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Projeto

PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS
ON-LIME

Apostolado Veritatis Spiendor


com autorizagáo de
Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb
(in memoriam)
APRESENTAQÁO
DA EDigÁO ON-LINE
Diz Sao Pedro que devemos
estar preparados para dar a razáo da
nossa esperanga a todo aquele que no-la
pedir (1 Pedro 3,15).

Esta necessídade de darmos


conta da nossa esperanga e da nossa fé
hoje é mais premente do que outrora,
visto que somos bombardeados por
numerosas correntes filosóficas e
religiosas contrarias á fé católica. Somos
assim incitados a procurar consolidar
nossa crenga católica mediante um
aprofundamento do nosso estudo.

Eis o que neste site Pergunte e


Responderemos propoe aos seus leitores:
aborda questóes da atualidade
controvertidas, elucidando-as do ponto de
vista cristáo a fim de que as dúvidas se
dissipem e a vivencia católica se fortalega
no Brasil e no mundo. Queira Deus
abengoar este trabal no assim como a
equipe de Veritatis Splendor que se
encarrega do respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.

Pe. Esteváo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR

Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e


passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e
Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicagáo.
A d. Esteváo Bettencourt agradecemos a confiaga
depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e
zelo pastoral assim demonstrados.
respondernos
SUMARIO

Ritmo Vital
<n
ni "Carnis Resurrectionem"?
O
,_ Milagres: Sim ou Nao?

J2 Santa María Goretti: Luz sobre o caso


3 E as f¡naneas da Santa Sé?
a
^ "O Segredo de Fátima
oo Os Ritos Soviéticos
«g O Zen-Budismo

m
O
ce
a.

ANO XXVII - SETEMBRO - 1986 292


PERGUNTE E RESPONDEREMOS SETEMBRO - 1986
Publicado mensa! N°292

SUMARIO

Como traduzir
Diretor-Responsave.: ,.CARms RESURRECT(0NEM..? g
Estévao Bettencourt OSB
Autor e Redator de toda a materia Entre as muitas noticias de nossos tempos:
publicada oeste periódico MILAGRES: SIM OU NAO? 9
Diretor-Admininrador
D. Hildebrando P. Martins OSB Um "livro bran«>":
SANTA MARÍA GORETTI: LUZ SOBRE 0 CASO
Administradlo e distribuido:
Edipóes Lumen Christi Questáo indiscreta?
Oom Gerardo. 40-59 andar, S/501 E AS FINANCAS DA SANTA SÉ? n
Tel.r (021)291-7122 17
Caixa postal 2666 Que será?
20001 - Rio de Janeiro - RJ „..,..,.,.. __ ._„
O SEGREDO DE FATIMA" por José
Geraldes Freiré 26

Composicáb e I mpressao: Para substituir os ritos religiosos:


"Marques Saraiva" OS RITOS SOVIÉTICOS «
Santos Rodrigues. 240 00
Rio de Janeiro Em voga no Ocidente:
O ZEN-BUDISMO 41

NOTAS 45

Assinatura de 1986: CzS 100,00


Número avulso CzS 11,00
NO PRÓXIMO NÚMERO
Para pagamento da assinatura de
1986, queira depositar a importan 293-Outubro-1986
cia no Banco do Brasil para crédito
na Conta Córreme n9 0031 304 1 A encíclica "Senhor e Fonte de Vida".
em nome do Mosteiro de Sao Bento - A única Igreja de Jesús Cristo. - "Em Cuba
do Rio de Janeiro, pagável na Agen nao há tortura". - "Horizonte de Esperanca.
cia da Praca Mauá (n? 0435) ou en Teología da Libertario". - Urna carta da
viar VALE POSTAL pagável na África do Sul. - Igreja Católica "Liberal".
Cemitérios: jardins de lazer?
Agencia Central dos Correios do
Rio de Janeiro. COM APROVACÁO ECLESIÁSTICA

RENOVÉ QUANTO ANTES COMUNIQUE-NOS QUALQUER


A SUA ASSINATURA MUOANCA OE ENDERECO
Ritmo Vital

Toda sociedade que trabalhe, tem seu organograma, seu crono-


grama, seus balan?os, suas estatlsticas... Mas tem também algo de invisí-
vel e, por isto, algo que menos chama a atencáo, a saber: o seu ritmo vi
tal, o seu metabolismo interior. Este é pressuposto indispensável, táo
identificado com o organismo que s<5 se pensa nele quando nao vai bem
ou quando há disturbios respiratorios ou circulatorios.

Algo de semelhante se dá com a Igreja. Esta é o Corpo de Cristo,


que exerce sua missáo neste mundo, concebendo seus organogramas e
cronogramas..., mas vivificada por um ritmo interior, que é a vida espiri
tual dos seus membros..., vida espiritual que tem seu cerne na vida de
oracjio. Esta deve ser algo de táo entranhado no cristáo que ele a prati-
que sem ter consciéncia disto, como ele nao tem consciéncia de que res
pira, de que digere, de que o sangue circula em suas veias...

Sabiamente dizia o Peregrino Russo: "Reza, e pensa o que quise-


res... Reza, e faze o que quiseres... Reza, e nada temas... Reza de urna
forma ou de outra, mas reza sempre, e nao te desvies da oracáo por nada
no mundo".^ O programa é belo, mas-aparentemente utópico ou inexe-
qülvel. Como realiza-lo? - Os mostres nos indicariam duas regras muito
simples:

1} Reservar diariamente um espado digno (bem situado dentro do


nosso horario) para a oracáo pessoal e silenciosa; nao nos contentemos
apenas com as "sobras" de tempo, pois estas sao raras e ficam muito
aquém do valor da oracáo. Tal espago deve ser programado, pois nao
basta ter a intencáo de rezar; sabemos que as distracoes logo nos
acometem ou as aves do céu nos assaltam e devoram a sementé da Pala-
vra de Deus lampada nos nossos coracóes (cf. Mt 13,4). Por conseguinte,
no seu horario de oracao o cristáo aplica-se a leí tura meditada da S. Es
critura ou de algum sólido livro de espiritualidade. Ao terminar a oracáo
de vinte ou trinta minutos no mfnimo (pois em menos tempo é difícil pe-
netrarmos no fundo de nos mesmos, táo densa é a nuvem de distracóes e
preocupacóes que existem na periferia da nossa mente), o cristSo deve
estar como quem sai de um mergulho profundo (no océano de Oeus) ou
como Moisés que trazia os efeitos íntimos do seu contato com Deus (cf.
2Cor 3,7s; Ex 34,29s). Ele está polarizado ou imantado por Deus. Pois
bem; procure conservar essa polarizado durante o resto do seu dia.

1 O Peregrino Russo. Tres relatos inéditos.Ed. Paulinas, SSo Paulo


1985, pp. 104.106.

385
2) Em vista disto, entregue-se aos afazeres da sua jornada com um
propósito firme e ¡nquebrantável: "Nao resistir ao Espirito Santo" ou,
como diría Sao Paulo, "nao entristecer o Espirito Santo de Deus" (cf. Ef
4,30). Ele é o Mestre interior, que nos fala e leva adiante nos caminhos
que conduzem ao Pai mediante o Filho (cf. Ef 2,18). A grande aventura de
descobrirmos Deus é obra da graca ou dom do Senhor, mas a graca re-
quer disponibilidade e prontidáo generosa da nossa parte; sem o qué, ela
nao se expande, mas é sufocada. A entrega dócil aos apelos do Espirito
(por mais surpreendentes ou incómodos que parecam) tem sua compen-
sacio estupenda, pois implica cada vez mais "ver o Invisível" (Hb 11,27),
penetrar no Absoluto, naquele que é para sempre a Grande Resposta e
o Tu perféito de todos os homens. O Espirito Santo, pois, se encarrega
do que julgamos nao poder fazer; Ele o realiza desde que the digamos
Sim em tudo. Conseqüentemente a uniáo com Deus torna-se no cristáo
como que urna "segunda natureza", um ritmo de vida (comparável á res-
piracáo e á circulacáo do sangue), de que o discípulo nao tem consciéncia,
por estar tio arraigado dentro dele. Observa va Santo Antio, um dos
mestres da vida de oracáo: "Só oramos bem quando ignoramos que es
tamos rezando"; alude assim a este estado permanente de oracáo que re
sulta do exerefeio regular e perseverante da oracáo explícita e consciente.

Possam os cristáos dos nossos dias atender ao convite do Senhor e


da sua Igreja, que os chamam para urna vida de oracáo mais intensa e
profunda..., oracáo sem a qual "em váo trabalham os construtores da ca
sa, em váo vigiam os guardas da cidade" (S1126,1)!

E.B.

386
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS"

ANO XXVII - n5 292 - Setembro de 1986

Como traduzír

" Carnls Resurrectionem " ?

Em slntese: É aqui apresentado mais um documento da Santa Sé refe


rente ao momento da ressurreigSo final. Em vista da teoría que a admite logo
após a morte do individuo, a Sagrada CongregagSo para a Doutrina da Fé
afirma que esta se dará táo-somente na consumagSo da historia, quando o
Senhor vier para julgar todos os homens; todos entáo ressuscitaráo; haverá,
pois, a ressurreigSo da carne. Em conseqüénda, a Sagrada CongregagSo pa
ra a Doutrina da Fé ensina que a traducáo da fórmula latina "carnis resurrec-
tíonem" do Símbolo dos Apóstalos há de ser "ressurreigáo da carne" e nao
"ressurreigáo dos mortos"; esta última fórmula poderia ser entendida no sentí-
do de que o homem morre todo, sem que naja separagáo de corpo e alma, e
por isto ressuscita ¡mediatamente após 'a morte (e nao no día do jufzo univer-

Os cristáos professam a ressurreicáo dos mortos. Classicamente e


com fundamento na própria S. Escritura (cf. 1Cor 15,23; 1Ts 4,15; 2Cor
5,1-4), diz-se que a ressurreic§o ocorrerá quando Cristo voltar para con
sumar a historia e julgar todos os homens. Nos últimos decenios, porém,
tem-se divulgado a tese de que a ressurreicáo se dá logo após a morte do
individuo; em conseqüénda a Missa por um cristáo falecido é, nao raro,
chamada "Missa da RessurreigSo". Esta concepcáo vai tomando o vulto
de urna doutrina teológica válida e tranquila...

Ora sabe-se que a Sagrada Congregado para a Doutrina da Fé já


publicou aos 17/05/1979 urna Instrucáo a respeito, rejeitando tal teoría; cf.
PR 238/1979, pp. 399-404; 275/1984, pp. 266-281. A fim de evitar qualquer
hesitacáo sobre o assunto, deu-se posterior pronunciamento da mesma
S. Congregacao, que passaremos a analisar ñas páginas seguintes. En-
contra-se em Italiano na coletánea Documenta inde a Concilio Vaticano
Secundo Expíete Edita (1966-1985).' Librería Editrice Vaticana 1986, pp.

' "Documentos publicados após o Término do Concilio do Vaticano II


(1966-1985)".

387
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 292/1986

249-251. Tal pronunciamento deve datar de dezembro de 1983 (como se


deduz da respectiva apresentacjio) ou do comego de 1984; a quanto sa
bemos, é inédito no Brasil.

Eis a tradugáo portuguesa do texto em pauta, á qual acrescentare-


mos breve comentario:

1. O TEXTO DA SANTA SÉ

"í. O artigo 'carnis resunectionem" do Símbolo dos Apostólos loi até


agora Iraduzido para as diversas línguas de maneiras diferentes:

- tomándose ao pé da letra o texto latino do Símbolo dos Apostólos;1


- traduzindo-se o termo 'camis'por um equivalente?
- traduzindo-se o vocábulo 'camis' pelo termo 'mortuorum', tirado do ar
tigo 'Et exspecto resurrectionem mortuorum' do Símbolo niceno-constantino-
potitano.3
2. A questáo da tradugSo do artigo 'camis resurrectionem' do Símbolo
dos Apostólos foi examinada pela Sagrada Congregado para a Douthna da
Fé, que numa de suas reuni6es ordinarias adotou as decisóes abaixo, acom-
panhadas de suas respectivas razdes teológicas.

1 Ver traducóes em l/ngua italiana, francesa e portuguesa:

- 'La risurrezione deila carne' fMes.sale Romano, Conferenza Episco-


pale Italiana, 2* edizione, 1983, p. 306);
- 'La résurrection de la chair' (Missel Romain pour les pays franco-
phones, París 1974, p. 11).

- 'A ressurreicao da carne' (Missal Romano, Conferencia Nacional


dos Bispos do Brasil, Rio de Janeiro 1973, p. 351).

2 Ver traducSo inglesa:


- The résurrection of the body' (The Román Ritual: Rite of Baptism
for Children. English translatíon approved by the National Conference ofCa-
tholic Bishops and confírmedby the Apostolic See, New York 1970, p. 89).

3 Ver tradugóes em alema"o e espanhol:


- 'Auferstehung der Toten' CMessbuch tur die Bistümer des deutschen
Sprachgebietes, 1974, Teil, 1,p. 119);
- 'La ressurrección de los muertos' (Libro de la sede. Secretariado
Nacional de Liturgia, Madrid 1983, p. 394).

388
"CARNIS RESSURRECTIONEM"

Tais decisóes, aprovadas pelo S. Padre em audiencia concedida a S.


Eminencia o CardeaiJoseph Ratzinger, Prefeito da mesma Congregagáo, aos
2 de dezembro de 1983, toram transmitidas a este Dicastério com urna carta
datada do día 14 de dezembro subseqüente (Prot. 121/75).

CONGREGACÁO PARA A DOUTRINA DA FÉ

A) DECISÓES

1. Em principio, nao há razóes doutrinárias contra a traducáo 'ressur-


reigáo dos morios', como se esta fórmula nao exprimisse a mesma fé profes-
sada pela ¡fórmula 'ressurreigáo da carne', mas há urna convergencia de ra
zóes teológicas conjunturais que militam em favor da conservagáo da tradu-
gao exaia tradicional (literal).

2. Ñas traducóes que futuramente forem apresentadas para ser apro


vadas pela autoridade eclesiástica, dever-se-á manter a traducáo exata literal.

3. Nos lugares onde a mudanga tenha sido autorizada, convém comu


nicar aos Srs. Bispos as razóes que recomendam o retomo á tradugSo exata
tradicional.

B) RAZÓES TEOLÓGICAS E CONJUNTURAIS

Militam pela conservagáo da traducáo exata tradicional do artigo do


Símbolo dos Apostólos 'camis resurrectksnem' as seguintes razóes:

1) As duas fórmulas 'ressurreigSo dos mortos' e 'ressurreigSo da carne'


sao expressóes diversas e complementares da mesma tradigáo primitiva da
Igreja; por feto a prevalénda exclusiva ou total da fórmula 'réssurreigáo dos
mortos' viña a ser um empobrecimento doutrinal. Com efeito, é verdade que
também esta última contém implícitamente a afírmacSo da réssurreigáo corpo
ral, mas a fórmula 'réssurreigáo da carne', como expressSo, é mais explícita
ao afirmar aquele particular aspecto da ressurreigáo, como demonstra a sua
própria origem.

2) No abandono da fórmula 'ressurreigáo da carne' está contido operi-


go de se sutragarem as modernas teorías que pSem a ressurreigáo na hora da
morte, excluindo oráticamente a ressurreigáo corporal, especialmente desta
carne. Na sua Carta 'Sobre Algumas Questóes Concementes á Escatologia'
(17/05/79), a Sagrada Congregagáo para a Doutrina da Fé chamou a atengáo
dos Bispos para a atualdifusáo de tal teoría 'espiritualizante'da ressurreigáo".

389
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 292/1986

2. COMENTARIOS

1) Acrescentamos que, entre as próprias tradugóes oficiáis existen


tes no Brasil, ocorre, além de "ressurreicáo da carne" (Missal), também a
fórmula "ressurreicáo dos mortos" (Rito do Batismo de Cnancas, Profis-
sáo de Fé feita ¡mediatamente antes da infusáo da agua; Rito de Unció
dos Enfermos).

2) A Sagrada Congregado para a Ooutrina da Fé afirma que am


bas as fórmulas traduzem a verdade da fé, mas prefere a clássica por ra-
zoes "conjunturais", ou seja, em vista de falsas concepcóes que poderiam
ser hoje em dia associadas á fórmula "ressurreicáo dos mortos". - Quais
seriam tais concepcóes?

Urna teoría recente nega a distincáo real de corpo e alma; conside


ra-os como duas facetas (como cara e coroa) da mesma e única realidade
humana; o homem seria um todo monolítico. Em conseqüénda.quartdoa
pessoa morre, morre toda a sua realidade; nao sobrevive a alma espiri
tual separada do corpo. Ora, para evitar um hiato ou urna ruptura na
existencia do ser humano, urna corrente teológica moderna afirma que a
ressurreicáo se dá logo após a morte. Por conseguinte, tal corrente prp-
fessa nao a ressurreicáo da carne, pois esta é sepultada e decompóe-se,
mas a ressurreicáo dos mortos; é o falecido que ressuscita, sem que se
faca a distincáo de corpo e alma.

