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Projeto

PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS
ON-LINE

Apostolado Veritatis Spiendor


com autorizagáo de
Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb
(in memoriarñ)
APRESENTAQÁO
DA EDigÁO ON-LINE
Diz Sao Pedro que devemos
estar preparados para dar a razáo da
nossa esperanga a todo aquele que no-la
pedir (1 Pedro 3,15).

Esta necessidade de darmos


conta da nossa esperanga e da nossa fé
hoje é mais premente do que outrora,
V».-r visto que somos bombardeados por
numerosas correntes filosóficas e
religiosas contrarias á fé católica. Somos
assim incitados a procurar consolidar
nossa crenga católica mediante um
aprofundamento do nosso estudo.

Eis o que neste site Pergunte e


Responderemos propóe aos seus leitores:
aborda questóes da atualidade
controvertidas, elucidando-as do ponto de
vista cristáo a fim de que as dúvidas se
dissipem e a vivencia católica se fortalega
no Brasil e no mundo. Queira Deus
abengoar este trabal ho assim como a
equipe de Veritatis Splendor que se
encarrega do respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.

Pe. Estevao Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR

Celebramos convenio com d. Estevao Bettencourt e


passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e
Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicagáo.

A d. Estéváo Bettencourt agradecemos a confiaga


depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e
zelo pastoral assim demonstrados.
responderemos
SUMARIO

< Páscoa: a Vitoria da Vida


V)

"J Ateísmo e Ciencia


O

c Os Mártires da América Latina


UJ

3 O que é a loga

""- Que Pensar de Teresa Neumann?

^ Carta de um Campo de Concentracio


ni
_i Svetlana Stalin através de cartas
03
O
oc
o- ™

ANOXXVNI - ABRIL - 1987


PERGUNTE E RESPONDEREMOS ABRIL - 1987
■t . i

Publicarlo mental N?299

SUMARIO
Diretor-Respomável:

EstévSo Bettencourt OSB


PÁSCOA: A VITORIA DA VIDA 145
Autor e Redator de toda a materia
publicada neste periódico Como se relaáonam entre si
Diretor-Administrador ATEÍSMO E CIENCIA? 146
D. Hildebrando P. Martins OSB
Quem sSo
OS MÁRTIRES DA AMÉRICA
Administracao e distribuicao: LATINA? ; 154

Edicdes Lumen Christi


Tres livros sobre
Oom Gerardo. 40 - 5P andar, S/501
Tel.: (021)291 -7122
O QUE É A I0GA 161
' Caixa postal 2666
Vinte e cinco anos após a sua morte:
20001 - Rio de Janeiro - RJ
QUE PENSAR DE TERESA
NEUMANN? 172

Competido «Imprnaáo Ateksandr Ogorodnikov escreve:


"MARQUtS'SARAIVA" CARTA DE UM CAMPO DE
niÁUtuimttuoi etArrcoi í a.
fta 9m ItaUgia* M» - CONCENTRACÁO 179
EcfetoUS
*J 17S44M
-I7VM49-W
Itinerario addentado:
SVETLANA STALIN ATRAVÉS DE
CARTAS 187

ASSINATURA EM 1987:
NO PRÓXIMO NÚMERO
A partir de Janeiro de 1987 Cz$ 200.00
Número avulso: Cz$ 20,00 300-maio- 1987

Queira depositar a importancia no Banco Ciencia e Fé hoje. - A Data do Nascimento de


do Brasil para crédito na Conta Córreme Jesús. - O caso Medjugorje. - Inquisicao e Cris-
f»5 0031 304-1 em nome do Mosteiro de táo-novos. - A Confissao Sacramental de crian-
cas.
Sio Bento do Rio de Janeiro, pagável na
Agenda da Praca Mauá (n? 0435) ou en
viar VALE POSTAL pagável na Agencia COM APROVACÁO ECLESIÁSTICA
Central dos Correios do Rio de Janeiro.

RENOVÉ OUANTO ANTES COMUNIQUE NOS QUALQUEH


A SUA ASSINATURA MUDANQADE ENDERECO
biLLIUILliA

Páscoa: a Vitoria da Vida


O mes de abril é o mes de Páscoa, festa da Vida que luta contra a
Morte e, atravessando a Morte, sai vitoriosa. Entre outras coisas, Páscoa
nos lembra que o Pai tanto amou o homem que entregou seu Filho para
que por Ele dominássemos a Morte e tivéssemos a Vida (cf. Jo 3,16).

Este amor de Deus ao homem, a Igreja o prolonga através da sua


historia, inclusive ñas últimas semanas, quando publicou a Instrucáo so
bre a Bioética ou "sobre o respeito á vida humana nascente e a dignidade
da procriacáo". Tal documento suscitou criticas desfavoráveis; parece
opor-se tanto ao progresso da ciencia quanto aos anseios de muitos ca
sáis...

Apesar disto, afirma a Instrucáo logo no seu inicio que "as inter-
vengóes da Igreja, particularmente no que diz respeito á vida humana e
ás origens, exprimem o amor que Ela deve ao homem" (Introdugáo).
Sim; a Igreja quer evitar que este esquega sua identidade e se deixe redu-
zir á condicSo de mera materia de laboratorio, pega de engrenagem/xa-
beca de gado de um rebanho...

A posicáo restritiva da Igreja ás experiencias biológicas que mani-


pulam a vida humana, nüo significa imobitismo ou conservadorismo.
Este seria urna atitude preconcebida e cega, ao passo que a ¡ntengao da
Igreja é reafirmar valores perenes, que atravessam todos os tempos e
que devem ser respeitados pela ciencia; desligada da consciéncia moral, a
ciencia pode tornar-se mortífera para o homem, como se dá no caso da
bomba atómica, alta expressáo da ciencia moderna, que, utilizada sem
Moral, vem a ser ameaga constante para a humanidade.

Toda a Instrugáo é, pois, perpassada pelo intuito de lembrar que


a reprodugáo humana é algo que ultrapassa as leis da Bioquímica, pois
envolve pessoas ou seres cuja corporeidade é penetrada por profunda
espiritualidade ou por urna vocagáo transcendental. "Os esposos expri
mem reciprocamente o seu amor pessoal na linguagem do corpo e do
espirito. O ato conjugal é indissoluvelmente corporal e espiritual... A pro-
criagáo está associada a uniáo nao somente biológica, mas também espi
ritual, dos esposos" (Sfntese 4b). Dal nao se poder tolerar que a mulher
alugue o seu corpo como incubadora ou que o feto humano seja obtido a
partir de Bancos de sementes vitáis ou sofra eliminagáo quando contrario
ás expectativas dos cientistas ou se torne materia de comercio para a fa-
bricagáo de sabonetes e cosméticos...

Possa a luz de Páscoa projetar-se sobre a problemática da Genética


e ajudar os cristaos a compreender o elevado prego do corpo humano,
que valeu o sangue do Filho de Deus feitb homem!

E.B.

145
"PEROUNTE E RESPONDEREMOS"
ANO XXVIII - N? 299 - Abril de 1987

Como se relacionan! entre si

Ateísmo e Ciencia?
Em slntese: Ao invés do que muitos pensam, a mensagem crista se
prende estritamente ao uso da razSo e ao estudo das ciencias experimentáis.
E preciso banir á suspeita de divorcio entre aqueta e estas. Verdade ó que
o estudo nSo prava a verdade intrínseca das proposicóes de té, mas serve
para alicorear a crética. A onda de antiintelectualismo vigente nos últimos de
cenios prejudica a vida crista; esta se toma, em conseqOéncia, algo de subje
tivo, sentimental, inconsistente e sujeito a perder sua identídade. As proposi
cóes de fé se dirigem é inteligencia humana e nSo apenas ao coracSo. -Ain-
teSgéncia toi dada por Deus ao homem para que este nSo só descubra as
verdades acerca do mundo contingente e material, mas também chegue ao
conhecimento de Deus como Principio e Fim de todas as coisas.

Especialmente os resultados das ciencias naturais -eda piópria astro


nomía - interessam grandemente aos cristáos. A Biblia nao ensina proposi
cóes de ordem científica sobre a constituigSo e a origem do mundo e do ho
mem; a sua doutrina é de índole sapiencial ou teológica, de modo que nunca
se poderá dizer que há antagonismo entre a mensagem bíblica e as ciencias
naturais.

Houve épocas em que se julgava haver total incompatibilidade en


tre a ciencia e a fé; quem estudasse o mundo, n§o poderia crer em valo
res transcendentais. Em nossos dias, embora esta posicao se vá dissipan
do, persiste a conviccao, em muitos, de que a fé e a ciencia, mesmo nSo
sendo antagónicas, nada tém que ver urna com a outra; a fé seria urna
posicáo assumida gratuita ou emotivamente pelo estudioso de ciencias
naturais. Ora esta cisSo entre saber científico e saber religioso do homem
desfigura um e outro e leva a conclusóes muito erróneas. - Eis por que
procuraremos, ñas páginas seguintes, examinar o problema com exati-
d§o.

146
ATEÍSMO E CIENCIA

1. A revolucáo cosmológica moderna

Em meados do sáculo XX descortinou-se aos dentistas urna visSo


do universo assaz diferente da que as geracóés passadas tinham conce
bido: os contemporáneos tomaram consciéncia de que o universo é um
sistema que tem sua evolucáo, sua historia e, por conseguirle, também
está em constante regime de envelhecimento.

Os amigos gregos imaginavam o mundo como algo que nao tivera


inicio nem teña fim, algo serri evolucáo nem desgaste; seria divino e in-
criado. A escola de Parménides (séc. Vl/V a.C.} concebía esse algo divino
como estático, fixo, ao passo que Heráclito de Éfeso (576-480 a.C.) o en
tendía como algo sujeito a constantes pulsacóes do uno ao múltiplo e do
múltiplo ao uno ou algo sujeito ao eterno e monótono retorno. - Tam
bém sabemos que, para os amigos, o universo se reduzia ao nosso sis
tema solar; ao contrario, hoje se afirma que o universo é um "gas de. ga
laxias", um gas do qual cada molécula é urna galaxia.1 A nossa galaxia
compreende cerca de cem bilhdes de estrelas; o nosso sol é urna destas.
Este gas de galaxias está em icgime de expansáo, isto é, comporta-se
como um gas que invade novos espacos e se dilata; ao mesmo tempo se
desgasta e envelhece, conforme o segundo principio da termodinámica
ou a lei da entropía (ou da degradacáo) formulada por Carnot ( 1832) e
Clausius (1"I888). - Esta lei ensina que a energía motriz ou dinámica se
converte em calor (ou energía térmica); mas o calor nao se converte de
novo em movimento. Em conseqüéncia, o universo posto em expansáo
tende a se estagnar ou estabilizar.

Entropía é palavra grega que significa involucáo; é o contrario da


evolucSo. A evolucao cósmica, física e biológica é o crescimento irrever-
sfvel e acelerado da informacáo (ou das estruturas moleculares) da mate
ria inanimada e da vida. Ora a entropía é a tendencia natural de todas as
estruturas físicas, químicas e bioquímicas a voltar atrás se nao recebem
novas ¡nformacóes; decompdem-se e desfazem-se quando nao re-ali
mentadas. - Numa palavra, todos os seres materiais estáo sujeitos a esta

Mais precisamente vejamos como se dá a evolucáo da materia, que


constituí o universo.

1.1. A formacSo da materia

A materia nao é urna realidade isenta de orígem e composicáo, co


mo julgavam os atomistas gregos Demócríto (460-370 a.C.) e Leucipo
(séc V a.C), mas conhece etapas de formacáo.

1 Galaxia é a maior aglomerado de materia que conhegamos; contóm gis,


estrelas, poeira e planetas. As galaxias comegam a existir como ¡mensas ni
veas de gas, cuja condensagáo produz as estrelas.

147
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 299/1987

1) Recuando até os primordios do universo, podemos dizer que a


materia se reduzia a sua forma mais simples ou a partículas: destas as
mais numerosas eram os eletrónios e suas antlteses, os positrAnios; havia
também partículas sem massa, como os fotdnios, os neutrinos e os anti-
neutrinos.

2) A partir de tais partículas, formou-se o primeiro átomo, o mais


simples, que é o de hidrogénio. Depois deste, formou-se o de helio,

3) A seguir, formaram-se as estrelas, que sao massas de hidrogé


nio, que se transforma lenta, mas irreversivelmente, em helio. No interior
das estrelas é que se formam os núcleos mais pesados ou os elementos
de composicáo mais complexa.

4) A formacio dos elementos químicos nao é indefinida; ela produz


urna centena de átomos, e para. Segue-se a formacio de moléculas, que
resultam da estrutura?§o de átomos em equilibrio. As moléculas, por sua
vez, se compSem e associam entre si ñas chamadas "macro-moléculas".
Estas também se combinam urnas com as outras, de modo a dar as
"moléculas-gigantes".

5} As moléculas-gigantes, que apareceram na face da Térra há cer


ca de tres bilhóes e meio de anos, sao mensagens genéticas; sao tele
gramas ou ¡nformagóes que governam a construyo dos corpos vivos,
desde os mais simples até os mais complexos. A estrutura desses seres
vivos está inscrita em tais moléculas.

6) Mas também a evolucSo das moléculas n3o é indefinida. Ela se


encerra com a formapáo de cinco moléculas-gigantes fundamentáis: a
adenina, a guanina, a timina, a citosina e a uracil. As quatra prímeirasse
combinam tres a tres. Estas cinco moléculas servem para se escreverem
todas as mensagens genéticas (ou as estruturas básicas) do ser vivo, des
de os monocelulares até o homem (que é relativamente muito recente
sobre a face da Térra). Formam enormes cadeias arquitetónicas, das
quais resultam as proteínas, com seus vinte aminoácidos fundamentáis.

7) Depois da evolugSo dos átomos e das moléculas, cometa a evo-


lucio dita "biológica". Como as evolucSes anteriores, também a biológi
ca nao é indefinida; termina com a formacáo de alguns sistemas biológi
cos principáis - o que vem comprovado pelo fato de que há milhdes de
anos nao se vé o surto de novos grupos zoológicos, nem se podería indi
car a partir de que tronco se daría hoje a evolucSo dos viventes.

Vé-se, pois, que o universo é um sistema em evolucSo irreverslvel,


dirigida para composicóes sempre mais complexas e também ... mais
imprevislveis; de fato, quem examina o universo em alguma das fases de

148
ATEÍSMO E CIENCIA

sua evolucáo, nao tem dados para predizer o futuro dessa evolucáo; o
passado é sempre mais pobre do que o futuro dentro dos quinze bilhóes
de anos que conhecemos de sua historia.

8) Voltemos a considerar os elementos mais simples que compóem


a materia. Cada estrela é urna massa de hidrogénio, que se transforma
lenta, mas irreversivelmente em helio. Quando esta transformando está
totalmente realizada ou acabada, a estrela torna-se estrela morta, urna
ani branca, constituida por "materia degenerada".

9) Disto se segué que nenhuma estrela - nem o nosso sol - pode


ser eterna. Nao sao compattveis entre si o concertó de evolucáo e o de
eternidade, pois evolucáo diz "comeco e transformacáo", ao passo que a
eternidade é a negacáo de cometo e transformacáo. Sendo, pois, com-
provada a evolucáo do universo, fica com provado também que ele teve
comeco. Nenhuma galaxia é eterna, nem o conjunto das galaxias é eter
no, pois todas se acham em evolucáo. Em vez de falar de eternidade do
sol ou do universo (como faziam os amigos), a ciencia contemporánea
assinala as datas aproximadas de origem das estrelas e das galaxias.

Urna vez esbogadas estas linhas de cosmología contemporánea,


procuremos ver como se comporta o ateísmo diante das conclusóes da
ciencia.

2. Que diz o ateísmo a propósito?

Enunciaremos duas posicoes do ateísmo frente ás ciencias cosmo


lógicas.

2.1. Os amigos gregose o século XIX

Na sua carencia de conhecimentos de astronomia, os amigos pen


sadores gregos (os pré-socráticos, Platáo, Aristóteles, Plotino e outros...)
afirmavam que o universo é divino; os astros seriam substancias divinas,
isentas de evolucáo, de historia, de envelhecimento; o universo nao teria
inicio nem fira, mas seria o Ser Absoluto.

