Professional Documents
Culture Documents
Boa parte das ações do homem na sociedade, objetivam fazer a vida melhor para a
humanidade, ou despertá-la para as medidas ou precauções necessárias.
Um importante elemento neste contexto é o nível de saúde do indivíduo, de um
grupo ou de uma sociedade. Saúde não significa apenas a ausência de doença, mas
também bem-estar somático, psíquico, social e harmonia no meio em que vive.
É importante que os profissionais que trabalham com pacientes que apresentam e
sofrem com as conseqüências das desordens do Sistema Estomatognático e estruturas
relacionadas, tenham consciência de que também os fatores somáticos, psíquicos e sociais
podem estar alterados e comprometer o senso normal de bem estar.
Estes pacientes podem apresentar persistente desconforto na face, cabeça, articula-
ções temporomandibular – ATMs e pescoço, além de contrações, fadiga muscular e limi-
tação dos movimentos mandibulares.
Estalidos nas ATMs ocorrem com freqüência e geralmente são tolerados pelos pa-
cientes até que atraiam a atenção de outros, originando um incômodo e um problema
social ao indivíduo. A dor de cabeça pode ser tolerada uma única vez, mas a repetição
diária altera o comportamento do paciente, irrita familiares e colegas de trabalho.
Os sintomas mencionados, se forem discretos e esporádicos, são ignorados por alguns
pacientes, porém para outros podem ser sérios a ponto de causar redução da capacidade
de trabalho e complicações emocionais, sociais e econômicas.
Mesmo com o conhecimento que os profissionais da Odontologia tem sobre as
desordens do Sistema Estomatognático, um grande número de pacientes continuam sem
um diagnóstico definitivo. Pesquisas epidemiológicas têm dado importantes informações
342 PROMOÇÃO DE SAÚDE BUCAL - PARADIGMA, CIÊNCIA E HUMANIZAÇÃO
FIG. 17.1
Nesta ilustração vê-se os diferentes estágios das ATMs durante o desenvolvimento do crânio e da mandíbula de um recém
nascido, de uma criança, de um adulto e de um idoso.
HARMONIA OCLUSAL PARA A PROMOÇÃO DE SAÚDE 343
doença, e sim dentes mal posicionados ou desalinhados. equilíbrio entre as forças de ação que incidem sobre os
Muitas pessoas apresentam maloclusão, mas se adaptam a dentes e a reação biológica adequada dos tecidos do perio-
ela não apresentando sinais patológicos. Entretanto, na pre- donto de sustentação, cemento, fibras periodontais e osso
sença de desarmonia a oclusão será patológica, quando alveolar mantêm a integridade das estruturas e representa o
gera patologias aos tecidos. principal componente da homeostasia desse periodonto.
No sistema estomatognático, os dentes posteriores têm
como funções: mastigação, ponto de apoio da mandíbula SISTEMA NEUROMUSCULAR
durante a deglutição, manutenção da dimensão vertical de
oclusão, transmissão e dissipação das forças axiais, e a prote- Última das unidades fisiológicas básicas, o sistema
ção aos dentes anteriores e das articulações temporomandi- neuromuscular é considerado fator preponderante nas fun-
bulares, quando do fechamento mandibular, na posição de ções do sistema estomatognático; o sistema muscular, exci-
oclusão em relação cêntrica - ORC. tado pelo sistema nervoso, constitue-se na parte ativa que
Os dentes anteriores têm como funções: estética, foné- origina as forças necessárias às funções a que se des-tinam,
tica, apreensão e corte dos alimentos, e proteção dos dentes (Figura 17.3). As demais unidades repre-sentam os elemen-
posteriores e ATMs nos movimentos excêntricos da mandí- tos passivos encarregados de receber e transmitir a ação das
bula. forças.
Para o entendimento da interação do sistema neuro-
PERIODONTO muscular com a morfologia oclusal, faz-se necessário o co-
nhecimento das relações anatômicas das articulações tem-
Considerado uma das unidades fisiológicas básicas, já poromadibulares e de seus ligamentos com os músculos
que as forças que incidem sobre os dentes são transmitidas que o constituem. Este conhecimento inclui a função, a
aos ossos através das fibras periodontais. Figura 17.2. O inervação e a vascularização destes músculos.
FIG. 17.3
Sistema neuromuscular.
FIG. 17.2
Transmissão das forças incidentes ao osso através das fi-
bras periodontais.
