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Cultivos Ecológicos

um roçado de alimentos para a vida


Apresentação
A Comissão de Cultivos Ecológicos vem, desde 2001, animando um trabalho
em mais de 15 municípios da região do Agreste da Paraíba, resgatando e
valorizando os conhecimentos dos agricultores, favorecendo a construção de
novos e incentivando a troca de experiências entre as famílias.

Essa Comissão, assim como a de Sementes, Água, Saúde e Alimentação,


Criação e a Comissão agrária, é parte integrante do Pólo Sindical da
Borborema, uma articulação de organizações de agricultoras e agricultores
familiares, que vêm juntos construindo coletivamente um novo modelo de
desenvolvimento rural, baseados no fortalecimento da agricultura familiar e na
agroecologia.

Desta forma, a cartilha Cultivos ecológicos: um roçado de alimentos para a


vida nasce a partir do acúmulo dos resultados do trabalho dessa Comissão e
de um conjunto de agricultoras e agricultores experimentadores que vem
testando inúmeras experiências de produção de alimentos sem veneno e sem
adubo químico, de diversificação de cultivos, de manejo e conservação do
solo, do plantio de árvores, da valorização das plantas nativas, enfim, de
experiências de valorização da vida na terra de trabalho.

Pra começo de conversa


O modelo de desenvolvimento historicamente proposto pelas elites do país
sempre se centrou na forte concentração de terras, na exploração dos
trabalhadores e trabalhadoras rurais e no uso indiscriminado dos recursos
naturais ao incentivar a monocultura e o uso de agrotóxicos.

Aqueles agricultores e agricultoras que tentaram acompanhar esse modelo


foram completamente vencidos pela concorrência e acabaram por vender
suas terras para saldar suas dívidas. Aqueles que resistiram, tiveram suas
terras reduzidas, principalmente por herança e partilha. A redução das terras
vem promovendo uma intensa pressão sobre os recursos naturais que,
somada ao uso abusivo do pacote tecnológico, se configurou em uma grave
crise de insustentabilidade ambiental, social e alimentar.

Esse modelo escolhido e executado pelas autoridades do país foi, portanto,


retirando dos agricultores e agricultoras seus principais instrumentos de
trabalho: a terra e todo seu conhecimento sobre o ambiente e sobre sua forma
de trabalhar.

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Diante desse grave quadro de exclusão social e degradação cultural e
ambiental, o Pólo Sindical da Borborema inicia, desde 1996, um intenso
processo de construção coletiva de um modelo de desenvolvimento rural em
que os agricultores e agricultoras passam a ser os principais motores da
promoção desse desenvolvimento.

Dessa forma, o grupo de Cultivos Ecológicos vem contribuindo intensamente


com esse processo na medida em que pesquisam, redescobrem, multiplicam e
divulgam para todos da comunidade e da região o uso de produtos naturais para
o controle e tratamento de pragas e doenças; o reflorestamento a partir do
estímulo à produção de mudas em viveiros familiares e comunitários; as
estratégias dos agricultores e agricultoras para a recuperação do solo; o uso e
manejo das árvores nos diferentes espaços do sítio; a valorização e a
conservação das plantas da natureza e daquelas trazidas de fora e que estão
adaptadas ao clima da região; a diversificação de cultivos e também as práticas
de comercialização dos produtos agroecológicos da agricultura familiar.

Para tanto, realizam inúmeras visitas de intercâmbio, participam de reuniões,


eventos e encontros de formação, promovem cursos e mutirões. A partilha do
conhecimento e a solidariedade entre as pessoas fazem com que essas e
muitas outras ações da Comissão de Cultivos Ecológicos e também do Pólo
Sindical da Borborema vêm semeando e cultivando um roçado de alimentos
para a vida.

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A natureza nossa grande mãe
A mata é o roçado de Deus
Quando a gente olha para uma mata e vê grandes árvores, muitas outras
plantas de médio e pequeno porte, ficamos imaginando quanto adubo foi
preciso colocar naquele local, para que todas crescessem em harmonia, sem
competição e com saúde. Observamos também que, lá na mata, vive uma
grande variedade de animais, sendo muitos insetos.

Na mata ninguém colocou adubo, muito menos foi usado agrotóxico para
controlar o mato ou matar as pragas. Lá existe capim, cipó, espinheiro, junto
com pau-d'arco, cedro, mulungú, angico, côco catolé, umbú, aroeira, jucá,
juazeiro, catingueira, feijão bravo, jurema preta, macambira, xique-xique,
mandacaru, todos crescendo juntos e produzindo frutos. Na mata, também
existem animais. O maior se alimenta do menor e todos vivem juntos. Lá tem
formiga para alimentar os pássaros e servir de sobremesa para o tamanduá,
tatu, teiú e o peba.

Na mata ninguém passa fome e todas


as espécies vivem nesse ambiente de
competição e equilíbrio. Foi Deus
quem criou tudo e colocou cada
coisa no seu lugar. Essa perfeição
do roçado de Deus deve ser imitada
na nossa casa. Devemos criar um
ambiente que favoreça a
transformação das folhas e galho s
em adubo orgânico.

Associativismo Vegetal
Padre Antonio Vieira, Sertão Bravo, 1968.
Muita coisa mexeu com os meus nervos e o meu sentimento na Festa do
Agricultor, recentemente realizada na Paróquia de Milhã. Sertanejo, por dentro
e por fora, eu vivi o meu clima natural. E tudo foi direto ao coração com grandes
dosagens de adrenalina.

Uma Musa logo me chamou a atenção. E foi que todos os enfeites das casas,
dos carros, do palanque, do altar, não eram flores artificiais ou flores de jardim,

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que tudo isto é requinte de cidade
hipercivilizada. Os adornos e enfeites
eram pés de milho arrancados do roçado,
com todo o seu viço, com pendão, folhas
verdes e espigas de cabelos alourados
pelo sol. Reparava tudo com gosto e sabor.
Ali bem perto do altar, aqueles pés de
milho pareciam bandeiras verdes, soltas
em atividade triunfal, cantando nas suas
folhas, tangidas pelo vento, o Hino
Nacional da fartura, da riqueza, do
trabalho.

No canto esquerdo do altar havia, porém,


um pé de milho que não veio à festa
sozinho. Trouxera enlaçado, num grande abraço vegetal, um pé de feijão que
se enroscava em todo o seu corpo. E a gente fica a imaginar o que aconteceu.
Numa manhã rosada de luz, a leguminosa chega para o pé de milho lhe dá um
bom dia alegre, fala da chuva que caíra durante a noite e lhe pede confiante
uma mãozinha de ajuda para espiar o sol que nasce- E o pé de milho, garoto
mais crescido e de coração compassivo, vendo a sua irmã a debater-se
friorenta sobre a terra úmida, num gesto de solidariedade vegetal lhe estende a
mão, abre os braços e os dois se abraçam num grande momento de alegria e
de expansão. Cresceram juntos. Viveram os mesmos sentimentos.
Compartilharam de toda a euforia da natureza e, naquela hora, unidos vieram à
mesma festa. Unidos como se fossem da mesma família e tivessem o mesmo
destino.

Tiveram o mesmo regaço. Disputaram a mesma nesga de sol. Comeram no


mesmo prato a seiva gostosa da terra e beberam no mesmo caneco as gOtas
saborosas de água. E ali estavam para falar aos homens. Para lhes dizer
naquela festa que as competições do interesse, as ambições da riqueza, a luta
pela vida, não se resolvem pelo choque de classes ou pelo egoísmo do
indivíduo.

Os dois ali estavam unidos, mostrando saúde, riqueza, felicidade. As


diferenciações profundas do caráter, do gênio, do temperamento não
impediram aquele consórcio admirável. E que entre as plantas não há
egoísmo. Nem ambições.

Na flora há sempre uma doação recíproca, uma troca mútua e constante de

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energias, de elementos vitais. Nesta hora trágica para a humanidade, onde o
ódio se fez norma pública do agir, valia ouvirmos a linguagem cristã do pé de
milho e de feijão da Paróquia de Milhã.

A experiência de Zé Leal e Maria Luzia: um


exemplo de preservação e de amor a natureza
José Alves Leal e Maria Luiza possuem 4 filhos,
hoje todos casados. O casal mora no sítio
Floriano, em Lagoa Seca, desde 1976. Quando
vieram morar no sítio, as terras eram
praticamente ocupadas com roça, feij~ao e
milho. Aos poucos e com muita criatividade, a
família foi mudando os plantios e o jeito de
trabalhar. Passaram a plantar vários tipos de
fruteiras, sendo a laranja e o caju as principais
frutas para o comércio.

Quando chegaram, as terras eram muito fracas,


além de serem enladeiradas. Nos períodos de
chuva, as águas carregavam a terra fértil e o
paú. Conta que em alguns lugares a terra já não
produzia mais. Passaram então a plantar
cortando as águas e a construir valas para
segurar mais a água no
chão. Começaram a juntar todo o bagaço do mato e os
restos de cultura para proteger e estrumar a terra. Entre as
linhas das fruteiras, a família planta os cultivos de inverno
como o feijão, coentro, girassol. Plantam também o guandu
e o feijão de porco para adubar a terra. Conheceu essas
plantas numa visita de intercâmbio em experiências de
agrofloresta em Bom Jardim, Pernambuco.