Ora tal teoria nao corresponde á mensagem bíblica nem á doutrina


da Igreja. Por isto é que, a fim de evitar seja veiculada entre os fiéis, a
Santa Sé nao admite a traducáo "ressurreicao dos mortos", mas deseja
que se mantenha o teor exato da formulacáo latina: "ressurreicáo da car
ne". Quanto á expressáo "ressurreicáo dos corpos", é tida como equiva
lente a "ressurreicáo da carne"; nao implica a ambigüidade contida na
fórmula "ressurreicáo dos mortos", mas nao há por que a substituir a
"ressurreicáo da carne".

3) As razóes pelas quais nao se pode admitir a ¡dentificacáo de cor


po e alma nem, por conseguinte, a ressurreicáo logo após a morte, jé fo-
ram longamente explanadas nos citados artigos de PR; ver p. 387 deste
fascículo. Por isto aqui enfatuaremos apenas os textos bíblicos que con-
tradizem a tal teoria:

Jo 6,54: "Ouem come a minha carne e bebe o meu sangue, tem a vida
eterna, eeuo ressuscitarei no último día".

1Cor 15,22s: "Assim como todos morrem em Adáo, em Cristo todos


receberáo a vida. Cada um, porém, em sua ordem: como primicias. Cristo;
depois, agüeles que pertencem a Cristo, por ocasiáo de sua vinda (paru-

390
"CARNIS RESSURRECTIONEM"

sia)". Donde se vé que o "último dia" éoda "parusia" ou o da segunda vinda


de Cristo.

Jo 5,28s: "Nao vos admiréis com isto: vem a hora em que todos os
que repousam nos sepulcros ouvirSo a voz do Filho do Homem e sairáo:os
que liverem praticado o bem, para urna ressuneigáo de vida; os que tiverem
praticado o mal, para urna ressurreicáo de condenacño".

1Ts 4,16: "Quando o Senhor, ao sinal dado, á voz do arcanjo e ao


som da trombeta tfwna, descer do céu, entSo os morios em Cristo ressuscita-
ráo". Está claro que neste texto as imagens apocalípticas de "desuda do
céu", "trombeta divina" e "voz do arcano" nao podem ser tomadas ao pé da
letra.

2Cor 5,1-4: "Sabemos que, se a nossa morada terrestre, esta tenda,


for destruida, tetemos no céu um edificio, obra de Deus, morada eterna, nao
feita por mios humanas. Tanto assim que gememos pelo ardente desojo de
revestir por cima da nossa morada terrestre a nossa habitacáo celeste, o que
será possfvel se tormos encontrados vestidos e nao ñus. Pois nos, que
estamos nesta tenda, gememos acabrunhados, porque nao queremos ser
despojados da nossa veste, mas revestir a outra por cima desta, a ñm de que
o que é mortal, se/a absorvido pela vida".

Nestes dizeres, o Apostólo exprime o desejo de nao morrer, ou se-


ja, de nao ser despojado do corpo mortal, mas de revestir por cima do
corpo mortal o corpo ¡mortal ou a gloria celeste. E Sao Paulo afirma que
¡sto nao é ¡mposstvel; condicáo para tanto é que, no dia em que Cristo
voltar, sejamos encontrados vestidos, isto é, vivos, e nao ñus, isto é, nao
despojados do corpo mortal pela morte. Donde se deduz que a morte nos
desnuda do corpo mortal e nos deixa sem corpo ou sem veste até o dia
da parusia, quando receberemos o corpo glorioso, como nova veste.

4) Os textos bíblicos citados evidenciam ainda o seguinte: nao se


pode dizer que a tese da separadlo de corpo e alma em vista da ressur-
reicéo no dia final seja urna concepgáo platónica ou grega, alheia á men-
sagem bíblica. Muito ao contrario; ela está profundamente inserida na
mensagem do Novo Testamento. A Biblia nao professa algum sistema
filosófico definido ou exclusivo, mas serve-se do instrumental da filosofía
em geral, para exprimir a sua mensagem de fé. No Antigo Testamento
prevaleciam concepcoes semitas e urna escatologia muiró pálida ou em
brionaria; no Novo Testamento tais noyóes desabrocharam puma esca
tologia mais lúcida, que ensina a separadlo de corpo e alma na hora da
morte e a futura recomposicáo do ser humano na consumado da histo
ria (Deus nao terá que catar a poeira do cadáver deteriorado, mas unirá á
mesma alma o que a Filosofía chama "materia prima"; donde resultará o
corpo correspondente a tal alma).

391
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 292/1986

5) Tal é a doutrina que a Igreja professa na Instru9áo da Sagrada


Congregacáo para a Doutrina da Fé datada de 17/05/1979:

"A lgreja afirma a sobrevivencia e a subsistencia, depois da morte de


um elemento espiritual, dotado de consdéncia e de vontade, de te/ modo que o
eu humano1 subsista, embora entrementes careca do complemento do seu
corpo. Para designar esse elemento, a Igreja emprega a palavra 'alma', con
sagrada peto uso que déla fazem a Sagrada Escritura e a Tradigáo. Sem igno
rar que este termo é tomado na Biblia em diversos significados, Elajulga, nao
obstante, que nao existe qualquer razáo seria para o rejeitar e considera
mesmo ser absolutamente indispensável um instrumento verbal para susten
tara fé dos cristáos" (n93).

As consideracóes propostas neste artigo evidenciam quanto em


Teología se faz necessária urna terminología precisa e clara para evitar
mal-entendidos e erros na fé.

A propósito ver também PR 291/1986, pp. 338-346 (apreciacño do livro


"Escatotogia Crista"de J.B. Libánio e M. Cl. Bingemer).

Quando dizer NAO é precisofior Pauto Goilarte. Publícacóes CEDI-


CARMO, Rúa Grao Mongol 502, 30000 Beto Horizonte (MG), 1985, 125 x 195
mm, 112 pp.
Mais de quatro mil sacerdotes tombaram nos campos de concentracáo
durante a última guerra. Um deles foi o carmelita holandés Freí TitoÓrandsma,
cuja biografía se encontra neste livro. Freí Tito foi um homem polivalente: Sa
cerdote e Religioso, dedicou-se ao magisterio, ao jornalismo, ao ecumenismo
e á vida pastoral. A um confrade que Ihe observava a necessidade de poupar-
se em razáo de sua frágil saúde, respondeu: "O Senhor nao fez tudo o que
podía por nos?". Atendía solícitamente tanto ao aluno universitario como á máe
preocupada por seu fílho. Curvava a cabega diante do voto de obediencia reli
giosa e bradava aos céus contra a violáceo da liberdade da imprensa; escuta-
va a todos com paciencia e resistía á perseguígSo dosjudeus por parte dos
nazistas, que o fizeram morrer mediante urna injecáo de ácido fénico aos
26/07/1942. Aos 3/11/1985 o Papa Joáo Pauto llopmclamou Bem-aventura-
do, dizendo: "Este homem é um mártir do nosso secuto".

392
MILAGRES: SIM OU NAO?

Entre as murtas noticias de nossos tempos:

Milagres: Sim ou Nao?

Em símese: Apesar do descrédito que sofre a palavra "milagre" em


nossos días, a Igreja continua a professar a possibilidade e a existencia de
auténticos milagres. Estes nao sao sintptesmente demonstragóes do poder de
Deus, mas vém a ser, conforme a linguagem bíblica, slnais,./sto é, acenos
eloqüentes de Deus aos homens a fim de dissipar dúvidas ou demonstrara
Providencia e o Amor de Deus para com as criaturas. - De modo especial,
a Igreja eré que Deus faz milagres queatestem a santidade de homens e mu-
Iheres que a devogáo popular considera "santos"; a Igreja, para confirmar tal
opiniáo. geralmente espera que Deus se pronuncie sobre a temática, realizan
do um ou dois milagres ou sinais. Existe em Roma a CongregagSo para as
Causas dos Santos, que examina a documentagSo relativa a cada candidato a
canonizagáo e que, por conseguinte, se interessa pela autenticidade ou neo
de tatos tidos como milagrosos.

O artigo seguinte aprésenla declaragóes de umprofessore médico que


trabalha em tal Congregag&o, e oferece tres relatos de milagres reconhecidos
como tais pelos peritos médicos e canonistas.

Os milagres hoje em día correm o perigo do descrédito, pois se ve


rifica que mu ¡tos fatos até época recente tidos como inexplicávéis sio
elucidados pela ciencia médica e pela parapsicologia. Nao obstante, a
Igreja continua a valorizar os milagres dentro de certas co.ndicóes:

1) o episodio em foco tenha realmente ocorrido como fato históri


co (é preciso examinar criticamente os relatos de "prodigios" logo que
sejam a presentados pelo povo de Deus; muitas narracóes sao entáo
comprovadas como fantasiosas e nao históricas);

2) o episodio histórico seja totalmente ¡nexplicável pela ciencia;

3) haja ocorrido em condigóes dignas de Deus, como resposta do


Senhor a um contexto adequado ou a preces de fiéis devotos. Esta ter-
ceira característica é muito acentuada em nossos días, pois o milagre só

393
JO "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 292/1986

tem sentido na medida em que é um sinal (semeion, diz sempre o evan


gelista Sao Joáo) de algo maior ou de urna mensagem de Deus aos ho-
mens. Exemplo tfpico de milagre-sinal é o da cura do paralitico em Me
2,3-12: Jesús, ao vé-lo, perdoou-lhe os pecados; visto que os circuns
tantes nao acreditavam na validado do gesto do Senhor, Este mandou
que o paralitico se levantasse e andasse. O "sinal" comprovou a autori-
dade de Jesús; tornou-se urna palavra mais eloqüente do Senhor Jesús.

Precisamente porque acredita no valor dos milagres, a Igreja exige,


para a canonizacáo dos Santos, milagres comprovados; estes sao tidos
como sinais de Deus que autenticam as virtudes dos Santos e possibili-
tam a Igreja propor tais fiéis como amigos de Deus e intercessores dos
homens. - Alias, é de notar que toda canonizacáo de Santo é proferida
com a assisténcia infallvel do Espirito Santo; é urna afirmacáo de fato
dogmático, ou seja, do fato de que tal ou tal servo(a) de Deus é modelo
de vida crista e pode ser tido(a) como intercessor(a) junto a Deus; em tal
tipo de definicáo a Igreja nao pode errar, pois toca a fé.

Recentemente o jornalista italiano Vittorio Messori foi entrevistar


personalidades da Santa Sé relacionadas com os processos de canoniza-
cao dos Santos. Ñas páginas subseqüentes, publicaremos partes de um
diálogo havido entre o jornalista e o Prof. Dr. Marcello Meschini, médico
legista de Roma e Secretario dos Processos de Averiguado de Milagres.1

1. Milagres: como averiguá-los?

O Dr. Marcello Meschini logo observou que, para se poder falar de


milagre, se requerem sucessivas pericias médicas: o exame de cada caso
comeca na própria diocese da pessoa tida como virtuosa; os médicos lo
cáis estudam o ocorrido e recolhem toda a documentacáo atinente ao
fato. O material é enviado a Santa Sé, que submete o caso á "Consulta
Médica" da S. Congregacáo para as Causas dos Santos; urna Comissáo
de cinco médicos examina os dados com plena liberdade científica e au
tonomía de decisáo: as discussdes podem tornar-se candentes. Desde
que os médicos reconhecam a total inexplicabilidade do caso, este é leva
do a exame teológico, que ocorre em duas fases: primeiramente, há urna
sessáo de teólogos apenas, que investigam os aspectos religiosos das
ocorréncias (terá havido al manifestacSes supersticiosas, v§ gloria ou, ao
contrario, auténtica piedade?); depois, o documentarlo é apresentade a
urna Congregacáo de Cardeais e Bispos. Os resultados de. todas essas

' Extraímos estes dados da revista JESÚS, das Edigóes Paulinas da Italia,
margo 1986, pp. 90s.

394
MILAGRES: SIM OU NAO? 11

pericias sao levados ao Papa; se este os reconhece como válidos, lé-se na


sua presenca o decreto referente á validade do milagre. Assim é aberto o
caminho para a Beatificapáo ou para a Canonizado da pessoa em foco.^
O Santo Padre pode dispensar da exigencia de milagres desde que naja
evidencia de se tratar de um mártir que derramou o sangue estritamente
por fidelidade á fé católica.

Observou o Dr. Marcello Meschini:

"Para que urna cura seja por nos considerada como científicamente
inexplicável e nÉagrosa, precisamos de conhecer bem o diagnóstico e as
probabiídades de cura; precisamos também de saber se foi cura definitiva,
completa, obtída sem tratamento adequado e em periodo de tempo nao natu
ral, isto é, de maneira instantánea ou inexplicavelmente rápida.

Para poder definir isto tudo, requer-se evidentemente urna documenta-


cao rigorosa a ser estudada pela Postulacáo da Causa, que nem sempre é fá
cil obter; os peritos podem pedir novas pesquisas e, mesmo assim, sSo muí-
tas vezes obrigados a pronunciarse negativamente por falta de documentos
suficientes".

2. Alguns exemplos

Acrescentou o Prof. Meschini:

"Muitos pensam que as curas que reconhecemos e que servem aos


processos de canonizacao, devam referirse á vida e á morte de algum en
fermo; este, sem a intercessSo do Santo, tena monido. Na verdade, porém, os
casos sao muito diversificados; nao exigimos que as previsoes de cura te-
nham sido nulas para pódennos falar de milagres".

A fim de ilustrar as suas afirmacSes, Meschini citóu o seguinte caso:


havia urna menina afetada de piodermite, isto é, urna infeccao da pele
que se estendia sobre o rosto ¡nteiro; com o tempo, a doenca poderia
provocar danos orgánicos, mas no momento limitava-se a desfigurar a
paciente (causando-Ihe, sem dúvida, disturbios psicológicos). Ora a invo
cado do Servo de Deus N.N. provocou o completo e definitivo desapare-
cimento da molestia no decorrer de urna noite. O caso foi reconhecido
como milagroso e ocasionou a glorificacSo do 'candidato'.

Eis outro caso mais recente e impressionante, em que a vida nao


estava em perigo, mas se tornara mais difícil: um menino indiano nascera

1 A respeito de BeatifícacSo e Canonizacao de Santos vero artigo de


PR 249/1980. pp. 355-364.
12 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 292/1986

com os pés tortos; as plantas dos pés nao pousavam sobre o chao, mas
estavam voltadas uma para a outra, de modo que so era possivel b crian-
ca arrastar-se sobre a parte lateral dos pés. O médico de sua pobre aldeia
natal diagnosticara o caráter definitivo e irreverslvel da deformacáo. Com
efeito, o menino, ao crescer, nao pudera senáo aprender a arrastar-se
com muito cansaco, apoiando-se em duas bengalas. Certa manhá, quan-
do penosamente se dirigía á escola distante tres quilómetros da choupa-
na de sua familia, deixou-se cair esgotado numa atitude de desespero.
Sua irmi, jovenzinha, o acompanhava; para consola-lo, propós-lhe que
orassem. Mas a quem haveriam de rezar? A menina Ihe sugeriu que invo-
cassem a Fundadora do Instituto Religioso no qual sua tia se fizera freirá.
Esta, com efeito, dizia muitas vezes que a Madre "fazia milagres". Dito
e feito; as duas enancas ¡nvocaram a Madre e logo ocorreu abura. O en
fermo pode ¡mediatamente desfazer-se de suas bengalas e caminhar
normalmente até a escola, onde todos conheciam a sua deformacáo e,
por isto, ficaram perplexos. Para dissipar as dúvidas sobré a realidade
dos fatos, pediram ao menino que fosse jogar bola com os colegas; ele o
fez, sim, naturalmente experimentando o grande cansaco de quem treina
pela primeira vez.

Eis mais um exemplo de milagre reconhecido como tal, segundo o


Prof. Dr. Marcello Meschini:

Uma menina canadense, afetada de leucemia, era vltima também


de um tumor retro-esternal (atrás do osso esterno), dentro da caixa torá
cica - o que Ihe acarretava sufocacáo crescente. Apesar de sucessivas in-
tervencóes cirúrgicas, a situacáo da menina foi-se agravando a ponto que
os médicos recomendaram aos país que a levassem para casa a fim de
que morresse entre os seus. Na falta de esperanca de cura, os genitores
chegaram a preparar o traje com que a menina seria sepultada. Eis, po-
rém, que um dos familiares Ihes sugeriu comecassem uma novena a um
"Servo de Deus" cuja causa estava sendo examinada em Roma. Ora a
paciente foi piorando sempre até o último dia da novena, quando, com
"enorme surpresa de todos, ela se sentou na cama e pediu alimentacáo. As
suas atitudes doravante eram de uma pessoa sadia. Foi entáo submetida
a rigorosos exames médicos, que evidenciaram a total inexplicabildade
do fato; todavía, antes de emitir um jubo sobre a cura, os peritos espe-
raram oito anos, a fim de se certificar de que o tumor nao tornaría a
aparecer. Após este prazo, os médicos puderam afirmar a plena inexpli-
cabilidade científica da cura.1

' Os médicos nao falam de milagre no sentido teológico. Éá ComissSo


de canonistas e teólogos que compete examinar o fato do ponto de vista da té.