Esta posicáo é insustentável aos olhos da ciencia moderna. Nao


obstante, no século XIX era defendida por pensadores como Marx e En-
gels. Este, por exemplo, restaurou a concepcao dos antigos gregos: o
universo estaría em movimento cíclico eterno; o universo seria o Ser Ab
soluto, para o qual nao se deve procurar comeco nem fim nem envelhe
cimento. O principio de Carnot-Clausius, que estabelece a entropía ou a
degradacáo da energia, foi ignorado conscientemente por Engels. Frie-
derich Nietzsche (fl900) fez o mesmo: retomou o tema mitológico do
eterno retorno, difundido nao só na civilizacáo grega, mas em outras

149
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 299/1987

culturas antigás; em nome desse mito, rejeitou com horror a idéia de um


universo cuja historia fosse linear, progressiva e ¡rreverslvel; alias, para
Nietzsche, o universo é um caos destituido de toda forma. Augusto
Comte (|1857), outro ateu do século XIX, proibiu aos seus discípulos o
estudo da análise do espectro, mediante o qual se pode perceber a com-
posicáo ffsica e química das estrelas.

Como se vé, o problema para os pensadores ateus do século XIX


era o de integrar os dados das ciencias experimentáis na sua filosofía
concebida abstratamente ou preconceituosamente. Em vez de reconhecer
as conclusóes filosóficas a que levavam as pesquisas cosmológicas, dis-
tanciaram-se destas, proclamaram o ateísmo pré-concebido como dog
ma ou como a única filosofía científica posslvel. O ateísmo foi, sim, o
dogma do século XIX.

2.2. No século XX: divorcio entre rienda e ideología

A cosmología contemporánea, estudada sem preconceitos, nSo se


concilia com o ateísmo. Com outras palavras: o ateísmo, do ponto de
vista científico, é inconcebível ou impensável. Ele só pode ser professado
e proclamado ñas escolas e ñas Universidades por quem nao queira levar
em conta as conclusóes das ciencias cósmicas modernas. Por isto nota
se que famosos pensadores ateus do nosso século nutriram desprezo
pelas ciencias naturais.

Com efeito. Tal foi o caso de Jean-Paul Sartre, que pretendía ig


norar as ciencias experimentáis e desdenhava a pesquisa das realidades
físicas e biológicas. Martín Heidegger, existencialista, também menospre-
zava os estudos experimentáis. Diga-se o mesmo a propósito de Aibert
Camus (1913-1960), para quem o mundo é absurdo.

Entre os filósofos marxistas da Cortina de Ferro, que naturalmente


professam o ateísmo, instaurou-se urna crise quando os cientistas ou físi
cos quiseram desenvolver as conseqüéncias da lei da entropía. Esta con-
tradizía ás premissas do ateísmo, que, para subsistir, tem de admitir a
eternídade da materia ou, ao menos, deve ignorar as conclusóes das
ciencias físicas contemporáneas. Foi optando por esta alternativa que
muitos resolveram o problema na Rússia, na Polonia, na Roménía (na
Franga também...); julgam que é ¡mpossível urna Filosofía da Natureza ou
urna filosofía das ciencias naturais. Assim dispensam-se de encarar o
choque existente entre as ciencias experimentáis e a ontologia marxista;
para eles, o marxismo se reduz a urna filosofía da historia, ao passo que
para Marx, Engels e Lenin ainda era urna filosofía da natureza ou urna
ontologia, que admite o universo envolvido num processo cíclico, para o
qual nao havia necessidade de procurar explicacáo da causa remota, pois

150
ATEÍSMO E CIENCIA

o universo se explicaría por si mesmo. - Alias, é ¡n»tressante notar que


tanto Engeis como Nietzsche e Heidegger se referenr. freqüentemente aos
mais antigos filósofos gregos (Heráclito, Parménides, Xenófanes, Ana-
ximandro); outros ateus se apoiam em Demócrito e leucipo, atomistas
gregos, todos eles falhos no tocante á ¡nvestigacáo científica, mas tidos
como válidos para eliminar o conceito de um Deus distinto do mundo e
Criador deste. Também a filosofía pantelsta dos estoicos é evocada pe
los autores ateus modernos, pois esta admite o Logos (a Razao) imánente
no universo, Logos que tornaría o universo inteligente e harmonioso sem
o recurso a um Oeus Criador; assim, mais urna vez, o universo com suas
leis se explicaría por si mesmo.

Vé-se, pois, que o confuto fundamental entre o ateísmo moderno e


o monoteísmo (que tem suas ralzes no pensamento hebreu) vem a ser o
confronto entre urna cosmología que faz do universo um Absoluto, que
nao precisa de expltcacáo ulterior, e urna filosofía que relativiza e dessa-
craliza o universo, reduzindo-o á categoría de mera criatura de um Ser
Supremo distinto do mundo e do homem. Quem terá razáo neste con
fronto? - A resposta so pode ser deduzida da observacao da realidade
objetiva, observacao despojada de qualquer preconceito e guiada única
mente pela evidencia das ciencias experimentáis. Ora quem segué este
método, verifica com muita clareza que os antigos filósofos gregos e os
seus discípulos modernos nao tinham nem tém razao.

Resta agora perguntar:

3. Por que há tanto ateísmo hoje?


Apontaremos duas grandes causas de tal fenómeno.

3.1. Preconceito contra a Metafísica

A Metafísica é a reflexáo que se estende para além das coisas físicas


ou naturais; é o estudo que procura nao somente as causas próximas,
mas as causas remotas ou as causas das causas, e assim vai penetrando
dentro do recóndito do que é ou do Ser; atinge o Invislvel através do vísl-
vel. Se, por exemplo, vejo um raio, sinto a necessidade de explícá-lo;
pesquisando científicamente, chego a conclusáo de que é o efeito de um
choque elétrico; mas minha mente pode nao se dar por totalmente satis-
feita com esta resposta e, por conseguinte, indago ulteriormente: donde
vem a eletricídade?... Por que existe ela? Quem Ihe deu a existencia? As
sim aos poucos vou cultivando a metafísica (meta = além; physiká = as
coisas naturais).

A Metafísica foi muito estimada pelos pensadores até a época mo


derna. Immanuel Kant (T1804) quís dar-lhe um golpe mortal, afirmando

151
8 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 299/1987

que só conhecemos fenómenos sem poder penetrar nassuas causas; nao


atingimos a realidade em si mesma ou como tal. Augusto Comte (f1857)
tomou posicáo semelhante, recusando todo conhecimento que ultrapasse
o das ciencias empíricas. Friederich Nietzsche (t1900), Sigmund Freud
(f1939) e seus discípulos também proclamaram a morte da Metafísica. -
Tal negativa influenciou nao somente os materialistas, mas também os
cristáos; varios destes, embora reconhecam a existencia de Deus e dos
valores transcendentais, julgam que estes nao podem ser atingidos pela
razáo, mas únicamente pela fé. A crenca em Oeus e ñas verdades religio
sas seria algo alheio ao setor da razáo; seria urna especie de conviccáo
que nao se poderia justificar ou explicar racionalmente. Assim há pensa
dores cristáos que sao kantianos e nos dizem que a análise metafísica do
mundo e da natureza é ¡mpossível; a afirmacio da existencia de Deus na
da teña que ver com o estudo da natureza e do universo; nao seria possí-
vel urna filosofía da natureza. Tais pensadores cristáos se encontram as
sim com os marxistas e os freudianos, e esse encontró é geralmente fatal
para eles, isto é, implica muitas vezes a perda mesma da crenca em Deus.
Com efeito; sem fundamento na lógica e ñas categorías da razáo, qual-
quer opcio é meramente subjetiva e arbitraria, carente de solidez e inca
paz de se transmitir de maneira convincente.

A recusa da filosofía da natureza leva ao velho materialismo do sé-


culo passado, o qual afirma va que, destruido o cerebro, se destrói a cons-
ciéncia humana e se tem a morte absoluta, ou aínda... que a destruicáo
do corpo humano é a destruicáo da própria pessoa.

Na verdade, o que é imposslvel é destruir a Metafísica ou nao culti


var a Metafísica. Com efeito; já Aristóteles (|322 a.C.) dizia: "Se é preciso
filosofar, filosofemos. Se nao é preciso filosofar, filosofemos ainda para
provar que nao é preciso filosofar". O que significa: negar a Metafísica
ainda é fazer Metafísica. Negar a finalidade do universo ou negar Deus é
afirmar que o mundo é regido por mecanismos e, em última análise, pelo
acaso. Ora quem postula tais mecanismos, de certo modo está praticando
a Metafísica ou está admitindo algo que a ciencia nao prava. Quanto ao
recurso ao acaso, é a capitulacáo da razáo; o acaso é o nome "ilustrado"
ou "bonito" que o homem dá á sua ignorancia, pois nao existe acaso co
mo sujeito ou nao existe o "Sr. Acaso"; este é apenas o cruzamento, para
nos imprevisto, de causas que tém sua finalidade e sua razáo de ser bem
especificadas (pelo fato de nao termos previsto que essas causas se en-
contrariam, surpreendemo-nos e dizemos que isto se deu por acaso).

3.2. Preconcehos contra a fé crista

Numa atitude antiintelectualista, muitos se fecham em preconceitos


contra a fé; deixam-se guiar nao pela razáo, mas por sentimehtos, "op-
cfies" ou displicencia. Julgando que a análise objetiva e racional do fato

152
ATEÍSMO E CIENCIA

religioso é impossfvel ou nao merece ser feita, assumem atitudes arbitra


rias, que tais pensadores nao saberiam justificar aos seus próprios olhos.

É certo que, da parte das pessoas de fé-digamos:... dos cristáos-,


tem havido motivo para certa aversáo á fé; assim as falsas interpretacóes
da Biblia, a piedade adocicada ou sentimental, os contra-testemunhos
decorrentes da fragilidade humana... Muiros confundem o Cristianismo
com aberracóes teóricas ou práticas que sao apresentadas ao público;
julgam que, para ser cristáo, é preciso renunciar á inteligencia ou a cul
tura. Grande número desses pensadores que se dizem ateus, na verdade
nao desdizem á fé no verdadeiro Deus (que eles nao conhecem), mas re-
jeitam as dístorcóes da auténtica noció de Deus.

Tal situacáo requer, do lado dos cristaos, urna revisáo do testemu-


nho que dáo ao mundo a fim de o expurgar de deformacóes e, do lado
dos ditos "ateus", o uso da razáo, a fim de que possam ter conceito mais
claro da mensagem da fé e saibam distinguir do acidental o essencial ou
das facetas contingentes a verdade perene professada pela fé.

4. Conclusáo

Ao invés do que muitos pensam, a mensagem crista se prende es-


tritamente ao uso da razáo e ao estudo'das ciencias experimentáis. É pre
ciso banir a suspeita de divorcio entre aquela e estas. Verdade é que o
estudo nao prova a verdade intrínseca das proposicóes de fé, mas serve
para alicercar a crenca. A onda de antiintelectualismo vigente nos últimos
decenios prejudica a vida crista; esta se torna, em conseqüéncia, algo de
subjetivo, sentimental, inconsistente e sujeito a perder sua identidade. As
proposicóes de fé se dirigem á inteligencia humana e nao apenas ao co-
racáo. - A inteligencia foi dada por Deus ao homem para que este nao
somente descubra as verdades acerca do mundo contingente e material,
mas também chegue ao conhecimento de Deus como Principio e Fim de
todas as coisas.

Especialmente os resultados das ciencias naturais - e da própria


astronomía - ¡nteressam grandemente aos cristáos. A Biblia n5o esina
proposicóes de ordem científica sobre a constituicáo e a origem do mun
do e do homem; a sua doutrina é de índole sapiencial ou teológica, de
modo que nunca se poderá dizer que há antagonismo entre a mensagem
bíblica e as ciencias naturais.

A propósito multo nos valemos do esludo de Claude Trasmontan!:


L'Ateismo in questa fine del ventesimo secólo dal punto di vista scienti-
fico e razionale, publicado na coletánea L'Ateismo: natura e cause, pp.
127-155. Milano 1981.

153
QuemsSo

Os mártires da América Latina?

, Em síntese: O conceito de mártir incluí a morte em testemunho da fé


explícitamente professada. Ora os mártires da América Latina sñopessoas -
multo veneráveis, sem dúvida - que morreram nao por professarem a fé cató
lica (alguns sao protestantes), mas por motivos sócio-econdmico-polfticos; daf
nao se Ihes poder reconhecero título de mártires. Há quem alegue que morre
ram pelo Reino de Deus, entendido comojustiga e fratemidade; tal conceito de
Reino de Deus, que se distingue da Igreja fundada por Cristo e nao incluí o
sacramento da Eucaristía, 6 um conceito secularista; pode até designar, se
gundo alguns, a aplicacSo da "¡usüca" marxista, totalitaria e dilatoria!. Ém con-
seqQéncia, nSo basta a alegagSo de que morreram pelo Reino assim entendi
do, para que tais pessoas sejam Odas como mártires, -é de lamentar que a
Liturgia católica esteja sendo utilizada para fíns políticos; urna das conseqüén-
tías deste lato 6 a desercáo de liéis que se passam para as assembléias
protestantes, onde procuram a ocasiáo de ouvir a Palavra de Deus num con
texto de fé e oragáo profundas, sem acirramento político.

Com insistencia crescente, algumas publicares católicas e celebra-


cóes de culto, na Igreja, proclamam os mártires da América Latina: sSo
homens e mulheres, clérigos e leigos que tém perecido ñas lutas em prol
da térra ou de melhores condicóes socio-económicas. A "Revista de Li
turgia", em seu n? 79 de janeiro-fevereiro de 1987,1 dedica as suas pági
nas a explanacao desta temática, apresentando as justificativas do titulo
de mártires atribuido a tais pessoas. - O presente artigo tentará analisar
alguns dos conceitos al formulados.

1. Mártir: quem é?

A palavra mártir vem do grego mártvs, mártyros. que significa tes-


temunha. Na linguagem crista antiga, foi consagrada para designar os fi-

1Doravante citada como RL 79.

154
OS MÁRTIRES DA AMÉRICA LATINA? 11

éis que deram testemunho (martyrion) da sua fé até o derramamento do


sangue. Já o Apocalipse, escrito no fim do século I, emprega o vocábulo
neste sentido preciso:

Ap 2,13: "NSo renegaste a minha fé, nem mesmo nos días de Antipas,
minha teslemunha (mártir) Sel, que foi morto ¡unto a vos, onde Satanás habita".

Ap 17¿k "Vi que a mulher eslava embriagada com o sangue dos márti
res de Jesús".

EmAp6,9 é circunscrito o conceito de mártir nos seguintes termos: "Vi


sob o altar as vidas dos que tinham sido ¡motados por causa da Palavra de
Deus e do testemunho que déla tinham prestado..."

Bm At 22¿0 lé-se: "Ouando derramavam o sangue de Estéváo, teu


mártir, eu próprio eslava presente".

Já os judeus estimavam grandemente aqueles que haviam morrido


por causa da fé ou da fidelidade aos preceitos religiosos; tenham-se em
vista o caso de Eleazar (2Mc 6,18-31) e o dos sete irmáos macabeus {2Mc
7,1-42).

O Cristianismo deu á noció de martirio urna densidade nova pelo


fato de que o apresenta como desdobramento dos sacramentos do Ba-
tismo e da Eucaristía. Ambos s§o, de modo particular, a participado ri
tual da morte e ressurreicáo de Cristo (cf. Rm 6,1-11; ICor 11, 26); essa
participacáo ritual ou litúrgica precisa de se desenvolver na vida moral do
cristáo, fazendo desta um holocausto até a entrega do próprio sangue, se
necessário {cf. Fl 2,17; 3,3; 4,18; Rm 1,9; 15,16; At 13,2; 2Tm 1,3; 4,6;
Hb 9,14; 12,28; 13,15; IPd 2,5). Assim o martirio cristao é a plena realiza-
qáo dos sacramentos do Batismo e da Eucaristía; é o ato supremo de
amor ao Pai suscitado e alimentado pela participado sacramental do sa
crificio de Cristo crucificado.

Esta concepcáo se exprime nítidamente logo na primeira gerapáo


que sofreu o martirio após os Apostólos. S. Inácio de Antioquia (f 107),
por exemplo, escreve aos Romanos, na perspectiva de ser entregue ás
feras no Coliseu de Roma:

"Deixai-me ser comida para as feras, pelas quais me é possfvel encon


trar Deus. Sou trigo de Deus e sou moldo pelos denles das feras, para en-
contrar-me como pao puro de Cristo. Acariciai antes as feras, para que se tor-
nem meu túmulo e nao deixem sobrar nada de meu corpo, para que na minha
morte nao me tome peso para ningvém" (ns 4).