Estão deixando crescer uma área de


mata. E neste local, eles ainda
plantam muitas árvores da natureza
como camunzé, pau d´arco, angico,
sabiá e louro. Da matinha, eles
retiram as folhas que caem e levam
para as frutas, para também ajudar a
estrumar a terra. No ano de 2001,

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conta José Leal que carregou mais de 100 balaios
de folhas secas para as fruteiras. Em 2002, a família
mais que dobrou a quantidade, carregaram 250 de
balaios para dentro das fruteiras.Nesta área, a
família trabalha com as plantas para produzir
estacas e ainda serve como um banco de mudas da
natureza que levam para outras áreas do sítio.

No lugar que não tem fruteira, aproveitam para fazer


roçado de milho, fava e feijão conservando as
plantas da natureza como camunzé, louro, angico,
cabatã e outras. Para plantar, José Leal conta que
nunca utiliza o fogo para assim proteger a vida da
terra.

Seu sítio é cercado com várias plantas: cajá, cajá-umbú, gliricídia, burra leiteira
e outras. Forma com isso uma cerca viva que produz alimentos para casa e para
terra.

Com mesmo prazer e zelo que a família cuida de seu sítio, cuida também de sua
casa e do terreiro. Várias qualidades de flores e árvores embelezam e
perfumam o seu arredor. E no oitão da casa, construíram a primeira cisterna de
placas do município de Lagoa Seca.

Assim a família vem dando seu exemplo de como


tirar seu sustento preservando a natureza. José
Leal, que se considera um ambientalista, conta:
onde não tem roça,
tem caju, onde não dá
caju, bota laranja,
onde não dá fruta
nem roça, tem
árvores como louro,
pau d´arco, angico,
jatobá, imbaúba,
aroeira, coco catolé,
bordão de velho.
Assim a terra estará
sempre revestida.
Quem passeia hoje
por suas terras pode

Cultivos Ecológicos 01
encontrar mais de 75 variedades diferentes de árvores, 17 tipos diferentes de
plantas de remédio e mais de 67 tipos diferentes de frutas. E as plantas de
enfeite? Ah! essas eles desistiram de contar porque são muitas, trazidas de
vários lugares por onde eles passaram.

Plantio Diversificado: a experiência de


Robinho
Robinho é um jovem agricultor de Lagoa
Seca. Ele mora com sua mãe, dona
Ordenira no sítio Retiro. Desde que seu pai
faleceu, foram os dois que assumiram o
comando do sítio e do trabalho.

O sítio da família mede 12 hectares de terra.


Separaram 3 hectares para conservar uma
matinha e, no restante, eles plantam muita
mandioca, feijão de várias qualidades,
batatinha, milho, fava, cará preto, inhame,
coentro, batata doce, ainda tem uma capineira e uma área de pasto. No sítio
tem também manga, jaca, jabuticaba, acerola e caju para o consumo da casa.

Robinho desenvolve muitas experiências,


muitas delas aprendidas com seu pai, que
por sua vez, aprendeu com seu avô. O
consórcio de plantas é uma delas. Acredita
que o consórcio seja uma coisa muito boa,
porque tem chance de explorar melhor a
terra. Quando arranca a macaxeira, fica o
milho e a fava. De outra forma, a terra ficaria 6
meses desocupada, explica Robinho.

Em suas terras, faz 3 tipos diferentes de consórcios:


No primeiro tipo, quando inicia o inverno, planta feijão preto de 60 dias em dupla
no lombo do leirão. E planta milho comum no
bucho do leirão do lado da chuva. Planta em
3 ou 4 leirões para não assombrar o feijão. O
milho, segundo Robinho, é muito
competitivo.

Depois de 90 dias, ele passa a enxada sem


Cultivos Ecológicos 01
virar a terra. O milho ainda fica e planta novamente o feijão em todos os leirões.
Planta macassa no bucho do leirão, do lado da chuva e planta ainda algumas
covas de maxixe e batata doce na cabeça dos leirões. Assim, ele acredita
aproveitar bem o inverno e o esterco, garantindo uma safra de feijão de inverno
e outra de seca.

No segundo tipo, planta, no início do


inverno, feijão preto ou carioca no lombo de
todos os leirões e em fila dupla. Planta
milho comum no bucho, pulando 3 a 4
leirões. Planta também maniva 10 dias
depois, no lombo do leirão, entre as fileiras
do feijão.

Depois de 90 dias, planta feijão macassa


no bucho do leirão. O milho ainda fica e a mandioca permanece por mais 1,5 ou
2 anos. Quando chega o inverno seguinte, ele decota a mandioca, planta milho
com fava. Planta de 4 em 4 leirões. E onde não tem milho, ele coloca feijão
macassa. Dessa forma, aproveita melhor a terra de plantar a mandioca, sem
deixar de plantar as outras coisas.

Um terceiro tipo de consórcio é feito.


Desta vez, planta feijão faveta no início do
inverno. Depois de passar 50 dias,
Robinho vira a terra e planta batatinha no
lombo do leirão. Planta também milho de 3
em 3 leirões e o macassa onde não estiver
o milho. A batatinha é uma cultura muito
exigente, por isso, sempre aproveita a
terra e o estrume com outros cultivos.

Para manter sua terra sempre forte,


Robinho sempre estruma a terra. Antes, costumava comprar 3 carros de
estrume, mas recentemente construiu um curral. Segundo ele, assim ficou bem
mais fácil, porque seu gado dorme no curral e dá para juntar um carro de
esterco a cada 4 meses. Além do estrume, ele usa, desde 1999, o biofertilizante
e a calda bordalesa. Tem sentido resultados muito positivos em suas culturas,
apesar de achar que ainda precisa melhorar o adubo para batatinha, para elas
aumentarem de tamanho. Mas, sobretudo, Robinho que um dia já usou veneno
em suas terras, hoje é um dos grandes produtores orgânicos do município de
Lagoa Seca. A partir do uso de produtos naturais, ele se diz satisfeito porque
economiza e não está envenenando nem a ele, nem seus parentes e nem que

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compra seus produtos. Veja a prova nas contas do que ele gastava quando
comprava veneno e agora, usando produtos alternativos.

Semeio: uma experiência de plantio em


equilíbrio com a natureza
Seu Antônio, dona Maria e Ivete, a filha mais nova do casal, moram no Sítio
Várzea Grande, em Massaranduba. Casados a
mais de 30 anos, seu Antônio e dona Maria
tiveram 7 filhos, 4 rapazes e 3 moças. A família
tem a agricultura como o principal sustento. É da
terra que eles tiram os frutos que alimentam seus
filhos. E é por isso que eles possuem muito zelo
por ela.

Há mais ou menos 10
anos, eles conheceram o semeio. Uma
experiência que um amigo missionário, o Citonho,
trouxe lá do Maranhão.

Seu Antônio separou duas 25 braças de um


terreno coberto por uma capoeira grossa, 30
quilos de feijão e 1 quilo de milho. E para fazer o
semeio, chamou um grupo de amigos para um
adjunto. Aí é uma manhã de trabalho. Primeiro,
eles abriram nessa área umas 25 varedas. Cada
pessoa leva um saco com sementes de feijão e
milho e saíram semeando para o lado direito até
chegar no final da vareda. Então eles voltam pela
mesmo caminho, também
semeando para o lado direito.

Aí, explica seu Antônio, tem até


2 dias para brocar o mato. É uma festa! Enquanto Ivete traz
a água e dona Maria prepara o almoço para a turma, seu
Antônio Roberto, Luiz Lopes, Bel, José Carlos, Ari, seu
Custódio, Everaldo, José Joaquim, seu Manuel, Loro,
Bamam e Gilberto vão cortando o mato de baixo para cima.
Podam as árvores maiores, cortam os matos, separam a
lenha, as estacas e fazem o rebaixamento. Por fim, deixam

Cultivos Ecológicos 01
o basculho ali mesmo. Ele vai virar adubo para a terra. Depois é só esperar a
chuva molhar o chão e fazer o feijão e o milho nascer, florar e render os grãos.

Segundo seu Antônio, uma das grandes


vantagens dessa experiência é que o camarada
não precisa limpar o terreno, voltando na área só
para colher. Ainda explica que para uma terra
laderosa como a dele, o semeio é uma
experiência muito boa porque assim a água bate
e não leva o caroço nem a terra por causa da
cobertura das folhas e garranchos. E são eles, as
folhas e garranchos, que apodrecem e viram
estrume para a terra. E quanto mais coberto ficar
a terra, melhor para segurar o molhado e evitar
que nasça mato. É por isso que seu Antônio
sempre recomenda fazer o semeio em áreas de
capoeira grossa.

Como resultado, tem sempre um feijão forte e


sadio. Espera colher 4 sacos de feijão dessa área,
mais o milho. Mas, segundo seu Antônio, o principal resultado é a união da
turma na hora do adjunto ou mutirão como outros preferem chamar.

Depois da colheita, seu Antônio deixa a área repousando por 1 ano. Só no ano
seguinte é que repete o semeio naquele local. Assim, dependendo do inverno,
permite que a capoeira engrosse novamente.

A família ainda faz outras experiências em suas terras sem usar o fogo. Em um
espaço entre duas capoeiras grossas, seu Antônio abriu um terreno
espalhando as folhas no chão, separando os garranchos no aceiro . Ele explica
que o tempo transforma tudo em adubo.
Neste local, plantou milho em linhas
atravessadas. Plantou numa terra escura,
úmida, cheirosa e cheia de vida.