396
MILAGRES: SIM OU NAO? 13

Após narrar tais fatos, acrescentou o Prof. Dr. Meschini:

"Hoje em dia o progresso da medicina é tai que toma mais raros os ca


sos em que devamos reconhecer curas dotadas de características nao natu-
rais ou prodigiosas. Doutro lado, tal progresso tornou possfvela uWizagao de
meios que controlam a índole total e definitiva da cura com precisáo e segu-
ranea que outrora nao tíhhamos. Em todo caso, ñas minhas aulas para osjo-
vens que freqüentam o Studium instituido pela Congregacáo para as Causas
dos Santos, recomendó absoluto rigor, objetividade, aceitagáo táo-somente
dos principios reconhecidos pela ciencia oficial; nunca admitam fazer de W-
póteses teses comprobadas, transformar proposicóes prováveis em certas e
seguras, nem recorram apenas ao método dedutivo.1 Todos trabalhamos para
a gloria de Deus; ora o Senhor nao precisa de afirmacóes vagas, ilusorias ou
superficiais. Mas é o próprio Deus do Evangelho que nos Incita sempre, e de
todo modo, a procurar a verdade".

Sao estas algumas observares importantes relativas ao tema


"milagros". Verifica-se que a Igreja acredita em fatos que, totalmente
inexplicáveis pelos estudiosos, sejam sinais de auténtica intervencáo de
Deus na historia dos homens, ... sinais da benevolencia e do amor de
Deus ás suas criaturas necessitadas de urna Palavra "forte" do Todo-Po
deroso.

Apocalipse, por Freí Battistíni. - Edicáo própria; endereco: Av. Pe. An-
chieta, Caixá Postal 93.630, CEP25900- Magé (RJ), 1986, 115x 155mm, 70
pp.

Freí Francisco Battistíni acaba de lanpar mais um livro de orientagáo


catequética, tendo em vista os mal-entendidos correntes a respeito do Apoca
lipse. De modo especial mostra que a Besta do Apocalipse, identificada
pelo número 666, é o símbolo do Imperador Ñero e nada tem que ver com per-
sonagens posteriores da historia. Alude aos rumores de próximo fim do mun
do, procurando dissipar a expectativa de iminentes acontecimentos assusta-
dores. Por fim, aponía o caminho da satvagáo, tal como a Igreja Católica o a-
presenta aos fiéis. Certamente o livro tara bem aos leitores atingidos por ru
mores alarmistas falsamente fundamentados no Apocalipse.

..'O método dedutivo é o que prescinde da observacáo empírica e de-


duz conclusóes a partir de principios teóricos.

397
Um "livro branco":

Santa Maria Goretti: luz sobre o (aso

Em sfntese: A 5. Congregagáo para as Causas dos Santos publicou


recentemente um livro resultante de minucioso estudo realizado sobre o pro-
cesso de canonizacáo de Santa Maria Goretti, mártir da té em 1902. Talpro-
cesso foi impugnado pelo escritor italiano Giordano Bruno Guerri em 1984
como se tivesse glorificado urna menina débil mental, ignorante e desprezfvel.
- O estudo ofetuado por peritos da Santa Sé mostra que Giordano Bruno
Guerri nao leve conhedmento do texto dos documentos e dos tatos atinentes
a Maria Goretti; escreveu na base de preconceitos e de interpretagdes ten
denciosas dos acontecimentos. O depoimento de A. Serenelli, assassino de
Maria Goretti, transcrito neste artigo, corrobora o valor da heroica menina, que
morreu por ñdelidade aos seus principios éticos cristáos.

Já em PR 283/1985, pp. 506-511, foi dada a noticia de que o escritor


italiano Giordano Bruno Guerri em 1984 publicou o livro Pavera Santa,
povero assassino: la vera storia di Maria Goretti. Procurava provar que a
menina Maria Goretti, de doze anos, nao passava de urna débil mental de
Nettuno, que a Santa Sé quis canonizar a fim de atender a interesses de-
correntes da Segunda Guerra Mundial (1939-1945): necessidade de re-
valorizar a virgindade, vilipendiada pelas tropas de ocupacáo da Italia, e
exaltar a pobreza frente á riqueza dos militares norte-americanos.

O livro de Giordano Bruno Guerri nao teve no público a repercus-


sao que se esperava, causando decepcáo ao autor e ao editor, que julga-
vam tirar da edicáo rico lucro financeiro. G.B. Guerri se acostumara aos
sucessos editoriais, publicando biografías de membros do alto escaláo do
fascismo italiano.

Para responder ao autor critico, a S. Congregagáo para as Causas


dos Santos nomeou urna Comissáo presidida por Mons. Nicola Ferrara,
Prelado Emérito da Sacra Rota Romana, e destinada a investigar o fun
damento das alegagóes e acusacóes do referido escritor. Após um ano de
atento trabalho, esta Comissáo pode dar á luz o livro A proposito di Ma
ria Goretti. Santita e Canortizzazioni, pp. 154, Librería Editrice Vaticana.

398
SANTA MARÍA GORETTI: LUZ SOBRE O CASO 15

Tal estudo foi elaborado com seriedade objetiva, em plano de estrita


pesquisa historiográfica. Os historiadores da Santa Sé trabalharam com
especial afinco, visto que nos últimos tempos se tem verificado urna
campanha de livros que tendem a desfigurar os Santos: assim a escritora
Ida Magli apresentou Santa Teresinha de Lisieux como histérica, neuróti
ca e, provavelmente, atéia; Guido Ceronetti quis ver em Sao Joáo Bosco
um homem de tendencias pederastas, "atraído para os jovens por um
doentio enternecimento sexual"; Giordano Bruno Guerri considera María
Goretti como "urna desgranada obscurecida pela ignorancia, urna mise-
rável rázinha destituida de inteligencia". Ora a Comissáo do Vaticano, no
livro recém-publicado, mostrou que Giordano Bruno Guerri incorreu em
77 erros na sua obra acusatoria. O escritor nao replicou a esta demontra-
cáo, alegando que o seu advogado Ihe havia recomendado esta atitude.
Acrescentou que, se há erros no seu livro, isto se deve ao fato de que o
Vaticano mantém inacesstveis os documentos respectivos. Os comenta
dores, porém, observam que, se um historiador nao dispóe dos docu
mentos necessários para trabalhar, nao deve reconstituir os fatos como
se estivessem devidamente fundamentados. Mais: verifica-se que muitas
das réplicas da Santa Sé foram formuladas na base de documentos que
Guerri tinha em msos; este se enganou até mesmo ao transcrever textos
latinos citados em sua obra. A clamorosa defesa de G. B. Guerri consistiu
em afirmar que ele era vítima de "nova Inquisicao", de "procedimentos
medievais", numa "situacao paralela á*de Galileu" (o que se tornou "cha-
váo", vazio de conteúdo, especialmente no caso de Guerri, em que se
tratava nao de um debate filosófico, mas de urna questáo de fatos históri
cos... que se resoive mediante documentos).

O assassino de María Goretti, após arrepender-se do delito, fez-se


frade franciscano, e aos 05/05/1961 escreveu II Mió Testamento Spirítuale
(O Meu Testamento Espiritual), onde se lé a seguinte passagem, escarne
cida por G. B. Guerri, mas altamente valorizada pela Comissáo da Santa
Sé:

"Sou um anciáo de quase 80 anos, prestes a encerrar a minha jomada.


Langando um olhar sobre o passado, reconheco que no infrio da minha ¡u-
ventude entrei por urna vida falsa: a estrada do mal, queme levou á ruina. Eu
acompanhava, alravés da imprensa, os espetáculos e os maus exemptos que
a maior parte dos jovens segué trilhando aqueta estrada sem preocupacóes.
Eu mesmo nao me preocupava com os rumos que seguía. Junto a mim eu ti
nha pessoas de fé e de prática religiosa, mas nSo Ihes dava atengáo, obceca
do por urna torga bruta que me empurrava pela via do mal. Aos vinte anos
cometí o delito passional, cuja recordagáo hoje é suficiente para me encherde
horror. María Goretti, Santa, foi o anjo bom que a Providencia havia colocado
enante de meus passos. Aínda conservo guardadas no meu coráceo as pata-
vras suas de censura e de perdió. Ela rezou por mim, intercedeu por mim,
seu assassino. Seguiram-se trinta anos de prisáo. Se eu nao tora menor de

399
16 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 292/1986

idade, teña sido condenado para o resto da vida. Aceitéis sentenca merecida:
resignado, expiei a minha culpa. María foi realmente a minha luz, a minha pro-
tetara; com o seu auxilb, Uve boa conduta e procurei viver honestamente
quando a sociedade me aceitón de novo entre os seus membros. Os filhos de
SSo Francisco, os frades menores capuchinhos das Marcas, com seráfica ca
ridade, me acolheram nao como servidor, mas como irmao. Vivo com eles
desde 1936. E agora espero com serenidade o momento de ser admitido ávi-
sáo de Deus, de abragar de novo os meus entes queridos, de estar perto do
meu anjo protetor e da sua cara genitora Assunta. Aqueles que lerem esta 'mi
nha carta, queiram daf deduzir a licao de fugir do mal, seguir o bem sempre
desde a infancia. Lembrem-se de que a religiáo, com os seus preceitos, nao é
coisa que se possa dispensar, mas é o verdadeiro apoto, a única vía segura
em todas as circunstancias, mesmo ñas mais dotorosas da vida. Paz e bem!"
(Texto publicado por Fortunato Gbmei no livro II pugnale de¡ tanti remorsi.
Vita di Alessandro Serenelli, l'uccisore di Santa María Goretti. Nettuno
1983, p. 69).

Estas palavras de A. Serenelli vém a ser auténtico filáo para se en-


tender o caso de María Goretti. A coragem e a fidelidade da menina as-
sassinada acabaram por vencer a furia do próprio assassino. Tais teste-
munhos e exemplos de vida podem parecer estranhos a quem nao tenha
antenas para captar os valores moráis em foco, mas sao o argumento
mais convincente de que ácima dos valores materiais e transitorios se
acham os valores espirituais e definitivos (cf. 2Cor 4,17s); estes sao per-
ceptíveis a quem se liberte de preconceitos e paixóes, a fim de apreender
a Verdade.

A propósito ver

Vittorio Messori, II caso María Goretti: quando l'lnquisizione é laica


em JESÚS mato 1986, pp. 67-70.

Cónego José Amaral Mello. Um exemplo de Vida Sacerdotal, por


Mons. Primo Vieira. - Ed. Loyola, SSo Paulo 1986. 138x208mm, 157 pp.

Estudante de medicina, José Amaral Mello (1895-1942), já no último


ano, optou pela vida sacerdotal, sendo ordenado em 1923. Consagrou toda a
sua existencia ao magisterio eclesiástico e á formacáo de futuros sacerdotes.
Foi o orientador espiritual do consagrado escritor Paulo Setúbal, cujos passos
ele acompanhou até a conversáo e a morte edificante. Na obra postuma de
Setúbal, Confíteor, o Con. José aparece com o pseudónimo de Padre Z.; foi
quem terminou o livro, interrompido pela morte do autor. Sua vida, iluminada
por fé candente, constituiu-se num admirável exemplo de caridade intensa, de
mortüfícacSo constante e de evangélica pobreza.

400
Questáo indiscreta?

E as financas da Santa Sé?

Em símese: Quem considera o processo de receitas e despesas da


Santa Sé, verifica que esta é deficitaria há atguns anos e tende cada vez mais
a ser tal. As razóes deste déficit permanente sao, em parte, a criacSo (após o
Concilio do Vaticano II) de Organismos novos para atender ás exigencias da
missáo da Igreja no mundo contemporáneo, a intemacionalizacio da Curia
Romana, a reaíizacáo de assembléias (Sínodos, Conclaves...) ordinarias e
extraordinarias... A generosidade dos fiéis do mundo inteiro tem contribuido
para aliviar as Rnancas da Santa Sé, mas as ¡acunas na economía exigem
solugSo mais sistemática e garantida.

O Instituto para as Obras de Retigiáo (IOR) é quase um Banco do Vati


cano, que últimamente foi infeliz ao prestar apoio ao Banco Ambrosiano de
Roberto Calvi (MilSo). Apuradas as responsabilidades, verifícou-se que o di-
retor do IOR, Mons. Pauto Marclnkus, procedeu de boa fé e guarda o seu no-
me honrado; nao obstante, a Santa Sé quis pagar 240.800.000 de dólares aos
credores do Banco Ambrosiano para ressarcir os danos sofridos.

Os "tesouros" do Vaticano (Obras de arte dos Museus e da Pinacote


ca) seo patrimonio da humanidade inteira, do qual o Vaticano é guardiSo quali-
fícado. NSo seria desejável que esse patrimonio artístico fosse desbaratado;
deve-se a doadores magnánimos que, ao entregar seus bens á Santa Sé, tí-
nham muitas vezes a intengáo de fazer do Sumo Pontífice o tutor dos objetos
de arte consignados.

A Santa Sé está para tomar públicos os seus balancos anuais para que
todos os fiéis, tomando conhecimento dos mesmos, se sintamcada vez mais
Igreja juntamente com os seus Pastores. ■

Vem nao raro a baila o tema "Finanzas da Santa Sé". A respeito


transmitem-se hipóteses e afirmacoes fantasiosas ao lado de outras
multo verídicas. Sabe-se que a economia do Vaticano tem sofrido abalos
e situacdes deficitarias nos últimos anos. O assunto jé foi abordado em

401
18 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 292/1986

PR 233/1979, pp. 194-216. Visto que é sempre atual, volta ds páginas


deste fascículo, ilustrado por publicares recentes.

1. As diversas faces do problema

A Igreja é chamada, na Biblia, "Esposa de Cristo", "Morada de


Deus entre os homens", "Povo de Deus", "Corpo de Cristo"-títulos es
tes que póem em relevo o aspecto transcendental ou místico da Igreja;
esta nao é apenas urna assembléia de pessoas que procuram ser hones
tas, mas é o Cristo vivo através dos séculos a prolongar o misterio da En-
carnacio. - Todavia a Igreja é, ao mesmo tempo, urna realidade histórica
e social, que necessita de lidar com meios temporais e materiais para po
der cumprir a sua missüo na térra. Desde os primeiros séculos, os cris-
táos ofereceram suas doacóes para sustentar os irmáos e a obra de evan-
gelizacáo da Igreja; o dinheiro assim oferecido exige órgaos administrati
vos com seus procedimentos próprios; estes ainda em nossos dias ocor-
rem, avolumados pela complexidade da vida moderna.

Quem considera a face temporal da Igreja, distingue quatro aspec


tos naquilo que se chama "as financas papáis": 1) o Papa é o Bispo de
Roma e, como tal, tem a seus cuidados o balanco da diocese de Roma; 2}
o Papa é o Soberano do Estado Pontificio do Vaticano, que também tem
seu orcamento próprio; 3) o Papa é o Pastor da Igreja Universal - o que
significa mais um tipo de contabilidade; 4) o Papa ¡ndiretamente respon
de também pelo Instituto para as Obras de Religiáo (Istituto per le
Opera di Reügione - IOR).

Vejamos o que se pode dizer sobre cada um dos tres últimos aspec
tos da questio, já que o primeiro nao costuma vir d baila nos comenta
rios públicos.

2.0 Estado do Vaticano

O "Estado da Cidade do Vaticano" é o resquicio do que foi outrora


o Estado Pontificio. Este tem sua origem em doacóes de térras que desde
os primeiros séculos os fiéis faziam ao Bispo de Roma, constituindo o
"Patrimonio de Sio Pedro"; em 756, o mordomo (e, depois, reí) Pepino o
Breve, da Franca, reconheceu esses territorios como Estado próprio ad
ministrado pelo Bispo de Roma (o Papa) em meio a urna Europa ainda
convulsionada pelas invasSes bárbaras. Em 1870 tal Estado cedeu á unifi-
cacáo da península itálica, e só em 1929 foi restaurado sob forma de mi
núsculo territorio independente (0/44 km2). Ele é necessário para facilitar
o exercfcio da missüo universal do Sumo Pontífice, que, tendo de se rela
cionar com o mundo inteiro sobre questóes relevantes e delicadas, nao
pode estar sujeito ao controle de potencia estrangeira.

