII
S. Alaria Madatena de Pazzi
FEVEREIRO
26 S. Filipe Neri
2 Apresentacáo do Senhor 27 S. Agostinho de Cantuárta
3 S. Brás 31 Visitacao da Virgem SS.
S. Ansg&rio
JXJNHO
5 S. Águeda
6 S. Paulo Miki e os mártires 1 S. Justino
japoneses 2 S. Marcelino e S. Pedro
8 S. JerOnimo Emiliano 3 S. Carlos Lwanga c os
10 S. Escolástica Mártires de Uganda
11 N. S« de Lourdes 5 S. Bonifacio
14 S. Cirüo e S. Metódio 6 S. Norberto
17 Os sete Fundadores dos 9 S. Efrém
Servitas 11 S. Barnabé
21 S. Pedro Damiao 13 S. Antonio de Pádua
22 Cátedra de S. Pedro 19 S. Romualdo
23 S. Bolicarpo 21 S. Luís de Gonzaga
22 S. Paulino de Ñola
MARCO S. Joilo Flsher e S. Tomás Moro
24 Natividade de S. Joao Batista
4 S. Casimiro
• 7 • S. Perpetua e S. Felicidade 27 S. Cirilo de Alexandria
28 S. Ireneu
8 S. Joao de Deus
9 S. Francisca Romana -
29 S. Pedro e S. Paulo
30 Os santos prlmelros mártires
17 S. Patricio
de Roma
18 S. Cirilo de Jerusalém
19 S. José JULHO
23 S. Turibto de Mongrovejo
3 S. Tomé
25 Anunciacao do Senhor
4 S. Ellsabete de Portugal
5 S. Antonio Maria Zacarías
ABRIL
6 S. Maria Goretti
I 2 S. Francisco de Paula 11 S. Bento
4 S. Isidoro 13 S. Henrique
5 S. Vicente Ferrer 14 S. Camilo de Lellis
7 S. Joáo Batista de la Salle 15 S. Boaventura
II S. Estanislau 16 N. S' do Carmo
13 S. Martmho I 21 S. Lourenco de Brindis!
SANTOS «CASSADOS» E «CONFINADOS»? 37

22 S. María Madalena 6 S. Bruno


23 S. Brígida 7 N. S* do Rosario
25 S. Tiago 9 S. Dionisio e seus companhelros
26 S. Joaquim e S. Ana S. Joáo Leonardi
29 S. Marta 14 S. Caliste
30 S. Pedro CrisolDgo 15 S. Teresa de Avila
31 S. Inicio de Loiola 16 S. Hedviges
S. Margarida. Maria Alaooque
AGOSTO 17 S. Inácio de Antioquia
lo S. Lucas
1 S. Afonso de Ligório 19 S. Isaque Jogues e os Mártires
2 S. Eusébio de Verccil Canadenses
4 S. Joáo Maria Vianney S. Paulo da Cruz
5 N. S' das Neves 23 S. Joáo Oapistrano
s. xisto n 24 S. Antonio Maria Claret
6 Transfiguragáo do Senhor 28 S. Simáo e S. Judas
7 S. Domingos
8 S. Caetano de Tiene NOVEMBRO
10 S. Lourengo 1 Todos os Santos
11 S. Clara 2 Finados
13 S. Ponciano e S. Hipólito 3 S. Martinho de Lima
15 Assuncáo de N. S* 4 S. Carlos Borromeu
16 S. Estévao da Hungría 9 Dedicada da basílica do Latráo
19 S. Joao Elides 10 S. Leao Magno
20 S. Bernardo 11 S. Martinho de Tours
21 S. Pió X 12 S. Josafá
22 S. Maria Raínha 15 S. Alberto Magno
23 S. Rosa de Lima 16 S. Margarida da Escocia ,
24 S. Bartolomeu ■ S. Gertrudes
25 S. Luis da Franca
17 S. Ellsabete da Hungría
S. José Galanznns
18 Dedicac&o das basílicas de
27 S. Mónica S. Pedro e S. Paulo
28 S. Agostinho 21 Apresentacao de N. S*
29 Martirio de S. Joáo Batista 22 S. CecUia
23 S. Clemente
SETEMBRO S. Columbano
30 S. Amdré
3 S. Gregorio Magno
8 Natividade de N. S' DEZEMBRO
13 S. Joño Crisóstomo
14 Exaltacáo da S. Cruz
3 S. Francisco Xavier
4 S. Joao Damasceno
15 N. S' das Dores
16 6 S. Nlcolau
S. Cornélio e S. Cipriano
17 7 S. Ambrosio
S. Roberto BeJarmino
19 S. Januarlo 8 Imaculada Conceicáo de N. S*
21 S. Mateus 11 S. Dámaso
26 S. Cosme e S. Damlao
12 S. Joana Francisca de Chantal
27 13 S. Lucia
S. Vicente de Paulo
28 S. Venceslau 14 S. Joáo da Cruz
29 21 S. Pedro Ganisio
S. Miguel, S. Gabriel e S. Rafael
30 S. Jerónimo 23 S. Joao Canelo
25 Natal
26 S. EstévSo
OUTUBRO
27 S. Joáo Ev.
1 S. Teresa do Menino Jesús 28 SS. Inocentes
2 SS. Alijos da Guarda 29 S. Tomas Becket
4 S. Francisco de Assis 31 S. Silvestre