155
12 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 299/1987

As Atas do Martirio de Sao Policarpo (1156), discípulo do Apostólo


Sao Joáo, mostram de novo o binomio "Eucaristía-martirio":

"Policarpo, de máos ligadas ás cosías, cordeiro de escolha tomado de


um grande rebanho para o sacrificio, holocausto agradável preparado áo Se-
nhor, olhando o céu, disse:

'Senhor Deus onipotente, Pai de Jesús Cristo, leu fílho amado e bendi
to, pelo qual Te conhecemos; Deus de toda a familia dos justos que vive na
tua presenga, eu te bendigo por me haveres julgado digno deste día e desta
hora, digno de participar no número dos mártires, do cálice do leu Cristo para
a ressuneicáo da vida eterna do corpo e da alma, na inconvptibilidade do Es
pirito Santo! Recebe-me hoje com oles na tua presenga como sacrificio agra
dável e perfeito e, o que me havias preparado e revelado, reaüza-o agora,
Deus da verdade'".

Estes textos, associando entre si martirio e Eucaristía, exprimem


fielmente o pensamento da Igreja nascente.

Quando a era dos mártires chegou ao fim mediante o Edito de Mi-


láo (313), os cristáos procuraram um sucedáneo para o martirio cruento,
retirando-se para o deserto, onde viviam o martirio incruento ou "o mar
tirio da consciéncia"; praticavam a mortificagáo dos afetos desregrados e
se despojavam dos bens terrestres para poder configurar-se, o mais in
timamente posslvel, ao Cristo crucificado.

Eis, em poucas palavras, o conceito cristáo de martirio: é o teste-


munho de fidelidade a Cristo e ao Pai até o derramamento do sangue.

2. Os "mártires" da América Latina

2.1. Quemséo?

Os "mártires" da América Latina chamam-se, conforme a RL79, p.


24, "Marcal, Sepe Tiaraju, Eloy, Tiao, Gringo, Santo Dias, Rutllio, Ro
dolfo, Josimo, Ezequiel, Romero, Joáo Bosco, Angelelli, Irmas Cleusa,
Adetaide, comadre Margarida, Piazinhos de Ronda Alta».". Sao ou bispos
ou sacerdotes ou leigos e leigas, trabajadores rurais; Sepe Tiaraju era
Indio cacique; José Inácio era pastor batista, Joáo Pedro Teixeira era
crente da Assembléia de Deus.

Morreram nao porque professavam obstinadamente a fé em Jesús


Cristo nem os seus perseguidores Ihes pediam que a renegassem. Pode
mos dizer que nao vinha ao caso o problema religioso como tal, pois In
dios (nao cristáos?), católicos e protestantes foram atingidos pelos golpes

156
OS MÁRTIRES DA AMÉRICA LATINA? 13

mortais. O que movía a anjmosidade dos perseguidores eram questdes


sócio-polllico-económicas ou, em muitos casos, a disputa pela posse de
térras.

Ora tal motivo nao é suficiente para que se possa falar de martirio
no sentido teológico atrás exposto ou para que se possam colocar essas
vftimas na seqüencia dos Apostólos, de S. Inácio de Antioquia, de S. Poli-
carpo de Esmirna, etc.''; ainda que alguns mentores e o povo por eles
conduzido os proclamem mártires, tal proclamado carece de validade
oficial. A Igreja no século X quis precisamente por termo ás "canoniza-
coes por aclamacSo" que até entáo ocorriam no povo de Deus, por causa
dos equívocos que assim se verificavam; eram tidas como santas pessoas
que haviam impressionado o público, mas cujo teor de vida, atentamente
considerado, nSo fazia jus ao título. A partir de 993, a Igreja realiza rigo
rosos processos de canonizado para certificar-se de que pode apresen-
tar, como modelos de vida e intercessores, pessoas que realmente se te-
nham distinguido pela heroicidade de suas virtudes (sabemos mesmo
que em tais processos funciona sempre um "advogado do diabo", que
procura por em relevo os obstáculos á canonizacSo). Foi em parte por
causa das "canonizacóes por aclamado" dos primeiros séculos que o
Martirologio e a hagiografía se encheram de nomes e estórias espurias
- o que levou a Igreja a fazer a revisáo do catálogo e das legendas? dos
santos após o Concflio do Vaticano II. •

2.2.Objec6es

1. Aqueles que apregoam o titulo de mártires para as vltimas da


América Latina, conhecem a doutrina atrás exposta, masinsistem na sua
posicSo, que eles procuram assim justifican

"Pode ser chamado de mártir aquele que dá a vida pela mesma causa
pela qual Jesús deu a sua vida. Jesús entregou a vida pelo Reino e todo
aquele que morre pelo Reino é Mártir.

1É importante notar que, na própria RL 79, p. 4, o Pe. Gregorio Lutz pro-


póe o genuino conceito de martirio, que as demais páginas do mesmo fascí
culo parecem ignorar por completo: "Podemos deñnir o mártir como cristáo
que entrega sua vida por Cristo, dando testemunho de sua divindade ou da re-
ligiáo da Fé crista. Nesse sentido a Igreja entende desde o 29 secuto até hoje
'Mártir1 e 'martirio'" (p. 4). Se tal conceito, explícitamente proposto na revista,
fosse mantído, nao se leriam af as distorcées que estamos verificando:'na
verdade, o mártir é aquele que dá testemunho da Divindade de Cristo ou da
religiSo da fé crista.
¿Legenda, no caso, nao é a mesma coisa que lenda. Significa o que de-
vía ser lido ou o que era lido quando se celebrava a (esta de um Santo.

157
14 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 299/1987

Evidentemente, para nos, cristáos, aquele que morre conscientemente


pela causa da ¡ustiga, da verdade, da liberdade, contra a tortura, professando
a sua Fé no Deus da vida, que é o Deus de Jesús Cristo, será Mártir cristáo.
Aquele que morre pela mesma causa sem urna fé explícita, nao será mártir
cristáo. Os dois, entretanto, sao mártires, porque foram liéis a esta causa
maior do Reino" (D. Pedro Casaldaliga na RL 7% p. 15).

Estes dizeres apresentam o martirio propriamente dito como morte


sofrida pelo Reino (e o Reino é entendido como vida terrestre na verdade,
na justica, na fraternidade, com térra, morada, pao e liberdade). Se a este
motivo de martirio sobrevem também razóes de fé em Jesús Cristo, tem-
se um mártir cristSo ou um mártir marcado pela dimensáo pessoal da sua
fé crista, mártir, porém, que, mesmo sem fé, seria mártir no mesmo pla
no que os mártires vitimados por causa da fé.

Em tal caso, dá-se a secularizado ou a dessacralizacáo dos con-


ceitos de Reino e de martirio. O Reino de Deus nao coincidiría com a
Igreja baseada no Batismo e na Eucaristía, mas identificar-se-ia com o
cultivo dos valores leigos ou seculares da justica, da verdade ou da filan
tropía e do humanitarismo.1 Para estimar tais valores e morrer por eles,
a pessoa nao precisa da fé crista, mas pode professar o ateísmo. Preci
samente o secularismo da I resultante é a "religiSo sem Deus" ou é o
"Cristianismo ateu", o Cristianismo que só vale na medida em que afirma
os valores humanos, valores que todos os homens (até os ateus) podem
abracar. Entre parénteses, diríamos que o ateísmo marxista nao respeita
tais valores, pois para ele a pessoa humana nada significa, sufocada que
está pelo coletívismo.

O Cristianismo ateu ou a religiáo sem Deus é realidade extrema


mente ambigua: guarda nomes religiosos e cristáos, mas esvazia o con-
teúdo desses nomes. Com efeito; nSo se pode dizer que a justica e a fra
ternidade nao sejam valores reconhecidos pelo Cristianismo, mas quem
professa apenas esses valores e nao os integra dentro de um contexto de
fé transcendental ou de fé que é loucura e escándalo aos olhos da filoso
fía, nao satisfaz ás exigencias do Cristianismo (cf. ICor 1,23s).

É por ¡sto que só se pode falar de martirio no sentido teológico


desta palavra se a morte da vítima é sofrida por amor á fé crista explíci
tamente professada.

1É notorio, añas, que os conceitos de ¡ustiga, verdade e fraternidade


desvinculados das proposigóes da fé católica sSo, muitas vezes, entendidos,
nos nossos días, em sentido marxista ou no sentido das ditaduras totalitarias,
que praticam, sob o título de ¡ustiga, o contrario da ¡ustíca ou a sufocagSo dos
cidadSos.

158
OS MÁRTIRES DA AMÉRICA LATINA? 15

2. Em outra passagem da mesma RL 79, p. 9, lé-se:

"No nosso confínente há cristáos, e mesmo entre eles pastores, que


infelizmente nSo concordan) com estas celebracOes. Em primeiro lugar nSo
reconhecem como mártires a 'Raimundo, José, Margañda, Nativo' e tantos
outros que o hiño proclama 'inocentes que tombaram ñas mSos dos tiranos'.

Só seriam mártires os que dáo a vida por motivos estritamente retigio-


sos, Nossas comunidades populares nSo pensam assim. Consideram-nos
mártires de Cristo. Nao tém dúvida sobre isto. Úbedecem á palavra de Jesús,
que proclamou: 'Bem-aventurados os perseguidos por causa da justica'
(Mi 5,10). Os Mártires da caminhada sao mártires do Reino e por isso sao
mártires de Cristo" (Marcelo de Barros Souza).

Neste texto, além do conceito secularista de Keino, ocorre um "ar


gumento" que nada prova: "Nossas comunidades populares nao pensam
assim. Oonsideram-nos mártires de Cristo". - Ora nSo sao as afirmacdes
das comunidades populares que definem a fé católica; as comunidades
populares bem orientadas sentem-se em comunháo com a Igreja inteira
(que elas muito estimam) e n3o tencionam constituir um "magisterio
paralelo" (ao lado do magisterio da comunháo da Igreja). Somente as
comunidades de pessoas mal orientadas tomam atitudes dissidentes.

3. "O contrario da fé é o medo" sSo dizeres de teólogos da liberta-


c§o citados em RL 79, p. 15. - Observe-se: o medo é um sentimento, um
afeto, urna paixáo, ao passo que a fé nao é um sentimento apenas, mas é
a adesáo da inteligencia, movida pela vontade, d verdade revelada por
Deus (é claro que essa adesáo inteligente repercutirá nos afetos e na vida
de quem eré). Por conseguinte, o contrario da fé é a adesáo a urna pro-
posicáo nao revelada por Deus. Com outras palavras: nao se pode reduzir
a fé ao plano da praxis..., da praxis corajosa...; a fé é anterior ¿ praxis; ela
se dá no plano da verdade ou do Logos e deve iluminar a praxis ou a vida
ética do cristáo.

3. Conclusáo
■ '

Mais urna vez repete-se o que se tem dado nao raro no decorrer da
historia da Igreja: a Liturgia é utilizada como instrumento de doutrinacáo
espuria do povo de Deus. No sáculo IV eram os arianos que déla se ser-
viam para incutir nos fiéis o conceito de "Filho, criatura do Pai e subordi
nado a Este"; na época do Galicanismo (sáculo XVII-XIX), o calendario
litúrgico foi enxertado de festas que ¡neulcavam o poder do monarca (as
sim a festa de S. Napoleao, com referencia a Napoleáo Bonaparte).
Em nossos dias, a Liturgia é transformada em veteulo de politizacüo do

1S9
16 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 299/1987

povo, com seu calendario e suas celebracóes próprias (tenham-se em


vista es dias 11 e 12 de outubro, consagrados aos "mártires" da América
Latina). Oesta forma acontece que o povo, ñas suas assembléias de culto,
em vez de ser alimentado pela Palavra de Deus haurida ñas suas fontes, é
formado segundo teorías políticas revestidas de vocabulario bíblico. As-
sim, por exemplo, se lé em RL79n p. 10:

"Em varias celebracóes de mártires a comunidade substituirá urna das


leituras da. Biblia por alguma carta ou palavra do próprio irmáo mártir, ou aínda
em algun's casos um testemunho de atguém que de modo especial atuatize a
sua memoria.

Podemos dizer também que já é comum a invocagáo dos mártires da


tena como ladainha. O costume popular antigo das ladainhas de todos os
santos é simplesmente atualizado. Em varios lugares, como no VI Encontró
'ntereclesial com urna música conhecida da ladainha de todos os santos a
xmunidade invocava na comunháo dos santos os nomes e as preces dos
tossos mártires" (Marcelo de Barros Souza).

Como substituir a Biblia, Palavra de Deus, pela palavra de urna


criatura?

É por este motivo que muitos fiéis, mesmo os mais carentes, tém
abandonado as assembléias de culto católicas para freqüentar as protes
tantes; nestas o povo procura a ocasiáo de se reabastecer interiormente e
se elevar a Deus em oracáo, em vez de se acirrar na luta política (da qual
já falam muito os sindicatos e outras ¡nstituicóes). Se na igreja se repe-
tem os dizeres das assembléias de profissionais, o povo de Deus é logra
do ou traído e com razáo poderá queixar-se dos seus mentores. Nao é
condizente com o Espirito de Jesús Cristo fazer das celebracóes litúrgicas
ou paralitúrgicas a ocasiáo de que os fiéis "clamem por punicáo dos ad
versarios", porque "estáo em tempos de guerra e no chao desta Patria é
grande a peleja" (p. 9); é preciso "continuar a luta dos mártires" (p. 10).

Sem dúvida, a causa da justica merece zelo e empenho da parte dos


cristáos; a Igreja, em seus documentos oficiáis, a tem recomendado in-
cessantemente; mas tal causa há de ser debatida em lugares e horas con
venientes, no seu estilo próprio, e nao no recinto dos templos, sob forma
de preces, ladafnhas e hinos, que mais parecem discursos políticos do
que eleva?So da mente a Deus.

160
Tres fivros sobre

0 que é a loga

Em sfntese: O presente artigo analisa tres livros referentes á loga, pro-


curando por em evidencia a distincáo entre técnicas ou práScas e filosofía da
toga. As primeiras sao aceitáveis a um cristáo, pois, baseadas na experiencia
humana, tentam levar a mente a certa liberdade interior, eximindo-a das per-
turbacóes que os sentidos e o mau funcionamento do organismo fhe podem
acarretar. - Ouanto á filosofa da loga, nSo se coaduna com o Cristianismo,
pois é panteísmo-monista, identificando o ser humano com urna centelha de
Divindade envolvida num corpo do qual se deve libertar. O livro de Ismael
Quiles, analisado em primeiro lugar, póe em clara evidencia estas observa-
cues. Ao contrario, o de Julio Maran, apresentado em segundo lugar, incute
tanto as práticas como a filosofía da loga, que as inspirou originariamente na
India. A terceira obra, a de Swami Siddheswarananda, é de mestre hindú, que
tendona fazer o paralelo entre Sao JoSo'da Cruz e a loga; tal paralelismo po
de, de lato, existir no tocante a certas exerctcios mentáis (meditacáo, con-
centracáo...), mas nao ocorre em absoluto se se comparam entre si as idéias-
mestras do místico cristáo e as dos ascetas ióguis.

A loga está sempre em foco, pois a procuram tanto os filósofos e


pensadores quanto os profissionais da saúde e seus respectivos pacien
tes. Há quem Ihe atribua efeitos maravilhosos, que suscitam curiosidade
e, por vezes, discussóes.

O Pe. Ismael Quiles, jesuíta, esteve na india, onde pode estudar de


perto o assunto, aprendendo dos mestres hindus a mensagem e as técni
cas da loga. De tais contatos resulta o livro "Que é a loga" (sfc), traduzido
do espanhol para o portugués, e atualmente entregue ao público brasi-
leiro.1 Esta obra, de fácil leitura, aprésenla sintética e claramente o seu
objetivo e se torna ocasiáo para que o íeitor brasileiro possa formar um

1Ed. Loyola, SSo Paulo 1985, 140 x 210 mm, 115 pp. TraducSo de Luiz
Joáo Gato.

161
18 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 299/1987

jufzo sobre a loga e a sua eventual conciliario com o Cristianismo. Eis


por que exporemos o assunto, servindo-nos dé tal volume. Após o que,
proporemos breve comentario de dois outros livros concernentes á
mesma temática.

1. "Que é a loga"

por Ismael Quiles S.J.

1.1. A Substancia da loga

1. A palavra Yoga vem do sánscrito yuj, que significa "unir, manter


unido, reunir (um exército, urna frota, por exemplo)". De tal vocábulo
sánscrito fez-se a palavra latina iugum, jugo, que ainda inclui, de certo
modo, a noció de unir ou reunir, loga corresponde ao substantivo mas
culino sánscrito que significa uniio. O homem que pratica a loga, 6 cha
mado yogui ou iógui em portugués; a mulher, yogufni.