402
E AS FINANZAS DA SANTA SÉ? 19

A administrado da Cidade do Vaticano está entregue ao "Gover-


natorato", que supervisiona diversas seccóes: Correios do Vaticano, Mu-
seus Vaticanos, Servícos de Seguranca, Servicos Técnicos (distribuicáo
da energía elétrica, aquecimento, limpeza...), Manutencáo dos ¡movéis e
dos jardins do Vaticano, Observatorio do Vaticano, Radio Vaticano,
Guarda Suica... No Vaticano trabalham 1565 pessoás assalariadas, ás
quais se devem acrescentar, na folha de pagamentos, 560 aposentadas;
cerca de 58% das despesas se faz com o pagamento dos servidores. A re-
ceita se deve a venda de selos, moedas, produtos alimenticios, vestes, ga
solina..., bilhetes de entrada nos Museus (estes fácilmente sao deficita
rios, pois as despesas de conservado, restaurado e vigilancia freqüen-
temente ultrapassam as receitas dos ¡ngressos). Em 1984 o balanco acu-
sou um pequeño superávit de 700.000 marcos alemáes aproximadamen
te.

3. A Santa Sé

Sob este título compreenderemos o movimento financeiro que se


refere ao governo da Igreja Universal.

3.1. As tarefas da Santa Sé

O Senhor Jesús quis fazer de Redro e seus sucessores "o principio


e o fundamento perpetuo e visível da unidade da fé e da comunhio"
(Constituido Lumen Gentium n? 18). Para exercer ó pastoreio de mais de
840 milhóes de fiéis esparsos pelo mundo inteiro, o Papa precisa de cola
boradores experimentados que o assessorem estreitamente. Estáo distri
buidos pelas Congregares Romanas (que sao quase Ministerios), pelos
Secretariados e Conselhos, as Nunciaturas, o Tribunal da Segnatura
Apostólica, o 'da Rota Romana, o Arquivo e a Biblioteca do Vaticano, a
Pontificia Academia de Ciencias, os Pontificios Institutos de Arqueologia,
de Música Sacra...

EstSo a servido da Santa Sé 1932 péssoas (entre clérigos e leigos),


ás quais se acrescentam, na folha de pagr.mento, 1019 aposentados.

Além das despesas ocorrentes com os Organismos ácima e seu


pessoal, devem-se registrar as que a Santa Sé realiza em prol das Mis-
sóes ou da evangelizado em térras nao cristas. Mais: sempre que ocorre
no mundo alguma catástrofe de vulto, o Santo Padre se senté obrigado. a
enviar recursos ou ajuda ás vítimas respectivas.

Em 1984 as despesas da Santa Sé elevaram-se a 197.600.000 de


marcos alemaes, ao passo que as entradas nSo foram além de
108.60*0.000 de marcos; houve, pois, um déficit de 89 milhóes de marcos.
403
20 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 292/1986

Alias, desde 1973 o orcamento da Santa Sé é deficitario em escala cres-


cente. As razóes desse déficit sao bem compreensíveis:

a} ocorreram recentemente na vida da Igreja alguns eventos ex-


d« 0¿t?Á"°\qZ£?Oj£am suficie"temente autofinanciados: o Concilio
do Vaticano II (1962-1965, quatro sessóes a 60 milhóes de francos cada
uma), a construcáo da nova sala de audiencias por Paulo VI (seis bilhóes
de liras), os dois conclaves de 1978 (8 bilhóes de liras cada um);

b) o Concilio do Vaticano II suscitou a criacáo de novos Organis


mos^ todos eles assaz dispendiosos: o Secretariado para a Uniio dos
Cnstaos, o Secretariado para o Diálogo com os Nao Cristáos, o Secreta
riado para o Diálogo com os Nao Crentes, a Comissáo "Justica e Paz" o
Conselho dos Leigos, a Comissáo para as Comunicares Sociais, o Pon
tificio Conselho para a Cultura, a Comissáo para a Pastoral do Migrante e
do Turismo, a Comissáo para a América Latina, o Conselho Cor Unum_.

c) além disto, o Concilio do Vaticano II provocou a realizacáo pe


riódica de Sínodos Mundiais de Bispos, a internadonalizacáo da Curia
Romana, a convocacao de peritos estrangeiros, a reforma da Liturgia e
do Direito Canónico, que exigiram a participacáo de especialistas do
mundo inteiro em viagens sucessivas de estudo e trabalho... Isto tudo
acarretou pagamento de novos salarios, viagens internacionais, instala-
(oes e escritorios adequados, etc.;

d) a Santa Sé tem mais e mais participado de reunióese Congres-


sos Internacionais destinados a estudar problemas da humanidade tem
ampliado o seu Corpo Diplomático, tem desenvolvido a sua acáo ecumé
nica; mediante o Pontificio Conselho Cor Unum tem desenvolvido acáo
eficaz em prol do desenvolvimento dos países do Terceiro Mundo;
e) atendendo ás exigencias da vida contemporánea, a Santa Sé tem
aumentado o salario dos seus servidores. Verdade é que estes nao sao de
alto nfvel. Como quer que seja, a Santa Sé é o Estado onde há menos di-
ferencas salaríais no mundo: em 1977, por exemplo, um funcionario do
mais alto escaláo no ápice da sua carreira (como seria o Substituto da Se
cretaria de Estado) recebia 600.000 liras mensais, ao passo que os servi
dores menos graduados (porteiros, caixeiros, auxiliares de escritorio )
percebiam 400.000 liras mensais. Notemos ainda que os servidores da
Santa Sé gozam de especiáis regalías: além de assisténcia médica apo-
sentadoria, abonos de familia, usuais em todos os países, tém aluguéis a
precos reduzidos, acesso ás lojas de comercio do Vaticano, que vendem a
presos módicos...;

f) em vista da penuria de muitos daqueles que recorrem aos Orga


nismos da Santa Sé, muitos servicos sao prestados a título gratuito ou
quase gratuito. Assim nos Tribunais da Santa Sé as taxas pagas pelos
404
E AS FINANgAS DA SANTA SÉ?

interessados nao cobrem 20% das despesas totais, ficando 80% a cargo
do Sumo Pontífice. De modo geral, a Curia Romana aboliu suas taxas ou
tornou-as simbólicas - o que acarreta novo rombo ñas f¡nangas gerais. O
S. Padre Joáo Paulo II referia-se a isto em sua alocucáo de 9/11/79 diri
gida aos Cardeais:

"A Santa Sé Apostólica, para realizar eficazmente a missáo universal da


Igreja, para poder cumprir o programa pastoral do Concilio, para trabalhar na
evangefízacáo, precisa de recursos fínanceiros. Contado estes, em compara-
cSo com aqueles que o mundo gasta, por exemplo, com os armamentos, sao
arquimodestos!"

Ora as receitas nao acompanham o aumento das despesas; nem


mesmo recorrendo a contencio de gastos com viagens, servicos dispen-
sáveis, etc. consegue-se equilibrar o orgamento da Santa Sé, anualmente
deficitario. A previsáo de déficit para 1986 vai além de 100 bilhóes de li
ras.

Vejamos agora quais os recursos de que dispóe o Sumo Pontífice.


3.2. Patrimonio e administracáo

Urna boa parte do patrimonio da Santa Sé é constituida pela quan-


tia que o Estado Italiano em 1929 enttegou ao Sumo Pontífice a titulo de
indenizagáo pelos bens perdidos em territorio italiano no ano de 1870:
750.000.000 de liras em especie e um bilháo de liras em tttulos do Estado
a 5%. - Visto que essa quantia se destinava a ressarcir a Igreja por perdas
sofridas na Italia, Pió XI julgou de justica aplicar parte de tal dinheiro na
Italia mesma: construiu, portento, Seminarios para formar sacerdotes
e restaurou muitas casas paroquiais semidestrufdas, principalmente no
Sul da Italia. Outra parte serviu a construcSo do edificio Sao Calixto no
Trastevere (para a administracáo da Curia) e b reestruturagüo da Bibliote
ca e da Pinacoteca Vaticanas.

Durante séculos a Santa Sé nao teve orgamento sistemático; nem


sentía necessidade disto, pois as despesas e receitas nao eram táo sujei-
tas a variantes quanto nos tempos modernos. Havia no Estado Pontificio
diversos Organismos administrativos, cada qual com seu orgamento e
sua autonomía. LeSo XIII (1878-1903) comegou a centralizar o sistema.
Todavia foi Paulo VI quem tomou a importante iniciativa de criar a Pre-
feitura dos Assuntos Económicos (PAE) da Santa Sé mediante a Consti-
tuigáo Regimini Ecdesiae Universas de 15/08/1967. Tal instituto tem o
encargo de coordenar todas as secgóes administrativas dos bens da Santa
Sé e exercer sobre elas urna certa vigilancia; de modo especial, compe-
te-lhe apresentar ao Sumo Pontífice o balango de cada ano administrati
vo findo e o orgamento previsto para o ano seguinte. EstSo, pois, subor
dinadas a PAE: a Administragáo do Patrimonio da Sé Apostólica (APSA),

405
22 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 292/1986

o Governatorato do Estado do Vaticano, a Sagrada Congregado para a


Evangelizado dos Povos, a Fábrica de Sao Pedro, a Cérnara Apostólica,
os cabidos de Sao Pedro, Santa María Maior, Sao Joáo do Latráo, Sao
Paulo fora dos Muros, a Universidade do Latráo, etc. É atual presidente
da Prefeitura o Cardeal Giuseppe Caprio, assessorado por um Conselho
de quatro Cardeais estrangeiros: Krol, dos Estados Unidos, Hóffner, da
Alemanha, Aramburu, da Argentina, e Sin, das Filipinas.

Em particular, a APSA compreende dois Departamentos: o Ordina


rio e o Extraordinario. O Departamento Ordinario administra quase todo
o patrimonio imobiliário da Santa Sé (edificios das S. Congregacóes, dos
Tribunais, dos Secretariados...). O Departamento Extraordinario da AP
SA administra os bens recebidos como indenizacáo em 1929. A principio,
tais valores foram investidos em empresas italianas tidas como de utili-
dade pública: a Sotieta Genérale Immobiliare. a Sorieta deU'Acqua Pía
Antica Mareta (que realizava obras públicas de abastecimento), o Banco
di Santo Spirito, o Banco Ambrosiano, conjuntos hoteleiros, como o Ca-
vaflieri Hilton de Roma... Os criterios que atualmente regem a aplicacáo
desse patrimonio sao os seguintes:

1} evitar todo ¡nvestimento que possa causar problemas de ordem


moral: assim os da industria farmacéutica (que, entre outras coisas, fabri
ca contraceptivos), os da industria armamentista (pois a Igreja deseja o
desarmamento e a paz), os da rede cinematográfica, os da construcáo ci
vil (para evitar as especulacóes imobiliárias, freqüentes na Italia)...

2) evitar partid pa?áo majoritária, para que os representantes da


Santa Sé nao tenham que tomar parte decisiva nos Conselhos de Admi-
nistragáo, que muitas vezes optam por medidas odiosas (despedidas de
funcionarios, liquidacóes, represalias aos funcionarios...). O Vaticano,
alias, nao teria condigóes de suprir as necessidades financeiras urgentes
de firmas das quais fosse acionario majoritário. Por conseguinte, a norma
é repartir os investimentos por varias empresas, só assumindo 5% do ca
pital;

3) transferir os investimentos da Italia para o estrangeiro (Estados


Unidos, Sufca, Alemanha, Japáo, Franca, Canadá...). Este criterio se deve
nao só á tendencia a internacionalizar a Curia, mas também ao fato de
que mais vantajosas sao as propostas estrangeiras. A Santa Sé tende
também a vender ¡movéis para transforma-los em acóes, pois isto é fi-
nanceiramente mais recomendável.
. 3.3. Como superar o déficit anual?

0 principio da colegialidade ou da corresponsabilidade dentro da


Igreja faz que o Papa nao se veja entregue a si mesmo para cobrir as la-
cunas do balanco da Santa Sé. As dioceses esparsas pelo mundo inteiro

406
E AS FINANZAS DA SANTA SÉ? 23

tém-se empenhado generosamente por solucionar a problemática, numa


autentica atitude de comunháo e servico. Eis as principáis formas de aju-
da colegial levada á Santa Sé:

1) O Óbulo de Sao Pedro. Desde o século VIII na Inglaterra existe o


costume de apoiar a Santa Sé financeiramente. Tal prática se mahteve
através da Idade Media na Escandinávia, na Polonia, na Hungría. Foi in
centivada no século passado pelos católicos franceses, que, juntamente
com os fiéis do mundo inteiro, se dispuseram a enviar subsidios ao Papa
Pió IX após a perda do Estado Pontificio. A coleta respectiva, chamada
"Óbulo de Sao Pedro", tem lugar geralmente na festa de Sao Pedro
(29/06), no domingo precedente ou no domingo subseqüente. A impor
tancia arrecadada sob o Papa Joao XXIII (1958-1962) subía a 12/15 mi-
Ihóes de dólares; na década de 70 desceu até 4.000.000 de dólares. A po-
pularidade do Papa Joao Paulo II contribuiu para avivar de novo a ge-
nerosidade dos católicos. Todavía em 1984 registrou-se forte babea, devi
da á infeliz gestáo do IOR unido ao Banco Ambrosiano, de que falaremos
em breve.

2) Contribuicóes especiáis de dioceses ou de Conferencias E pisco-


país tém socorrido á Santa Sé no combate aos seus déficits mais recen
tes. A partir de 1983, por exemplo, a Conferencia dos Bispos da Alema -
nha Ocidental tem contribuido anualmente com 5.000.000 de marcos;

3) Por ocasiáo de audiencias, visitas pastorais ou outros acontecí-


mentos, o S. Padre tem recebido donativos em especie ou em cheques,
que aliviam as suas financas. Em 1981, tais ofertas chegaram a um total
de 30 milhóes de marcos alemáes. Tais subsidios ajudam a Santa Sé a
enfrentar o desafio de suas financas, mas nao sao suficientes; em 1384 foi
preciso, pela primeira vez, mexer no patrimonio da Santa Sé resultante
das indenízacóes pagas em 1929, ao passo que até entáo o Óbulo de Sao
Pedro e doaedes anexas haviam bastado. O problema exige remedio
mais cabal, que o S. Padre JoSo Paulo II vem estucando com seus asses-
sores qualificados.

4. O Instituto para as Obras de Religiáo (IOR)

Em 1887 o Papa Leao XIII criou um Instituto Bancário de pequeño


porte no Vaticano. Este foi-se desenvolvendo, dada a importancia dos
servicos que prestava.

Aos 27/06/1942 o Papa Pió XII deu-lhe a estrutura do chamado Is-


tituto per le Opere di ReGgione (IOR); atualmente tem por finalidade ad
ministrar depósitos de dioceses, paróquias. Organismos da Santa Sé, Or-
dens Religiosas, Universidades Católicas e pessoas particulares que te-
nham acesso ao Instituto (funcionarios da Santa Sé, diplomatas creden-

407
24 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 292/1986

ciados junto a esta...); o Instituto pode transferir tais depósitos para o es-
trangeiro, especialmente para territorios de missáo... Durante varios anos
o IOR prestou bons servicos; os seus eventuais excedentes constituiram
um fundo de reserva. Todavía o Instituto comprometeu-se com o Banco
Ambrosiano de Miláo, tributando a este excessiva confianca; quando o
Ambrosiano, sob o banqueiro Roberto Calvi, faliu, o IOR se viu atingido,
ficando em má situacáo Mons. Paulo Marcinkus, seu Diretor; este, bem
intencionado, dera caucáo e apoio ás atividades de Calvi. No processo
instaurado para apurar as responsabilidades, verificou-se que a honra de
Mons. Marcinkus ficava incólume, pois nao assinara os documentos liti
giosos, mas dois dos colaboradores do prelado - Mennini e Strobel - fo-
ram indigitados pela Justica Italiana e, por isto, fixaram residencia dentro
do Vaticano. Em meados de 1984 o Instituto pagou aos credores do Ban
co Ambrosiano a quantia de 240.800.000 de dólares, sem que estivesse
jurídicamente obrigado a isto, pois nao era responsável pela falencia do
Ambrosiano: tal quantia saiu das reservas ou do patrimonio que o IOR
em quase cem anos de existencia conseguirá formar.

A experiencia dolorosa levou a Santa Sé a pensar numa reforma do


IOR, que poderá constar dos seguintes tragos:

1) a gestáo do Instituto seja colocada ñas máos de leigos experi


mentados;

2) a gestáo e o balanco do Instituto sejam controlados regular


mente por um órgáo independente;

3) seja nomeada urna Comissáo de peritos economistas que ga


ranta a sadia administrado do Instituto e exclua especulares arriscadas.