— 353
38 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969, qu. 4

IV. EDUCACÁO

4) «Que dizer, do ponto de vista crista», sobre a intro-


ducaoi da educacáo sexual ñas escolas?

Nao será urna exigencia de nossa época?»

Resumo da resposta: Educacáo sexual compreende necessaria-


mente, além de instrucSes de anatomía e biología, a comunicacáo de
principios étioas que regem o uso do sexo e incutem disciplina ao
adolescente; em caso contrario, já nao é educacáo.
Tal educa^áo há de ser ministrada, normalmente, pelos genitores,
a quem de resto compete primeiramente a tarefa de educar; sámente
em casos de impossibilidade, os pais confiaráo tal encargo a um
amigo ou educador. Visto que muitos e muitos casáis hoje em día
no Brasil se sentem intimidados ou inabilitados para exercer tal
mister, é preciso que se multipliquen! os cursos de preparacáo para
o casamento nos quais se forneca a orientacáo de que necessitam os
pais para desempenhar sua tarefa de educacáo sexual.

Esta deve ser ministrada gradativamente, de acordó com a evolu-


cao do adolescente, evitando-se despertar problemas aínda nao exis
tentes. Por isto nao se deve fornecer educacáo sexual coletivamente
ou em turmas, onde há diversos níveis de desenvolvimento íisico e
psíquico; a educacáo sexual em grupo pode ser nociva a muitos dos
alunos, despertando-lhes a curiosidade e incitándoos a experiencias
intempestivas.
Destas premissas se segué que nao convém introduzir a educacáo
sexual ñas aulas escolares. A escola poderá, porém, atender ao desen
volvimento sexual e as questoes dos alunos mediante o seu Departa
mento de Orientacáo Educacional, onde professdres idóneos atendem
a cada aluno em particular. — Nao se deveria omitir ñas escolas a
apresentacáo de normas éticas, que preparem os alunos a desempe
nhar idóneamente seu respectivo mister na sociedade.

Resposta: Torna-se cada vez mais insistente em certos


setores a tese segundo a qual se deve ministrar educacáo
sexual de maneira oficial e coletiva ñas escolas. Todavía, já
que o assunto tem suscitado dúvidas e debates, as páginas se-
guintes o abordaráo, considerando sucessivamente: 1) Que é
própriamente educacáo sexual 2) Por quem e como há de ser
ministrada? 3) Convém introduzi-la na escola?

1. Que é educagáo sexual ?

A educacáo sexual própriamente dita compreende duas


tarefas:

— 354 —
EDUCACAO SEXUAL ÑAS ESCOLAS? 39

1) iniciagáo biológica ou instrugáo científica referente á


anatomía e a fisiología do sexo. Tal instrucáo pertence ao
estudo das ciencias naturais;
2) desenvolvimento de hábitos moráis que fomentem o
dominio e a disciplina que todo ser humano deve exercer sobre
si mesmo (nao há personalidade sem morigeracáo ou disciplina
de costumes). «Educar» é justamente eduzir da potencialidade
da enanca e do jovem as boas qualidades latentes em sua
natureza. Educar é, de certo modo, plasmar, modelar segundo
um belo exemplar; o educador é semelhante a um artista que
procura fazer que a massa por ele trabalhada se torne harmo-
niosa segundo todas as suas virtualidades.
Vé-se, pois, que sem a tarefa n« 2) nao há própriamente
educacáo sexual. O educador nao cumpre a sua missáo en-
quanto nao comunica principios de comportamento sadio.
Note-se a diferenga existente entre a iniciagáo sexual e
a instrugáo relativa a outras fungóes do organismo (como
respiragáo, digestáo, metabolismo, etc.). O conhecimento déstes
outros temas de fisiologia fica sendo sempre meramente inte
lectual; os alunos geralmente os estudam de maneira fría e
desinteressada. Ao contrario, as nogóes concernentes ao sexo
e as suas funcóes suscitam ou alimentam naturalmente nos
jovens urna curiosidade mais ou menos intensa, acompanhada
do desejo de experimentar pratícamente aquilo que aprendem.
Precisamente a idade do estudante ginasial e colegial é aquela
em que se dá a transformagáo física chamada «puberdade»;
o adolescente experimenta entáo anseios a prazeres que ele
apenas entrevé; sente-se inquieto e atormentado por curiosi
dade, a qual nao é senáo urna forma do instinto sexual que
se desperta (as vézes, com grande veeméncia). Em outros
termos: no tocante ao sexo, os conhecímentos adquiridos pelos
jovens nao permanecem simplesmente no plano intelectual, mas
sugerem a prática (ainda que o professor nada recomendé),
pois de certo modo agugam instintos cegos da natureza. Ora
a prática sexual, nos anos de adolescencia e puberdade, nao é
recomendável sob aspecto algum: tanto a sá consciéncia moral
quanto a medicina e o bem comum da sociedade a desaconse-
Iham sem hesitagáo.
Em conseqüéncia, verifica-se que a educagáo sexual deve,
de um lado, atender á necessidade de saber científico que o
jovem traz em si; mas, de outro lado, deve, com nao menos
preméncia, dissuadir o adolescente de se entregar a experien
cias sexuais — dissuasáo esta que só será possível se o edu
cador souber excitar em seu discípulo a disciplina de costumes

— 355 —
40 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969, qu. 4

e o respeito pelos valores moráis. Assim torna-se claro também


que a educagáo sexual nao há de ser ministrada por qualquer
pessoa dotada de conhecimentos biológicos; ela supóe sempre
um mestre que estime profundamente a disciplina moral e viva
pessoalmente segundo urna reta consciéncia.

O conceito de educagáo sexual assim proposto talvez nao


seja aceito pela maioria dos que hoje em dia a propugnam.
Verifica-se mesmo urna certa onda de menosprézo das normas
éticas, como se estas fóssem a expressáo de mentalidade ultra-
passada. A satisfacáo dos instintos é mais e mais excitada por
diversóes (cinema, teatro, televisáo...) e imprensa (revistas,
literatura popular...), que tendem a apresentar como normal
e legal a vida sexual anterior ao matrimonio. Ora a redugáo
da educagáo sexual as condigóes de mera instrucáo científica
é, em grande parte, responsável por numerosos desatinos mo
ráis de nossa juventude, por unióes matrimoniáis infelizes
(porque os respectivos conjuges nunca aprenderam a discliplina
sexual), assim como por doencas venéreas, que afligem parte
nao exigua da sociedade.

Pergunta-se agora:

2. Por quem e como. . . ?

Entendida no sentido ampio ácima exposto, a educagáo se


xual é nao sómente aceitável, mas até mesmo necessária; ela
deve ser situada no quadro geral da educacáo. O problema
sexual é incutido aos pequeños desde o uso da razáo pelos
mais diversos meios; requer-se, pois, que pessoas idóneas acom-
panhem com zélo a evolugáo das criangas e as váo formando
para que aprendam reta e sadiamente o que devem aprender.

1) Quem deve ministrar a educa(ao sexual ?