Que tipo de uniáo implica a loga?

- Falando linguagem hindulsta,1 deve-se responden "uniio da al


ma consigo mesma" a fim de que esta adquira o pleno controle do seu
ser ou a consdéncia da sua identidade. A uniio da alma consigo mesma
acarreta a uniio com a Divindade. Visto que esta dupla uniio supfie que a
alma se torne livre dos impedimentos que I he provinham dos instintos
inferiores, a uniio se chama também "libertario" e "realizacio de si".
- A uniáo proposta pela loga é obtlda mediante exerclcios corporais e
métodos de controle das desordens moráis, de modo que loga implica
aséese e técnicas psicossomáticas.

2. As práticas ióguicas sio muito antigás. Já há 5.000 anos repre-


sentava-se a Divindade sentada como um asceta iógui. A doutrina e os
exerclcios da loga eram amigamente transmitidos por via oral: os discí
pulos acreditavam na eficacia da palavra do mestre (gurú): o modo de
transmitir as fórmulas, de pronunciar os vocábulos e o próprio som da
voz do gurú despertavam o iniciado. Ainda hoje a tradicSo ióguica pro-
fessa profundo respeito pelos seus mestres; todo aspirante procura an
siosamente o gurú que Ihe abrirá os segredos da libertacio interior.

3. Os ensinamentos milenares da loga foram recolhidos e expostos


sistemáticamente por grandes mestres. A compilacio mais antiga que

'/finúb&no 6 o conjunto de crenca antigás da India, ñas quais há mésela


da religiSo primitiva politeísta com a filosofía pantefsta postenor.

162
OQUEÉAIOGA 19

existe, é atribuida a Patanjali, mestre que, segundo alguns, viveu no sé-


culo II a.C, e, segundo outros (com mais probabilidade), nos sáculos IV
ou V da nossa era. Patanjali deixou o escrito mais clássico sobre o as-
sunto, denominado loga-Sutra ou "Tratado sobre a loga", redigido sob
forma de aforismos ou breves sentencas; tais fórmulas sao, por vezes,
enigmáticas, mas o conjunto da obra contém toda a substancia da men-
sagem ¡óguica.

Os mestres distinguem diversas classes de loga ou diversos cami-


nhos para chegar á uniáo. Eis os sete principáis:

1} Jñarta ioga, ou ioga do saber. Proclama que a sabedoria é o


meio da libertacáo; a ignorancia é que mantém a alma afastada de si
mesma e da Divindade.

2) Hatha ¡oga ou ioga do corpo. Procura a libertacáo principal


mente por meio do cultivo da saúde corporal e das posturas do corpo
(ginástica); estas facilitam a concentrado espiritual.

3} Karma ¡oga ou ioga de acáo. Recomendé o exercício das boas


obras, a Moral e a ascese como métodos de libertacáo interior.

4} Raja ioga ou ioga real. Recorre, antes do mais, as técnicas de


concentrado da mente, procurando a uniáo com a Divindade mediante a
meditacio.

5) Bakti ¡oga ou ioga da devocáo. Cultiva a piedade e a oracáo a


Oeus de maneira preponderante.

6} Tantra loga ou ioga dos ritos mágicos promotores da libertacáo.


Aqui insere-se a "ioga erótica", que paradoxalmente procura a uniáo
com a Divindade mediante a satisfacio dos instintos. Foi considerada
heterodoxa, embora em todas as épocas ten ha tido adeptos.

7) Mantra ioga ou ioga do som. Usa o som e o ritmo para entrar


em sintonía com o Absoluto ou a Divindade. Esta é concebida como urna
onda sonora cósmica. Por isto a mantra ioga repete sons, sílabas e fór
mulas (mantras), aos quais atribui poder mágico; o mantra supremo é a
silaba sagrada AUM ou OM.

Dizem os sabios que a auténtica loga deve ser integral, isto é, reunir
os elementos dos diversos caminhos. Urna loga meramente corporal, li
mitada á ginástica do corpo e a higiene, sem exercfcio da mente, sería in
suficiente para levar á libertacáo plena; vice-versa, a meditacSo, sem a
procura do dominio do corpo e da respectiva higiene, vem a ser mais ou
menos estéril.

163
20 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 299/1987

1.2. A antropología toguica


Peigunta-se agora: como a loga (em qualquer das suas modalida
des) concebe o ser humano, que ela quer levar á plena auto-realizacáo?

Eis a resposta:

O mundo consta de dois principios coeternos: a oonsdénda e


a natureza material (diríamos: espirito e materia). A consciénda está di
vidida em infinitos individuos ou almas; estas, por sua vez, segundo um
destino ¡rrevogável, caem na natureza material e se misturam com ela.
Desta mésela resulté o ser humano: é alma e materia, duas realidades
antitéticas. A alma é espiritual, oniciente e imutável, feliz por sua própria
natureza, mas, urna vez unida a materia ou ao corpo, perde a consciéncia
de si e torna-se sujeita as mutapóes, h infelicidade, ás vicissitudes do
tempo, inclusive á reencarnado em sucessivas existencias dolorasas...

O nome sánscrito da alma é purusa, que significa sujeito ou pessoa.


O purusa é o verdadeiro eu. Acontece, porém, que, unido a materia, ele
cria um eu fenoménico (ahamkara), ilusorio, com seu cerebro, sua mente,
sua inteligencia, seus sentidos. Em conseqüéncia, todos estamos alucina
dos, jülgando que nosso verdadeiro eu 6 este principio de atividade que
experimentamos, nosso corpo, com suas sensacoes e sua faculdade de
pensar. O verdadeiro eu nSo é este, mas é o espirito, o purusa, realidade
interior, nSo percebida, imutável, perfeita, oniciente e onipotente.

A grande tragedia ou o grande pecado é que o verdadeiro eu (o in


terior) se confunde com o eu aparente e mutável, e nSo se dá conta da
verdadeira realidade; perde a no?8o da sua ¡dentidade.

A esta problemática acode a loga, procurando deter a corrente da


consciéncia ilusoria, dominar o corpo para que nSo distraía a alma, liber
tar o purusa dos vínculos da sensibilidade e da materia, para que trans-
parega o verdadeiro eu do ser humano; assim o purusa se descobre, re
conquista seus poderes e sua' natureza; ao tomar consdéncia de sua
identidade, verifica que está unido ao Principio Cósmico Universal ou
unido a todos os seres e ao Purusa universal.

Onde fica Deus neste contexto?

- Há escolas de loga que dispensam ou excluem Deus como tal;


professam urna filosofía atéia, que procura explicar a realidade do rio-
mem e do mundo sem referencia a Deus.1

1Este ateísmo é apenas nominal, pois. na verdade, atribuindo ao espirito


ou á consciéncia os predicados de etemidade. onidéncia, onipoténda, os
mestres estáo fazendo da consciéncia o Absoluto ou a DMndade.

164
O QUE É A IOGA 21

Patanjali, porém, o codificador das tradicóes ióguicas, reconheceu a


Divindade e recomendou a devocdo a Deus como o melhor meio de li-
bertacáo. Todavía nao é claro o conceito que Patanjali tem de Deus: ora
aparece como Oeus pessoal (Ishvera) ou como alma especial, suprema,
que é o instrutor e senhor dos mestres primitivos; ora aparece como a
realidade fundamental (Aum), que está subjacente a todos os seres, de
acordó com a filosofía monista ou panteísta.

Esta ambigüidade do conceito de Deus se explica do seguinte mo


do: a religiio mais antiga da india é politeísta, admitindo diversos deuses
configurados ao homem e heróis das estórias da mitología hindú. Poste
riormente a religiosidade dos indianos se tornou panteísta (= tudo é
Deus} ou monista (existe urna só realidade fundamental = mdnon). O
panteísmo se sobrepds ao politeísmo, de tal modo que este transparece
(com seus deuses} por debaixo do conceito de Divindade cósmica univer
sal.

Em slntese: a antropología da loga sup5e o dualismo de espirito


(realidade perfeita) e materia (capaz de amesquinhar o espirito); a combi-
nacio de um e outro produz o ser humano (purusa = iludido pela cor-
poreidade). Este deve tender a se emancipar da materia, que o engaña,
para viver a sua verdadeira vida, ao lado dos outros punisas libertados
ou, mais provavelmente, identificados com o Purusa universal, com a Di
vindade; nesse estágío final da evolucao, nao haverá mais distincáo de
pessoas (eu, tu, ele), mas a Realidade Una e Única, a Primeira Realidade,
¡ndiferenciada e indecifrável.

Pelo fato de admitir Deus e recolher diversas tradicóes religiosas, a


loga codificada por Patanjali pode tomar características profundamente
religiosas; muitos de seus seguidores ¡nvocam Deus com fervor, em ati-
tudes semelhantes ás dos cristáos, como se fosse um Tu distinto do eu
do devoto.

é com base nestas concepcóes doutrinárias que a loga ensina aos


seus discípulos exerclcios de ginástica e respira?áo, regimes de alimenta-
pao e sonó, tendentes a libertar dos empeculios do corpo a alma ou o es
pirito envolvido na materia.

Procuremos agora elucidar a questSo:

1.3. Compattob entre si loga e Cristianismo?

1. Para responder, é preciso distinguir entre a filosofía da loga e as


respectivas técnicas.

165
22 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 299/1987

A filosofía religiosa da loga, monista ou pantefsta como é, nao se


coaduna com o pensamento cristáo. Este é monoteísta, professando um
so Deus distinto do mundo e Criador deste, ao passo que a loga nao co-
nhece tal conceito ou mesmo o excluí.

Quanto aos exercfcios corporats da loga, podem ser praticados pe


los cristáos, desde que saibam encontrar urna motivacio crista e nao
pantelsta para os mesmos. Assim, por exemplo, o cristSo deve estar
consciente de que as suas práticas ascéticas nao visam a fazé-lo identifi-
car-se com a Divindade nem libertá-lo de um corpo supostamente mau
por sua própria natureza. "O cristáo pode praticar a loga como exerclcio
físico e como técnica psicológica, mas em seu próprio horizonte religio
so", afirma Quiles (obra citada, p. 67).

Praticamente, isto quer dizer que, quando um cristáo deseja entrar


num curso de loga, deve estar atento á filosofía que os seus ¡nstrutores
Ihe poderáo transmitir, a fim de nao a confundir com a mensagem do
Cristianismo. Geralmente os mestres de loga compartilham as doutrinas
pantefstas que desde as origens estSo assodadas aos exercfcios da mes-
ma; em conseqüéncia, o fiel cristáo há de ser muito cauteloso caso se
disponha a matricular-se em Centro de Treinamento lóguico. Muito a
propósito escreve o Pe. Quiles:

"Sem dúvida, a prática da. ginástica ióguica nao tem em si nenhum in


conveniente do ponto de vista religioso. Mas a matoria dos centros ióguicos
estáo inspirados, ao mesmo tempo, em doutrinas religiosas ióguicas, que se
misturam com a prática dos exercfcios de ginástica. Isto faz com que nos
centros ióguicos naja, em geral, um ambiente religioso que nao condiz com os
principios católicos. Neste caso, a experiencia nos diz que, se o católico nao
possui idéias claras, o efeito é contraproducente. Em vez da serenidade psi
cológica, com freqüéncia cai-se mima confusSo e, és vezes, distorcáo psíqui
ca, que desorienta e desequilibra mais a vida.

É preciso ter presente também que na matoria dos centros ióguicos falta
o nivel de seriedade científica que 6 de se desejar. e porisso com freqOéncia
distorcem a personalidade, em vez de orienta-la" (p. 68).

2. Precisando tais afirmacóes, o Pe. Quiles aponta quatro diferencas


doutrinárias existentes entre Cristianismo e loga:

1) A loga é pantelsta ou monista. "No fundo tudo é Um"; a diferen-


ca entre os seres é mera aparéncia. - Ao contrario, o Cristianismo distin
gue Deus de qualquer outro ser, como o Criador se diferencia das cria
turas; o homem e o universo tém sua realidade própria, que nao é a de
Deus, embora em tudo dependam de Deus.

166
O QUE É A IOGA 23

2) No tocante ao conceito de pessoa, a loga tecide a apagá-lo como


sendo algo de imperfeito ou parcelamento da Unidade fundamental. Ao
contrario, o Cristianismo enfatiza o valor da pessoa humana e o misterio
de um so Deus em tres Pessoas.1

3) Para a loga, todas as retigióes sao iguais. Este relativismo reli


gioso, se levado as últimas conseqOéncias, destrói todas as religióes, co
mo o relativismo filosófico anula todas as filosofías. - Existem verdade e
erro também err materia religiosa. O Cristianismo afirma que Jesús é "o
Caminho, a Verdade e a Vida" (Jo 14,6).

4) A reencamacSo, professada pela loga, é um postulado gratuito


ou nao comprovado. "A explicacSo dá origem do mal e da diferenca en
tre os homens nesta vida pode ter urna interpretado adequada dentro
dos dogmas cristaos, sem recorrer a cadeia de reencarnacSes... Nao
existe prava experimental e, por outro lado, a doutrina reencarnacionista
desfaz em sua raíz a personalidade: se eu sou agora eu e no século pas-
sado fui NapoleSo, e no século XVI um mendigo e no século I um pesca
dor, entáo pergunto-me: quem sou eu? Aqui a metafísica e a religiáo 1a-
zem, ao mesmo tempo, tremendas interrogares" (p. 70).

Eis, em sfntese, o que Ismael Quiles S. J. prop6e de valioso em seu


livro: urna boa explanacáo e urna crltjca equilibrada do pensamento da
loga. Todavía parece-nos ¡ndispensávél acrescentar urna restriego é obra
do autor.

1.4. Urna reserva

Á p. 46 escreve Ismael Quiles:

"É ¡negável que temos urna serie de centros espirítuais que inñuem em
nossas glándulas de secrecáo... O controle oestes centros está em boa parte
em nossas máos. E o que 6 controlar estes centros senáo dispó-bs para re-
ceber a energia vital do universo e transmití-la ao nosso organismo? Que é
controlá-tos senáo tratar de situá-los e comunicá-los com as tontes de energia
universal? Em termos cristaos, esta tente 6 Deus. A alma, para continuar nos
mesmos termos, faz o corpo viver e vive ela mesma por essa torga que rece
be do cosmo circundante, que transmite e comunica aos outros seres, mas
que, em última análise, senté que vem de um principio absoluto e transcen
dente que 6 Deus" (pp. 46s).

^Está claro que as Pessoas divinas nSo devem ser entendidas em sentido
unívoco com as pessoas humanas; há apenas analogía entre aquetas e estas.

167
24 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 299/1987

Estes dizeres reduzem o enconro da alma com Deus ao plano físico;


sería um encontró de energías; Deus faria viver cada ser humano me
diante a comunicagáo de urna corrente semelhante, talvez, á da eletrici-
dade. Deus seria a fonte de urna energía vital universal, que se transmite
ao "cosmo circundante" e, mediante este, á cada alma. - Ora estas con-
cepgóes carregam em si resquicios do panteísmo que os mestres da loga
expuseram a Ismael Ouiles na fndia e que este em outras páginas do seu
livro rejeita.

Deus é puro espirito; nao é energia fluida nem corrente ou fluxo de


energía quantitativa ou comensurável. Ele pode, sim, criar energías
quantitativas, materiais, mas nao as emite a partir de si como urna fonte
de eletricidade as emite. Ele sustenta cada criatura na existencia por seu
poder, que nao necessita de produzir energia material para se exercer.

Há, pois, urna incoeréncia misteriosa no trecho assinalado. Verdade


é que o autor o faz preceder de urna observacáo cautelosa: "Vamos expor
sinceramente nossa opiniáo, embora tenhamos que confessar que é urna
materia na qual nos movemos com temor" (p.46).

Feita esta ressalva, eremos que o livro de I. Quíles poderá ser útil a
muitos leitores.

2. "Sementes de Harmonía"

por Julio Maran

O autor é orientador educacional, professor de loga e radiestesia.


Aprésenla um livro1 portador de considerares teóricas sobre a harmo
nía do homem consigo e com o universo, além de ¡ndicacóes precisas so
bre posturas do corpo, alimentacáo, respiracáo, etc.