Seu Antônio ainda cuida com muito zelo


de seus cortiços de abelha uruçu que cria
desde o tempo de seu pai. Além de seus
cortiços, ainda possui um apiário com 7
colméias.

Cultivos Ecológicos 01
A experimentação de produtos
naturais
Manipueira e Urina de Vaca: a experiência de
Zezinho Plácido
José Plácido do Nascimento, mais conhecido
como Zezinho Plácido, é agricultor e desenvolve
importante trabalho de experimentação e
divulgação de experiências junto ao Sindicato
dos Trabalhadores Rurais de Lagoa Seca.

Zezinho é casado com Maria e juntos tiveram 9


filhos. Moradores do Sítio Lagoa do Barro,
possuem uma área de 5 hectares. Em suas
terras, a família planta muito amendoim, feijão
macassa consorciado com maxixe, feijão mulatinho, feijão preto. Possuem
mandioca e macaxeira. Plantam milho,
fava e várias verduras. No sítio ainda tem
caju, manga, mamão, café de sombra,
sementes selecionadas e guardadas
desde a época de seus avós. Tem capim
na área da barragem e possuem várias
plantas de remédio. A família ainda possui
gado e uma porca. E no curral, fizeram
uma cerca viva de gliricídia.

Para manter toda essa diversidade de


plantas sempre sadias e produtivas, a
família desenvolve várias experiências. Neste folheto, eles irão explicar o uso
da manipueira e da urina de vaca.

Zezinho conta que aprendeu usar a


manipueira para combater a formiga com seu
avô. Ensina que para usar devemos tomar
algumas providências. Devemos guardar a
manipueira em um recipiente tampado.
Deixar em repouso por 3 dias para azedar. E
na hora de abrir, devemos colocar uma bacia
em baixo porque ela espuma.

Cultivos Ecológicos 01
Para aplicar nas culturas, Zezinho sempre dilui
1 litro de manipuiera em 20 litros de água
quando vai aplicar no feijão. E para as verduras
novas, ele usa ½ litro de manipueira para os 20
litros de água, depois vai aumentando a
dosagem até chegar 1 litro. Aplica sempre como
prevenção, ou seja, antes que a praga se
espalhe pela cultura.

Zezinho observou que a manipueira, além de controlar a formiga, serve para


acabar com a lêndea do feijão macassa, a lagarta da couve, usa ainda no
coentro, alface e pimentão. Além de ter percebido que é um ótimo adubo.

Há dois anos, Zezinho também vem usando a


urina de vaca na batatinha, feijão, tomate,
pimentão, alface e no coentro. Pega sempre a
urina da vaca que está dando leite.
Geralmente, recolhe a urina com um balde
logo cedo quando o bezerro vai mamar. Tem
sempre o trabalho de colocar um pano no
fundo do balde para que o barulho não
assuste a vaca. Depois, engarrafa a urina e
deixa em um local escuro por 4 dias. É comum
que a urina mude de cor. Zezinho afirma que pode guardar a urina por 1 ano.

Para aplicar a urina de vaca nas culturas, deve-se misturar 300 mililitros de
urina em 20 litros de água. Ou seja, uma garrafinha de 600 mililitros dá para
fazer duas bombas de 20 litros. Zezinho explica que serve para todas as
culturas e hortaliças e aplica de 8 em 8 dias. E para as culturas de roçado,
conta que pode misturar a manipueira com a urina.

A família fez a experiência de adubar a


A urina de vaca é muito rica em nutrientes para batatinha só com a urina de vaca.
as plantas, desta forma, torna-se um excelente Plantaram uma caixa de 15 quilos de
adubo. Para usar a urina é bem simples. Na hora batatinha em 12 leirões. Depois de
da ordenha, leve um balde com um pano no três aplicações, tiveram como
fundo para que o animal não se assuste com o
barulho. Depois é só guardar a urina em uma
resultado 100 quilos de batatas para
vasilha fechada por pelo menos 3 dias. Na hora venda e mais 20 quilos de batatas
de usar, misture meio litro de urina a 100 litros deixadas para sementes. Zezinho
de água para que não queime as plantas. A urina analisa que é considerada uma
pode ser utilizada em qualquer cultura. produção normal, principalmente por
causa da qualidade da batata

Cultivos Ecológicos 01
plantada, a baraka, uma variedade que produz pouco, mas que é importante
para os agricultores por ser de ciclo curto.

Calda de Fumo: experiência de Otávio


Otávio Pequeno Gangorra é casado com Maria e
possuem 4 filhos. Moradores do sítio Oiti, em Lagoa
Seca, plantam de tudo um pouco em 1,5 hectare de
terra. Plantam banana, coco, goiaba, milho, feijão
vagem, flores, pimentão, pepino, chuchu, berinjela e
muito mais.

Otávio estruma sempre


o solo com palhada de banana e com bagaços
para manter a terra forte e proteger suas plantas.
Faz uma cobertura para a terra que, com o tempo,
vira adubo. Otávio ensina que essa prática é muito
boa para combater a erosão e segurar o molhado
na terra.

Para manter a saúde de suas plantas, utiliza alguns produtos naturais. Usa a
calda de fumo para evitar o ataque de rosca na raiz do pimentão. Coloca ½
quilo de péia de fumo em 5 litros de água. Deixa de molho na
água por 4 dias. Depois, quando vai mudar o pimentão, passa
somente as raízes na calda pura por 2 minutos. Já utilizou a
calda de fumo para pulverizar a lêndea preta na folha do
pepino. E o controle foi positivo.

Para o controle da lagarta e da lêndea do milho, usa também a


folha do angico. Coloca aproximadamente 1 quilo de folha de
angico em 5 litros de água. Depois de 3 dias, côa-se as folhas.
Depois tem que diluir essa água em 20 litros para então
pulverizar. Os resultados foram as plantas de milho bem limpa.

Otávio conta que aprendeu com o professor


Sebastião Pinheiro que laranjas podres podem
controlar as formigas. Coloca 8 laranjas podres em
4 litros de águas. Depois de 3 dias, ele machuca as
laranjas e coa. Otávio aplicou ½ litro deste água no
formigueiro. No dia seguinte, observou que as
formigas estavam mortas. Então repetiu a
aplicação, assim acabou matando o formigueiro.

Cultivos Ecológicos 01
Calda Bordalesa: a experiência dos irmãos
Maciel
Severino é agricultor familiar e também
representante da Comissão Água e Meio Ambiente
do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Lagoa
Seca. Ele, sua esposa e seus três filhos moram na
vila Alvinho. E, quando não vai participar das
reuniões no Sindicato, Severino sai sempre bem
cedo para trabalhar nas terras de sua família no sítio
Almeida.

Em 1 hectare de terra, trabalham, além de sua


família, outras 4. Sob os olhares atentos de sua mãe, dona Domerina,
trabalham os irmãos em um exemplo único de união e partilha. Lá, eles
desenvolvem muitas experiências. Plantam inhame, macaxeira, feijão, milho,
cará. Produzem, vendem ou doam mudas de várias qualidades como o nim,
guandu, leucena e várias fruteiras. Possuem
um pequeno pomar com bananas, graviola,
manga, caju e uma horta com vários tipos de
plantas de remédio e de enfeite. São
instrutores de cisternas de placas e estudam
diversas formas de melhor aproveitar a água
que passa pelo sítio. Possuem uma
barragem subterrânea onde estão plantando
verduras e feijão vagem. Ainda possuem
uma pequena área de mata que estão
preservando. Criam cabras e uma garrota. E Severino e seus irmãos têm se
especializado na enxertia de limão. Uma técnica que permite colocar uma
qualidade diferente de limão no seu pé.

Uma experiência que a família de Severino tem usado com


sucesso é a calda bordalesa para controlar as doenças
das plantas. Contam que aprenderam há dois anos
quando José Lichesck, um agricultor do Paraná, veio dar
um curso no Sindicato de Lagoa Seca. Desde então, eles
vêm usando principalmente nas mudas de limão e no
plantio de inhame. Quando suas plantas apresentam os
primeiros sinais de ataque, aplicam imediatamente uma
combinação de calda bordalesa com o biofertilizante. A
experiência tem mostrado bons resultados. Além de
acabar com a doença, Severino conta queAs plantas
Cultivos Ecológicos 01
passam a desenvolver mais sadias, fortes, ficam
mais verdes e, conseqüentemente, produzem
mais.

Severino ensina como é fácil fazer a calda


bordalesa. O produto é feito com sulfato de
cobre, que pode ser comprado em casa de
agricultura, cal e água. Primeiro, pegamos uma
vasilha de plástico com 10 litros de água e
misturamos 200 gramas de sulfato de cobre. A vasilha deve ser de plástico
porque o sulfato de cobre corrói o ferro. Em outra vasilha, colocamos mais 10
litros de água para dissolver os 400 gramas de cal. Se preferir fazer como
Severino, temos que colocar menos água para
interar com o líquido do biofertilizante.
Misturamos o conteúdo das vasilhas muito bem,
para só então misturar os dois líquidos.

Mas antes de aplicar nas plantas, temos que


fazer o teste do ferro. Para isso, pegamos um
pedaço de ferro qualquer, uma faca, por exemplo,
e molhamos com o produto. Temos que esperar
uns dois minutos e se enferrujar significa que a
calda ficou muito forte. Então, temos que colocar mais umas 150 gramas de
cal. Devemos fazer o teste novamente. Só devemos aplicar nas plantas
quando parar de enferrujar o metal, senão queimará as folhas.