Já que educar é fungáo, antes do mais, dos genitores,


ministrar a educagáo sexual (que nao é senáo um aspecto da
educagáo geral) compete aos pais em primeiro lugar. Obser
vando diariamente os seus filhos, os genitores sao as pessoas
mais habilitadas a perceber ou entrever os problemas dos.
jovens; em virtude da familiaridade carinhosa e sem igual que
deve reinar entre pais e filhos, os pais estáa em oondigóes
oportunas de esclarecer os filhos a respeito das questóes e dú-
vidas concernentes ao sexo que lhes váo aflorando á mente.
EDUCACÁO SEXUAL ÑAS ESCOLAS? 41

É preciso que os genitores assim procedam; nao preten-


dam ignorar os problemas dos filhos, tentando sufocá-los pelo
silencio ou diferindo indefinidamente a sua abordagem. Nao
digam os pais aos filhos que nao pensem ñas dúvidas que os
próprios filhos já conceberam; nao lhes sugiram que tais dú
vidas versam sobre assuntos indignos e desonestos. Mas, antes,
com espirito tranquilo e firme tratem de elucidar as questóes
formuladas, direta ou indiretamente, pelos jovens. Se nao o
fizerem dessa forma, inspirados sempre por amor ao bem da
prole, arriscar-se-áo a decepgóes e dissabores, pois os jovens
procuraráo esclárecer-se (ou seráo esclarecidos sem solicitacáo
previa) em ambientes de colegas ou quisa pessoas pervertidas;
em tais círculos ensinam-se muitas vézes, de maneira pro
miscua, o certo e o errado, sem respeito á personalidade do
jovem, mas, antes, de maneira cínica e brutal; falsas nogóes
e maus hábitos sao assim fácilmente comunicados. O desejo
da volúpia passa a reger o jovem, ao passo que a vontade se
desvirtúa e o caráter se amolece. Os mesmos efeitos nocivos
ocorrem quando meninos e meninas, carecentes da sólida ori-
entagáo que os genitores lhes deverñ dar, recorrem a livros,
opúsculos e revistas ilustradas que tratam de sexo.

Numa palavra: a omissáo dos pais, no caso, implica intru-


sáo por parto de companheiros e colegas, com efeitos talvez
fatais para o jovem.

Há casos, porém, (e talvez nao poucos, no Brasil) em


que os genitores nao se sentem á altura de dar educacáo sexual
a seus filhos: sentem-se tímidos e inibidos, ou nao foram pre
parados para isso, ou nao tém os conhecimentos de psicología
necessários para discernir a evolugáo e os problemas das cri-
angas, ou nao dispóem de tempo e de convivencia com os fílhos
para poder orientá-los no setor sexual. Em tais circunstancias,
compreende-se que os genitores deleguem essas suas atribui-
góes a pessoa idónea e reta: um educador, um médico ou um
amigo leal e competente. Tal pessoa se encarregará de cum-
prir a missáo própria dos pais no caso, sem detrimento para
os jovens. — Todavía é para desejar que se ministrem nos
cursos de preparacáo ao casamento as instrupóes necessárias
para que os esposos se tomem também os ministros da edu-
cagáo sexual dos filhos. É nesse terreno da preparagáo ao
Imatrimónio que se há de procurar a solugáo do problema
«quem deve dar educagáo sexual?» Hoje em dia percebe-se
cada vez mais que o casamento requer formagáo previa por
parte dos cónjuges; é necessário, portante, que essa formagáo
inclua no seu programa os dados necessários para que os

— 357 —
42 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969, qu. 4

genitores ministrem a educagáo sexual a seus filhos. As auto-


'ridades e os homens públicos, em vez de pensar em transferir
a missáo dos pais para a escola, cuidem de proporcionar aos
genitores, mediante cursos e bibliografía, os meios de cumprir
fielmente as suas funcóes educacionais; é nisto que consiste a
solucáo do problema táo debatido em nossos dias.
Observa muito a propósito o Dr. Marcondes Calazans:

«Uma dificuldade que pode sobrevir a respeito da educacáo sexual


dos jovens e que é mecessário vencer, é a falsa nocjio de que se
deve evitar falar déstes assuntos, movidos por um falso pudor e
puritanismo...
A estes lembramos a afirmacáo de Clemente de Alexandria, dos
primeiros séculos do Cristianismo, de que 'nao devemos ter vergonha
de chamar pelo seu nome aquilo que Deus nao se envergonhou de
criar1. 'A natureza deve ser motivo nao de vergonha, mas de respeito',
diz Tertuliano» («Anais do 1» Congresso Brasileíro de Médicos Cató
licos». Sao Paulo 1947, pág. 271).

2) E como procederé* os educadores ?

A educagáo sexual, para ser eficaz, há de ser gradativa.