A parte técnica do livro merece respeito. Quanto d seceáo filosófi-


co-relígiosa, é nitidamente pantefsta. Isto faz de tal obra um espécimen
do que geralmente ocorre nos cursos de loga: a técnica é ensinada jun
tamente com a teoria originaria hindufsta, que nao se coaduna com o
pensamento religioso cristáo. Eis alguns dos trechos mais significativos
do livro no tocante á filosofía:

"Ouando vocé trabalha o corpo na toga, vocé nao mexe com músculos,
ñervos, ossos, etc., mas um TEMPLO, onde habita urna centelha cósmica,
urna sementé divina" (p. 22).

'toga Sementes de Maimona Ed. Loyola, Sao Paulo 1986,


140x210mm,51pp.

168
O QUE É A IOGA 25

"O ioga como superacSo da dialética sujeitwbjeto é caminho para o


SerRearfp. 12).

"É a sensibiSdade que vai captar as vibracdes do Absoluta" (p. 12).

"O silencio é saóde, harmonía, paz, energía, Deus" (p. 11).

O ponto de chegada da meditacáo ióguica é o "SarnadN (identiBcacSo


do ser individual com o Ser ReaT (p. 13).

Estes e outros trechos inspirados por filosofía pantefsta sSo mes-


dados a outros em que Deus aparece no sentido monoteísta cristáo (p.
12), como figuram também ao lado de citacóes de autores católicos como
Thomas Merton (p. 23) e Teilhard de Chardin (p. 10.24).

Estes dados tornam o tivro ambiguo. O cristáo deverá saber distin


guir, em suas páginas, os ensinamentos técnicos das proposites filosófi- •■
cas que os acompanham, o que nem sempre é fácil a um leitor despre
parado. Por isto ¡ulgamos que tal obra nao deveria ter sido publicada por
urna Editora católica. Infelizmente, porém, na quarta capa do livro o ob
servador verifica que as Editoras Loyoia (Sao Paulo) eVozes (Petrópolis)
ou publicam ou divulgam sete outras obras do mesmo autor, de teor
maisou menos semelhante.

3. "El Raja Yoga de San Juan de la Cruz"


por Swami Siddheswarananda

Esta obra1 se deve a um mestre indiano, falecido em 08/05/1957.


Apresenta um estudo comparativo da "Noite Escura" de Sao Joáo da
Cruz com o Ashtamga-Yoga (loga das Üito Ramitiracóes) de Patánjali.
Em poucas palavras, pode-se dizer que tenta mostrar a correspondencia
entre o itinerario espiritual de Sao Joáo da Cruz e da mística crista, de
um lado, e o caminho que a loga aponta para levar á Uniáo Perfeita, de
outro lado. Assim.

1) a vía purgativa, compreendendo o trabalho que a alma deve


exercer sobre si mesma, teria por equivalente o yaman-niyama (regra de
disciplina e purificacáo mental) da loga;

2) a vía contemplativa correspondería, na loga, a pratyahara


Oharana y Dhyana, isto é, o recolhimento, a concentragio e um estado de
meditagáo contemplativa;

1Ed. Orion, México 1974, 120 x 180 mm, 108 pp.

169
26 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 299/1987

3) a via unitiva, a da uniáo com Deus (o autor em foco diz: "uniáo


com o divino", isto é, com algo de neutro), corresponde ao estado em
que a Divindade se apodera por completo da alma (purvsha).

Após afirmar tal correspondencia de estágios (pp. 21-28), Swami


Siddheswarananda observa: "Podemos dizer, sem vacilar, que conside
ramos 53o Joáo da Cruz como o Patñnjali do Ocidente" (p. 28).

A seguir, o autor tenta mostrar como os termos "concentracáo,


meditacao, contemplacáo e contemplado infusa" de Sao Joáo da Cruz
tém seus equivalentes na loga; o diretor de consciéncia ou também a
Igreja seria o gurú; Jesús Cristo seria o Istham; os demonios, os sidhis
(pp. 50s). Após muitas considerares e comparacóes de textos, o mestre
hindú termina seu livro dizendo: "Entre os místicos cristáos, aos quais
podemos aplicar de algum modo o termo iógui, Sao Joáo da Cruz pode
ser chamado o lógui por excelencia, pois nele se unem harmoniosamente
todos os elementos dos diferentes logas, mantidos em conjunto pela su
premacía da Fé crista" (p. 105). A mesma afírmacáo é repetida a p. 61 em
termos semelhantes: "Sao Joáo da Cruz pode, com pleno fundamento,
ser considerado como um dos grandes raja-ióguis".

Quem lé tal livro, tem a impressSo de que o autor quer mostrar


como todos os místicos - cristáos ou hindus - praticam semelhantes
exerclcios mentáis e disciplinares, procurando dominar a memoria, a
fantasía e os sentidos em geral a fim de que a mente se possa elevar mais
livremente aos valores divinos. Este propósito é válido, pois, a estrutura
psicossomática sendo a mesma em todos os seres humanos, é necessário
que todos facam semelhantes experiencias e exercfcios para dar a su
premacía ás suas faculdades espirituais (inteligencia, vontade...).

Todavia nao se pode ir além da semelhanca no plano das práticas


ou dos exerclcios. Na verdade, a filosofía religiosa ou as concepcóes teo
lógicas de Sao Joáo da Cruz sSo totalmente diversas das da loga: aquelas
sao cristas, monoteístas, ao passo que as da India sao panteEstas-monis-
tas. Esta diferenca radical no tocante ¿ teología nao pode ser esquecida,
pois é de importancia capital; por causa de tal diversidade eremos que
nao convém atribuir a Sao Joáo da Cruz o titulo de iógui, pois isto seria
criar ambigüidades, ambigilidades que repugnam a quem caminha pelas
vias da sinceridade e da verdade.

É, sem dúvida, pouco agradável apontar diferencas a irmáos que,


ao contrario, procuram identificar escolas diversas. Tal atitude penosa,
porém, é exigida pelo bem comum. Quem eré na Verdade e sabe que ela
se manifesta aos homens, sente-se impelido a respeitá-la e a evitar que
seja obscurecida a sua identidade. A Verdade é patrimonio de todos os
homens, que deve ser guardado incólume por quem tem a certeza de a

170
OQUEÉAIOGA 27

ter descoberto, a fim de que possa reluzir, na sua integridade, aos outros.
Já os antigos diziam: "Amicus Plato, magis árnica ventas. Amigo é Pla-
táo; maís amiga, porém, é a verdade".

0 diálogo religioso preconizado pelo Concilio do Vaticano II leva os


fiéis católicos a se encontrar com os nao cristáos numa atitude de escuta
e disponibilidade para os valores comidos em outras correntes religio
sas, mas também numa atitude de incondicional servico a Verdade re
velada pelo Senhor Jesús.

O Concilio do Vaticano II reconhece tais valores ñas religióes hindufstas:

"No hindufsmo, os homens perscrutam o misterio divino e expri-


mem-no com a inexaurfvel fecundidade dos mitos e com os esforcos
penetrantes da filosofía. Os hindulstas procuram libertar-se da' angus
tias da nossa condicáo, seja através das formas de vida ascética, seja na
meditacao profunda, seja ainda no refugio em Deus com amor e con-
flanea. O budismo, ñas suas variadas formas, reconhece a insuficiencia
radical deste mundo mutável e ensina a via através da qual os homens,
com coracáo devoto e confiante, poderáo atingir o estado de libertacáo
perferta, ou chegar ao estado de lluminacio suprema por meio dos pro-
prios esforcos ou com a ajuda vinda do alto" (Declaracáo Nostra Aelate
n5 2).

Com isto o ConcISo está tonge de proclamar o relativismo religioso. Ao


contrario, reconhece a Verdade onde ela se encontra, semdesdizera mensa-
gem apregoada pelo Evangelho.
• • m

(continuacao da p. 178)

A guisa de comentario final, acrecentamos: pódese dizerque Svetla-


na é a testemunha viva daquelas palavras que ela proferiu logo ao desembar
car em Nova lorque: "i ¡mpossfvel viver sem Deus no coracSo". Tal é o bra-
do do maís profundo da natureza nSo s6 de Svetlana, mas de todo ser huma
no; esse brado brotou do íntimo de Svetlana apesar da educacSo atéia que
recebeu; a filha de Stalin experimentou tudo o que há de antinatural nesse
regime. — Talvez, porém, nao tenha encontrado no Ocidente o testemunho
de vida crista que ela esperava achar; tsto a terá decepcionado; assim se ex
plicaría o seu retorno á Rússia. Finalmente, porém, parece prevalecer de no
vo o bom senso em Svetlana, que quis escapar da violencia do ateísmo, para
tentar descobrir auténtico ambiente de vida cristS no Ocidente. — Permita
Deus que o descubra! Compete aos cristSos ocidentais oferecer-lho.

Estévao Bettencourt O.S.B.

171
Vinte e cinco anos após a sua morte:

Que pensar de Teresa Neumann ?

Em síntese: Há vinte e cinco anos (18/09/1962) (saetía Teresa Neu


mann, camponesa de Konnersreuth (Alemanha Oddental), temosa pelos es
tigmas que trazia e por outros sinais extraordinarios. O caso de Teresa foi
estudado por médicos, psicólogos, lingüistas, eclesiásticos..., cuja opinióes se
dividem sobre o assunto. A própria autoridade diocesana de Ratisbona (dio-
cese de Teresa) manteve-se até hoje reservada, embora se mostré disposta a
comecar o piocesso canónico que examina toda a documentagSo, oral e es
crita, referente a Teresa.

O que importa, em Teresa Neumann, é muito mais a santídade de vida


do que os seus fenómenos extraordinarios. Caso se possa compmvar que
exerceu a virtude em grau heroico, a Igreja estará mais aberta a reconhecer
nos falos extraordinarios a intervengSo de Deus. A razio da prudencia da
Igreja diante destes é o progresso das ciencias psicológicas e parapsicológi-
cas, que explicam por vias naturais fenómenos humanos outrora tídos como
milagrosos. Deus age entre os homens constantemente por vias ordinarias,
que a fé sabe compreender e assimilar; as intervencóes extraordinarias do
Senhor nao sao essenríais á santifícacáo dos homens. Deus as pode reaSzar,
sem dúvida, mas é preciso que os cristSos nao se precipitem ao avallar as
oconéndas extraordinarias; antes, procurem ouvir a voz da Igreja, que tem
seus criterios para discernir os tíons de Deus.

Aos 18/09/1962 faleceu em Konnersreuth (Baviera, Alemanha Oc¡-


dental) urna camponesa famosa no mundo ¡nteiro, porque parecía trazer
os estigmas do Senhor Jesús e quase todas as sextas-feiras entrava em
extase e revivía na sua pessoa as fases da PaixSo de Cristo. Outros fenó
menos extraordinarios se associaram ao nome de Teresa Neumann, de
modo que estudiosos de diversas nacdes se interessaram pelo caso, pro
curando analisá-to e interpretá-lo. As opinióes, porém, estiveram sempre
divididas a respeito de Res!, Teresinha, em alemao familiar.

172
TERESA NEUMANN 29

Vinte e cinco anos após o falecimento da vidente, apresentamos um


noticiario a propósito da mesma, incluindo fatos passados e presentes.

1. Teresa Neumann: quem era?

Teresa nasceu aos 09/04/1898 em Konnersreuth, povoado de 1.500


habitantes situado no extremo S.O. da Baviera. Era a primeira de dez fi-
Ihos de um casal cujo esposo era campones e alfaiate. Freqüentou apenas
as primeiras series da escola. Era piedosa, sem chamar a atencáo por sua
devocio; mostrava-se muito simples, modesta e mansa, interessada
principalmente por assuntos religiosos. Nao pensava em namorar; antes,
esquivava-se aos rapazes. Com dezesseis anos de idade, foi enviada a
trabalhar junto a camponeses de certo bem-estar. Oesejava tornar-se be-
neditina missionária, quando Ihe sobreveio um fato decisivo para o resto
da sua vida.

Aos 10/03/1918 ¡rrompeu um incendio na aldeia; com efeito, num


domingo, quando se dirigía á igreja para participar da S. Missa, Teresa
observou que do telhado de urna casa saiam chamas; jovem corajosa e
robusta como era, deu logo o alarme; formou-se entio urna corrente de
pessoas que, com baldes de agua, se.esforcavam por apagar o fogo; tre
pada numa escada, Resl entregava os baldes chelos a quem os devia des
ea rregar sobre as chamas. Deu-se, porém, um acídente, em conseqüéncia
do qual Teresa passou a sentir lancinantes dores ñas costas; o médico
diagnosticou lesáo na espinha dorsal, com o perigo de serias com plica-
coes.

Apesar de tudo, a jovem continuou a trabalhar, pois seus irmáos se


achavam ñas frentes de guerra, de modo que caiu, outras vezes, de esca-
das. Em conseqüéncia, comecou a sofrer de urna especie de parálisis.
Obligada a ficar deitada, quase nao se levantou desde o fim de 1918 até
1923. Mais: em 1919 foi acometida de cegueira completa (recordando tal
periodo, dizia Teresa que haviam sido "os mais belos anos de sua vida").

A seguir, o seu estado pós-se a melhorar. Aos 29/04/1923, Pió XI


beatificou Teresinha de Lisieux; ora Teresa, que sempre invocara a jovem
carmelita, recuperou entSo a vista muito surpreendentemente. Dois anos
mais tarde, quando a mesma santa foi canonizada (25/05/1925), Teresa
Neumann pode levantar-se da cama, sem empecilho algum para andar.

Logo no ano seguinte (1926), na Semana Santa, Teresa comecou a


aparecer com estigmas ñas m3os, nos pés e no tronco, que lembravam
os do Senhor Jesús em sua PaixSo. Durante os restantes 36 anos de sua

173
30 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 299/1987

vida, nada ingeriu de sólido a nao ser a S. Eucaristía (recebida em frag


mentos de duas gramas e meio de pao ázimo); bebeu algumas poucas
gotas de liquido. Dormia urna ou duas horas por noite, nao de modo
continuo. Todas as sextas-feiras entrava em éxtase e experimentava em
seu corpo a dolorosa realidade da Paixáo de Cristo; corriam-lhe dos
olhos lágrimas de sangue, que Ihe marcavam a face. Saia-lhe sangue
também dos estigmas do peito, das mios e dos pés. Aproximadamente
setecentas vezes Teresa assim reviveu a Paixáo de Jesús; mais intenso
era o seu sofrimento as sextas-feiras santas: a zero hora perdía total
mente a consciéncia da realidade que a cercava e passava a contemplar
em seu íntimo cerca de cinqüenta cenas da Paixáo; nada sentía nem vía
com os sentidos externos, mesmo quando submetida a violentas pravas:
numa noite um médico Ihe lancou sobre o rosto a luz de poderosa lám
pada de 5.000 watt, sem que Teresa tenha reagído. Só voltava ao normal
na manhá do domingo de Páscoa, como quem recomeca a víver; lembra-
va-se entio claramente das cenas que contemplara em éxtase.

Tais fenómenos fizeram de Teresa e de Konnersreuth o alvo da


atencáo dos jornalistas como também dos cristáos de diversas partes do
mundo; especialmente ás sextas-feiras da Quaresma era enorme a ocor-
réncia de onibus e carros particulares na pequeña aldeia. - Sem demora
comecaram as discussóes em torno do caso Neumann por parte de mé
dicos, psicólogos, lingüistas... As opinióes mais contradítórias chocavam-
se entre si.' A ascensáo do nacional-socialismo de Adolf Hitler em 1933
provocou apreensóes, pois se receava que o regime quisesse por termo
ao caso. Todavia os governantes da Alemanha se intimidaram diante de
posslveis protestos da opiniáo pública nao só na Alemanha, mas também
no estrangeiro (pois o caso era de interesse internacional). NSo faltaram,
porém, vexames a Teresa. Durante a guerra escapou milagrosamente
dos bombardeios certa vez quando se encontrava na igreja a rezar.

Após o término da guerra em 1945, recomecaram as peregriqacóes


a Konnersreuth, mesmo a partir do além-mar. A estigmatizada em nada
contribuía para alimentar esse afluxo; raramente se afastava da sua aldeia;
a ninguém, ou quase ninguém, respondía, apesar dos milhares de cartas
que recebia. Soube resistir especialmente aos repórteres norte-america
nos, que queriam fazer a publicidade do "milagre" de Konnersreuth.