344 PROMOÇÃO DE SAÚDE BUCAL - PARADIGMA, CIÊNCIA E HUMANIZAÇÃO
O sistema muscular é o responsável pelo movimento. O sistema nervoso tem como funções básicas:
A capacidade de diminuir seu comprimento a partir de Manutenção da constância do meio interno (homeos-
uma contração provocada pelo estímulo nervoso gera a tase) através de funções vegetativas que asseguram sua orga-
movimentação; porém, o excesso de função ou a função nização.
indevida pode gerar fadiga Durante uma parafunção ou Emissão de comportamentos que são funções globais
mesmo na função mastigatória, ou de deglutição um distúr- do organismo no meio em que vive.
bio oclusal, conforme será visto na frente, poderá gerar des- Para o melhor entendimento do mecanismo de ação
conforto muscular intolerável, precipitando uma patologia. do sistema nervoso, deve-se recordar que este se constitui de
O acadêmico e o cirurgião-dentista devem ser capazes de sistema nervoso central - SNC e sistema nervoso periférico -
palpar os músculos envolvidos (Figura 17.4) para o diagnós- SNP.
tico de qualquer possível patologia, bem como identificar
os fatores etiológicos. NEUROFISIOLOGIA
As funções musculares ocorrem através de contrações,
sempre em direção à sua origem, podendo ser: A neurofisiologia bucal é a parte da Biologia que ex-
plica os mecanismos a serem explorados como recursos te-
- Isotônica: quando o músculo, ao se contrair, tem rapêuticos.
somente um de seus extremos de inserção fixo, se É fundamental aprofundar o conhecimento nesta
encurta sem aumentar a tensão de suas fibras (ex.: área, para estabelecer um elo entre estímulo e resposta nas
abrir e fechar a boca). abordagens clínicas, visto que os diversos caminhos percor-
- Isométrica: quando o músculo, ao se contrair, tem ridos pelos estímulos elucidam, através da participação do
os dois extremos de inserção fixos; não podendo se Sistema Nervoso, como e onde agir.
encurtar, gera um aumento da tensão de suas fibras A neurofisiologia se desenvolve em três etapas defini-
(ex.: hábito de apertamento den-tário ou bruxismo). das:
Existe outro tipo de mecanismo neuromuscular in- O que são e a que se destinam os
consciente, cuja ação motora se produz sem intervenção do objetivos
córtex cerebral, de forma automática: os arcos reflexos, que
se classificam como condicionados e incondicionados. Um Dimensão vertical (DV) é a dimensão vertical da face,
exemplo clássico deste mecanismo na odontologia é a brus- entre dois pontos quaisquer, arbitrariamente selecionados e
ca parada da mastigação, quando se morde uma pedra ou convenientemente localizados um acima, e outro abaixo da
algo estranho misturado ao alimento. boca, normalmente na linha média da face, variando entre
a dimensão vertical de repouso e dimensão vertical de oclusão.
A ODONTOLOGIA E O SISTEMA Fundamental na preservação da saúde da unidade fisiológica
ESTOMATOGNÁTICO neuromuscular do SE.
A dimensão vertical de repouso (DVR) é a dimensão
A manutenção ou reabilitação do sistema estomatog- vertical da face, quando a mandíbula se encontra sustenta-
nático pelo cirurgião-dentista tem como objetivo preservar da pela posição postural, ou de repouso fisiológico dos
ou restabelecer a: músculos do SE e com os lábios se contatando levemente.
- Dimensão vertical - DV. Independe da presença ou não dos dentes.
- Relação cêntrica - RC. A dimensão vertical de oclusão (DVO) é a dimensão
- Estabilidade oclusal - EO. vertical da face, quando os dentes estão em máxima inter-
- Guia anterior – GA. cuspidação e os músculos contraídos em seu ciclo de po-
tência máxima. Dependendo da presença dos dentes em
Para isto são necessários os seguintes procedimentos: oclusão.
O paciente pode apresentar diferentes perfis faciais
- Anamnese, exames: clínico, radiológico e dos mode- em detrimento de alterações na DV Figura 17.5.
los de estudo montados em articulador semi ajustá- A distância existente entre as superfícies oclusais e in-
vel em RC. cisais dos dentes antagonistas, quando a mandíbula se en-
- Diagnóstico. contra sustentada pela função postural ou de repouso mus-
- Planejamento e execução de procedimentos educa- cular fisiológica, é denominada espaço funcional livre
tivos, preventivos e restauradores. (EFL) o que representa a diferença entre as DVO e DVR,
sendo de aproximadamente 3 mm.