Severino recomenda aplicar a calda nos momentos mais frios do dia, ou seja,
pela manhã cedinho ou no final da tarde. Segundo ele, é que nos momentos
mais quentes o produto evapora e perde o seu efeito. As aplicações devem ser
feitas uma vez em cada 15 em 15 dias. Severino ainda observa que a calda
deve ser feita na hora em que for aplicar.
Modo de preparo da calda bordalesa
Ingredientes para 20 litros Em um balde plástico, penere o cal; depois despeje aos poucos
- 200 gramas de sulfato de cobre um copo de água e mexa bem até formar uma pasta. Espere a
- 200 gramas de cal comum cal queimar por 8 a 12 minutos. Em seguida, acrescente 10 litros
- 20 litros de água limpa de água, sempre mexendo bem. Em outro balde, coloque o sulfato
de cobre e acrescente dois copos deágua quente. Mexa bem.
Material necessário Acrescente 10 litros de água fria, sempre mexendo bem. Encha
- 3 baldes de plástico uma caneca com calda de cal e a outra caneca com a calda de
- 1 pá de madeira sulfato de cobre. Depois vá despejando as duas ao
- 1 peneira mesmo tempo em um terceiro balde. Mexa com a pá de
- 2 canecas de plástico madeira. Faça assim até passar toda a calda de cal e de
- 1 coador cobre para o terceiro balde, sempre mexendo. Desta forma,
a calda ficará bem misturada. Por fim, é só coar a calda.
Cultivos Ecológicos 01
Óleo de Nim: a experiência de seu Guimarães
João Guimarães, mais conhecido por seu
Guimarães, possui quase 3 hectares de terra no
sítio Oiti, em Lagoa Seca. Nascido há 67 anos no
Ceará, seu Guimarães se considera meio
cearense e meio paraibano. Depois de ter rodado
quase todo o Brasil, já conheceu do Rio Grande do
Norte ao Rio Grande do Sul, do Acre à João
Pessoa, seu Guimarães resolveu vender suas
terras no Piauí para se mudar para Lagoa Seca.
Faz três anos que deixou de usar veneno e tudo na sua terra é natural. Apesar
de morar em Campina Grande com sua esposa, dona Alzira, seu Guimarães
vai ao sítio todos os dias.

Planta cebolinha, rabanete, pimentão amarelo e verde,


cenoura, chicória, alface crespo, alface liso, alface roxo,
alface americano, quiabo, fava, brócolis, rúcula, mastruz,
manga, coco, abacaxi. Em outra parte do sítio também
tem agrião, espinafre, muitas qualidades de alface, cana.
Ainda tem um bosque de nim. Suas plantas são muito
bem tratadas. Onde não tem canteiro de horta, ele
protege a terra com capim para não dar erosão.

Sempre atento às novidades, seu Guimarães planta


hortaliças que quase ninguém tem. Atualmente, ele está
lançando na Feira de Produtos Orgânicos de Lagoa Seca o fruto da palma, que
é muito nutritivo.

Desenvolveu um serviço especial de entrega de cestas


com seus produtos. Já tem 150 fregueses certos, além
de fornecer verduras para 8 restaurantes diferentes de
Campina Grande. Seus fregueses podem escolher
entre os quase 30 produtos diferentes que produz.
Sempre inovando, entrega as macaxeiras já
descascadas, só precisa cozinhar.

Grande admirador da planta chamada nim, seu


Guimarães possui mais de 40 pés em sua propriedade.
Eles são plantados como quebra vento na horta, como
bosque perto do açude. Nunca deixa de plantar novos
pés. Aprendeu a apreciar e usar esta planta com uma

Cultivos Ecológicos 01
sobrinha que mora no Ceará. Ela tem plantado
322 pés e usa para fazer chapéus, sabonete e
pasta de dente. Seu Guimarães usa o extrato
ou o óleo de nim sempre que precisa para
combater o pulgão, lagarta e a mosca branca.
E suas estacas dão um ótimo cabo de enxada.

O óleo de nim é
comprado. Para usar ele
pega um litro de óleo e acrescenta 200 litros de água. Para
fazer o extrato, ele pega 1 quilo de folha, bate no
liquidificador com água. Côa e coloca numa bomba de 20
litros.

Para combater o cachorrinho d´água, seu Guimarães


usou dipel. Misturou dipel com açúcar e fubá de milho.
Jogou no canteiro e ele nos conta que ou os bichos
morreram ou eles foram embora. Usou esse produto
também para evitar a broca do pepino. Pulverizou uma vez
e 15 dias depois. Segundo ele, os resultados foram muito
bons.

Extrato de Melão de São Caetano: a


experimentação participativa
Está sendo realizado, pelos agricultores
experimentadores em parceria com professores e
alunos da Universidade Federal da Paraíba
UFPB e a AS-PTA, um estudo sobre o uso do
extrato de melão de São Caetano no controle do
pulgão da erva-doce e do feijão macassa. Mais
recentemente agricultores do sítio Araçá, Joab e
seu Tota, iniciaram um teste no ácaro do jiló e no
pulgão do pepino e do feijão macassa.

O melão de São Caetano, também conhecido por


melão Caetano ou erva de lavadeira, é uma planta muito comum na região.
Nasce com facilidade dentro dos aceiros do roçado. É uma planta trepadeira,
ou seja, gosta de subir em árvores, muros e cercas. Essa planta é conhecida
pelos agricultores pelo seu uso medicinal. É utilizada no tratamento de pano
branco, coceiras, sarnas, impinge. E agora está se estudando um novo uso, o
de controle de pragas e doenças das culturas.
Cultivos Ecológicos 01
Para se fazer o extrato do melão de São Caetano são necessários alguns
equipamentos, como o extrator (foto ao lado). Primeiro, pega-se 1 quilo de
ramas que foram secas à sombra. Tritura-se bem. Coloca-se tudo dentro de um
balão de vidro com 3,5 litros de álcool de farmácia. O balão é então aquecido
por 2 horas. Retira-se as ramas que foram fervidas deixando apenas o líquido
que é composto de álcool e extrato. Continua-se aquecendo o balão até o álcool
virar gás e subir por um tubo de vidro. Neste momento, por ser o tubo mais frio, o
álcool vira novamente líquido e cairá dentro de um pote ao lado. Dentro do
balão, só irá ficar aquelas substâncias que foram retiradas das ramas, o que
nós chamamos de extrato. No final deste processo tem-se por volta de meio litro
de extrato. E depois do extrato pronto, é melhor se guardar dentro da geladeira.

Para aplicar, recomenda-se pegar um litro de extrato e acrescentar mais 20


litros de água. Logo que perceber o ataque das pragas, deve-se iniciar a
pulverização. Deve-se aplicar em um intervalo de 8 dias, mas se o ataque
estiver forte o ideal é que seja realizado de
5 em 5 dias. Os experimentadores ainda
ensinam que deve-se pulverizar nos
horários mais frios do dia, logo pela manhã
ou no final de tarde. E que o extrato deve
ser pulverizado bem em cima da praga.

Para quem não tem todo esse


equipamento em casa, os
experimentadores ensinam que pode-se
fazer e testar o macerado. Pega-se 1 quilo de ramas verdes, pisa bastante e
coloca água e meio litro de álcool para sair o
sumo. Deixe as ramas na água por 2 dias. Depois
é só espremer bem as ramas, colocar o líquido na
bomba e pulverizar. Alguns agricultores já estão
testando o macerado. Os primeiros resultados
mostraram-se positivos.

O estudo do extrato de melão de São Caetano,


ainda em fase de testes, está sendo
desenvolvido por professores da UFPB de
Bananeiras, alunos da UFPB de Areia e diversos
agricultores experimentadores da região.
Acredita-se que esse produto possa ser utilizado
em outras pragas e doenças. Aqueles
agricultores e agricultoras que se interessarem

Cultivos Ecológicos 01
por experimentar o extrato e participar desta pesquisa deverão entrar em
contato com o STR de seu município, com a AS-PTA ou na UFPB de
Bananeiras com o professor Paulo Wanderley.

Produção de Sementes de horta


João Miranda e Terezinha moram no sítio Serra dos
Mares, no município de Remígio. Trabalham com
seus filhos numa área de 2,5 hectares. E há alguns
anos a família está lutando por uma área no
assentamento Fazenda Sessenta e Oito.

No sítio em Serra dos Mares, a família de João


Miranda e Terezinha desenvolve muitas
experiências. Eles possuem 3 barragens
subterrâneas, várias barreiras de pedra, área de
palma, roçado diversificado, faixas de algodão
preto plantado atravessado para impedir a erosão e
melhorar a terra. Estão conservando e plantando
muitas
plantas da
região como a aroeira, frei Jorge,
juazeiro, catingueira, ubaia,
canafístula, mororó e outras tantas.
Desenvolveram uma cerca viva com
plantas da região (pinhão, burra
leiteira, imburana de espinho) e
fizeram um enchimento com gliricídia.
Para fechar a base da cerca, eles
plantaram palma de espinho.
Possuem um tanque de pedra e um
barreiro. Aproveitam a área das
barragens subterrâneas para plantar
muitas fruteiras como pinha, caju,
graviola, laranja, limão, manga, coco e os
cultivos de horta e de vazante. Além de
plantar essa diversidade de plantas, a
família está preocupada em produzir e
distribuir mudas com seus vizinhos e
visitantes.