5. Conclusáo

Na medida em que existe e trabalha neste mundo, a Igreja utiliza os


recursos materiais indispensáveis para o exerclcio da sua missáo. Ela nao
o pode fazer simploriamente, pois isto equivaleria a atirar-se conscien
temente na bancarrota; mas tem que se valer das normas de economistas
e peritos fidedignos. Quem compreende isto, nio se surpreende por sa
ber que a Santa Sé tem seu organograma administrativo. Este é relati
vamente modesto, se comparado com o de outras instituicóes. Deve-se
mesmo louvar a coragem dos Papas Paulo VI e Joio Paulo II, que, ape-
sar da exigüidade de recursos financeiros, neo se tém furtado a instituir
novos e novos Organismos (com todas as despesas decorrentes) para
atender ao bom desempenho da missáo da Igreja no mundo contempo
ráneo. Vé-se que nao é o criterio do dinheiro nem sao os interesses eco
nómicos que orientam as opcóes e tomadas de posicio da Santa Sé. É
esta magnanimidade dos Pontífices que explica, em grande parte, o défi
cit da Santa Sé.

408
E AS FINANCAS DA SANTA SÉ? 25

Há quem se ¡mpressione com os "tesouros" guardados no Vatica


no. Tais tesouros sao os Museus, as Galerías de Quadros ou a Pinacote
ca, a Biblioteca... Nao poucas pessoas julgam que esses bens deverism ser
vendidos; dar-se-ia o dinheiro correspondente aos pobres ou aos credo-
res do Vaticano! - A tai sugestáo pode-se responder citando Mi 26,13: os
discípulos de Jesús se ¡ndignaram porque um frasco de perfume precio
so nao fora vendido para socorrer aos pobres; o Senhor respondeu que
.nao sonriente a esmola, mas certos outros valores merecem respeito e
devem ser deixados incólumes. Na verdade, as obras de arte guardadas
no Vaticano sao o fruto do sacrificio de muitas geragóes e constituem
atualmente um patrimonio comum de toda a humanidade; a presente
geracáo nao tem o direito de dispersar ou destruir esse tesouro artístico,
mas deve transmiti-lo ás geracóes seguintes. Alias, a maioria de tais bens
está vinculada á vontade do respectivo doador, que tinha em mira urna
finalidade especifica (nao raro explicitada) quando fez a outorga. Mais: o
Vaticano possui bens que pertencem a pessoas privadas ou a familias
(assim os fundos da casa dos Borghese, nos Arquivos Vaticanos). Em
vista disto, pode-se perguntar se o Vaticano é realmente proprietário de
tais valores ou se nao é antes o guardiáo qualificado dos mesmos. É de
notar, por exemplo, que o Tratado firmado entre a Santa Sé e o Estado
Pontificio em 1929 estipulava que os tesouros de arte e de ciéncja exis
tentes na Cidade do Vaticano e no Palacio do Latráo "devem permanecer
acesslveis aos pesquisadores e visitantes".

0 que se pode esperar da Santa Sé - e o que de fato esta realizará -


é a minuciosa apresentacáo de contas ao público. - Alias, desde 1979 sao
publicados os resultados fináis do balanco anual da Santa Sé: receita,
despesa, e eventual déficit sem especificacáo de dados particulares.
Atualmente está em cogitacáo um relatório mais preciso, o que nao é fá
cil, pois sao múltiplos os Organismos e Departamentos que contribuem
para formar o balanco. Nao poucas dioceses e paróquias efetuam a sua
prestacao de contas aos fiéis, a fim de Ihes avivar a consciéncia de que,
junto com seus pastores, sao a Igreja. O Sumo Pontífice está para fazer o
mesmo, a fim de corroborar no Povo de Deus a sua conviccáo de que é
a Igreja esparsa pelo mundo inteiro.

A propósito:

CEfíETI, GIOVANNI, Ressources et activités financiares du Vati-


can, em Concilium n-137, setembro 1978, pp. 15-32.

CHEUNI, JEAN, Au Vatican sous Jean-Paul II. Hachette 1985.

HÓFFNER, JOSEPH, Per Bilanci Sani, Cargo agli esperti, em 30


Giomi, apríle 1986. pp. 6345.

409
Que será?

"O segredo de Fátima"

por José Geraldes Freiré

Em síntese: O Pe. José Geraldes Freiré realizou minuciosa pesquisa


sobre os acontecimentos de 1917 em Fátima e o segredo relacionado com os
mesmos. Observa que a última parte deste segredo nao foi revelada ao mun
do, embota a vidente Ir. Lucia tenha insinuado que podeña ser desvendada
em 1960. O autor da pesquisa propóe entáo sua interpretagáo da terceira
parte do segredo em Svro que vai analisado neste artigo: o segredo referír
sela a Portugal e aos recentes acontecimentos de que tem sido teatro esta
nagio. Com efeito, diz Freiré, Portugal, tendo sido pouco fiel a sua vocagSo
católica a partir de 1959 (ano em que recusou abrir sua Contituigáo em nome
de Deus), sofreu vexames e humilhacóes decorrentes da escalada comunista
após 1974 tanto na metrópole como ñas colonias de Ultramar. O avango do
marxismo causou serios danos ao povo católico de Portugal. Felizmente foi
contido e rechagado oportunamente, pois a Virgem SS. em Fátima havia
prometido que a fé seria mantída em Portugal. Todavía, observa o Pe. Geral
des Freiré, é preciso que se observe mais eferentemente o apelo de Nossa
Senhora á oragSo, é conversao e á penitencia. - O autor reconhece que a sua
explicagáo Oca no plano das conjeturas, pois há realmente poucos dados ob
jetivos e válidos para se identificar o conteúdo do segredo de Fátima.

O Pe. José Geraldes Freiré, da diocese de Portalegre e Castelo


Branco (Portugal), é Professor Extraordinario da Faculdade de Letras em
Coimbra. Tem-se dedicado ao estudo do segredo de Fátima, especial
mente da sua terceira parte, que náo foi revelada pela Santa Sé e que
deixa muitas pessoas perplexas e curiosas. Como fruto de suas pesqui
sas, o Pe. Geraldes Freiré publicou o livro "O Segredo de Fátima. A ter
ceira parte é sobre Portugal?".1 Esta obra, minuciosa e assaz documen
tada (na medida em que o pode ser), atende a anseios de muitos leitores
desejosos de conhecer o "segredo de Fátima". Por ¡sto apresentaremos,
ñas páginas subseqüentes, os traeos principáis da obra. É certo, porém.

1Edigáo do Santuario de Fátima 1978 (2? edigáo ampliada), 205 pp.


162x232mm.

410
"O SEGREDO DE FÁTIMA" 27

que a explicacáo do Pe. Geraldes Freiré vem a ser, como ele mesmo diz,
urna conjetura {cf. p. 172). Tem o valor de corresponder aos estudos de
um pesquisador serio e honesto.

Mais precisamente: tendo tido a ocasiáo de ir a Portugal e Fátima


em maio pp., concebí o propósito de lá procurar esclarecer-me, de fonte
limpa, sobre o conteúdo da terceira parte do segredo de Fátima, de que
tem falado freqüentemente a imprensa no Brasil. Inspecionando curio
samente algumas livrarias importantes, encontrei o livro do Pe. José
Geraldes Freiré, monografía especializada sobre o assunto e talvez a
melhor do ponto de vista da documentacáo e da honestidade do autor.
Eis por que a trouxe para o Brasil e a apresento sumariamente aos leito-
res de PR, sem ter a ¡ntencáo de definir algo sobre o assunto; muito me
nos desejo dizer o que seja, em detrimento de qualquer nacáo; todos os
homens sao pecadores, lembra Sao Paulo, e precisam da graca de Deus
(cf. Rm 3,9.23). Antes, refiro o conteúdo do livro para evidenciar quáo va
riadas sao as interpretacóes do segredo e quáo pouco se devem assustar
os fiéis que ouvem falar de próximo fim do mundo em nome do segredo
de Fátima.

A propósito já foram publicados alguns artigos em PR, dos quais o


último é o de PR 258/1981, pp. 330-340. - Na exposicáo subseqüente,
ater-nos-emos estritamente ao que refere o Pe. José Geraldes Freiré.

1. A redacáo do "Segredo"

As aparicóes de Nossa Senhora em Fátima deram-se de 13 de maio


a 13 de outubro de 1917. Os tres pequeños pastores assim agraciados
nada escreveram de imediato a tal respeito.

A partir de 1937 a vidente Irma Lucia redigiu quatro relatos ou


"Memorias", atendendo a solicitacóes de seus Superiores e tendo obtido
licenca do Céu para fazd-lo.

O terceiro Memorial, datado de 30/08/1941, revela duas partes do


segredo que a Virgem SS. confiara aos pequeños pastores: a primeira
parte compreendia urna visáo do inferno; a segunda parte dizia respeito
ao fim da guerra de 1914-1918 e á conversio da Rússia, que seria obtida
mediante oracáo e penitencia. A terceira parte do segredo foi redigida
entre 25/12/1943 e 09/01/1944; o texto ficou em envelope lacrado, que foi
entregue ao Sr. Bispo de Leiria, D. José Alves Correia da Silva. Este nao
abriu o segredo. Em 1957 o envelope lacrado foi enviado ¿ Santa Sé. Lu
cia havia observado que, por ordem do Céu, o terceiro segredo nao de-

411
28 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 292/1986

veria ser manifestado antes de 1960. Aconteceu, porém, que neste ano,
apesar da grande expectativa reinante, o segredo nao fot revelado ao pú
blico pelo Papa Joáo XXIII; o Pontífice, segundo referem fontes abaliza
das, o leu e, depois, colocou o respectivo envelope em outro involucro e
guardou tudo nos arquivos secretos do Vaticano.

Nao se sabe por que nao foi publicado o conteúdo desse terceiro
segredo; os Papas e os seus colaboradores mais próximos nao somente
mantiveram plena discricáo sobre o assunto, mas nao quiseram revelar o
porqué da sua laconicidade. Tal atitude de reserva provocou a curiosida-
de do público em geral e da imprensa: foram (e sao até hoje) divulgadas
noticias aterradoras, segundo as quais o terceiro segredo de Fátima
anuncia catástrofes apocalípticas, fome terrível, queda de meteoro, gi
gantes sobre a térra, guerras horrendas, próximo fim do mundo, perse-
guicóes ao Santo Padre, aos fiéis católicos... (pp. 29-39). O Cardeal Otta-
viani, porém, desmentiu tais noticias, que certamente sao fantasiosas e
altamente hipotéticas.

2. A tese do autor do livro

O Pe. Geraldes Freiré, após ter reunido e estudado ampia docu-


mentacáo sobre Fátima e o terceiro segredo, julga poder concluir que
este se refere a Portugal e vai-se cumprindo na historia recente deste
país.

Com efeito, argumenta o autor, a Virgem SS. predisse no segundo


segredo, após haver recomendado oracáo e penitencia:

"Se atenderem a meus pedidos, a Rússia converter-se-á e teráo paz;


se nao, espalhará os seus erros pelo mundo, promovendo güeñas e perse-
guicóes á Igreja".

Ora Geraldes Freiré observa que tais predicóos desastrosas encon-


tram a sua realizacáo na vida de Portugal dos últimos decenios. Eis os
fatos que ele aponta como graves ofensas aos direitos de Deus e da fé em
térras de Portugal:

1) Aos 8 de julho de 59, a Assembléia Legislativa Nacional rejeitou


a invocado do nome de Deus no principio da Constituicáo Portuguesa,
ou seja, recusou o seguinte preámbulo de Constituicáo:

"A Nacáo Portuguesa, fíela fé em que nasceu e em que se engrande-


ceu, invoca o nome de Deus ao volar, pelos seus representantes eleitos, a leí
fundamental que segué".

412
"O SEGREDO DE FÁTIMA" 29

Para basear a recusa, alegavam os congressistas a pluricontinenta-


lidade de Portugal, cujas provincias contavam com muitos ateus, pagaos
e sequazes de religióes diferentes do Cristianismo.

2) No mesmo ano de 1959, outra grave ofensa aos direitos da


Igreja foi cometida pelo Governo portugués. Na verdade, o Sr. Bispo do
Porto D. Antonio Ferreira Gomes propugnava os direitos fundamentáis
do homem e da justica social; isto Ihe valeu urna campanha hostil da
parte dos mentores do Governo, que o tachavam de comunista. No dia
24/07/59, D. Antonio partiu Nvremente para o estrangeiro; quando, sema
nas depois, procurou regressar a Portugal, foi impedido de atravessar as
fronteiras, embora comprovasse a legalidade da sua situacjo cívica. Em
conseqüéncia, mesmo sem decreto de exilio e sem nota pública, o Bispo
do Porto viu-se obrigado a habitar no estrangeiro até a queda do Pri-
meiro-Ministro Salazar; so aos 18/6/69 pode voltar a Portugal e reassu-
mir o governo de sua diocese. - Verdade é que este caso foi muito con
trovertido em Portugal; como quer que seja, o Pe. Geraldes Freiré julga
que "o exilio (sem lei) do Bispo do Porto foi um grave atentado á liber-
dade da Igreja. Ao menos que houvesse um processo e urna sentenca ju
dicial!" (p. 122).

Os fatos de 1959 "negavam o valor das consagrares anterior


mente feitas de Portugal aos Coracóe.s de Jesús e de María. O Govemo e
os representantes do povo falavam em Deus, promoviam festas, com-
participavam obras religiosas - mas o seu coracáo e as suas acóes esta-
vam longe dos mandamentos de Deus" (p. 123).

3) Continua o Pe. Geraldes Freiré: "É nossa opiniáo que existe urna
relacáo de culpa entre a recusa oficial do Nome de Deus na Constituido
Portuguesa e os sofrimemos e humilhacóes por que Portugal tem passa-
do desde entáo, tanto interna como externamente" (p. 128). O autor póe-
se entáo a comentar "a expansio dos erros da Rússia no antigo Ultramar
Portugués": o esforco de evangelizacio realizado pelos portugueses du
rante mais de quinhentos anos foi fortemente ameacado, se nao anulado,
pelos avanzos do comunismo ñas antigás colonias de Portugal. Observa
Freiré: "Só urna de nossas antigás colonias permanece e quer continuar
unida a Portugal: é a que tinha e continua a orgulhar-se do nome de Ci-
dade do Santo Nome de Deus de Macau!" (p. 128).

Os anos de 1960 e seguintes foram efervescentes ñas colonias por


tuguesas: tumultos, revoltas, represalias, guerras, encarceramentos e
homicidios foram af cometidos... Finalmente em 1974 o Governo instala
do pela revolucao de 25/04/74 proclamou o direito das colonias portu
guesas á autodeterminacio. Rápidamente as Forcas Armadas abando
na ram o Ultramar Portugués, entregando-o, em cada territorio, ao "úni-

413
30 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 292/1986

co legitimo representante" do seu povo indígena. Acontece, porém, que,


de todos os movimentos de libertacáo existentes, só os marxistas-leni-
nistas tiveram a simpatía e a ajuda do Governo de Lisboa: em Angola,
Mozambique e Timor os planos da Rússia para as coidnias portuguesas
foram fielmente executados; os missionários perseguidos deixaram, em
mais de metade dos efetivos, o seu campo de apostolado; os novos Bis-
pos nativos, apos urna fase de esperance, reconhecem que, sob o mar
xismo-leninismo, a Igreja nao tem grande futuro.

Observa o Pe. Geraldes Freiré:

"Os nossos olhos devem abrirse. Em Fátima, a 13 de julho de 1917,


Nossa Senhora disse: 'Se nao atenderem aos meus pedidos, a Rússia espa-
Ihará os seus erras pelo mundo, promovendo guerras e persegúigOes á tgreja.
Os bons serño martirizados, o Santo Padre terá muito que sofrer, varias na-
gOes serio aniquiladas'.

Que vemos hoje ñas ex-colónias portuguesas?... Estará a aplicarse a


nos, agora, a segunda parte do 'segredo de Fátima'? Ou nao será isto antes a
realizacSo, sobre nos, da terceira parte?

Oxalá sobre os novos países de expressSo portuguesa se reaBze tam-


bóm a conclusBo da profecía de Fátima: 'Por fím, o meu Imaculado Coráceo
triunfaré'"(pp.131s).

4) A Revolucáo de 25/04/74 levantou os finimos do povo portugués.


Verifica-so, porém, que o Partido Comunista Portugués foi o principal
vencedor do processo revolucionario entfio iniciado; os setores do traba-
Iho, do ensino e da informante foram dominados pela forca e a virulencia
dos comunistas. Os jomáis estatizados, a Radio nacionalizada, e a televi-
sfio mantiveram campanhas sistemáticas contra a Moral e a Doutrina da
Igreja; defendeu-se o divorcio, a contracep$3o livre, o aborto, e ataca-
ram-se o culto religioso, as peregrinacóes a Fátima, etc. Formou-se em
Portugal a córreme dos "CristSos para o Socialismo", que acusavam a
Igreja de compromisso com o fascismo e pediram a sáfda do Nuncio
Apostólico e a "renuncia" de todos os Bispos ¿s suas dioceses. O ensino
foi posto a servico da implantado do marxismo, com o incentivo do Mi
nisterio da Educacfio, que forneceu textos destinados á "redclagem" po
lítica dos professoras e do pessoal escolar. - Assim se instaurou a "D¡-
namizacfio Cultural" filomarxista.