Um dos prodigios que ocorriam durante os éxtases de Teresa, era o


fato de que falava aramaico, embota tivesse pouca instrucáo. Quando,
por exemplo, via Pilatos mostrando Jesús á multidáo, Teresa ouvia
muito bem o clamor aramaico Chalapa (Crucifica-O). Ouvia também o
Senhor crucificado dizer: Es-que (Tenho sede). O professor WuU, filólo
go perito em llnguas antigás, discordou de Teresa, alegando que Jesús
devia ter dito: Sachana; quando, porém, os pesquisadores investigaram a

174
TERESA NEUMANN

fundo o assunto, verificaram que Teresa tinha razáo: a expressáo que ela
ouvia, era precisamente a que se usava nos tempos de Cristo.

Alias, nSo somente o aramaico era utilizado por Teresa ao relatar


suas visóes; falava também em grego, em latim, como ainda em llnguas
mais recentes: assim o italiano de S. Antonio de Pádua, do qual era muito
devota, o francés provencal de Bernadete Soubirous, a vidente de Lour
des...

Quiseram os estudiosos levar Teresa para urna Clínica, a fim de


examinarem mais apuradamente os seus fenómenos. Contudo tanto a
vidente como o seu pai se recusaram a isto; sao palavras do velho cam-
ponés e alfaiate: "Nao deixarei partir a minha filha para fazer experien
cias, nem mesmo a título de promover a ciencia". Teresa afirmava: "NSo
é verdade que vivo de nada, pois vivo do Salvador".

A resistencia a exames médicos mais precisos fez que aumentas-


sem as suspeitas de muitos sobre a autenticidade religiosa dos fenóme
nos observados: n3o se trataría de urna farsa montada pela interessada e
por seus familiares? - Verdade é que, conforme Johannes Steiner, na sua
obra Theres Neumann von Konnersreuth, a familia a principio nao foi
refratária a investigares científicas; com efeito, este autor refere que em
julho de 1927 (logo no inicio da historia extraordinaria), com a aprovacSo
do Bispo de Ratisbona, a estigmatizada foi observada de perto por urna
comissSo médica e quatro Religiosas ditas "Mallersdorfer Schwester";
estas - duas de cada vez- teráo passado quinze dias ao lado de Resl, sem
a deixar a sos por um momento do dia ou da noite; observaram "prescri-
cfies que haviam recebido dos médicos e das autoridades eclesiásticas e
que haviam jurado cumprir com fidelidade". Chegaram a medir a quanti-
dade de agua com a qual lava va a boca. Em conclusáu, diz Johannes
Steiner, as Irmas durante quinze dias nao puderam notar o mais leve
consumo de alimento sólido ou liquido.

Consideremos agora a pergunta:

2. Que pensar a respeito?

Durante os vinte e cinco anos que se seguiram a morte de Teresa, o


seu túmulo tem estado coberto de um "mar de flores" e cercado de ins-
cri;6es como: "Recebemos tal ou tal graca por intercessáo de Resl".

Os adversarios do caso tentam explicá-lo por histeria de Teresa ou


por vias parapsicológicas. Há, porém, dentistas, como o Pe. Agostinho

175
32 "PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 299/1987

Gemelli O.F.M., fundador da Universidade do Sagrado Coracáo (Miláo) e


o Prof. Woltry, que negam qualquer vestigio de histeria nos fenómenos
estudados. A célebre grafóloga E. von Brach examinou a grafía (a escrita)
de Teresa, sem saber de quem era e concluiu nao haver al sinal algum de
doenca nervosa.

Apesar de tudo, as autoridades da Igreja tém-se mostrado reserva


das e cautelosas diante dos fenómenos e da memoria da vidente de
Konnersreuth. Tres bispos tiveram que ocupa r-se com o caso até agora:

1) O primeiro foi Mons. Michael Bruchberger, que se tornou dioce


sano de Ratisbona em 1927 e governou esta diocese até 1962. Declarou
oficialmente aos 27/11/29: "Interessa-nos, antes do mais, a vida santa de
Teresa Neumann; se esta fattasse, os demais elementos de nada vale-
riam". Assim falando, Mons. Bruchberger fazia eco ao Papa Bento XIV
(1740-58), que declarara: "Sofrer por motivos extraordinarios, como sao
os estigmas, nao pode servir isoladamente para provar a santidade de al-
guém". - De resto, dentre 320 estigmatizados que a Igreja Católica co-
nhece, somente sessenta e poucos foram declarados santos ou bem-
a venturados.

Ainda em consonancia com tal atitude, o episcopado alemáo se


pronunciou em 1952 nestes termos: "Em atencáo ¿s disposicóes do Papa
Urbano VIII, declaramos que só se deve prestar credibilidade humana
aos fatos de Konnersreuth enquanto a Igreja nao se pronunciar de outra
forma".

2) O segundo bispo que teve de tratar do assunto, foi Mons. Rudolf


Graber, que assumiu o governo da diocese de Ratisbona aos 28/03/1962,
isto é, poucos meses antes da morte de Teresa. Mostrou-se assaz favorá-
vel a Teresa. Em 1980 manifestou pelo radio a sua simpatía pelo caso,
que ele conhecia desde 1926, afirmando que Teresa "nSo fingirá as visSes
e as suas dores". Aos numerosos críticos e céricos Mons. Graber censu
ra va um preconceito profundo em relacSo aos valores transcendentais.
No seu pronunciamento, porém, enfatizava que é preciso nao nos deter
mos sobre os fenómenos ¡solados, como sao os estigmas, para afirmar a
santidade de alguém. Observava que Teresa tivera seus defeitos, suas
fraquezas, mas também dons de Deus "em tal medida que deveriam ser
levados em corita". E continuava: "Para avaliar a situacáo atual, sSo mais
importantes os ensinamentos explícitos contidos na existencia de Teresa:
o seu amor á Cruz deve-nos fazer pensar, a nos que vivemos numa época
avessa ao sacrificio e á Paixáo; o seu amor a Jesús Eucarístico é um .
exemplo necessário contra a recusa moderna deste Santlssimo Sacra
mento".

176
TERESA NEUMANN 33

Mons. Graber levou a termo algumas pesquisas e indagacóes diri


gidas a centenas de testemunhas oculares do caso Neumann.

3) O sucessor de Mons. Graber, o atual Bispo de Ratisbona, Mons.


Manfred Müller, ainda nao resolveu abrir o processo canónico em nivel
diocesano. Desde que tomou posse de sua diocese aos 16/06/82 até
agosto de 1986, nada dissera em público sobre o caso. Porta-vozes da
Curia Episcopal dio a entender que em breve recomecará o interrogato
rio das testemunhas, especialmente daquelas que se dizem contrarias a
Resl; seráo examinadas cartas e outros escritos da estigmatizada, assim
como fotografías, filmes e as dezenas de fitas gravadas durante as horas
de visóes e éxtase de Teresa. Existe grande número de documentos que
ficaram intactos sob a custodia do atual pároco de Konnersreuth, Pe.
Antón Vogl.'

Há, sem dúvida, vozes abalizadas que falam em favor da vidente


em meio a um conjunto de céticos. Assim, por exemplo, refere-se que
Pió XI terá um dia exclamado: "Nao toquéis em Teresa Neumann..."
Também o primeiro Bispo de Ratisbona, que acompanhou os fenómenos
durante decenios, o já citado Mons. Bruchberger, observava em 1953 que
aqueles que iam a Konnersreuth voltavam de lá "atendidos ou ao menos
consolados"; outros "de novo encontravam lá a fé ou eram corroborados
na sua crenca"; quem nao tinha a graca da fé, sentia-se ao menos "per
turbado", sacudido, impressionado e eomecava a refletir seriamente so
bre o caso.

3. Conclusáo

A parapsicología em nossos días explica muitos fenómenos outrora


tidos como resultantes de extraordinaria intervengo divina ou como mi
lagres. Dar a cautela de muitos estudiosos diante de visóes, estigmas,
éxtases...; podem ser a expressáo de um psiquismo excitado ou de um
subconsciente fantasioso. A Igreja é sabia quando submete a exames os
fatos extraordinarios ocorrentes com seus filhos.

Isto, porém, n§0 quer dízer que Deus n8o se queira manifestar,
num ou noutro caso, através de fatos impressionantes, mais eloqüentes
do que os habituáis; os milagres nao estáo excluidos do plano de acáo da
Providencia Divina. Todavía háo de ser devidamente identificados como
sinaís de Deus; no caso, a vida humilde, entregue a Deus e santa de Tere-;
sa, como também os frutos (conversóes, fortalecimento da fé, genufnas
curas».} obtidos em Konnersreuth poderlo contribuir para autenticar os
fenómenos registrados nessa aldeia e levar a conclusáo de que Deus, por
essa via, quer despertar os homens - crentes e nao crentes - para reco-

177
34 "PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 299/1987

nhecerem o apelo do Senhor á imitacáo de Cristo e a santificacio eres-


cente.

0 fiel católico aguarda com submissao o pronunciamento da Igreja


sobre o caso de Konnersreuth, consciente de que os dons extraordinarios
nao sao essenciais para a salvacáo dos homens; Deus os outorga quando
e como quer, sem que os possamos exigir. Para que o cristSo entenda e
assimile o que Deus Ihe quer dizer mediante intervencóes extraordina
rias, é preciso que exercite a fé nos sinais cotidianos e ordinarios de Deus,
conforme a advertencia do Senhor Jesús no Evangelho: "Se nao escutam
nem a Moisés nem aos Profetas, mesmo que alguém ressuscite dentre os .
mortos, nSo se convenceráo" (Le 16,31}.

(contínuagáo da p. 192)

A propósito a jornalista Franca Zambonini, em "Famiglia Cristiana"


de 23/04/1986, p. 58 publica um parecer emitido por Irina Alberti, perita
em sovietismo e diretora do jornal La Pensée Russe, dos emigrantes russos
de Paris:

"O pedido, de Svetlana, de deixar a UniSo Soviética para voltar ao


Oddente é outro sinal da inquietude dessa pobre senhora, que nunca encon-
trou paz. especialmente nunca na sua patria. Eu soube por pessoas que fre-
qüentavam Svetlana em Cambridge, onde elapassou os últimos temposantes
de voltar á UñSS, que ela se fechara em si mesma, vftima de forte depressSb,
e procurava alivio no álcool. Tal era a conseqüéncia final dos profundos
traumas psicológicos que ela nunca teve a forca e a clareza de mente para re
solver e que a levaram a desorientarse.

Toda a vida de Svetlana foi um desastre. Teve um pai que, a seu modo,
a amava e que ela amou, descobrindo mais tarde que ele era um monstro
(expressao usada pela própria Svetlana); teve urna mSe suicida. Foi, a prin
cipio, adulada como filha do 'pai dos povos', com um misto de reverenda,
terror e inveja; depois rejeitada como urna espade de herdeira do reino do
terror e do sangue. Foi renegada pelos dois filhos deixados em Moscou, com
os quais esperava reconciliarse ao voltar; mas também nisto iludiu-se.

A fé teña podido salvé-la; ela p'rocurou crer, talvez aínda o procure,


mas confusamente, sem chegar é clareza e á paz do coracSo. Imagino que, se
Hitler tivesse tido filhos, teriam sido infelizes como Svetlana".

(continua na p. 171)

178
Aleksandr Ogorodnikov escreve:

Carta de um Campo de Concentrado

Em símese: Abaixo vai transcrita em traducSo portuguesa urna carta


do prisioneiro russo Aleksandr Ogorodnikov. de 37 anos de idade, encarcera-
do por motivos religiosos para o resto da vida. Escreve é sua mié, lembran-
do-lhe que tem sido deixado só e esqueddo; a única esperanca (humana/ de
tais prisioneiros é o alarde que os familiares fazem em favor deles ¡unto é
imprensa estrangeira; as autoridades soviéticas se intimidam quando se espa-
Iha a fama dos tratamentos desámanos infligidos aos prisioneiros. Ocorre,
porém, no caso de Aleksandr que a mSe e os familiares parecem acovardados
e tém medo de sofrer represalias, desde que se interessem pelo filho ou pelo
párente encarcerado. Este expande sua tristeza com palavras dilaceradoras;
tres vezes tentou suicidarse e pede que os familiares roguem ás autoridades
que o condenen) á morte; a sua vida ¡á nao Ihe parece ter sentido. O único
reconforto que experimenta Ihe vem da fé, mas esta nSo pode ser alimentada
pela leitura da Biblia nem pelo uso de algum livro de oracOes, nem pela prá-
tica explícita da oracSo, pois os carrascos Ihe impedem a prática visivelda
religiao. - Aos cristSos otídentais compete interessar-se por Ogorodnikov e
milhares de outros ¡rmSos detidos por causa da sua fidelidade ao Senhor
Jesús.

* * *

Aleksandr Ogorodnikov nasceu em 1950 na cidade de Cistopol (Repú


blica Tártara, URSS) de país comunistas. Desde adolescente, distinguiu-se
por sua írrequietude e pela procura do sentido da vida. Por duas vezes foi
expulso da Faculdade de Filosofia em virtude de comportamento "fora das
regras". Matriculando-se no Instituto Superior de Cinematografía no principio
da década de 70, reuniu em tomo de si um grupo de amigos que faziam as
mesmas perguntas.

Urna etapa fundamental da sua conversáo foi assinalada pelo filme "O
Evangelho segundo Mateus" de Pasolini, que, na qualidade de estudante do

179
36 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 299/1987

Instituto, ele pudera ver. Em 1973 fo¡ expulso do Instituto de Cinematogra


fía. Em 1974 recebeu o Batismo. Aínda em 1974 organizou reunioesdees
tudo. ou seja, o "Seminario Filosófico-religioso de Moscou", a fim de apro-
fundar os efeitos que a cultura crista possa ter na construcio da realidade
presente.

Em 21 de novembro de 1978 fot encarcerado. Mas nao se encontrou


outro título para condená-lo senáo o de "parasitismo". O tribunal o puniu
com um ano de campo de concentracao. Todavía a sua recusa de qualquer
compromisso e a vontade, do regime, de manté-lo ¡solado explicam que, ao
terminar o ano de pena, tenha sido preso no próprio campo de concentrado
e enquadrado dentro do artigo muito severo de n?70: "agitacáo e propagan
da antisoviética". Isto valeulhe a condenacio por mais onze anos. Antes
que terminasse esta segunda pena, em novembro de 1985, foi detido nova-
mente no campo de concentracao e processado na base do artigo 188-3:
"grave insubordinacáo as autoridades do campo". Assim aos cinco anos de
pena que ainda Ihe f altavam, somaram-se mais tres.

Em maio de 1986, após longo silencio, Ogorodnikov enviou para fora


do campo de concentracáo algumas cartas e um relatório minucioso de to
dos os abusos e violencias de que era vítima nos últimos oito anos. Eisque
neste último se pode ler:

"Quima dias de cércete ¡solado, porque o botáo superior da farda es-


tava quase soltó. Cinco días, porque eu cam'mhava nao alinhado, Dez días,
porque copiara á mió o salmo 50. Cinco dias, porque compartilhara urna ti
gela de sopa com meu companheiro de cela. Dez dias, porque tomara parte
numa reuniSo de prísioneiros (bebíamos chai. Sete dias, porque fui encon
trado de ¡oelhos entre os leitos em oracSo (mas na verdade rezo todos os
dias). Sete dias. porque o meu pequeño armario se encontrava em condicoes
antihigiénicas (continha mais de cinco livros)".

A tonga lista se encerra assim: "Além de tudo isto, em sete anos nSo
recebi urna visita particular (sempre foram canceladas); tive urna só visita
breve (de duas horas, em julho 1982);tiraram-me todos ospacotes e proibi-
ramrne de fazer compras na loja vinte e nove vezes".

Seguem-se trechos de urna carta de Ogorodnikov a sua mae. É violento


ato de acusacáo porque os genitores se deixaram tomar pelo esquec¡mentó e
pelo medo, atitudes estas que afetam muitas vezes também os cristaos oci-

180
CARTA DE CAMPO DE CONCENTRACÁO 37

dentáis. Nao faltam, porém, pedidos de perdao: "Mamáe. papai, Helena, per-
doem-me as palavras fortes, ásperas e cheias de censura. Perdoem-me miseri
cordiosamente todas as maldades que Ihes disse. Mas eu sentia dentro de
mim urna grande dor e, ao exprimi-la, rompí os diques".

* * *

O TEXTO DE OGORODNIKOV

Mamáe can'ssima.

Finalmente apresentou-se urna breve ocasiao de falar abertamente.