Para isto se fazem necessários os conhecimentos de: A relação cêntrica (RC) é a relação do côndilo com a
fossa mandibular do osso temporal em completa harmonia
- Biologia dos tecidos. com o disco articular. É uma posição estável e reproduzível
- Fisiologia do sistema estomatognático. pelo equilíbrio fisiológico dos músculos de sustentação
- Propriedade dos materiais odontológicos, mandibular e independe do relacionamento dentário. Im-
- Técnicas de execução dos procedimentos clínicos e portante na preservação da saúde das unidades fisiológicas
laboratoriais. neuromuscular e ATMs, do SE. Sendo fundamental nos
- Fundamentos de estética odontológica. casos de reconstruções oclusais extensas.
FIG. 17.5
Diferentes perfis faciais.
346 PROMOÇÃO DE SAÚDE BUCAL - PARADIGMA, CIÊNCIA E HUMANIZAÇÃO
Estabilidade oclusal (EO) é a estabilidade dada à dentária que independe da posição dos côndilos, logo não
mandíbula em relação às maxilas pela intercuspidação si- deve ser impropriamente chamada de oclusão cêntrica,
multânea das cúspides funcionais nas respectivas fossas an- pois nesta posição a mandíbula estará sempre desviada da
tagonistas, em ambos os lados da arcada dentária (Figura RC.
17.6). Fundamental na preservação da saúde das unidades Como Guia Anterior (GA): descreve-se o relaciona-
fisiológicas: neuromuscular, ATMs, oclusão e periodonto mento das bordas incisais dos dentes anteriores inferiores
do SE. Pode ser conseguida com arco dental curto, em com a face lingual dos dentes anteriores superiores, duran-
algumas situações com oclusão até segundo pré-molar, mas te os movimentos de protrusão e de lateralidades da mandí-
com segurança até primeiro molar. A reposição de um se- bula, sem contato dentário posterior, formando-se com as
gundo molar só se justifica por estética ou para impedir a ATMs direita e esquerda um tripé de estabilidade (Figura
extrusão do antagonista. 17.8). Fundamental na preservação da saúde das unidades
A intercuspidação máxima dos dentes ocorrerá para fisiológicas: neuromuscular, ATMs, oclusão e periodonto
favorecer a melhor trituração dos alimentos, fonte de ener- do SE. Impede contatos indevidos e potencialmente pato-
gia e nutrição para o organismo. Esta intercuspidação máxi- lógicos dos dentes posteriores durante os movimentos ex-
ma ocorrerá com os côndilos estáveis ou não, determinan- cêntricos da mandíbula, seja quando da apreensão e cor-
do as posições mandibulares, chamadas respectivamente de te dos alimentos - guia anterior propriamente dita, ou da
1 - oclusão em relação cêntrica e 2 - máxima intercuspida- mastigação - guia de proteção lateral, em canina ou função
ção habitual. em grupo.
Denomina-se Oclusão em Relação Cêntrica (ORC) Como Guia Canina de proteção lateral: descreve-se
(oclusão cêntrica ou máxima intercuspidação cêntrica) o relacionamento de contatos contínuos de deslocamento
quando há coincidência da posição de máxima intercuspi- entre a superfície incisal do canino inferior e a fossa lingual
dação dos dentes, com a posição de relação cêntrica, Figu- do canino superior durante as excursões laterais de trabalho
ra 17.7. da mandíbula, ou seja o movimento que ocorre durante a
Como Máxima Intercuspidação Habitual (MIH), é mastigação do bolo alimentar, evitando contatos dos de-
considerada a posição maxilomandibular com maior núme- mais dentes anteriores e posteriores, o que geraria grande
ro de contatos entre os dentes antagonistas. É uma posição força lateral Figura 17.9.
FIG. 17.6
FIG. 17.7
Oclusão em relação cêntrica.
HARMONIA OCLUSAL PARA A PROMOÇÃO DE SAÚDE 347
Como Guia em Grupo de proteção lateral: descreve- entre cada movimento mandibular e suas respectivas guias
se o relacionamento de contatos contínuos de deslocamen- anteriores - unidade fisiológica básica. Torna-se imprescindível
to entre a superfície incisal do canino inferior e a fossa um melhor entendimento dos movimentos mandibulares.
lingual do canino superior, e entre as pontas de cúspides
vestibulares dos dentes interiores, cúspides funcionais - CF MOVIMENTOS MANDIBULARES
e as vertentes triturantes das cúspides vestibulares superio-
res, cúspides não funcionais - CNF, durante as excursões A partir da posição mandibular fisiológica inicial, a
laterais de trabalho da mandíbula, (Figura 17.10). Salienta- RC, os movimentos mandibulares de abertura, fechamen-
se que não poderão ocorrer contatos entre dentes do lado to, protrusão, retrusão e lateralidade são executados pelos
de não trabalho - balanceio. movimentos de rotação e translação condilar, direcionados
Considerando-se a definição de oclusão, como as rela- em planos e graus distintos.