A freqúénda as igrejasdimlnuiu. Alguns sacerdotes foram aliciados


pelo Governo de esquerda, que os quería colocar em seus órgSos admi
nistrativos so lado de comunistas (coisa que os Bispos nSo permitiram).

414
"O SEGREDO DE FÁTIMA" 31

Finalmente a campanha marxista foi sofrendo seus reveses. Os mi


litantes católicos se puseram ñas rúas e, lutando corajosamente, conse-
guiram rechacar os comunistas instalados no poder; estes perderam as
eleicSes de 25 de abril e 25 de novembro de 1975, mas aínda retém certo
poder em Portugal.

A esta altura o Pe. Freiré comenta:

" 'A Rússia espathará os seus erros pelo mundo, promovendo guerras e
perseguicOes á Igreja' - disse Nossa Senhora em Fátima a 13 de julho de
1917, na segunda parte do 'segredo'. Portugal fo¡ poupado durante e após a II
Guerra Mundial, gragas á protegió divina, como nos garante ñas suas Cartas
a Irma Luda. Se, desde 1959, Portugal no seu todo foi duramente atingido com
guerras e hurrilhagóes; se, após o 25 de abril, o povo portugués sentiu de di
versos modos a opressSo comunista; se a Rússia espaihou e continua a di
fundir entre nos os seus erros e a perseguirá Igreja - nao haveremos nos de
pensar que se está a realizar a continuagáo (ató agora nao revelada) do 'se
gredo de Fátima'?

Sio os tatos que nos abrem os olhos para a sua interpretado, á luz da
func&o providencial de Fátima em relagéo ao aparedmento e expansio do
comunismo. Por nossa parte, pensamos que Portugal está cumprindo, por
meto da expiacáo, a terceira parte do 'segredo de Fátima'. Também para nos a
Rússia está a ser o agoite de que Deu's se serve para punirá inlideüdade na-
cional.

Resta-nos urna esperanga. O texto da IV Memoria termina: 'Em Portugal


se conservará sempre o dogma da fé1 (EPF, IV. 148). Que este indicio de
perspectiva protetora seja continuado por outras palavras de bom augurio e
que termine com a promessa e a certeza de que 'por ñm o Meu Imaculado Co-
ragáo triunfará'!" (pp. 138s).

5) Aos elementos assim recordados o Pe. Geraldes Freiré associa


mais o seguinte: ao anoitecer de 21/01/1976, o povo portugués pode ver
um sinal no céu. As ¡mpressóes dos que o observaram, sao diversas: uns
dizem que era urna foice incandescente; outros, um 5, e mais outros, um
S... As explicares dadas para este fato sSo as mais variadas: fumaca de
aviio a jato..., aurora boreal... estrato de nuvem no qual se refíetiam os
ratos solares ao crepúsculo... O Pe. Geraldes Freiré julga que, qualquer
que seja a explicacfio dada ao fenómeno, foi um sinal enviado por Deus
para Indicar que "algo já profetizado está em decurso de realizacSo no
tempo" (p. 147).

Estaría assim confirmada a tese do Pe. Freiré, segundo a qual o ter-


ceiro segredo de Fátima se refere aos acontecimentos ocorridos em
Portugal a partir de 1959: abandono dos principios da fé e conseqüente

415
32 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 292/1986

infiltrado do comunismo, do qual Nossa Senhora quer salvar aquela na-


c§o. Como conclusáo da tese, dever-se-ia recomendar mais atencao á
mensagem da Virgem, que pedia oracáo, conversao e penitencia em pe-
nhor de preservado da fé e das auténticas tradicdes do povo portugués.

Em sfntese, o autor da obra escreve:

"O ensaio critico acabado de fazer leva-nos a conjecturar que a


terceira parte do segredo de Fátima podorá conter os seguintes pontos:

1 - Apelo especial a Portugal para que cumpra os pedidos de


Nossa Senhora;

2 - Anuncio de que, se Portugal for infiel, depois do ano de


1960 será punido;

3 - A Rassia espalhará os seus erros em Portugal e ñas suas co


lonias, o que levará a guerras que terminario com a independencia das
colonias e com persegulcóes á Igreja;

4 - Portugal Europeu será castigado, sofrendo grandes perturba-


cóes sodais e ataques A doutrina da Igreja, a ponto de muitos se afas-
tarem do caminho da salvacSo;

5 - Aviso de que um sinal no céu de Portugal indicará que o pe-


rigo do dominio dos 'erros da Rússia' nao tara terminado com a apa
rente pachicacao da vida pública;

6 - Promessa de que 'em Portugal se conservará sempre o dog


ma da fé' e de que 'por fim o Imaculado Coracáo de María triunfará'
(IV Memoria, EPF, 148)" (p. 171).

A tudo isto acrescenta o Pe. Freiré:

"Espero que o leitor me reconhccerá a honestidade Intelectual e


moral de ter conduzido desde o principio até ao fim este longo estudo
sobre o que é, em mlnha opinISo, com probabtHdade. a 'terceira parte
do segredo de Fatima'... Nao conheco o texto do 'segredo', que conti
nua guardado no Vaticano; por bao nSo posto dizer que tenho a certe
za. Quanto acabo de aprasentar é, portante, apenas urna conjectura,
mas que julgo apoiada em fatos claros e em indicios tirados dos textos
da Irmi Luda" (p. 172).

416
"O SEGREDO DE FÁTIMA" 33

Passemos agora a urna

3. Reflexáo final

Nao podemos deixar de louvar o esforzó de pesquisador desenvol


vido pelo Pe. Geraldes Freiré. Colecionou ampia documentado sobre
Fátima e seu segredo; trabalhou com honestidade e seriedade, oferecen-
do a'o público urna obra que merece respeito. - Após ler com atencüo es-
se livro, ocorrem-nos as seguintes ponderacóes:

1) O estudo do Pe. Geraldes Freiré evidencia quanto o caso do ter-


ceiro segredo de Fátima está envolto em penumbra e, por isto, sujeito a
hipóteses e conjeturas. A laconicidade dos tragos desse "segredo" dá
ocasiáo as mais diversas interpretacóes, que dependem muito mais da
imaginacao dos intérpretes do que da documentacio objetiva.

2) O Pe. Freiré mostra que a Santa Sé tem ¡ntencionalmente evita


do falar do assunto. Segundo o autor do livro, isto se deve ao fato de que
o terceiro segredo trata da política interna de Portugal (Governo salaza-
rista, revolucáo de abril de 1974 e acontecimentos subseqüentes...); por
isto a revelacáo do segredo poderia parecer ¡ntromissáo da Santa Sé em
questóes de ordem interna da nacáo.portuguesa. Pode ser esta a razáo
exata do silencio dos Papas a respeito do segredo de Fátima. Todavia
pode-se também admitir que os Pontífices hajam ponderado que o se
gredo nada de essencialmente novo acrescenta á clássica mensagem de
Fátima e dos Evangelhos: "Oracáo, Conversáo e Penitencia" (cf. Le 18,1;
Me 1,15).

3) A conjetura do Pe. Geraldes Freiré toma como objeto do terceiro


segredo de Fátima Portugal e sua historia recente. Será que o autor es-
sim procedeu porque é portugués? - Como quer que seja, é um portu
gués que conhece bem o assunto e todas as interpretacóes dadas ao se
gredo de Fátima. A sua conclusáo insinúa que nao se deveria relacionar o
segredo de Fátima com catástrofes, guerras internacionais, crimes re
tumbantes do cenário mundial. É freqüente em nossos dias associar cata
clismos famosos e o segredo de Fátima; este comería as mais variadas
profecías sinistras (inclusive a do atentado ao Papa na Praca de Sao Pe-
dro)... A tendencia a proceder assim - típica da imprensa escrita e falada
- é arbitraria e fantasiosa; deve ser rechacada.

4} Se a identificando do conteúdo do terceiro segredo de Fátima


com os acontecimentos recentes da história-de Portugal é i conjetural,
devemos acrescentar que nao é conjetural a reflexáo que o Pe. Geraldes
Freiré apresenta ao concluir sua obra; está Tora de dúvida que Fátima faz

417
34 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 292/1986

ressoar aos ouvidos de todos os fiéis a sua perene e ¡nsofismável mensa-


gem: oracio, conversáo e penitencia. Em vez de se preocuparen-! com o
conteúdo do segredo de Fátima, procurem os católicos abrir-se coeren-
teniente a exortacao da Virgetn SS., que nao é senSo a do Evangelho e a
da Santa Igreja: renunciem ainda mais decididamente ao pecado e ás
concessóes que conduzem ao pecado e á infidelidade, a fim de levar urna
vida cada vez mais auténticamente crista, pois o Senhor quer salvar os
homens mediante a colaborado dos seus irmáos; somos todos respon-
sáveis pela salvacao dé nossos semelhantes, e nos desempenhamos
desta tarefa na medida em que nos esforzamos para ser plenamente luz
no mundo, sal na térra e fermento na massa (cf. Mt 5,13s; 13,33): "Se o
sal perder o seu sabor, com que há de se salgar?" (Mt 5,13). Se os cris-
táos perderem sua identidade, quem levará ao mundo a mensagem sal-
vlfica do Evangelho? - Eis o que certamente deve ficar no espirito de
quem se interessa por Fátima e seu segredo.

CURSOS POR CORRESPONDENCIA

Sao Pedro nos diz que todo cristSo deve estar sempre pron
to para responder a quem Ihe pepa razoes da sua esperanca (1 Pd
3,15). Em vista disto, a Escola "Mater Ecclesiae" oferece tres
Cursos por correspondencia: Curso Bíblico, Curso de Iniciacao
Teológica, Curso de Teología Moral.

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duracao do curso está a criterio do.aluno.Quem se matricular,re-
ceberá as primeíras licoes em casa; após estudar, responderá ás
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que Ihe devolverá o trabalho corrigido juntamente com novas
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20241 -RIO(RJ).

418
OS RITOS SOVIÉTICOS 35

Para substituir os ritos religiosos:

Os Ritos Soviéticos

Em tíntese: A Rússia Soviética, embora professe oficialmente a ideo-


logia atéia, instituiu ritos cívicos para acompanhar a vida dos seus cidadios
desde o nascer até o morrea .. ritos que lembram de perto as cerim&nias re
ligiosas e suscitam, a seu modo o sonso místico dos participantes. Tal fato é
alómente significativo, pois evidencia quanto o senso religioso é profundo
no ser humano, a ponto de se manifestar sob formas leigas quando é privado
de suas expressdes auténticamente inspiradas peía fé.
* * *

Verifica-se na Rússia Soviética contemporánea que a vida dos cida-


dáos, desde o nascer até o morrer, é acompanhada por ritos cívicos, que
apresentam grande semelhanca com os ritos religiosos e despertam, a
seu modo, o senso místico dos participantes. Também as grandes festas
do calendario nacional, a transicáo das estacóes do ano, a celebracáo dos
heróis do pats... sao ocasiio de cerimónias rituais significativas. - A se
guir, examinaremos a origem e a inspiracao fundamental de tais ritos, a
exporemoso desenrolar dos principáis dentre eles.

1. Origem e inspiracao básica

Já na época de Trotsky pensavam os mentores soviéticos na cele


bracáo ritual de algumas datas cívicas. Na década de 1950 e principal
mente ñas regióes do Mar Báltico (N.O. da URSS), na Bielorússia Oc¡-
dental, na Ucrania e na Moldavia forarrr adotadas de maneira sistemática
tais cerimónias a fim de contrapor-se ás reminiscencias religiosas dos ci-
dadáos; em tais territorios a religláo ainda era um símbolo da indepen
dencia e da consciáncia nacional das respectivas populacóes.- A primeira
de tais cerimónias foi a de "entrada da idade adulta", concebida para
apagar o ritual de Confirmacao dos luteranos e inaugurada em 1957.1 O
éxito de tal praxe incitou as autoridades soviéticas a introduzir outras ce
rimónias rituais, desta vez relativas ao casamento, ao nascimento e aos
hiñerais...

1 Na Estonia, por exemplo, contavam-se 3.500 Confirmacoes em 1950 e


maisde 10.000 em 1957.

419
36 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 292/1986

Alias, nao somente o desejo de combater a religiáo sugeriu aos go-


vernantes a adocSo de tais ritos; visava m também a difundir entre os jo-
vens um certo idealismo e entusiasmo que dissipassem o ceticismo, a de-
linqüéncia, o alcoolismo, o divorcio... existentes em carnadas da popula-
ció, especialmente ñas mais jovens. Urna certa "educacáo" doscidadáos
seria assim obtida, com beneficios para a fidelidade ao socialismo e ao
patriotismo soviético. O jornal Pravda de 18/10/1984 apontava como fina-
lidade de tais ritos: "incutir nos jovens urna visáo do mundo científico-
materialista do mundo". "Do avanco desses novos ritos dependerá o de-
saparecimento dos preconceitos religiosos. Esses ritos sao um meio efi
caz de luta contra a influencia da religiáo", escrevia um especialista no
assunto. Por sua vez, Constantino Chernenko em discurso de junho de
1983 afirmava: "A transformado revolucionaria da sociedade nao será
possfvel sem que transformemos o próprio homem. E nosso Partido
adota o principio de que a formacáo do homem novo nao é apenas um
objetivo da mais alta importancia, mas é também um meio obrigatório da
construcáo comunista".

Por isto os ritos sao preparados por Comissóes de peritos: artistas,


sociólogos, historiadores, representantes do Partido e do Soviet local-
Estes elaboram os textos para cada cerimdnia antes de entrega-los aos
agentes de propaganda, que desenvolvem intensas campanhas de difu-
sáo dos mesmos.

Examinemos agora o desenrolar de algumas de taiscerimónias.

2. Principáis ritos

Enumeraremos quatro cerjmónias principáis.

2.1. A Atribuicáo do Nome

Tal é o rito que corresponde ao Batismo cristáo. A partir de 1960,


foi muito fomentado para substituir a cerimdnia do oktiabriny,1 que caira
em desuso. Pode ser celebrado dentro das primeiras seis semanas de
existencia da enanca.

No dia aprazado, os pais, familiares e amigos do pequenino (nao


raro portadores de medalhas ganhas na guerra patriótica) dirigem-se ao
Palacio do Malkxitfca (= Recém-nascido, em russo); sao acompanhados
pelos respondentes ou padrinhos. A recepcionista do Palacio, trajando

' Oktiabriny é a cerimónia inlroduzida nos primeiros anos da revolugáo rus-


sa. O nome era urna réplica a krestiny, Batismo em russo; em vez de krest,
(cruz), foi utilizado o radical oktiabr, outubro, com o sufíxo iny.

420
OS RITOS SOVIÉTICOS 37

vestido longo, acolhe máe e filho num saláo especialmente destinado a


preparar a cerimónia. A seguir, convida solenemente todos a subirem
para a sala dos ritos. O pai entáo toma a enanca nos bracos, precedido
pela recepcionista; o cortejo caminha processionalmente ao som de mar
cha própria. A sala dos ritos é dominada por vitró, que representa mSe e
enanca; diante deste há algo que nao é propiamente nem urna mesa
simples, nem urna escrevaninha, mas se assemelha a um altar, portador
de flores e do emblema da República. É entao que entra em cena a fun-
qonária que presidirá á cerimónia ritual.

Também revestida de traje longo, trazendo ao pescoco um grande


colar do qual pende urna medalha com os símbolos da República (foice e
martelo), a dirigente pronuncia breve discurso, no qual felicita com sim
patía a familia portadora da crianca. Diz entáo:

"Os filhos sao tesouro inestimável na sociedade socialista. Tornam-se


objeto de preocupacao constante do nosso Partido leninista. Vamos hoj'e
proceder ao registro de novo cidadSo da URSS. Qual o nome que desojáis
dar á crianca?"

Após a resposta dos genitores, toca-se o hiño da Uniáo Soviética,


em honra do novo cidadao.

A seguir, os genitores e os responsáveis se comprometem a educar


a crianca em conformidade com "as exigencias da sociedade". Sio cha
mados a assinar um por um, a declaracáo de nascimento e o registro civil
da crianca. Em troca, sáo-lhes entregues um certificado, que equivale a
um salvo-conduto, e urna "carta para o futuro" comemorativa de tal dia.
Em torno do pescoco da enanca coloca-se urna fita (azul ou rosa, segun
do o sexo) com urna medalha. Após o qué, os participantes sao convida
dos a passar para a sala contigua, onde um copo de mousseux espu
mante é oferecido a todos pelos genitores, os quais recebem congratula
res calorosas de cada convidado. Retiram-se entáo para a casa da fami
lia em festa, que continua a celebracáo no lar.