Gloria seja dada a Cristo! Antes do mais, tenham a conseiéncia de que, se vo
ces nao recebem de mim duas cartas por mes, devem preocuparse; no me-
Ihor dos casos isto significa que as cartas foram confiscadas; pode também
significar que me puseram em cela solitaria ou na prisao do campo de con-
centracáo ou que me foi infligida alguma outra punicao. Habitualmente em
tais casos os familiares dos outros prisioneiros polfticos dao o alarme, man
dando explicacoes e pondo-se em contato com os correspondentes estran-
geiros. Tudo o que eu Ihe escrevo, minha esposa Lena deve sabé-lo. Cuide,
de todo modo, de que ela leia esta carta.

Eu sou o mais desinformado de todos os prisioneiros. Compreendo,


mamáe. que levar esta vida, morando em Cistopol e com a saúde que voce
tem. . . A sala do tribunal vazia, onde, além dos agentes do KGB, estavam
apenas vocé e a tia Vera (a quem mando um abraco), é a prova sintomática
de que se perdeu todo interés» pela minha causa, causa do renascimento
religioso na Rússia, e de que a acSo dos cristaos é fraca.

A indiferenca de voces em relacSo a mim, a inercia, a absorcSo pelos


seus assuntos particulares traduzem-se, para mim, num sentimento de solí-
d3o. de abandono, de tristeza, pois em última análise ná*o estou em campo
de concentracSo por causa de mim pessoalmente, mas pela Santa MSe Igreja
e pelos outros. E o silencio forcado de voces, no momento em que sufocava
os meus gritos atrás dos espessos muros da cela, é urna tácita cumplí cidade
com os meus perseguidores. Durante um ano e meio voces nSo receberam
cartas minhas, e só no fim deste período comecaram a dar sinais de preo-
cupacáo. Os familiares dos outros, apos um mes de silencio apenas,
pSem-se logo em movimento. Por certo, é penosa a lembranca da sala do tri
bunal vazio, onde nSo havia um só dos meus amigos. Isto mostra claramente
que me esqueceram. No próximo julgamento a sala estará totalmente vazia.

181
38 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 299/1987

O meu futuro depende, em grande parte, da atitude de vocfis. Os en-


carcerados cujos familiares movem a opiniSo pública mundial e mantfim viva a
recordacSo dos seus caros prisioneiros, saem, no tempo devido, destas esquá-
lidas paredes sem novas condenacSes; e — nao so ¡sto — recebem no próprio
campo de concentracáo um tratamiento melhor, porque o KGB é obrigado a
levar em conta o que poderiam fazer os seus familiares.

Quanto menos alguém tem noticias de urna pessoa, tanto menos a po


de defender. Voces nfo falam de mim porque tém medo, mas ¡sto certamen-
te nao mudará a atitude do KGB para com voces...

Quando os policiais tomaram consciéncia da passividade de voces e da


minha impossibilidade de defender-me, chegaram a me encerrar em cela soli
taria antes mesmo do processo, s6 para mostrar como eram prepotentes; ra-
param-me os cábelos, a barba e, depois do processo, me puseram de novo em
cela solitaria e na mais fria, onde a temperatura 6 de zero aproximadamente.
E tudo isto acontece agora, quando os governos ocidentais e a opiniao públi
ca reagem vivamente á nossa aflicto. Devo dizer que, durante todo o perío
do que passei encarcerado em Perm, procuraram humilhar-me - o que nao
tinha acontecido em Leningrado nem em Kalinin. Fecharam-me nos subter
ráneos gelados de Perm durante dez dias porque nao pusera os bracos atrás
das costas aos 8 de Janeiro de 1986; oito dias, porque eu recusara agachar
me no corredor mima atitude que me humilhava (25 de Janeiro de 1986).

Estou convencido de que, se estas coisas fossem conhecidas lá fora, até


os meus carcereiros se sentiriam obrigados a moderarse. Ao contrario, agora
o seu comportamento demonstra a certeza da impunidade. Já chegamos aos
espancamentos. No momento espera-me um campo de concentracao para
delinqüentes comuns, no qual o regime é duro até a neurose. Todos os dias
há doutrinacáo política; habitualmente o prisioneiro político nSo é submeti-
do a isto. Nos campos comuns obrigam todos a marchar, até mesmo os ve-
Ihos. O regimentó nSo deixa um momento livre. Li haverá para mim caree-
res e prisoes solitarias em número sem fim. É certo que voces ná*o conse-
guem imaginar tal coisa, porque nunca a experimentaran!. Espera-me a pri-
sao solitaria, com as paredes úmidas, porque, como se compreende, nao vou
querer marchar nem assistirei á instrucao pol ítica. E, mesmo que eu partici-
passe desta, o sistema carcerário n3o mudaría.

Nestas condic5es, repito com insistencia o meu pedido. É urna decislo


sofrida que tomei há tempos. Voces compreendem que, para mim, agora a

182
CARTA DE CAMPO DE CONCENTRACÁO 39

morte sería o fim do suplicio, a libertacüo frente aos sofrimentos. Já cheguei


a manchadme com um pecado tremendo: procurei matar-me (a 19/05/84
cortei-me as veías as ocultas; eu o repetí nos días 9 e 17/05; encontraram-me
desmatado e salvaram-me a vida com urna transfusao de sangue). Repito o
mau pedido: dirijam-se ao Presidium do Soviet Supremo solicitando que me
seja concedido o fuzilamento como graca, a fim de libertar-me do suplicio
que já dura oito anos e deve perdurar por toda a minha vida. Impedem-me
de viver em condicSes dignas de um homem; privam-me dos livros de cultu
ra; torturam-me com a fome e o frió e cela de punicao rigorosa e, em prisáb,
com humilhacoes e abusos, com o abandono. Proibem-me até de rezar;
retiraram-me a cruz ¡numeras vezes; jejuei 65 dias para gozar do direito de
ter urna Biblia e um livro de oracffes; passei 411 dias fechado numa cela.
Desta maneira, espremeram-me, gota por gota, a saúde, a esperanca, a vida.

Esta existencia é urna tortura. Um homicidio que se arrasta no tempo


atrás de cruéis e poderosos muros. É a condenac&b á solida*o. Fui obrigado a
jejuar 65 dias para ter urna Biblia. Será que algum cristao, ao menos urna vez
e em algum momento, apoiou o meu pedido junto ao Governo ateu? Receio
que ná*o. Tenho ante os olhos oito outros anos de condena?3o: tres mais cin
co de reclusSo. Prometeram-me que estarei encarcerado para sempre. E a res-
peito disto tudo: silencio. Torturam um homem até levá-lo a desojar a morte
e ninguém se interessa.

As obras iníquas procuram sempre as trevas: torturam-nos com o frío,


a fome, as injusticas no silSncío das celas subterráneas, com a protecáo do
¡solamente e do segredo, enquanto falam bonito de humanitarismo. Somen-
te a publicidade que lance luz sobre as obras das trevas, poderá segurar a pe
sada máo do poder. E a publicidade, no meu caso, so será possfvel através
de voces e dos meus amigos. Se voces nío derem o alarme, aqueles que se
preocupan» com a nossa sorte se tranquilizarlo, certos de que tudo vai bem.
O silencio e a tranqüilidade precisamente no momento em que nos repri-
mem e, castigando-nos, procuram tirar-nos a vontade de viver, signif icam dar
silenciosamente mío forte aos carrascos. A tática da luta, no caso, é fazer
publicidade.

Sou urna pessoa solitaria e abandonada. Somonte o Senhor continua a


alimentar em mim a fraca chama da vida e urna tímida centelha de esperan
ca. Pois a causa pela qual me puseram no cárcere, já está esquecida.

A Igreja de Cristo existe há dois mil anos e criou urna civilizacáo gran
diosa, urna profunda cultura espiritual, mas onde estSo o sentido de fraterni-

183
40 "PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 299/1987

dade crista, a compaixSo para com o próxima, que para Dostoievsky é o


mais nobre sentimento cristao? A quanto sei, ninguém no mundo cristSo es
tá a par das minhas greves de fome. Na verdade, eu nao faco greve para ser
posto em liberdade, nao! Mas para ter urna Biblia, um livro de orajes e
urna cruz, para alimentar a fé na fonte da RevelacSo Divina. Todas as de-
claracóes de sua Santidade o Patriarca sobre a liberdade de crenca sá*o varri-
das por este simples fato. Entrementes a perseguicaV» religiosa intensifica-se
cada vez mais. Que é que me espera? So Deus o sabe. Póem-me na mesma
cela com criminosos briguentos, geralmente homicidas, procurando indireta-
mente fazer que surjam rixas. Um criminoso comum, que matou duas pes-
soas e está á espera de ser f uzilado, já me disse claramente que, para ele, tan
to faz morrer por causa de dois como por causa de tres homicidios. Quando
vou dormir, nSo sei se me acordarei. Confio apenas na vontade de Deus.

É possfvel que nao se encontré urna alma piedosa e compassiva neste


mundo? É possfvel que a caridade se tenha totalmente estancado? Bastaría
dirigirse aos Bispos ocidentais para que, por via oficial, me mandem no cam
po de concentracSo urna Biblia e um livro de oracdes em inglés, em francés
ou em alemSo (se bem que o alemá*o me canse). Visto que sofri tanta fome
por causa da Biblia, n3o merecí, com este sacrificio, um pouco de atencao?
É possfvel que a poderosa Igreja de Cristo universal nSo diga urna palavra em
defesa de um dos seus filhos perseguidos, cortamente pródigo e pecador, mas
sempre f ilho da Igreja?

Se antes eu pensava ser útil a alguém, se julgava que meus sofrimentos


nao eram perdidos e que a minha luta ajudava a causa do renasdmento reli
gioso na Rússia; se eu acreditava que os outros pensavam em mim, rezavam
por mim e me defendiam, agora compreendi de modo claro e cruel que as
pessoas tém seus problemas, tém medo talvez,. .. que me esqueceram e s3o
indiferentes aos meus sofrimentos. E, apesar de tudo, estes sofrimentos sSo
em beneficio de voces, da liberdade, da fé, da Igreja...

Abracos e beijos para voces. Que o Senhor os proteja!

* * *

A revista Communionis Litterae (CL), que publica o texto italiano


desta carta (edicao de dezembro 1986, pp. 10-13), acrescenta a seguinte no
ticia:

184
CARTA DE CAMPO DE CONCENTRACÁO 41

O caso de Ogorodnikov nfo é caso ¡solado. Na URSS sao numerosos


os prisioneiros por motivos religiosos, políticos ou nacionais.

Há trinta anos o Centro Studi Rustía Cristiana trata de tornar conhe-


cida á opiniao pública ocidental a sorte desses encarcerados e de promover
campanhas em prol da sua libertacSo.

Ora o Centro propfie aos leitores que se interessem por dois prisionei
ros católicos, escrevendo-lhes cartas: Kirill Popov e Sander Riga.

Kirill desde jovem se interessa por problemas de direitos humanos e


pela ajuda aos prisioneiros e aos seus familiares. Por isso foi condenado, em
abril 1986, a seis anos de campo de concentracáo e cinco de confinamento.
Pela primeira vez, na motivacao da condenacao, foi dito explícitamente que
"a ajuda moral e material aos prisioneiros políticos é um delito particular
mente perigoso contra o Estado"; assim a caridade crista torna-se delito po-
I (tico.

Sander Riga, nascido em 1939, é um artista let&nio que chegou á fé


católica após uma vida desesperada e nómade. Declarado doente mental, foi
condenado em 1984 a viver em manicomio por tempo indeterminado.

Eis os respectivos enderecos:

618801 Permskaja obl. 675007 g. Blagovescenk


Chusovskij raj. st. Polovínka Amurskaja obl.
ucr. VS-389/37 Serysevskij per., 55
Kirillu Popovu ucr. IZ-23/1 SPB
URSS Sander Riga
URSS

Cremos que farao obra de caridade crista e de solidariedade humana


aqueles que houverem por bem escrever a esses dois irmSos sofredores uma
palavra de reconforto, mesmo que nao seja redigida no idioma russo. O Se-
nhor Jesús propóe no Evangelho a chamada "regra de ouro". "Tudo aquilo
que queréis que os homens vos facam, fazei vos a eles" (Mt 7,12).

O caso de Aleksandr Ogorodnikov é altamente eloqüente, Sao mi-


Ihares os cristaos que sofrem pela fé atrás da Cortina de Ferro, sem que seus
irmaos no Oriente o saibam ou facam alguma coisa por eles. Entre as respos-
tas que os fiéis católicos ocidentais podem dar a tais situacoes, estao certa-

185
42 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 299/1987

mente o recurso a oracaoe a fidelidade crescente aos seus deveres de cristaos,


pois alguém que se santifica enriquece a comunhao dos santos e contribui
para que os irmáos carentes recebam de Oeus as gracas de que necessitam.
Deus quer salvar ou socorrer a uns mediante outros nessa grande comunhao
em que todos os membros da Igreja estao integrados.

* * *

APÉNDICE

O Bulletin Oecumánique d'lnformation BIP, SNOP, SOP, em suaedi


cao de 15/01 pp., p. 4, publica alvissareira noticia, recebida de Paris aos 14/
01/87.

A "Ajuda aos Crentes da URSS" (Aide aux Croyants de I'URSS) já co-


Ihera 50.000 assinaturas em favor de Aleksandr Ogorodnikov e tencionava
pedir audiencia á Embaixada da URSS em Paris para entregar a lista de tais
assinaturas.

Além disto, o caso Ogorodnikov tornou-se objeto de noticiario nos


jomáis Le Monde, La Croix, L'Actualité Retigieuse, La France Catholique;
Aleksandr Ogorodnikov é tido como "o prisionero contra o qual o KGB se
volta com mais sanha". Em programa de televisáo no sábado 13/1/86 o jor
nal ¡sta Noel Copin interrogou Dimitri Yakouchkine, representante da Agen
cia Russa de Noticias Novosti, a respeito de tal prisióneiro; o interlocutor
soviético respondeu entao que se surpreendia grandemente por receber tal
tipo de pergunta (alias, freqüentemente colocada aos jomatistas soviéticos),
pois teria preferido ser interpelado a respeito de teatro...!

CURSOS POR CORRESPONDENCIA

1) Curso Bíblico;
2) Curso de Iniciacio Teológica;
3) Curso de Teología Moral;
4) Curso de Historia da Igreja.

Pedidos de informacoes e inscricoes sejam enderezados á


Escola "Mater Ecclesiae", Caixa Postal 1362, 20001 Rio (RJ).

186
Itinerario acidentado:

Svetlana Stalin através de cartas

Em súrtese: Svetlana Stalin, filha do ditador Josef Stalin (11953), da


URSS, tem ocupado o noticiario dos jomáis. Embora educada em cerrado
ambiente de ateísmo, descobríu Deus e o Batismo em idade adulta e emi-
grou para o Ocidente. Passou quinte anos nos Estados Unidos e dois na In
glaterra, mas no final desta temporada era vltima de depressSo nervosa e do
élcool. Pediu entSo ás autoridades soviéticas que a deixassem retomar á
Rússia em 1984 — o que Ihe foi concedido. Em sua patria, viu-se confinada
á Georgia, térra do seu pai, onde carecía da liberdade almejada. Por isto em
marco de 1986 solicitou de novo autorizacSo para deixar a Rússia e viver no
Ocidente.

O itinerario físico de Svetlana revela inquietude exterior e interior; di-


zem que ela á "a última vftima de seu pai". Possa o sentimento religioso
existente em Svetlana superar todas as contradicdes, como ¡á as superou ou-
trora, e fazer que essa senhora defina claramente a sua identidade, vivendo o
seu Batismo com liberdade e coeréndal - O presente artigo aprésenla tre
chos de cartas de Svetlana dirigidas ao Pe. Giovanni Garbolino e que maní-
festam os pobres anseios dessa personalidade inquieta.

Svetlana Stalin, com 61 anos de idade. é a filha do ditador soviético


Josef Stalin (Jossif Vassarionovitch Djhugashvili, 1879-1953). que dirigiu as
sortes da Rússia durante decenios (1928-1953). Svetlana tem-se tornado no
ticia de jomáis por causa de suas atitudes e declaracoes imprevisiveis. O fun
do de sua personalidade, triste e inquieta, se desvenda um pouco através de
cartas que ela escreveu ao Pe. Giovanni Garbolino e que hoje sao oferecidas
aos estudiosos, a fim de que possam compreender melhor a figura de Svetla
na; esta certamente traduz o choque de correntes filosóficas antagónicas que
marcaram a sua vida.

187
44 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 299/1987

A seguir, examinaremos a personalidade e as declaracoes de Svetlana


acessi'veis ao público. Comecaremos, porém, por perguntar: qual o destina
tario das mencionadas cartas?