ções estáticas e dinâmicas entre as superfícies oclusais e os Movimento de Rotação: é o movimento de um corpo
demais componentes do SE, e o estreito relacionamento ao redor do seu centro, Figura 17.11.
FIG. 17.8
Guia Anterior, plano sagital.
FIG. 17.9
Guia canina de proteção lateral: A - trajeto da guia pelo
canino, plano sagital e plano frontal, B - relacionamento
côndilo - fossa e dentes antagonistas no lado de trabalho,
C - relacionamento côndilo fossa e dentes antagonistas no
lado de balanceio.
FIG. 17.10
Guia lateral de proteção em função em grupo, plano fron-
tal: A – trajeto da guia, B – relacionamento côndilo-emi-
nência e dentes antagonistas no lado de trabalho, C - rela-
cionamento côndiloeminência e dentes antagonistas no
FIG. 17.11
lado de balanceio. Movimento de rotação condilar: A - plano sagital, B – pla-
no frontal, C – relacionamento. dentário no plano frontal.
348 PROMOÇÃO DE SAÚDE BUCAL - PARADIGMA, CIÊNCIA E HUMANIZAÇÃO
FIG. 17.12
Plano sagital: A - movimento de translação condilar, B –
relacionamento dentário.
FIG. 17.13
Movimento de protrusão mandibular, plano sagital: A –
deslize do côndilo sobre a eminência articular, B – guia
anterior.
HARMONIA OCLUSAL PARA A PROMOÇÃO DE SAÚDE 349
FIG. 17.16
HARMONIA OCLUSAL PARA A PROMOÇÃO DE SAÚDE 351
FIG. 17.18
Nesta ilustração vê-se um molar superior com uma lesão
de cárie e o mesmo restaurado, porém a restauração sem
FIG. 17.17 contato oclusal, ficando estes nos planos inclinados das
cúspides, direcionando as forças oclusais obliquamente
Nesta ilustração vê-se duas restaurações dentárias
em relação ao longo eixo médio do dentes, o que caracte-
ocluídas, em que as forças oclusais se dissipam paralelas
riza um distúrbio oclusal.
ao longo eixo médio dos dentes, não se caracterizando
como distúrbio oclusal.
352 PROMOÇÃO DE SAÚDE BUCAL - PARADIGMA, CIÊNCIA E HUMANIZAÇÃO
FIG. 17.20
FIG. 17.19 Nesta ilustração, vê-se em A um molar inferior com lesão e
Nesta ilustração, vê-se em A um molar inferior com lesão e o antagonista com extrusão, em B o molar inferior restau-
o antagonista com extrusão, em B a demarcação da rado sem a prévia eliminação da extrusão do superior e
extrusão a ser eliminada e em C a extrusão eliminada sen- em C a interferência oclusal no lado de não trabalho gera-
do o molar inferior corretamente restaurado. do pela extrusão do antagonista não eliminada, causando
um distúrbio oclusal interferente.
FIG. 17.21
Nesta ilustração, vê-se um 3º molar inferior sem antagonis-
ta e extruído, provocando uma interferência oclusal no
movimento de protrusão e levando instabilidade às ATMs
e à guia anterior.
FIG. 17.22
Nesta ilustração, vê-se a ausência de estabilidade oclusal
do lado direito, o que permite a ação muscular M e M’
gerar instabilidade e estresse às ATMs, ao periodonto e aos
dentes remanescentes.
HARMONIA OCLUSAL PARA A PROMOÇÃO DE SAÚDE 353
QUADRO 17.1
QUADRO 17.2
Grupo III - pacientes suscetíveis à desordem oclusal. Cirúrgica - deve ser utilizada para corrigir discrepân-
- Quando da presença de distúrbios oclusais e outros cia dos maxilares em paciente adulto
fatores de origem psicológica e sistêmica induz o Nas outras áreas os esforços se concentram na pró-
desenvolvimento do hábito parafuncional de apertar pria desordem, ou em alguns casos em determinados sin-
e ou ranger os dentes. É o bruxismo. tomas, não necessariamente resolvendo a causa. Porém
em determinadas situações a associação destas terapias oti-
Grupo IV - pacientes suscetíveis à desordem temporoman- mizam e agilizam o tratamento odontológico. Alguns
dibular - DTM. exemplos são:
- Quando da presença de distúrbios oclusais, apresen- Fisioterapia - através do calor local - produzido por
tam um número de problemas clínicos que envol- uma toalha úmida aquecida sobre a região sintomática,
vem a musculatura mastigatória, as articulações mantida por 10 a 15 minutos, nunca ultrapassando 30 minu-
temporomandibulares - ATMs e ou estruturas asso- tos aumenta a circulação sangüínea na área aplicada. O uso
ciadas. do TENS (Transcutaneous Electrical Nerve stimulation) re-
Grupos V - pacientes não suscetíveis às desordens. comendado nos casos de dores faciais provocadas pelo há-
- Quando da presença de distúrbios oclusais, apresen- bito, mostrando-se como meio efetivo de controlar a dor e
tam uma acomodação tecidual. indução do relaxamento muscular.