O esquema da cerimónia da "Atribuicáo do Nome" é o mesmo em


toda a Uni§o Soviética; os pormenores, porém, variamde regiio para re-
giáo. Eis, por exemplo, passagens do discurso proferido pelo(a) presi
dente da cerimónia em Kiev (Ucrania):

"Cams pais... recordai-vos do vosso dever sagrado para com a socie


dade socialista: educar um fího que seja digno combatente até a vitória com
pleta do comunismo. Educai nele o amor ao trabalho e á sua grande patria so
viética. Seja honesto, sincero, bom, chelo de respeito, de modo que a Mae-
patria se tome ufana.dele... E vos, veneráveis avós, trabalhastes sem tregua

421
38 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 292/1986

durante a vossa vida; fízestes muito bem aos homens; educastes bons fílhos,
que vos deramnetínhos..."

Nao se pode dizer que a apresentacao ao Palacio do Recém-Nasci-


do seja obrigatória; cornudo sabe-se que é calorosamente estimulada.

2.1.0 Compromisso dos Jovens

Com dezesseis anos de ¡dade, o cidadáo recebe, em rito próprio, a


sua carteira de ¡dentidade (em russo dir-se-ia "o seu passaporte", válido
táo-somente para uso dentro das fronteiras do país). Esta cerimánia foi
introduzida em 1976, quando os "passaportes" de todos os cidadáos so
viéticos foram sendo progressivamente trocados. 0 rito tem porfinalida-
de "evidenciar aos jovens e ás jovens a importancia do acesso á plena ci-
dadania; a carteira de ¡dentidade lembra a cada cidadáo soviético a ne-
cessidade de respeitar escrupulosamente as leis e as normas da vida so-
viétca" (Ñachi Prazdniki, Nossas Festas, Moscou 1977, p. 137).

O elemento central e altamente emocionante dessa cerimónia, cu-


jos pormenores sao oscilantes, é o juramento prestado por um jovem em
nome de seus colegas:

"Eu, tídadSo da Uniáo das Repúblicas Socialistas Soviéticas, neste tía


e nesta hora soteno da minha vida, comprometo-me perante meus pais, meus
amigos, meus colegas, meus mestres, diante do meu grande país e de todo o
povo soviético, a ser sempre fiel á minha Patria bem-amada, a trazer garbosa
e dignamente o título de cidadáo soviético, a cumprir honestamente e até o Sm
os meus deveres de tídadSo, a trabalhare a estudar com afínco, colocando
todas as minhas torcas e todas as minhas capacidades a servigo do meu Po
vo e da minha grande Patria".

E todos os jovens de dezesseis anos exclamam: "Nos o juramos I


Nos o juramos!"

Outros ritos marcam a passagem para a maioridade, a entrada na


classe operaría, o recrutamento para o Exército soviético. Todavia as
formas rituais dessas celebracóes ainda nao foram uniformizadas.

23.0 casamento

Existe ñas cidades soviéticas o Palacio dos Casamentos, que fre-


qüentemente é ornamentado com imagens simbólicas: ferraduras de cá
valo estilizadas, "sinais de boa so ríe e felicidade", quadros elaborados
sobre madeira, á semelhanca dos Icones, que representam o amor, a fa
milia e a felicidade.

Os nubentes, ao penetrar nesse Palacio, sao acolhidos pela recep-

422
OS RITOS SOVIÉTICOS 39

cionista, que os leva, em companhia das testemunhas, para salóessepara


dos, onde confirmam sua opgáo matrimonial. A noiva está vestida de
branco, e traz na cabega um véu que lembra um coragáü. 0 noivo se acha
vestido com temo escuro e gravata. Ao sairem cada qual do respectivo
saláo, deparam-se com outra recepcionista, que desee pela escada de
honra, cujos degraus sao dourados ("a escada dourada da felicidade").
Em tom de voz levemente enfático, ela convida os nubentes a subir para
a sala dos ritos. Entáo sobem todos, enquanto se toca müsica aproprtada.
A sala dos ritos é simples. Sobre a parede de fundo, vé-se uma tapecaria
com personagens simbólicas, tendo em relevo a Fé, a Esperance e o
Amor (em russo, "Vera, Nadiejda e Lioubov", tres santos muito venera
dos pelos russos ortodoxos). Diante dessa tapecaria, vé-se uma especie
de altar de pedra, semelhante ao da Casa do Recém-Nascido.

A pessoa que preside ¿ cerimónia, de pé atrás do "altar", evoca to


da a importancia do rito e pede o consentimento matrimonial dos nu
bentes. Tendo-o obtido, ela os declara unidos pelos lagos do casamento.
Assinam entáo, juntamente com as testemunhas, o termo de matrimonio.
A seguir, sao levados a um pequeño tapete colocado a frente e á esquer-
da do "altar"; ali uma funcionaría Ihes oferece solenemente a taca co-
mum, da qual bebem alguns goles de suco. Depois, com uma fita ata o
antebrago direito do marido ao da esposa, para "simbolizar a uniáo in-
dissolúvel". A familia e os amigos sao convidados a felicitar os jovens es
posos. A seguir, passam para a sala contigua ornamentada simbólica
mente com uma nave, que serve de lámpada e que representa a familia a
enfrentar as aguas tumultuadas da vida. Uma cornucopia, símbolo de
fartura, é colocada sobre a mesa. Bebem a saúde do novo casal.

0 ritual de casamento varia segundo as regióes da URSS. Em


Rostov-sobre-o-Don, no Sul do país, é influenciado pelas cerimónias da
Igreja Ortodoxa. Essa usa, sim, o tapete sobre o qual se coloca o casal, a
taga (que lembra a Eucaristía) e o lago que ata os bragos dos nubentes
entre si. Na Ucrania, porém, a influencia é mais paga. No hall de entrada
do Palacio arde o "Fogo Eterno", "símbolo da sucessáo das tradigóes re
volucionarias de luta e de combate do povo soviético". O presidente da
cerimónia pronuncia a fórmula seguinte: "Aproximai-vos do Fogo eter
no. O Fogo simboliza nossa recordagáo de todos aqueles que sacrifica-
ram a vida pela liberdade e a independencia da nossa Patria soviética,
pelos ideáis comunistas, por um céu puro ácima de nos, por nossa felici
dade e pela de nosssos filhos. Que ele arda eternamente em vossos cora-
goesl" O nubente acende entáo a tocha que ele há de levar a frente da
procissáo até a sala dos ritos...

423
40 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 292/1986

Os discursos também podem diferir. Eis outro espécimen:

"Sob o céu pacifico de nossa Patria bem-amada, o Povo Soviético,


guiado peto Partido de Lenin, segué a vía luminosa que leva ao comunismo.
Sois filtra e filho de vosso povo heroico, esperanga e futuro desse povo... Ago
ra sois também esposa e esposo. Fundáis urna nova familia, perpetuáis vossa
Snhagem para o bem do nosso Estado socialista, a imortalidade do Povo so
viético e para a vossa felicidade pessoat".

Em Moscou os jovens esposos váo depositar flores no túmulo do


soldado desconhecido, diante do qual arde o Fogo eterno. Sao levados
ao muro do Kremlin, onde se encontra o Memorial dos monos da guerra,
em grandes vefculos alugados para tal fim, e portadores de dois grandes
anéis de ouro entrelazados. Em Kazakhstan, na Asia Central, foram tam
bém integrados no rito soviético elementos tradicionais.
2.4. Os funerais

Há também cerimónias soviéticas fúnebres. Constam de duas par


tes: urna: panikhide (palavra russa que designa o Oficio dos Mortos na I-
greja Ortodoxa) civil, ou seja, discursos em memoria do defunto, e urna
procissáo que acompanha o caixáo ao som de música fúnebre. As autori
dades tém procurado tornar cada vez mais significativos esses ritos, que
regulamentam minuciosamente a música, o caixáo e as covas.
Nem sempre os ritos soviéticos conseguem erradicar dos cidadáos
a reminiscencia das cerimónias religiosas. Nao raro os interessados parti-
cipam daqueles e destas, principalmente quando se trata do casamento.
É evidente que o ritual civil é muito mais pobre de significado do que o
religioso.

3. Condusáo

O fato de que o Estado Soviético ateu promove um cerimonial li


túrgico para as grandes datas dvis da sua populagáo, bem mostra que o
senso religioso continua vivo no povo russo. Este manifesta a necessida-
de de símbolos místicos; sob capa nao religiosa continua a professar a
crenca em valores que so Deus pode oferecer adequadamente: a plena
felicidade, a eternidade, o servico a urna Causa Maior que mereja plena
dedicacáo... É impossível, porém, que um fator nio religioso assuma sa-
tisfatoriamente o lugar da própria Religiio na vida de um povo.
O presente artigo utilizou as páginas escritas por Michel Sollogoub,
Professor de Economía em París e Mans, Wce-Presidente da Acáo Crista
dos Estudantes Russos, páginas publicadas com o título: Du Berceau au
Tombeau. Des rites pour tous les Ages en Unión Soviétique, em L'Ac-
tualité Religieuse dans le Monde, n*21, 15/03/85, pp. 6-9.

424
Em voga no Octdente:

0 Zen-Budismo

Em síntese: O Zen-Budismo (e o Budismo em geral) é urna forma de


monismo ( existe urna só substancia") ou mesmo de ateísmo ("nao há Deus
(Ssbnto do homem"}; o que o Budismo apregoa, ó a fíberiagáo do núcleo cen
tral do homem alualmente preso á materia (corporeidade) e chamado a se de
sencamar para se merguihar no Grande Todo ou no Nirvana, onde perderá a
sua tdentídade ou o seu eu pessoal; é esta sorte "postuma" ou suprema que o
Zen oferece ao homem. - Tais idéias sSo depreendidas ■ tío livro
Le Zen DémystUié", do Pe. Henry van Staelen. especialista em assuntos reli
giosos orientáis.

Entre as muitas corremos religiosas que do Oriente penetram no


Ocidente, está o Zen-Budismo. Este ensina o esvaziamento interior para
que o individuo humano se possa merguihar no Grande Todo. Até mes
mo fiéis católicos consagrados a Deus por votos religiosos tentam en
contrar no Zen o caminho para a sua auto-realizacáo; sem querer deixar
de ser cristSos, procuram valer-se da técnica budista Zen.
A propósito foi publicado em 1985 na Franca o livro "Ivresse ou
Abandon de Soi. Le Zen Démystifié", da autoria do Pe. Henry van
Staelen S. V. D., que esclarece o assunto com muita eficiencia. - E¡s por
que abaixo nos voltaremos para o conteúdo dessa obra.

1. O Autor

O Pe. Henry van Staelen é missionário do Verbo Divino, de nació -


nalidade holandesa. Licenciou-se em Direito pela Universidade de Nie-
mega e doutorou-se em Filosofía pela de Cambridge (Inglaterra). Envia
do para o Japáo, lecionou durante mais de trinta anos, em Ifngúa japone
sa, Filosofía Moderna e Ciencia das Religides Comparadas. Proferiu con
ferencias em Universidades do JapSo, da Alemanha, da Franca, da Ho
landa, da Bélgica, da Inglaterra, da Rússia e dos Estados Unidos. Publi-
cou numerosos livros filosóficos e teológicos em seis idiomas (holandés,
alemSo, inglés, francés, italiano e japonés). Foi nomeado por Paulo VI
"perito" do Concilio do Vaticano II; na base de seus conhecimentos redi-
gíu em japonés (com a colaborado de teólogos europeus e japoneses)
um ampio estudo dos documentos do Concilio, publicado em sete volu-
mes. - Atualmente reside em Liverpool, e continua a estudar, escrever e

425
42 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 292/1986

viajar para dar cursos e retiros espirituais tanto na América como na Asia.

Após quase quarenta anos de contato com as religióes orientáis, o


Pe. van Staelen publicou "Le Zen Démystifié" (O Zen Desmitificado). No
principio da sua carreirá docente e missionária o autor estava certo de
que poderia realizar fácil conúbio entre Cristianismo e Budismo (foi esta,
alias, também a suposicáo de Thomas Merton, 1968, que nos últimos
anos de sua vida se dedicou intensamente ao estudo da mística da India).
Em 1982, porém, o Pe. van Staelen publicou "Ouverture á l'autre. La-
quelle?", obra em que mostrava ter evoluído para conclusóes diferentes
das de sua juventude. O seu pensamento aparece plenamente amadure-
cido no livro que ora estamos para apresentar.

2. A tese do livro

1. A palavra Zen é a forma japonesa do vocábulo chinés Ch'an, o


qual por sua vez é transposicáo abreviada e ¡mperfeita do sánscrito Dh-
yana, que significa concentracáo espiritual, meditagao, transe, éxtase.
Dhyana é urna das palavras-chave do Budismo da india. Este, através da
China, foi levado para o Japáo, onde tomou modalidades especiáis sem
perder a sua característica fundamental de sistema de meditacio. O Zen
se transferiu posteriormente para o Ocidente, sendo a forma de Budismo
mais difundida entre nos. Para concentrar-se, o adepto do Zen levanta-se
entre tres e quatro horas da madrugada; vai para a sala de meditacáo,
onde ele se senta sobre urna esteira de patha, de busto reto, e com o
queixo para dentro, de modo que a ponta do nariz fique perpendicular-
mente ácima do umbigo. O budista fica assim diante de urna parede; res
pira varias vezes profundamente; depois retém a respiracáo e vai deixan-
do escapar o ar aos poucos. - Deve abster-se de pensar no que seja ou,
melhor, deve refletir sobre o nada (Mu em japonés). Tende assim a ilu-
minacáo interior (sartori); esta implica que o seu sujeito venha a identifi-
car-se com o fundamento original de todo ser (a grande realidade básica,
divina, indescritlvel, da qual todos os seres visfveis sao facetas apoucadas
ou amesquinhadas); este estado final significa também a perda total da
própria personalidade ou individualidade. Essa iluminacáo.'como se vé,
nao é o encontró de alguém com alguém, mas, ao contrario, é a destrui-
cáo de todo eu pessoal. Os pormenores de tal estado sao diversamente
descritos pelos diversos autores budistas, e ás vezes em termos obscuros
ou pouco compreenstveis.

2. Esta breve apresentacáo do Zen (e do amago da meditacáo bu


dista) é suficiente para evidenciar que nao se pode combinar com a dou-
trina e os métodos de ora?áo do Cristianismo. Com efeito:

1) o cristáo, através da sua fé e da sua meditacáo, procura entrar


em contato cada vez mais Intimo com um Deus pessoal ou com as tres

426
O ZEN-BUDISMO 43

Pessoas da SS. Trindade: "Vamos ao Pa¡ pelo Filho no Espirito Santo"


(cf. Ef 2,18). O cristáo só pode aceitar o Nada como etapa previa para um
pleno encontró com Deus; é o Nada em relacáo aos afetos desregrados e
a tudo que possa ser entrave para a descoberta de Deus (é neste sentido
que se há de entender o Nada apregoado por S. Joáo da Cruz). A propó
sito o Pe. Van Staelen cita Sta. Teresa: "Nunca nos será licito tentar eli
minar a inteligencia, parausar nossa atividade intelectual por meio de
técnicas, para esperarmos vazios e ociosos interiormente a ¡luminacáo"
(p.28;cf.p.59).

2) A Mística crista leva ao amor, pois sabe que Deus é amor (1Jo
4,19) e espera do homem urna resposta de amor. Este pode exigir renun
cia da criatura a si mesma, em vista de um reencontró em Deus. Ora o
Zen nao conhece "Deus-Amor" nem pede do homem o amor a Deus,
pois nao conhece um Deus distinto do homem, como se verá adiante.

3) O Zen nao impée preceitos moráis ou urna Ética correspondente.


Apregoa a placidez, o autodominio e a impassibilidade, que parecem
pairar ácima da distincáo entre o bem e o mal.

4) O Cristianismo conhece a graca de Deus, que socorre a fraqueza


humana e ajuda a criatura a se purificar do pecado para se abrir ao
Absoluto ou ao Senhor. Ora os conceitos de graca e Redencáo oferecidas
por Deus 30 homem sao totalmente- alheios ao Budismo; este incita o
homem a exerclcios físicos e mentáis muito exigentes, que a criatura de-
ve desempenhar por si; os mestres budistas sabem punir corporalmente,
e com veeméncia, os discípulos para que estes se esforcem na prática da
meditacio. Eis dois depoimentos tirados do livro em pauta:

"Na sala de meditacáo, um monge circula, munido de um bastió, com o


qual corrige eventuais atas ou posturas de oracSo deficientes. E, se atguém
for vencido pelo sonó, receberé censuras e insultos... O discípulo deve perió
dicamente ir procurar o mestre para ser orientado por ele... Deve expandirse,
fundirse no mestre... E, para tanto, deve sentarse diante dele, para poder o-
caskmalmente receber um golpe. Até mesmo esta 'amabilidade' parece dever
contribuir para facilitara iluminacáo desosada" (p. 38).