Ela nao deve antecipar os problemas que costumam surgir
na mente dos jovens, mas levar em conta a evolucáo física e
psíquica do adolescente, com as suas características pessoais
(grau de inteligencia, vivacidade, afetividade, curiosidade...)
e acompanhar essa evolugáo com as respostas ou explicagóes
que paulatinamente se váo tornando necessárias. Tenha-se em
consideragáo também o ambiente em que vive a crianga, am
biente ora mais, ora menos excitante.
Por isto nao se pode de antemáo assinalar rigorosamente
a idade em que há de comegar a educagáo sexual, nem o ritmo
(acelerado ou nao) que ela deve observar. Enquanto algumas
criancas despertam precocemente, outras se mostram tranqui
las ou mais ou menos indiferentes ao sexo por mais tempo.
Consciente disto, o educador tomará cuidado para nao excitar
problemas prematuros, pois com isto só perturbaría ou preju-
dicaria o discípulo.
O educador também deve estar atento ao comportamento
dos jovens: ... as suas reagóes, irritabilidade, suscetibilidade,
timidez, introversáo, de modo a poder discernir os problemas
dos adolescentes. Ouvi-los-á com benevolencia. As vézes mesmo,
estimulará as perguntas e os pronunciamentos dos discípulos,
desde que suspeite estarem inibidos. Evite transmitir meros
preceitos e proibigóes; procure, antes, justificar as normas de
disciplina e higiene que ele inculcar, a fim de qué o adoles-

— 358 —
EDUCAQAO SEXUAL ÑAS ESCOLAS? 43

cente as abrace consciente e voluntariamente. Em suma, ao


falar da vida sexual, procurem os genitores ou seus lugar-
-tenentes ser breves, simples, claros; nao entrem em porme
nores inúteis ou perturbadores; saibam aproveitar as ocasióes
que se lhes oferecem para dar suas explicacóes, usando sempre
de bom senso e sabia medida.
De quanto foi dito até aquí, segue-se que a educagáo se
xual ha de ser ministrada individualmente a cada adolescente,
pois cada qual tem sua estrutura física e psíquica própria,
suas fases calmas e suas crises. O que se diz para atender e be
neficiar a um, pode ser intempestivo ou prejudicial para outro.
Pondere-se também que a evolucáo e os interésses sao diferentes
no rapaz e na moga. Compreende-se assim que os assuntos
sexuais nao devem ser explanados promiscuamente diante de
urna coletividade; a nao observancia desta conclusáo poderá
redundar em males psíquicos e físicos para nao poucos ou-
vintes. Adolescentes despertados prematuramente para certos
problemas sexuais podem conceber o desejo de fazer suas ex
periencias, das" quais fácilmente resultam perda de brío, conta-
minacáo patológica e doencas venéreas...

3. Educaccío sexual na escola?

As ponderacóes anteriores sugerem resposta negativa á


questáo ácima.
Em urna turma de adolescentes há, sem dúvida, diversos
graus de despertar sexual, diversos estados de ánimo, devidos
ao ambiente da familia e á educacáo recebida (ou nao. rece-
bida) antes do acesso a escola. O educador sexual que njáo
leve em conta tais circunstancias, condena-se a causar mais
mal do que bem.
Pode-se, porém, admitir que, numa escola, o Servigo de
Orientacáo Educacional se encarregue de prolongar ou mesmo
suprir a orientacáo sexual que os alunos devem normalmente
receber de seus genitores. Nao será necessário frisar que,
mesmo na Orientacáo Educacional da escola, o atendimiento
há de ser pessoal ou dirigido a cada aluno em particular, por
parte de um professor ou urna professóra de consciéncia reta
e respeitosa; em caso contrario, o trabalho pode tornar-se
negativo.
O que a escola, em suas aulas, pode ministrar coletiva-
mente a seus alunos e alunas, é um código ético, que abran-