Cultivos Ecológicos 01
João Miranda e Terezinha guardam com muito zelo
as sementes das plantas de seu sítio. Selecionam e
guardam tanto as sementes das plantas da região
como as que irão plantar no roçado, na horta, na
vazante e aquelas utilizadas como remédio.

Há 3 anos, João vem se desenvolvendo


experiências em produzir sementes de verdura. Na
época da luta pela terra da Fazenda Sessenta e
Oito, compraram sementes de várias qualidades
numa loja. Conseguiram produzir e tirar sementes
de várias delas como tomate, pimentão, alface,
coentro, cebolinha, pepino e jerimum de horta. Aqui
eles irão nos explicar algumas.

Para selecionar as sementes, eles começam selecionando os pés. Procuram


as plantas mais fortes, bem desenvolvidas e sadias. Escolhem plantas
distantes uma das outras pelo meio do plantio.

Para o tomate, separa os frutos da primeira carga. Deixa ficar bem maduro e
coloca para apodrecer. Com 3 dias de podre, passa numa arupemba para
separar a semente e espalha no lajedo para secar. Coloca de manhã e ao meio
dia está pronto.

João colhe os pimentões maiores e sadios bem maduros. Abre, passa uma
escovinha e coloca para secar. Um dia de sol valente dentro de uma bacia de
zinco, as sementes ficam prontas. Elas podem ser guardadas consorciadas
com as sementes de tomate. Assim, diz João Miranda, faz um canteiro só na
hora de plantar, aproveitando também a água.

Para produzir as sementes de alface,


João planta, no final do inverno, as
mudas bem separadas uma das
outras e deixa crescer a vontade.
Quando sente que o cacho está perto
de amadurecer, ele corta e despreza
a ponta do cacho. Dessa forma,
eliminam-se aquelas sementes
chochas. E quando estiver maduro,
ele tira todo o cacho, deixa dormir, e
coloca no sol. Aí pode-se guardar as
sementes de duas maneiras. Dentro

Cultivos Ecológicos 01
do paú, o que ele chama de semente sebosa ou pode-se guardar a semente
ventada. Para isso, João aconselha fazer uma cortina de pano, para bater as
sementes.

Terezinha nunca deixa de ter sementes de mostarda em casa. Acredita ser uma
ótima planta de remédio e não fica sem, por isso sempre semeia pelo roçado.
Para separar as sementes ela colhe o pé inteiro bem maduro, quase seco, mas
observa que tem que ser antes de começar a debulhar.

Para guardar tanta semente, eles colocam em vasilhas de plástico ou latinhas.


E para livrar do ataque dos bichos, colocam pimenta do reino, cabeça de alho
ou cinza.

João nos lembra que para fazer semente tem que ter muita paciência e gosto
pelo ofício.

Armazenamento natural de sementes: a


experiência da família de dona Maria de
Edísio
Dona Maria de Edísio nasceu no interior de uma família
muito pobre no Rio Grande do Norte. Muito cedo, uma
fatalidade os obrigou afastar-se de seu pai. Como filha
mais velha, dona Maria se viu na obrigação de assumir
junto com sua mãe o sustento de sua família. A fim de
garantir dias melhores para os irmãos mais novos,
mudaram-se muito. Foram para o Maranhão onde
dona Maria chegou a quebrar coco para fazer a feira
para a mãe e para os irmãos. Cansados da luta,
resolveram mudar-se para Casserengue, no
Curimataú de Solânea, onde morava a avó materna de
dona Maria. Mas os dias ainda continuavam pesados
para ela e para sua mãe. Passaram a plantar de meia e
puxar agave para garantir a comida na mesa para os
irmãos mais novos.

Foi em Casserengue que dona Maria conheceu seu


Edísio. Casaram-se e os primeiros anos de vida juntos também foram
marcados pela dificuldade, pelo trabalho duro. Seu Edísio era morador na
fazenda de Bila Joca, quem ainda mantém respeito em sua memória. No dia
Cultivos Ecológicos 01
em que se casaram, mudaram-se para uma casa
muito simples, na época ainda de taipa. Tinham como
patrimônio apenas a cama, dois tamboretes e os
utensílios de casa comprados com capricho para o
enxoval de dona Maria.

No início do casamento, seu Edísio era marchante,


vendia e comprava bodes e era também carreiro do
patrão. Seu Edísio conta que juntos plantavam e
colhiam o algodão. Quem se ocupava do roçado era
dona Maria. No começo, plantava feijão estendedor,
achava ótimo, mas os invernos foram se afracando,
conta dona Maria. Passou a plantar e selecionar
sementes de feijão meia moita. As sementes que eu
via que dava certo para mim, sempre guardava.
Nessa época, plantavam tudo consorciado, junto
com o algodão mocó, plantavam o milho, a fava e o feijão estendedor que subia
nos pés de algodão. Todo o plantio do algodão era então dividido com o Bila
Joca. Mas os produtos do roçado eram todos da família. Todos os legumes
produzidos eram para o consumo da casa e o algodão era vendido para
comprar roupa, sapato, livros, animais ou para tratar alguma doença.

Aconselhados pela ANCAR, empresa governamental de extensão da época,


deixaram de plantar consorciado, assim aumentariam a produtividade, era a
promessa dos técnicos. Viveram anos mais difíceis, a praga passou a atacar as
plantações e o algodão deixou de ser um produto de renda. Toda a comunidade
passou a derrubar mais a vegetação para aumentar as áreas de roçado,
plantar agave ou fazer carvão. Acreditam que junto com a degradação do
ambiente, aumentou também a dificuldade das famílias em viver no Curimataú.

Em conseqüência dos bons negócios


como marchante e também do algodão,
seu Edísio foi capaz de acumular recursos
e formar seu patrimônio. Aos poucos,
foram comprando as terras dos herdeiros
de seu antigo patrão. Nos 40 hectares de
terra, hoje moram o casal e as famílias de
seus dois filhos.

Dona Maria recorda-se que, desde 1972,


vem guardando as sementes que vem
pesquisando. Com uma lista de critérios

Cultivos Ecológicos 01
bastante apurada, dona Maria vem separando ao longo dos anos aquelas
qualidades que dão mais, que são mais rendosa, que são vendável e as mais
saborosas.

Todos os anos, separa as suas sementes e as coloca para secar ao sol. Depois
que elas estiverem bem secas e frias, dona Maria coloca em seus garrafões ou
em silos de 10 ou 20 quilos, construídos por seu filho, Toinho, especialmente
para armazenar suas sementes. Mas antes de guardar, dona Maria mistura
suas sementes com as cinzas da fogueira de São João. Distribui as sementes
nos recipientes e para bem vedar, faz uma lama, como chama, da cinza com
água e coloca uma camada na tampa do recipiente. Quando seca, essa lama
transforma-se em um torrão que irá vedar com eficiência seus silos. Garante
que, em todos esses anos, nunca perdeu suas sementes com gorgulho.

Na época em que chega o inverno, divide suas sementes com seus filhos e
vizinhos. Se eu perder, meus vizinhos podem ainda ter. Não quero as sementes
só para mim. Quero para mim, para meus filhos e vizinhos, conta dona Maria.
Quando o inverno é ruim e as sementes estão mais limitadas, eu dou limitado,
mas quando dá mais, eu distribuo
bastante.

Dona Maria ainda tem algumas


estratégias para nunca perder suas
sementes. Em 2002 mesmo, eles
encheram o roçado de milho e feijão,
mas o inverno foi muito fraco. Dona
Maria conta que para não perder as
sementes, a família não comeu o
feijão e o milho verde, alimento
bastante apreciado na região.
Esperaram secar para poder colher e
separar as sementes e só comeram o
que sobrou.

O feijão macassa cariri e o camaupu, o


mulatinho da vagem roxa, o carioca e
o milho 60 dias são sementes que ela
preserva há anos. Acredita ser
importante guardar as sementes
todos os anos por ter a garantia do que
está plantando. Se comprar na feira, o
agricultor dificilmente terá a certeza
de sua qualidade e é arriscado até não
Cultivos Ecológicos 01
nascer. Guardando as sementes em casa, tem o conhecimento do tempo, o
que dá a segurança na germinação. Com a semente em casa, na hora que
chove o agricultor pode plantar, porque no Curimataú para lucrar o agricultor
tem que plantar no rastro da chuva. Dona Maria ainda conta que guardando a
semente em casa, tem-se certeza de que aquela semente é bem adaptada ao
seu setor e, com isso, guarda também todo o conhecimento sobre tempo de
germinação, de produção, de colheita, toda sabedoria vinda dos seus anos de
observação.

Dona Maria procura passar suas experiências para seus filhos e Toinho de
Edísio já é grande divulgador de seus conhecimentos. Já viajou dentro Brasil e
até mesmo para o exterior, divulgando essa e outras experiências de sua
família.