1. O correspondente de Svetlana

O Pe. Giovanni Garbolino tem hoje 74 anos de idade. É missionário da


"Consolata". Esteve tres vezes na Un ¡So Soviética: "urna vez como turista,
outra vez como doente e, por f ¡m, como missionário: eu quería celebrar a S.
Missa dentro do Kremlin, mas detiveram-me na alfándega e acusaram-me de
contrabando, porque eu levava comigo setecentas pequeñas imagens de Nossa
Senhora Auxiliadora".

O Pe. Garbolino morou doze anos nos Estados Unidos. Entregou ao


astronauta Edwín Aldrin urna cruz que ele devia levar i Lúa; de fato, Aldrin
a levou consigo na míssao Apolo que chegou a termo em 20/07/69; ao re-
gressar á térra, o astronauta devolveu-a ao Padre Garbolino; este entao a deu
de presente a Svetlana, que já vivia nos Estados Unidos.

Atualmente esse missionário mora em Roma, onde organiza vigilias


noturnas de oracao ñas igrejas da cidade, as quais afluem numerosos fiéis.

Conta Garbolino: "Em 1967 eu estava nos Estados Unidos e vi pela te-
tevisao a primeira entrevista dada a imprensa por Svetlana, que acabara de
chegar a Nova lorque após fugir de Moscou. Impressionou-me e causou-me
dó: apresentava-se ansiosa, agitada, frágil, respondía com fadiga a todas
aquelas perguntas, que as vezes eram brutais. Resolví escrever-lhe sem demo
ra, utilizando as poucas palavras russas que eu conhecia. Tres dias depois,
chegou-me sua primeira carta, escrita em perfeito inglés".

Acrescenta o padre: "Se agora julgo oportuno revelar algumas passa-


gens das muitas cartas que ela me foi escrevendo, nao o faco para deteriorar
a imagem de Svetlana, mas para transmitir o que nela vi de positivo". Garbo-
lino chama Svetlana a sua "ovelhinha" muito especial. Ele possui um pacote
de missivas dessa figura surpreendente na Biblioteca do Centro "Rússía
Ecuménica" em Roma, onde se encontram icones, livros e revistas russos. É
na base destes documentos e de traeos da historia contemporánea que passa
mos ao subtítulo seguinte.

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SVETLANASTALIN 45

2. Linhas biográficas de Svetlana

2.1. Fase russa

Josef Stalin, aos 26 anos de ¡dade. esposou Ekaterina Svanidze, da


qual pouco se pode dizer e que morreu pouco após o nascimento de seu fi-
Iho Jacob; este faleceu na segunda guerra mundial em campo de concentra-
cao nazista. A seguir, Stalin casou-se com Nadezda Allilueyva, que era vinte
anos mais ¡ovem do que ele; pessoa meiga, chamava-o Soso ou Soselo, dimi
nutivos georgianos de Jossif; de tal enlace nasceu Svetlana; a mae desta. po-
rém, nao resistiu ao clima de tiranía e terror que cercava o ditador; nurna
noite, após horrfvel discusslo suicidou-se em casa de Voroscilov.

Svetlana, a pequeña Sveta, cresceu num ambiente misto: em casa, an


gustia e ansiedade, pois o pai sofría de psicose manfaco-depressiva; verdade
é que nos bons momentos Stalin chamava-a "minha patroazinha" e "o
meu passarinho". Fora de casa, era honrada e privilegiada como f ilha do che-
fe do Governo, por conseguinte, na escola e no Kremlin era a pequeña prin
cesa. Enamorou-se, ainda muito menina, pelo judeu Alexei Kapler, que fazia
carreíra no cinema; o pai, descontente com isto, pos termo a esse amor, dan
do duas bofetadas na filha e enviando'Kapler para um gulag (campo de con-
centracao) por dez anos; Stalin, por esta e outras facanhas, era tido como
"o homem de acó", mais tarde escreveria Svetlana: "Todos nos, e eu mais do
que todos, éramos obrigados a viver debaixo daquela sombra tremenda e a
obedecer".

Tinha menos de vinte anos quando se casou com o dentista Morozov,


muito mais velho do que ela. Desta uniao nasceram os filhos José e Catarina.
Após o qué se deu o divorcio.

Houve um segundo casamento de Svetlana, desta vez com Yuri Zda-


nov, filho de um seguidor de Stalin. Também este enlace terminou num di
vorcio.

O ditador morreu em 03/03/1953. Sobo seu sucessor Kruschev, occr-


reu a desestalinizacSo a partir de fevereiro de 1956: os crirhes de Stalin fo-
ram denunciados ao público, de modo que se derrubaram dez mil monumen
tos que o representavam; a memoria de Stalin foi sendo apagada nos regis
tros históricos e nos coracSes da populacao russa; os seus despojos mortais
foram retirados do respectivo mausoléu na Praca Vermelha. Ao lembrar-se
desta época, escreveu Svetlana:

189
46 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 299/1987

"Após a morte de meu pai. eu quis suicidarme. Acusavam-me de ser


cómplice de seus crimes; tratavam-me como urna peste. Todavía urna amiga
deu-tne o livro dos Salmos, que para mim foi urna revelafSo; vejo a vida com
valores transcendentaís. Dirigi-me ao sacerdote mais visado pelas autoridades
policiais, que era o Padre Nicolai".

Aos 21/05/1967 escrevia Svetlana ao Pe. Garbolino:

"Nestes días pensó muito no Padre Nicolai, porque faz cinco anos que
fui balizada por ele na religiSo ortodoxa em Moscou, na ¡greja do Véu.
Aquele foi um dos poucos días serenos em minha vida. Agora, caro padre,*
eu tenho V.Revma. como diretor espiritual. O Sr. me fala como falava o Pe.
Nicolai; o Sr. compreende fundo os meus desgostos e as minhas ansias, mes-
mo antes que eu os exprima".

Ao menos, porém, após a morte do pai, tinha ela a liberdade de casar


se com quem quisesse. Foi o que ela fez realmente, ao esposar um indiano:
Brejesh Singh. Este terceiro marido faleceu em 1966; Svetlana entSo alegou
que precisava de ir a India para jogar as cinzas do marido no rio Ganges. Mal
se viu no estrangeiro, pediu asilo político e foi finalmente acolhida pelos Es
tados Unidos da América.

2.2. Chegada aos Estados Unidos

Os americanos viram na fuga de Svetlana um poderoso fator de propa


ganda política ou de combate ao comunismo; receberam-na, pois, com todas
as honras; pagaram elevado preco (US$ 1.500.000,00) pelos direitosautorais
do seu livro de memorias: "Vinte Cartas a um Amigo"; a imprensa escrita, a
televisáo e o radio a assediaram. .. Enfim Svetlana descobria a liberdade, e
também a riqueza. .. Mas tinha deixado em Moscou os seus dois filhos. —
Svetlana escreveu entao ao Padre Garbolino:

"Se ler nos ¡ornáis que os meus filhos me rejeitaram e repudiaran), nSo
acredite. Eles me amam, mas vivem num país totalitario e fascista, onde a
populafSo nao pode e nSo ousa desobedecer ás ordens de quem manda. Sei
por que nao me escrevem: no Estado Soviético é perigoso corresponderse
com urna criminosa política, como é a mSe deles. Por vías indiretas, envía-
ram-me um anel que me era caro e que eu deixara em Moscou. Querem que
eu o use sempre como penhor dos tacos que me unem a eles, é minha térra.

' A cana era redigída em inglés, mas caro padre vinha em italiano.

190
SVETLANA STAUN 47

á minha casa. Nada no mundo pode ser tSo eloqüente testemunho do amor e
da dedicapSo de meus filhos".

Ñas suas cartas, Svetlana fala freqüentemente de José, que, por oca-
si So da fuga da máe, tinha 22 anos, e de Catarina (17 anos): "José tem um
espontaneo sentimento religioso. Certa vez disse-me que quería ser batizado
também ele; mas perdemos tempo; o padre Nicolai morreu e José nao quis
falar com outros sacerdotes. — Ao contrario, Catarina na*o tem nocao de
Deus; é muito jovem e talvez infantil; alias, pertence á sua geracáb, que nao
se preocupa com a fé. Mas, caro padre, ambos gostam de música de Bach, e
isto me leva a compreender que dentro deles existe algo de espiritual".

Em urna de suas missivas convidava o Pe. Garbolino a comprar a revis


ta Atlantic Monthly: "O Sr. lá encontrará o meu primeiro ensaio traduzido
para o inglés sobre Boris Pasternak e o Ooutor Givago. É-me muito precioso,
porque o escrevi na Suica, em Friburgo, durante o breve período que passei
com as Irmas da Visitacao antes de seguir para os Estados Unidos. Ali encon-
trei por pouco tempo a paz do coracSo. O Sr. observou, caro padre, que du
rante a entrevista na televisao eu tinha a mSb direita fechada? Estava segu
rando urna medalhinha de Nossa Senhora, que me fora dada pelas IrmSsde
Friburgo. Essa medalhinha me dá coragem, tenho tanto medo...!"

2.3. Peripecias nos Estados Unidos

Svetlana fixou domicilio em Princeton, New Jersey. Aos poucosfaria


novas experiencias.

A Sra Olgivanna Wright escrevia-lhe cartas, ñas quais insistía em que


Svetlana a fosse visitar em Taliesin West, escola-comunidade, meio-mística,
meio-futurista, fundada por Wright no deserto Arizona; Olgivanna dizia
que via em Svetlana a reencarnacfo da sua filha morta em acídente automo-
bilfstico. A senhora russa acabou aceitando o convite e em marco de 1970
foi ter com a Sra. Wright; tres semanas mais tarde, casava-se com o viúvo da
filha de Olgivanna, o arquiteto William Wesley Peters, discípulo de Wright. O
Pe. Garbolino recebeu entSo cartoes postais e pedacos de cactus do Arizona,
e cartas inquietas, em que Svetlana dizia: "Talvez um dia me converta ao Ca
tolicismo. Por ora estou apavorada pela imprensa e a publicidade". Final
mente chegava a noticia da dissolucáb desse enlace após o nascimento de
urna menina: Olga Margedant Peters.

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48 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 299/1987

Svetlana passou quinze anos nos Estados Unidos. Depois fo¡ para a
Inglaterra, onde ficou dois anos: "Espantava-me o permissivismo das escolas
americanas", escrevia ao seu diretor espiritual. Daf por diante, a correspon
dencia se rarefez, reduzindo-se a cartoes de festas de Natal.

Para surpresa de todos, em 1984 Svetlana pediu ao Kremlin que a re-


cebesse de novo na Rússia Soviética. Isto I he foi concedido juntamente com
o perdió, visto que a filha de Stalin parecía reconhecer seus "erras" e se
autocriticava. Ém Moscou declarou ela:
"No estrangeiro nao me sentí livre nem por um só día. Dezessete anos
foram-me suficientes para ver os sofrimentos e as miserias do assim dito
" mundo civilizado'".

Eis, porém, que em marco de 1986 Svetlana, mais urna vez muito im-
previsivelmente, pediu as autoridades soviéticas a licenpa para deixar a Rús
sia com sua filha Olga.

O Pe. Garbolino comenta esta decisáo:

"Nao me surpreendeu a detísSo. de Svetlana, de voltar é URSS em no-


vembro de 1984. Ela parece condenada a ser urna fugitiva. Foge de tudo,
porque nSo consegue fugir de si mesma.

Nao me surpreende também a noticia destes días ou a sua dedsSo de


deixar de novo a Rússia. Ela julgava poder morar de novo com os filhos em
Moscou; mas foi confinada na Georgia, onde ela nSo pode ser protagonista
de coisa algutna. nem mesmo da sua vida".

Desde que Svetlana voltou a Rússia, o Pe. Garbolino escreveu-lhe algu-


mas vezes, enderezando as cartas para o Centro Cultural de Tiflis (Georgia).
Nunca recebeu resposta. Receia que a correspondencia nao Ihe tenha sido
entregue.

3. Observapáo final

Tal é o caso assaz doloroso de Svetlana Stalin, que procura nao somente
urna patria, mas também procura a própria identidade; a vida no Ocidente e
a vida na URSS sao tipos de vida bem diferentes, que supoem personalidades
diferentes. A instabilidade topográfica de Svetlana nSo será sinal de sua pró
pria instabilidade pessoal e emocional?

(continua na p. 178)
UN.■■!•«'•'■ - f-F-5

192
TV .. .S.
Dado o crescente interesse pela espiritualidade dos primeiros Mongesdo
Oriente e a espiritualidade crista do Ocidente, a CIMBRA (Conferencia de In
tercambio Monástico do Brasil) vem publicando Conferencias e Temas vividos
pelos Padres do deserto. Em brochuras xerografadas:

1. Conferencias de Joáo Cassiano:

I ■ II: Do escopo e do fim do nionge (abade Moisés)


Da discricao (abade Moisés) - Cz$ 20,00

Ill-V: Das tres renuncias (abade Pafnúcio)


Sobre a concupiscencia da carne e do espirito (abade Daniel)
Os oito vicios principáis (abade SerapiSo). — Cz$ 30,00

VI - V111: A matanca dos Santos (abade Teodoro)


Da mobilidade da alma e dos espCritos malignos (abade Sereno) —
Cz$ 50,00

IXX: Sobre a Oracáo (abade Isaac) - Cz$ 40,00

XI-XIII: Sobre a perfeicáo (abade Queremon)


Sobre a castidade (abade Queremon)
Sobre a protecáo de Deus (abade Queremon) - Cz$ 50,00

2. Vida de Sao Martinho de tours, escrita por Sulpício Sever.

A Gália foi para o Ocidente a térra clássica do monaquismo cristao, como o


Egito o fora para o Oriente. E, como o Egito teve Antáo, pai e espelho dos
monges, a Gália teve Martinho, origem e modelo de urna ¡numerável multi-
dao de monges. Na verdade, quando, em 361, Martinho se fixou em Ligu-
gé. Comecava a historia documentada do monaquismo cristao no Ocidente.
- 60 págs. - Cz$ 60,00

3. Vida de Santo Antao. escrita por Santo Atanásio de Alexandria.


- 146 págs.-Cz$ 100,00

4. Escritos monásticos de S. Cesário de Arles (470-542) - 52 págs. - Cz$ 40,00

5. Historia Lausfaca, por Paládio (ano 419) - Contém urna serie de fatos ou
historias curtas de Pais e Maes do deserto, edificantes ou nao, que o autor
conheceu pessoalmente ou sobre os quais recebeu informagóes de outros. i
o primeiro a empregar a expressao "Pai do Deserto". Nao apresenta nenhu
ma teoría ascética, embora o espirito seja de Evágrio. — 156 págs.
- Cz$ 130,00

6. Misterio da Salvacáo, cantado por hinógrafos bizantinos - 160 págs. . ...


-Cz$ 70,00. f.
NOVIDADE:

D. PIORO
MARÍA
ÚLTIMO BISPO DO RIO OE JANEIRO NO IMPERIO
(1868- 18901

Para elaborar o presente livro, o autor, D. Jerónimo de Lemos


O.S.B., além de consultar ampia bibliografía, viu também o arquivo de D.
Lacerda, lendo sua correspondencia, escritos, e preciosa documentacáo
até hoje inédita, bem como jomáis daquele tempo, gracas ao que pode
contribuir para urna perspectiva inteiramente nova sobre a pessoa e
acontecimentos da época em que viveu esse bispo, que, durante mais de
tfinte anos dirigiu espiritualmente os destinos da extensa diocese de Sao
Sebastiáo do Rio de Janeiro, a qual, naquela época, nao se restringía ao
assim chamado Municipio Neutro, mas abrangia torio o Estado do Rio e
Espirito Santo, e tprritórios das provincias de Sania Catarina e Minas
Geraís. - 615 páginas - Cz$ 600,00.

EMCOMUNHÁO
Revista bimestral, editada pelo Mosteiro de Sao Bento. destina-se
aos Oblatos e as pessoas interessadas em assuntos de espiritualidarie
monástica. Além da conferencia espiritual mensal de D. Estéváo Betien-
court para os Oblatos, contém traducóes de comentarios sobre a Reqra
beneditina e outros assuntos monásticos. - Assinatura anual em 1987'
CzS 50,00.

Para assinatura diri|a-se a Armando Re/ende Filho


(Caixa Postal 3608 - 20001 Rio de Janeiro - RJ) ou as Edicóes "Lumen
Chnsti" (Caixa Postal 2666 - 20001 Rio de Janeiro - RJ).

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