— 359 —
M «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 116/1969, qu. 4

gerá naturalmente normas relativas á disciplina sexual. A es


cola há de excitar em seus discípulos o brío, a honra, o he
roísmo, a fortaleza de ánimo, qualidades indispensáveis a urna
vida conjugal feliz. — Neste contexto, parece oportuno frisar
com muita énfase o seguinte: é muito para desejar que ñas
escolas católicas os professóres nao se abstenham de falar
também da vida una ou celibatária consagrada a um grande
ideal: ... máxime a Deus ou também ... ao próximo por
amor a Deus. O ser humano se realiza, sem dúvida, mediante
o amor; quem nao ama, se depaupera. É preciso, porém, que
os mestres lembrem a seus discípulos que o amor nao se exerce
apenas entre criaturas ou entre esposo e esposa; o amor de
um coragáo humano pode ser total e diretamente dirigido ao
primeiro dos bens, que é Deus; tal amor entáo, longe de se
desvirtuar, torna-se assim mais integral e genuino, pois mais
fácilmente se liberta da volta sobre si mesmo ou do egoísmo.
O amor indivisamente consagrado a Deus aplica-se ao pró
ximo através de Deus com eficacia e generosidade que a his
toria pode atestar através dos sáculos.
É claro que a vida una ou virginal a ninguém pode ser
imposta, pois supóe especial dom de Deus. Todavía ao edu
cador convém chamar a atengáo do discípulo para ésse nobre
ideal, cuja grandeza nada perdeu até nossos días, mas con
serva todo o seu valor.

4. ConclusSo

As idéias sobre educacáo sexual propostas neste artigo


talvez pouco ou nada signifiquem para muitos dos leitores
modernos. A imprensa escrita, falada e televisionada habituou
o público a considerar o sexo como um imperativo inelutável,
a cujas solicitacóes é preciso ceder para nao sofrer duras con»
seqüéncias. Generaliza-se a nocáo de que o homem é joguéte
de instintos eróticos, de sorte que todas as expressóes da
pessoa humana estáo direta ou indiretamente relacionadas
com o sexo. Nao pode, portante, haver felicidade sem uso da
sexualidade.
Ora deve-se dizer que tais afirmagóes, em grande parte,
dependem de sugestáo e preconceitos. O sexo pode tornar-se
imperioso ou obsessivo, como também pode desempenhar um
papel subordinado na vida do individuo, de acordó com a filo
sofía desse individuo. A atengáo crescente que se dá ao sexo,
em nossos tempos, só tem contribuido para escravizar mais

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e mais o homem, acarretando, para solteiros e casados, males
psíquicos, desgrasas moráis e molestias físicas.
A vida talvez fósse mais fácil e feliz, tanto para os indi
viduos como para a sociedade, se os homens, em :vez de se
julgar necessáriamente sujeitos ao sexo, procurassem decidi
damente tornar o sexo sujeito ao homem. Entáo, empalidecido
o aspecto erótico do ser humano, outras dimensóes da per-
sonalidade seriam realcadas, dimensóes muito mais nobres e
características da dignidade humana. Há, sem dúvida, mais
felicidade na disciplina e no dominio sobre os instintos do que
na aquiescencia a todos os apetites da carne.
Seria para desejar que os educadores na hora presente
incutissem tais verdades a seus discípulos e cuidassem de que
nao se proporcionen! aos jovens ocasióes de ouvir, em ambiente
promiscuo e fora da devida oportunidade, explicagóes que ser-
vem mais para excitar e desequilibrar do que para construir
urna personalidade sólida e harmoniosa.

Por falta de espaco, temos de omitir, neste número,


correspondencia miúda e Resenha de Livros.

Estéváo Bettencourt O.S.B.

«Scnhor meu Deus, única esperanga minha, ouve-me, para


que, fatigado, nao desista de Te procurar, mas procure sem-
pre ardentemente a tua face. Dá-me torgas para Te buscar,
Tu que a teu encontró me levaste e me deste ainda a espe
ranca de sempre mais Té encontrar».

(S. Agostinho)
NO PRÓXIMO NÚMERO:

As provas da existencia de Deus em nossos días

Oracáo é luta ? Adíanta rezar ?

Que sao as comunidades de base ?

Castidade pré-nupcial : possível ? recomendável ?

«Urnas e outras» de Chico Buarque de Holanda

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS»

porte comum NCr$ 17,00


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porte aéreo NCrS 22,00

Número avulso de qualquer mes e ano NCr$ 1,50


Número especial de abril de 1968 NCr$ 3,00
Volumesencadernados: 1957 a.1963 (preco unitario) .. NCr$ 10,00

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Volume encadernado de 1968 NCr$ 17>0Ü
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sisáo o índice de «P.R.» 1968. Prego: NCr$ 1,00.

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