Experimentação de alternativas
para libertar dos adubos químicos
Adubo da Independência: modo de preparo
O adubo da independência é um adubo que os próprios agricultores e
agricultoras podem fazer com o que eles encontram em sua região. É um
adubo natural preparado
Veja como é fácil fazer este adubo: com as coisas que se
Ingredientes necessários para fazer 2 toneladas: tem na própria terra, por
500 quilos de terra argilosa de barranco isso é importante que
350 quilos de húmus de minhoca cada agricultor ou
200 quilos de esterco bovino (pode ser de cabra ou agricultora experimente
ovelha) sua própria receita. Seu
160 quilos de MB-4 preparo é muito fácil,
160 quilos de calcário porém trabalhoso. O
80 quilos de farinha de osso ideal é fazer em regime
330 quilos de farelo de trigo de mutirão.
140 quilos de pó de carvão
6 litros de mel de cana-de-açúcar A motivação para a
2 litros de E.M ou 500 gramas de fermento de pão descoberta deste
20 quilos de batata-doce produto, experiência de
20 quilos de pó de telha um grupo de agricultores
20 quilos de fosfato natural do Paraná, foi a partir da
20 quilos de rocha potássica necessidade dos
agricultores produtores
Cultivos Ecológicos 01
“Esse adubo misturado
De tudo se aproveita
de batatinha do Agreste da Paraíba, que Terra e esterco de gado
ainda são muito dependentes de Até com carvão se ajeita
produtos químicos como a uréia e Pedra moída no motor
sulfato de amônia. Terra de barranco onde for perto da
terra ou no mato
A Comissão de Cultivos Ecológicos do Só dá pena a gente ver
Pólo Sindical da Borborema vem, Que em vez de se comer
portanto, promovendo diversos Joga-se dentro a batata”.
Euzébio Cavalcante.
mutirões de fabricação do adubo da
independência e vem estimulando a sua
experimentação nos vários tipos de
cultivos como batatinha, horta, frutas e também na produção de mudas. Nesses
mutirões estão envolvidos agricultores e agricultoras dos diversos municípios
do Pólo, que ao final saem com o compromisso de partilhar os resultados dessa
experiência com outras famílias de agricultores.

Modo de preparar
1º Passo: reunir os ingredientes necessários no local onde será preparado, de
preferência longe de casa, devido ao cheiro forte nos primeiros dias de
fermentação. É bom escolher um lugar coberto de chão batido ou piso de
cimento.
2º Passo: Colocar a terra de barranco no lugar onde vai ser fabricado.
3º Passo: Cozinhe 10 quilos de batata-doce ralada numa vasilha com 20 litros
de água. Esmagar bem até formar um mingau.
4º Passo: Quando o mingau esfriar, colocar 3 litros de mel de cana-de-açúcar.
Mexa bem e coloque o fermento de padaria.
5º Passo: Espalhar os ingredientes secos no chão batido, fazendo camadas
finas. Primeiro, comece pela terra de barranco e depois os outros ingredientes.
Traçar bem os ingredientes.
6º Passo: Derrame o mingau sobre os ingredientes secos já traçados. Em
seguida, molhe com água pura, mexendo bem para conseguir uma boa
mistura. Essa mistura deve ficar com 50% de umidade.
7º Passo: Faça um monte de aproximadamente 50 centímetros de altura.
8º Passo: Mexa o monte todos os dias para que ele não esquente demais.
Cuide para que o calor não passe de 60 graus centígrados. Se for preciso, esfrie
com água na hora que for mexer.

Cultivos Ecológicos 01
9º Passo: Quando parar de esquentar, o adubo da independência pode ser
guardado em sacos ou num monte. Preste atenção para que ele não fique
molhado novamente. Caso aconteça, coloque para secar um pouco na
sombra.
Adaptado da cartilha Adubos caseiros e caldas: receitas para nutrição e proteção das plantas. Fórum
das organizações dos trabalhadores e trabalhadoras rurais do Centro Sul do Paraná e AS-PTA.

Os resultados do adubo da independência no


roçado: a experiência de Robinho
Robinho é um jovem agricultor de
Lagoa Seca. E junto com sua mãe,
dona Odenira, vêm realizando diversas
experiências de cultivos ecológicos no
seu sítio.

Robinho planta muita mandioca, feijão


de várias qualidades, batatinha, milho,
fava, cará preto, inhame, coentro,
batata doce, ainda tem uma capineira e
uma área de pasto. Em 2002, ele
resolver fazer uma experiência de
adubação de solo no plantio da batatinha com orientação do Sindicato dos
Trabalhadores Rurais de Lagoa Seca e da AS-PTA.

Separou quatro cortes do roçado para fazer um teste com um novo adubo, o
adubo da independência. No primeiro corte, Robinho colocou, na encama do
leirão, meio quilo de adubo da independência por metro corrido. E depois
aguou com biofertilizante, na concentração de 1 litro de bio para 10 litros de
água. Para isso, usou meio litro
dessa mistura por 1 metro corrido.

No segundo corte, Robinho colocou


na encama do leirão somente
biofertilizante na mesma
concentração do primeiro corte.
Teve o cuidado de preparar essas
duas áreas no final da tarde para
que o sol não secasse o
biofertilizante, para no dia seguinte
realizar o plantio da batatinha.

Cultivos Ecológicos 01
No terceiro corte, não foi colocado nem
adubo da independência e nem
biofertilizante na encama do leirão.
Robinho plantou a batatinha e depois
que ela nasceu, contou 15 dias e
colocou o adubo da independência na
cova. De forma semelhante, Robinho
trabalhou no quarto corte. Só que
aplicou o adubo depois de 20 dias.

Em cada corte, plantou 3 caixas de batata semente. E em todos os cortes,


aplicou biofertilizante nas partes aéreas das plantas. Para tanto, iniciou a
aplicação quando as plantas estavam com 20 dias de nascida. Nas duas
primeiras aplicações, usou uma mistura mais fraca, de 1 litro de biofertlizante
para 19 litros de água. E nas aplicações seguintes, achou melhor aumentar a
concentração do produto. Usou a mistura de 2 litros de bio para 18 litros de
água, o que completa a bomba de 20 litros. No total, fez 8 aplicações de
biofertilizante nos 4 quatro cortes, obedecendo um intervalo de 8 dias de uma
aplicação para outra.

Nesta mesma área, fez ainda o consórcio com milho e


feijão macassa. Depois de 15 dias que a batatinha tinha
nascido, ele plantou o milho no bucho do leirão. Plantou
em um leirão, pulou outros 4, para plantar no outro
novamente. E após 20 dias do plantio do milho, plantou o
feijão macassa.

Depois de 120 dias, Robinho colheu 67 sacos de batata


desses 4 cortes. Avalia que as batatas produzidas com
produtos naturais conseguem durar muito mais tempo no
solo, sem apodrecer e mantendo a cor mais limpa.

De todos os testes realizados, o melhor resultado foi do primeiro corte, do uso


do adubo mais o bio na encama do leirão. Com esses produtos, a batatinha
teve um ótimo desenvolvimento, ficou com uma cor limpa, sem pinta e bem
amarela. Mas o que também chamou muita atenção de Robinho foi o peso das
batatas. Nesse primeiro corte, a produção foi de 18 sacos que geralmente
pesa 50 quilos. No entanto, por serem mais pesadas, cada saco estava em
média 8 quilos acima do peso comum. Observou também que o milho e o feijão
macassa produziram melhor nesta área.

No segundo corte, a produção foi de 17 sacos, porém observou que com esse
tratamento as batatas não eram tão pesadas quanto o do primeiro.
Cultivos Ecológicos 01
No terceiro e quarto corte, a produção foi bem abaixo dos dois primeiros
tratamentos; 13 sacos para o terceiro e 7 sacos para o quarto corte. Nessas
áreas, as batatas ficaram pequenas e com qualidade inferior.

Fazendo uma avaliação de seus experimentos,


Robinho chegou a conclusão que o adubo não
atua logo que é colocado na terra. Por exemplo,
quando aplicou o adubo na planta com 15 dias,
notou que ela só começou a usar o alimento do
adubo depois de mais 15 dias. Por isso,
acredita que o melhor tratamento seja aquele
que se coloca o adubo da independência com o
biofertilizante na encama, pois quando a planta
nasce ele já está disponível para ser
consumido pelas raízes.

Robinho conseguiu vender toda sua produção num preço acima do valor de
mercado. Vendeu 55 sacos de batata comércio para o mercado de produtos
orgânicos a 25,00 reais cada saco. Vendeu 7 sacos de batata refugo no
comércio normal, conseguindo um preço de 15,00 reais por saco, ou seja, o
mesmo preço da batata produzida com veneno. E ainda, separou 5 sacos de
batata semente.

No ano de 2003, Robinho repetiu, portanto, o procedimento que ele achou mais
interessante, ou seja, aplicou 1 tonelada do adubo e o biofertilizante na
encama. Os resultados novamente foram surpreendentes. Plantou 16 caixas
de batata semente e colheu 6 toneladas de batata comércio e mais 45 caixas
de batata semente.

Os resultados do adubo da independência na


verdura:experiências de Naldinho
Ednaldo Silva Nascimento, mais conhecido como Naldo é um
jovem agricultor de Lagoa Seca. Casado com Maria José, eles e
seus 3 filhos pequenos moram no sítio Lagoa do Barro. Lá eles
plantam feijão macassa, feijão preto, tomate, cenoura, coentro,
alface e pimentão.

Há dois anos, a família de Naldo passou a plantar as verduras. E


no início, chegou a plantar com muito veneno. Já usou dithane,
folidol e outros. Mas pelas mãos de seu próprio pai, o Zezinho
Plácido, Naldo conheceu os benefícios dos produtos naturais. E
Cultivos Ecológicos 01
hoje em dia ele não quer saber mais de
produtos de loja. Começou
experimentando o biofertilizante e a calda
bordalesa e depois foi testando a
manipueira, urina de vaca, melão de são
Caetano. Acredita que esses produtos
naturais sejam bons para quem está
lutando, para a família que passa a
consumir sem veneno, para o comprador
e, sobretudo, é para o bolso. Naldo fez a conta,
este ano ele vai gastar 70% a menos do que
gastaria se usasse veneno. Atualmente, vende
seus produtos na Feira Agroecológica de Lagoa
Seca.