"Quando trinta ou quarenta homens e mulheres gritam perdidamente, de


propósito, todos ao mesmo lempo, sem ordem nem harmonía, o Mu, o obser
vador pode acreditar que se acha num antro de leóes. Os exercitantes o fa-
zem muitas vezes com urna violencia e urna continuidade tais que o corpo in-
teiro estremece e que, mesmo na temporada fría, o suor corre pelas costas.
Numa palavra, temse um caos infernal. Entrementes os monges vigilantes
vSo e vém entre as ñleiras desses leñes que rugem, trazando ñas máos o
bastió ameagador para excitá-los mais aínda" (p. 71, transcrito do livro de
Lassalle, Le Bouddhisme Zen, p. 28, ed. alema).

427
44 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 292/1986

5) Em slntese, o Zen é bem caracterizado por Mestre Suzuki, que


muito o difundiu no Ocidente e que claramente confessa:

"O Zen nao é unía religiáo no sentido ordinario da palavra. Pois o Zen
nao reconhece um Deus que tenha dirato á nossa adoragáo. N&o conhece
morada no além ou um destino para os defuntos. E principalmente: o Zen nao
admite alma, cuja sorte postuma e imortalidade suscitam para muitos um tre
mendo problema. O Zen está totalmente livre desses obstáculos religiosos e
dogmáticos. O homem só se toma llvre se rejeita a terrível obrigagáo de con-
seguir a sua redengáo e sua salvagáo. O Zen mostra claramente a (utilidade
de toda crenca num Deus pessoal. Apesar de tudo, ele traz a mensagem uni
versal da libertagáo em todo lempo, em todo lugar e para todo homem"
(Transcrito da p. 108 do tivro em pauta).

Esta decíarafio nao deixa dúvidas sobre a incompatibilidade de


Budismo e Cristianismo. Aquele é urna forma de monismo ("Existe urna
só substancia") ou mesmo de ateísmo ("nao há Deus distinto do ho
mem"); o que o Budismo apregoa, é a libertacao do núcleo central do
homem atualmente preso á materia (corporeidade) e chamado a se des-
cencarnar para se perder (perder sua identidade) no Grande Todo ou no
Nirvana; é esta a sorte "postuma" ou suprema que o Zen oferece ao ho
mem. Ao contrario, o Cristianismo eré num só Oeus, que por amor criou
o homem e o chama ao consorcio de sua vida; o amor de Deus se mani-
festa especialmente no misterio da EncarnacSo, mediante o qual Deus
redime o homem do pecado e Ihe abre o acesso á vida eterna perdida
pela recusa do homem ao Criador. Existe urna Providencia Paterna que,
com a sua graca, ajuda o homem a firmar seus passos no caminho do
bem e da vida.

Verdade é que muitos cristáos procuram aprender do Zen ao me


nos os exerclcios respiratorios e físicos, que propiciam a concentracáo
interior, sem que tenham a intencáo de aderir a filosofía budista. - Ob
serva o Pe. van Staelen:

"Nao se pode reduzir a Yoga, o Zen e, menos aínda, a Meditacéo


Transcendental a simples técnicas de relaxamento. Mesmo se no nivel psico
lógico, nervoso e fisiológico se verifica urna certa eficacia, feto se dá, na mato-
na dos casos, ao prego de graves btoqueios espirituais" (p. 58).

Registramos esta observacáo sem a comentar. Há autores cristáos


que ensinam como aproveitar a técnica corporal dos orientáis em clima
puramente cristao; entre outros, Yves Monchanin em "loga para Cris
táos". E fato, porém, que muitos cristáos, ao se exercitarem nessa técni
ca, mais e mais se deixam absorver pela mentalidade monista, panteísta á
qual está ligada em suas ralzes.

428
Notas

1. O ZELO MISSIONÁRIO

Há quem julgue que nao há necessidade de esforco missionário


para transmitir a fé católica a todos os homens. Pregar o Evangelho seria
desrespeitar a crenca ou a cultura dos irmáos; bastaría, pois, que os mi
sionarios católicos se interessassem por promover as popula?oes carentes
levando-lhes instruyo, normas de higiene, profissionalizacjio... sem to
car em assuntos de fé.

O problema foi abordado por um grande arcebispo, Mons. Duval,


de Rouen (Franca), por ocasiáo de Pentecostés pp. (18/05/86), quando em
sua homilia disse:

"Lembramo-nos hoje dos primordios da tgreja ou do dia em que, impeli


dos pelo Espirito, os primeíros Apóstalos comegaram a anunciar a Boa-Nova
de Cristo morto e ressuscitado. Lembramo-nos também de todos aqueles que,
vivificados pelo Espirito Santo, nos últimos vinte secutas levaram a serio o
apelo de Cristo: 'Ide, enslnaia todas as nagóes' (Mt 28,19).

A evangetizac&o do mundo está longo de se ter encerrado. O Espirito


Santo nos 6 dado também a nos para que possamos continuar a anunciar a
Boa-Nova de Cristo...

Todavía varias vezes no deconer destas últimas semanas encontrei


cristSos quejutgam que a fase de evangetizagáo está terminada. Os homens
se distribuem geralmente por diversas religióes. Por que náq respeitar este
estado de lata? Todas as religióes nSo contém urna parte de verdade? Procu
remos, pois, entender-nos entre crentes e haverá um bom progresso...

Contudo o respeito, o diálogo, a oragSo em comum nao extinguem as


diferencas entre as religióes que, para ser breve, eu poderia caracterizar do
seguinte modo.

Os homens procuram respostas para as suas grandes interrogagóes a


respeito do que sSo, do que viráo a ser, e de Deus. As grandes religióes nao

429
KGUNTE E RESPONDEREMOS" 292/1986

" ' ujjfciifl aflcí n axfJessáo dessa procura da parte do homem. A té crista, po-
rém, tem sua fonte na Revelagáo de Deus por Jesús Cristo. A té crista repou-
sa sobre a RevelagSo de Deus, ao passo que as outras religióes sao a ex-
pressSo de urna procura de Deus da parte do homem Esta diferenga faz que
o diálogo respeitoso nao possa suprimir o esforgo que temos de fazer para
manifestar a outros a Boa-Nova revelada em Jesús Cristo e por Jesús Cristo.

Outros homens, menos favorecidos do que nos, tém o dimito, e/es tam-
bém, de conhecer a riqueza do misterio de Cristo, na qual eremos que toda a
humanidade pode encontrar, complenitude inimaginável, tudo o que ela procu
ra, tafeando, a respeito de Deus, do homem e do seu destino, da vida, da
morte e da verdade fEvangetü Nuntiandi ns 53). Dialogar é escutar os ou
tros, mas é também chegar ao ponto de professar a totaüdade da nossa fé ou,
antes, a totatidade da RevelagSo de Cristo que fundamenta a nossa fé.

Evangelizar nao 6 impor a fé aos outros; é oferecera outros a oportuni-


dade de conhecer nao nossas pesquisas, mas a RevelagSo que Deus nos
entregou, para que ela possa servir a todos os homens. Evangelizar é talar
a respeito de Deus a todos os que procuram a Deus" (Botetim Diocesano
Rouen-Le Havre n* 11,30/05/1986).

A propósito observamos:.

1) A Igreja é essencialmente missionária, de acordó com as palavras


do Senhor Jesús: "Ide, ensinai a todos os povos... batizando-os em nome
do Pa¡, do Filho e do Espirito Santo" (cf. Mt 28,18-20)..., palavras que os
Apostólos comecaram a por em prática desde o dia de Pentecostés
(cf.At2).

2) Evangelizar é um ato de amor ao próximo. Significa entregar-lhe


o Pió da Palavra e da Vida, que é o mais necessário e precioso de todos
os bens, pois os seus efeitos ultrapassam os limites da vida terrestre. Sem
saber por que e para que vive, o homem, mesmo bem aquinhoado no
plano material, cai no tédjo, e nao raro póe termo á sua existencia insípi
da.

3) Entre as denominares cristas, que tiveram a graca de receber a


Revelacáo de Deus em Jesús Cristo, só aquela que remonta sem inter-
rupeáo e sem recomeco até Jesús Cristo e os Apostólos chefiados por
Pedro está credenciada para propor ao mundo a auténtica Palavra de
Oeus.

4) A própria realidade da sociedade contemporánea, vltima da vio


lencia, do desatino e de atitudes irracionais, é um renovado apelo ao zelo
missionário dos fiéis católicos. Na falta de quem Ihes anuncie a Boa Nova
430
INSTITUIgÁO E CARISMA 47

de maneira vivaz e profunda, os homens de nossos dias -se deixem tevar


por mensagens emotivas, que significam a abdicacjo da razáo e do bom
senso em favor de um misticismo cegó e nocivo a pessoa humana. Para
nao nos alongarmos, citamos urna entre outras manchetes de nossos
¡ornáis: "Seita é acusada em Sao Paulo de surrar e torturar criancas"
(Jornal do Brasil, 3/7/86, 1?cademo, p. 16); as mais famintas.de tais
criancas eram obrigadas a comer até a exaustáo e engolir o próprio vó
mito; eram consideradas como levianas, tendo parte com Satanás e seu
reino de trevas angustiantes!

2. INSTITUICAO E CARISMA

Existem, em nossos dias, dentro da Igreja iniciativas e movimentos


novos que parecem suscitados pelo Espirito Santo. Podem ser carismas
ou dons especiáis. O Concilio do Vaticano II reconheceu o valor de tais
dons, quando auténticos; lembrou, porém, que por vezes sao ilusorios: a
fantasía e a vontade própria de um cristao podem, consciente ou incons
cientemente, acobertar-se com o título de "carisma do Espirito". É preci
so, pois, que haja discernimento entre genulnos e falsos carismas. 0
mesmo Concilio atribuí á autoridade-oficial da Igreja tal funcao de discer
nimento:

"Os carismas, quer eminentes, quer mais simples e mais amplamente


difundidos, devem ser recebidos com gratídáo e consolagáo, pois sao perfei-
lamente adaptados e úteis ás necessidades da Igreja. Os dons extraordina
rios, todavía, nao devem ser temerariamente pedidos, nem deles devem pre-
sungosamente ser esperados frutos de obras apostólicas. O jubo sobre sua
autentícidade e seu ordenado exercfcio compete aos que govemam a Igreja. A
eles em especial cabe nao extinguir o Espirito, mas provar todas as coisas
e (¡car com o que é bom" (Const. Lumen Gentium n? 12).

A sabedoria desta norma é comprovada por trechos .da autobiogra


fía de S. Margarida Maria Alacoque, (t 1630). Esta foi agraciada por apa-
ricóes do Sagrado Corac§o de Jesús, que I he pediu trabalhasse pela re
novado da piedade católica, incutindo o amor de Deus muito esquecido
pelos jansenistas da época. Tal Santa, como geralmente os videntes, en-
controu resistencia da parte das autoridades eclesiásticas, que tém o de-
ver de ser prudentes e nao dar fácil crédito ao extraordinario (como ensi-
na o Doutor Místico Sao Joáo da Cruz}; os Superiores pediam á Ir. Mar
garida Maria que se ativesse fielmente as normas da Regra de sua Con-
gregacao Religiosa. Ora a Santa refere as seguintes palavras de Jesús,
que deveriam servir-Ihe de or¡entac.ao:

431
48 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 292/1986

"Tem consciénda de que, de modo nenhum, me sinto ofendido por to


das essas lutas e oposigóes que me fazes por causa da obediencia..., obe
diencia pela qual dei a minha vida. Mas quero que saibas que sou o Senhor
Absoluto dos meus dons e das minhas criaturas, e ninguém me poderá impe
dir de realizar os meus designios. Portanto, nao somente quero que fagas
aquilo que as Superioras te diráo... Mas quero que nao creías fácilmente em
qualquer revelagáo e nao te confíes prontamente, pois Satanás range os den-
tes e arde para te engañar. Por feto nada fagas sem a aprovagáode quem te
orienta, a fím de que, tendo contigo a autoridade da obediencia, ele nao te
possa iludir; na verdade, ele nao tem poder sobre quem obedece" ^Autobio
grafía. n*47e 57; Vita e Opere di S. M.M. Alacoque, Roma 1985, pp. 46.
55).

Em outra passagem dizia Jesús:

"Por mais poderoso que eu se/a, nada quero que fagas sem a licenca
da Superiora..."(ib. mm. Frammenti rf3; ib. p. 172).

A linguagem é própria do século XVII; recorre a matizes que hoje


em día nao seriam enfatizados. Mas a mensagem faz eco ás normas clás-
sicas, já formuladas por S. Inácio de Antioquia (f 110): "Nada sem o Bis-
po (Nil sirte Episcopo)". As divisóes dentro da Igreja sao algo que ofende
profundamente o Senhor Jesús. Em sua última oracáo, Ele pediu que to
dos os seus discípulos fossem um, perfeitos na unidade {cf. Jo17.21.23).
Por isto todo "carisma" que leve a cisóes com a hierarquia da Icireja, é
suspeito de inautenticidade ou de inspiracio espuria. Os discípulos de
Cristo sejam pacientes uns com os outros, e caminhem juntos, carregan-
do mutuamente os seus fardos (cf. Gl 6,2)

Estéváo Bettencourt. O.SJB.

Despacho de Macumba contra um Casal Feliz, por Pe. Edvino Au


gusto Friderichs S. J. - Ed. Loyola, SSo Paulo 1985, 138x208 mm, 77pp.

Sob forma de novela, o Pe. Friderichs S.J., famoso parapsicótogo, enca


ra os fenómenos do Espiritismo e da Umbanda, que tanto impressionam o
público, propondo a expticagSo científica dos mesmos. A leitura se toma muito
agradável em virtude da forma literaria de romance, e oferece sempre a sá
qputrina a respeito da "eficacia" dos despachos, da evocagSo dos exus e ori-
xás, da torca da mente como também a propósito da reencamagSo... O autor
está de parabéns!

432
O MOSTEIRO DE SAO BENTO

Grande Álbum, em estojo: formato 36,5 x 28 Obra de arte, com


texto em portugués e inglés por Dom Marcos Barbosa. O.S.B.
Dezoito fotografías artísticas (preto-branco) por Hugo Leal, o
mesmo que fotografou Ouro Preto e Salvador - Bahia.
Como nem todos podem vir ao Rio de Janeiro ou penetrar na
clausura, poderao contudo admirar a beleza arquitetónica des-
se monumento colonial do inicio do século XVII.
Edicáo "Lumen Christi - CzS 400,00

EDIQOES "LUMEN CHRISTI"


MOSTEIRO DE SAO BENTO
Rúa Dom Gerardo 40, — 5° andar — Sala 501
Caixa Postal 2666 — Tel.: (021) 291-7122
20001 — Rio de Janeiro — RJ
NOVIDADE

SOBRE HISTORIA DA IGREJA NO BRASIL

D. Jerónimo de Lemos O.S.B., monge do Mosteiro de Sao Bento,


dedicado estudioso da historia da Igreja, nao so do Rio de Janeiro, mas
do Brasil. Após minuciosa e longa pesquisa nos arquivos do Río e da Ar-
quidiocese, bem como da Biblioteca Nacional, projeta urna nova luz ¡n-
teramente inédita e justa, sobre a pessoa do insigne Bispo do Rio de Ja
neiro, Dom Pedro María de Lacerda, que desempenhou papel altamente
relevante na chamada Questáo Religiosa.

O autor faz também o primeiro levantamento histórico sobre o Pa


dre Almeida Martins: prova que o mesmo sacerdote se retratou e abjurou
a seita macónica; pesquisa todo o longo período que vai de 1869 (e está
mesmo antes) e até além de 1890; refere-se ainda aos dois sucessores de
Dom Lacerda, D. Joáo Esberard e O. José Pereira da Silva Barros; sem-
pre que possivel aborda também a atuafáo dos monges Beneditinos e
questóes atinentes aos mesmos.

Já terminada a obra, está sendo revisada e preparada para a ¡m-


pressáo.

DIÁLOGO ECUMÉNICO: Temas controvertidos, por D. Estéváo Betten-


court O.S.B. 2- edigáo, com dois novos capítulos: "A Santissima
Trindade: fórmula paga?", "Seita e espirito sectario".

RIQUEZAS DA MENSAGEM CRISTA (23 edigáo), por D. Cirilo Folch


Gomes Q.S.B. - Continua sendo muito procurado este "manual" de
Teología que estuda de maneira completa e extensa todo o conteú-
do do "Credo do povo de Deus". O autor, falecido a 2/12/1983, de-
dicou sua vida de estudos ao aprofundamento das mais variadas
questóes teológicas. 690 páginas Cr$ 73,80.

ATENDE-SE PELO REEMBOLSO POSTAL

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