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Um Presidente Vulnerável

António José Teixeira


Director SIC Notícias

É pressuposto o Presidente da República ser um cidadão lúcido e de bom


senso. É o mínimo que se lhe pode exigir. Cavaco Silva já deu provas
sobejas, ao longo da sua história política, de que pesa bem o que faz e o que
diz. Nos últimos meses não parece que esteja à altura da lucidez e bom
senso que se lhe exigem. A constatação não podia ser mais grave.

Cavaco Silva perdeu o sentido de oportunidade da sua palavra, alimenta


suspeições e não sabe cuidar do bom-nome das instituições. Se assim
continuar não estará à altura das responsabilidades. Se alguém tenta puxar o
Presidente para a luta político-partidária, o Presidente tem a obrigação de se
demarcar imediatamente. Seria esse o seu contributo para a transparência
do processo eleitoral. Não é o silêncio calculista.

Se alguém em seu nome diz aos jornais que o gabinete do primeiro-ministro


anda a espiar o Presidente ou, mais prosaicamente, que em Belém se
desconfia do partido do Governo, das duas uma: ou é verdade e o Chefe do
Estado tem de agir imediatamente em nome da legalidade e da idoneidade
das instituições democráticas; ou é mentira e deve vir a público dizê-lo com
clareza.

Ora o que Cavaco Silva fez foi assistir impávido à publicação de notícias,
invocando o seu nome, sem se dignar tomar posição, espalhando a suspeita
ao mais alto nível do Estado. Como é possível que o Presidente ache normal
que um membro da sua Casa Civil espalhe suspeição e desconfiança sobre o
Governo que mantém em funções? A notícia ocupou quase por inteiro a
primeira página do Público e não merecia um reparo? Como é possível dizer
que «tem sérias dúvidas quanto à veracidade das afirmações» contidas no
email que o aponta como autor moral de uma manobra sombria que visava
desacreditar o Governo? Dúvidas podemos ter nós, Cavaco Silva tem de ter
certezas. Tem de estar à altura de nos garantir que o conteúdo do email é
falso. E não o fez.

Ficámos ainda a saber o valor exacto do rigor presidencial. Se alguém da


Casa Civil envolve Cavaco Silva numa maquinação grave, o castigo é mudar
de gabinete… Esclarecidos. A trapalhada é enorme e revela pouco sentido
de Estado.

A publicação do email do Público no Diário de Notícias fê-lo sentir inseguro.


Ontem, na véspera de finalmente falar ao País, o Presidente concluiu que os
computadores de Belém são vulneráveis… A suspeita e a insinuação
continuam. Não tardará que alguém lhe devolva uma frase célebre nos anos
90: É preciso ajudar o senhor Presidente da República a terminar o seu
mandato com dignidade.

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