Recentemente, Naldo testou mais um novo


produto, o adubo da independência. Foi mais uma
vez seu pai que lhe apresentou o novo adubo, que
resolveu testar no plantio de tomate, pimentão, coentro e alface.

Em um canteiro de 5 metros por 1 e meio, Naldo sameou 10 quilos do adubo em


600 mudas de pimentão que já estavam com 20 dias de transplantas. Naldo
comparou com outras vezes que havia plantado o pimentão e observou que
com o adubo, os pés tinham carregado mais e que tinha enramado bem.
Plantou uma semente de pimentão casca dura e observou que o adubo ajudou
a dar mais ponta de rama, o que permitiu tirar 5 panhas. E acredita que só não
tirou mais porque estava com pouca água. Produziu nesse canteiro mais de
1250 pimentões, o que avalia ser uma boa produção.

Depois que retirou o pimentão, plantou tomate na mesma área. E quando o


tomate começou a florar, ele colocou
aproximadamente 250 gramas de adubo
na cova de 110 pés. Atualmente, as
plantas já carregam os tomates em
cacho. E observou que nesta área cada
planta tem em média 8 cachos. Segundo
suas contas, cada planta deve produzir
mais de 1 quilo, o que lhe renderá uma
produção total de aproximadamente 150
Kg. Observou que as plantas com o
adubo da independência cresceram
mais limpas e bonitas. Pretende ainda

Cultivos Ecológicos 01
colocar mais um pouco de deste adubo na cova
desses tomates para ajudar na ponta de rama.
Uma adubação para o crescimento dos frutos.

Experimentou também o adubo da


independência no cultivo da alface. Sameou
aproximadamente 10 quilos de adubo em 300
pés de alface com 15 dias de crescimento.
Notou que se comparar com a área em que colocou o estrume de galinha, os
pés ficaram mais graúdos, mais evidente, mais verde, bem molinho, mais sadio
e foi mais rápido. No canteiro com o adubo da independência conseguiu colher
o alface com 40 dias, enquanto nos outros canteiros colheu com 45 dias.

Por fim, ele fez o teste no coentro. Ele e seus clientes têm notado bastante
diferença. Depois 20 dias em que plantou e estrumou, o coentro começa a ficar
amarelado. Aí resolveu samear uns 2 quilos de adubo da independência. O que
notou foi que o coentro ficou verde novamente em 8 dias e seus clientes
repararam que ele dura verde por mais tempo depois que chega em casa.

Naldo acredita ser o adubo da independência um bom produto porque ele dura
mais na terra. Depois que se coloca sob a terra, ele fica disponível para a planta
quando molha. Quando o sol seca a terra, seca também o adubo, que
permanece em cima da terra. Aí na próxima aguação, ele torna-se disponível
novamente para as plantas. Para Naldo, este adubo foi aprovado.

Comercialização de produtos
agroecológicos da agricultura
familiar
A feira Agroecológica de Lagoa Seca
A experimentação de produtos naturais no município de Lagoa
Seca começou a partir de uma visita de intercâmbio realizada
ao Centro-sul do Paraná. A partir dessa visita, o Sindicato dos
Trabalhadores Rurais passou a se preocupar com o uso
indiscriminado de veneno dentro do município, principalmente
por serem produtores e exportadores de verduras.

Esse processo ganhou um estímulo maior quando o Sindicato


promoveu uma visita de José Lichesck, um agricultor do
Cultivos Ecológicos 01
Paraná, e um curso de produtos naturais
realizado no sítio Lagoa do Gravatá. Deste
curso, 2 agricultores saíram capacitados e
animados em realizar diversos experimentos
em suas terras. Os resultados desses
experimentos sempre eram analisados
coletivamente por um grupo de agricultores e
agricultoras do município.

Em 1999, o Sindicato propôs então a esse


grupo que se montassem também pequenos
experimentos. Os agricultores e agricultoras
passaram a desenvolver experiências em um
canteiro e fazer comparação, ver os
prejuízos, os males que causam o veneno
para quem pulveriza e também para quem
consome os produtos.

As experiências passaram a dar resultado, os agricultores e agricultoras


passaram a acreditar e novas pessoas passaram a experimentar o
biofertilizante, a calda bordalesa, a calda de fumo, a manipueira, o dipel, o óleo
de nim, o extrato de melão de são Caetano e outros tantos produtos. Zezinho
Plácido cumpriu um papel importante na busca e na pesquisa dessas
novidades. Experimentava em casa e logo saia divulgando os resultados para
o grupo.

Em 2001, foi realizado no município de Lagoa Seca um diagnóstico sobre o


uso de agrotóxicos. Esse diagnóstico foi um momento importante dentro do
processo de formação dos agricultores e agricultoras que saíram
sensibilizados em abandonar de vez a sujeição aos produtos químicos.

Desta forma, produção de alimentos limpos foi aumentando e com ela a


consciência de que estava produzindo produtos diferenciados. A fim de dar
visibilidade ao trabalho e permitir que o consumidor possa ter direito de
escolha de um alimento saudável a um preço acessível, iniciou-se um intenso
processo de debate e troca de experiências sobre comercialização.

O grupo achou importante, portanto, iniciar os trabalhos formando


primeiramente um mercado consumidor e dentro de uma grande campanha,
Um Natal sem veneno, 25 famílias se organizaram na véspera do natal de
2001 para vender seus produtos. Como o município de Lagoa Seca não havia
feira, a aceitação foi imediata. Os feirantes foram convidados a voltarem no

Cultivos Ecológicos 01
sábado seguinte, quando promoveram o Ano Novo sem veneno. A partir daí,
nunca mais faltaram um sábado.

Todas as ações desse grupo são compartilhadas, foi assim também na hora de
decidirem pela imagem da feira. Fizeram algumas visitas de intercâmbio, em
Brejo da Madre de Deus e João Pessoa, para estudarem qual seria a melhor
banca e organizaram um fundo rotativo para a aquisição das barracas. O fundo
rotativo recebeu um impulso ainda de dois projetos e em outubro de 2003 já
possuem 29 barracas.

Na feira vendem-se produtos laranja, mamão, banana e verduras


diversificadas, vendem produtos do roçado, ovo de capoeira, mel, doces e
bolos. A qualidade dos produtos já está sendo reconhecida na região e sempre
são convidados a levarem a feira para outros lugares. Já foram para Campina
Grande, Itapororoca, Alto Sertão e outros.

Os feirantes possuem uma dinâmica própria de organização. Encontram-se


mensalmente para discutirem para avaliarem e planejarem seus trabalhos,
repassam o conteúdo e as discussões das visitas de intercâmbio, debatem
sobre os problemas de produção, os preços praticados, observam os produtos
que existem na feira e quais aqueles que estão faltando, incentivam e planejam
a diversificação de produção.

No ano de 2003, essas reuniões passaram a


acontecer ora na sede do Sindicato ora na
casa dos feirantes. É uma forma de garantir os
produtos além de se constituírem em
importantes momentos de formação. Foram
também nessas reuniões que se construiu um
regimento da feira, no qual se estabelecem as
condições de participação e permanência no
grupo. Foi formada também uma comissão
composta por feirantes, agricultores
experimentadores e lideranças sindicais que
dá apoio técnico aos feirantes e garante o
cumprimento de todas as regras do
regimento.

Em 2003, o grupo de feirantes e mais os


agricultores e agricultoras experimentadores
estão formando uma Associação dos
Produtores Agroecológicos de Lagoa Seca.

Cultivos Ecológicos 01
A experiência da Feira Agroecológica de Lagoa Seca é, sem dúvida, um
aprendizado para todos os agricultores do Pólo Sindical da Borborema. Essa
experiência está permitindo ao grupo poder criar uma cultura solidária de
comercialização e, sobretudo, fortalecer um espaço de troca de experiência e
de conhecimentos. E, aos poucos, estão se preparando para enfrentar um
desafio ainda maior, levar a feira agroecológica para Campina Grande,
Paraíba.

Comercialização de verduras: a experiência


de seu Guimarães
Ex seminarista, militar reformado, seu João
Teixeira Guimarães hoje vive da arte de
produzir e vender alimentos sadios. Depois
de ter rodado por todo o Brasil, de ter morado
do norte ao sul do país, seu Guimarães
escolheu a Paraíba para viver. Desde
pequeno já tinha amor pela a terra e cultivava
sua horta. Por onde passou no mundo, teve
suas terras, mas aqui na Paraíba descobriu
sua vocação de plantar sem veneno e de fazer amigos.

Em 1986, conta seu Guimarães que vendeu 600 hectares no Piauí para
comprar 2,5 hectares no sítio Oiti, em Lagoa Seca. Logo que chegou, admite
que fazia grandes monocultivos. Plantava campos inteiros de uma verdura só,
fazendo apenas rotação de culturas. Plantava alface, coentro, repolho,
pimentão, cebola, tomate, mas nessa época era obrigado a usar muito veneno.
Assim trabalhava seus vizinhos, não sabiam plantar de outra forma. Vendia
toda sua produção na CEASA. De 1990 a 1996, chegou a vender em 8
supermercados em Campina Grande.

Em 1998 e 1999, houve uma grande seca no estado. A água acabou, o açude
secou. Nessa época chegou ainda a plantar dentro do açude jiló e milho. O olho
d´água de duas terras deu apenas para sustentar 50 canteiros e também dar de
beber a mais de 200 famílias da região.
Foi exatamente nessa época que
deixou de usar veneno, trabalhou muito
pouco o terreno.

Há uns 3 anos atrás passou a andar


mais no Sindicato dos Trabalhadores
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Rurais de Lagoa Seca, começou a participar das
reuniões, passou a conhecer mais as pessoas. Foi mais
ou menos na mesma época que passou a mudar também
sua forma de atingir o mercado consumidor. Nessa
época, elaborou uma carta que começava mais ou
menos assim: De um produtor de verduras sem veneno a
um possível consumidor...

Um dia foi até a um grande supermercado de Campina


Grande para comprar um agrião para fazer uma
comparação com o seu, queria demonstrar assim o que o veneno fazia com as
folhas. Mas sua primeira demonstração aconteceu ali mesmo no caixa do
supermercado.

Depois de explicar o que os agrotóxicos faziam com as verduras, ele distribuiu


sua primeira carta ao consumidor. Assim, disparou-se o processo de
propaganda que ele considera mais eficaz, o boca a boca. A senhora do
supermercado era amiga da dona de um restaurante natural da cidade. As
duas foram as primeiras visitas que seu Guimarães recebeu em suas terras e o
restaurante tornou-se seu primeiro ponto de venda. E mais, foi também seu
primeiro e principal ponto de divulgação, pois sua dona resolveu pregar a carta
para que todos a lessem. Uma iniciativa positiva para ambas as partes, por um
lado, a garantia de que os produtos do restaurante eram realmente sem
venenos, por outro, permitiu que seu Guimarães arrumassem novos
fregueses.

A partir dali, as pessoas começaram a ligar e iniciou a segunda etapa de seu


trabalho, a distribuição das cestas. No começo, tudo ainda com prejuízo,
segundo seu Guimarães. Mas sabia que as coisas iriam
mudar se ele continuasse insistindo. Em meados de 2003,
já são 160 famílias e 5 restaurantes em toda Campina
Grande.

Seu Guimarães afirma que não quer fregueses, quer


amigos que lhe comprem verduras saudáveis. Seu
interesse maior é vender para quem quer servir, porque
seu preço é justo. Por isso, evita os revendedores, aqueles
que querem apenas lucro.

Para atender melhor seus fregueses, seu Guimarães


elaborou uma comanda, ou seja, um bloco de anotações
específico para marcar as quantidades de produtos que

Cultivos Ecológicos 01
cada freguês deseja. As pessoas ligam então para
sua casa e sua esposa, dona Alzira, faz as
anotações. Ao final do dia, monta uma nova lista.
Essa agora enumerando as qualidades pedidas e as
quantidades de cada produto. De posse desta lista,
seu Guimarães retira dos canteiros, no outro dia
bem cedo, as quantidades certas que serão
entregues naquele dia. Depois, com ajuda de seus
companheiros, separa em sacolas a quantidade que
cada pessoa solicitou, agora ele utiliza novamente a
comanda preenchida por dona Alzira. Aí é só
distribuir por toda a cidade.

Seu Guimarães observa que geralmente quintas e


sextas aumentam-se consideravelmente a
quantidade de pedido. Mais recentemente, passou a cobrar uma taxa de
transporte. Assim, a cada compra é acrescido o valor de 1,00 real.

Por fim, seu Guimarães faz anotações diárias em um caderno de controle.


Neste caderno ele construiu uma tabela com os produtos e os dias da semana.
Desta forma, ele tem o controle semanal do que saiu. Com essas anotações,
ele faz o pagamento do pessoal. São 5 pessoas que trabalham com ele e que
ganham por volta de 50,00 a 80,00 reais por semana. De lucro, ele retira por
volta de 200,00 reais semanais. Acredita ser seu trabalho importante também
para a comunidade em que mora. Dá emprego para muita gente e faz a
economia local movimentar.

Para o futuro pretende fazer novas parcerias. Quer conseguir montar em seu
sítio uma câmara fria. Assim como a batatinha, poderá por um preço justo
outros produtos como tomate, pimentão, quiabo que não são produzidos em
suas terras, mas que possuem grande saída no mercado. Desta forma,
acredita poder manter o preço estável, melhor para quem compra, porque sabe
que não está sendo explorado, melhor
para quem vende. E lembra mais uma
vez que seu tipo de comércio é antes
de tudo uma relação de amizade. Sua
maior satisfação em estar servindo é a
satisfação do cliente em estar bem
servido.

Por fim, seu Guimarães dá algumas


dicas básicas para quem quer vender.

Cultivos Ecológicos 01
Primeiro tem que ter a mercadoria, só não se vende aquilo que não existe.
Depois, um bom vendedor tem que conhecer bem sua mercadoria, saber como
preparar o produto, de onde ele veio, como fazer e, sobretudo, tem que ter boa
conversa. Confessa que assim já conseguiu vender até fruta de palma para um
caririzeiro.

Comercialização de frutas: a experiência de


dona Helena
Dona Helena é uma agricultora muito batalhadora.
Desde que deixou de criar menino, vem ajudando
seu marido a criar seus três filhos. E, todos os
sábados, tem presença garantida na feira de
Campina Grande. Dona Helena, com seu jeito meigo
e com seu papo bom, acabou conquistando uma
freguesia cativa na feira.

A família de dona Helena mora no sítio Cachoeira do


Gama, em Matinhas. Sua filha mais velha já se
casou, mas ainda vive na boa companhia de seu
marido e de seus filhos mais novos que a ajudam
muito no roçado e também na feira.

Há mais ou menos 20 anos atrás, dona Helena


começou vender guandu na feira de Campina
Grande. Saía bem cedo de casa, com um balaio na
cabeça cheio de guandu. Mas o começo foi muito
difícil, conta dona Helena. As pessoas ficavam mangando porque acabava
vendendo o balaio pela metade do preço que valia. Ainda não sabia vender.
Mas já nessa época, dona Helena foi conquistando seu público e logo ficou
sendo conhecida por toda a feira
como a Mulher do guandu. Até que
um dia, um senhor de Montadas,
seu Nem, falou para que plantasse
manga para vender. Aí dona Helena
resolveu plantar tudo no mundo para
vender na feira.

A família plantou então vários pés de


manga, laranja de vários tipos, jaca
mole e jaca dura, caju, tamarindo,
acerola, abacate, maracujá,
Cultivos Ecológicos 01
serigüela, carambola, banana e outras
mais. Quando não tem frutas, dona
Helena faz mudas de plantas de
remédio, de árvores de fruta, de plantas
de enfeite. Sempre tem alguma coisa
para levar para a feira. Cada produto
vale pouquinho, mas é dele que tira seu
sustento, conta dona Helena. Um
pouquinho de um, com um pouquinho
de outro é o que faz a diferença. E, em
2001, finalmente conseguiu comprar
sua própria banca junto com sua filha. Agora fica melhor ainda de vender, conta
dona Helena. Não precisamos mais passar humilhação de dividir a banca.

Para cada fruta, a família tem um cuidado. A manga, por exemplo, é tirada de
vez. Dona Helena leva na cabeça um cento ou cento e meio. E ainda faz
qualquer tipo de negócio. Troca na feira por pedaço de carne. E assim vai
trocando uma coisa por outra. Da laranja, dona Helena leva as frutas e as
folhas, que são usadas como remédio.

A jaca, dona Helena vende no grosso ou no retalho, o que acha melhor. Apesar
do trabalho a mais, vender no retalho dá um
pouco mais de dinheiro, conta dona Helena. Mas
temos que ter muito cuidado com o asseio, o
público é muito exigente. Corta a fruta na hora e
vai colocando os bagos em um saco plástico que
compra em Campina Grande mesmo. Chega a
levar de 5 a 20 jacas que variam de preço de
acordo com seu tamanho. Uma jaca grande é
vendida até 5,00 reais e uma pequena, por uns
0,50 centavos.

O caju dá muito mais trabalho, mas é uma fruta


ótima de comércio. Do caju, eles vendem apenas
a castanha torrada ou vendem a fruta. Se o caju
estiver bem bonito, pode vender 8 por 1,00 real.
Mas para vender a fruta tem que ter muito
cuidado, explica dona Helena. Eles forram todo o
chão da sala de sua casa com folhas e colocam a
fruta colhida uma do lado da outra sem amassar.
Colocam o caju de pé para não estragar. Na hora
de levar para feira, outro trabalho. Colocam as

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frutas com o mesmo cuidado nas caixas pra também não estragar. Aquelas
frutas que não passaram em seu exame de qualidade, dona Helena retira a
castanha e torra. A castanha é outra fonte de riqueza para dona Helena. E o
restante do caju ela dá para os bichos ou deixa virar estrume. O caju é uma
ótima fruta de comércio, conta dona Helena que confessa que suas contas são
pagas com sua venda.

Para vender bem, a gente tem que fazer uma gracinha, ensina dona Helena. E
assim vai cativando sua freguesia. Muitos de seus produtos são levados por
encomenda, principalmente os remédios e as mudas. E com toda sua
simplicidade, dona Helena vai nos dando lições de como continuar a vida
batalhando sempre.

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