Farmacológica - com o uso de miorrelaxantes. Tem
CONDUTAS TERAPÊUTICAS DAS DESORDENS um efeito limitado ao período de ação da droga, reinician-
OCLUSAIS do a sintomatologia quando de sua interrupção.
Psicológica - deve ser exercida por um profissional da
São várias as condutas terapêuticas das desordens área.
oclusais e disfuncionais, porém o único objetivo é estabele-
cer uma oclusão fisiológica. AJUSTE OCLUSAL POR ACRÉSCIMO DE
O tratamento deve ser de forma multiprofissional e MATERIAL RESTAURADOR OU DESGASTE
abranger vários aspectos, da terapia odontológica direta, DENTÁRIO SELETIVO
ajuste oclusal e ou restauradora; e da indireta, placas inte-
roclusais. Além de outras áreas, como a fisioterapia, a tera- O ajuste oclusal é a conduta terapêutica que trata das
pia médica, fármacológica, psicológica e o auto recondicio- modificações feitas nas superfícies dos dentes, restaurações
namento. Na odontologia os esforços se concentram em ou próteses, através de desgaste seletivo ou acréscimo de
eliminar ou minimizar os distúrbios oclusais, objetivando, materiais restauradores, buscando harmonizar os aspectos
como já dito restabelecer uma oclusão fisiológica. Assim funcionais maxilomandibulares na oclusão em relação cên-
sendo as seguintes terapias podem, dependendo da análise trica e nos movimentos excêntricos.
individual, ser utilizadas. Tem como finalidade melhorar as relações funcionais
Ajuste Oclusal - deve ser realizado sempre que estive- da dentição para que, juntamente com o periodonto de
rem presentes sinais e sintomas de oclusão traumática ou sustentação receba estímulo uniforme e funcional, propici-
patológica, discrepância em RC e interferências oclusais ando as condições necessárias para a saúde do sistema neu-
para reanatomizar as superfícies oclusais dos dentes, restau- romuscular e das articulações temporomandibulares.
rações e ou próteses, por acréscimo ou desgaste seletivo, Deve-se indicar o ajuste oclusal somente após um cor-
Placa Oclusal – deve ser utilizada para reposicionar a reto diagnóstico das necessidades do paciente
mandíbula e ou promover relaxamento muscular, diminui São as seguintes as indicações do ajuste oclusal:
a sintomatologia mesmo não tendo sido removidos os dis-
túrbios, pois podem atuar na ATM, induzindo o côndilo a - sempre que estiverem presentes sinais e sintomas de
se posicionar corretamente na fossa mandibular. Talvez a oclusão traumática ou patológica e as relações oclu-
simples distribuição das forças mastigatórias seja responsá- sais puderem ser melhoradas pelo ajuste, nas se-
vel por esse alívio sintomatológico. guintes situações:
Restauradora - a terapia restauradora deve ser realiza- - eliminar discrepância oclusal em relação cêntrica;
da, sempre que estiver presente superfície coronária dentá- - eliminar a tensão muscular anormal e conseqüente
ria parcial ou totalmente destruída, e que sua reconstitui- desconforto e dor resultante de hábitos como aper-
ção através da restauração dentária direta e ou indireta se tamento ou bruxismo, mesmo sabendo que terapias
fizer necessária para o restabelecimento da dimensão verti- complementares serão necessárias, como por exem-
cal de oclusão, relação cêntrica de oclusão, estabilidade plo uso de placa e terapia psicológica;
oclusal e guia anterior. - tratamento da disfunção neuromuscular;
Ortopédica - deve ser utilizada para corrigir discre- - estabelecer um padrão oclusal ótimo previamente e
pância dos maxilares em paciente jovem, durante procedimentos restauradores;
Ortodôntica - deve ser utilizada para nivelar e alinhar - auxiliar na estabilização dos resultados obtidos pelo
dentes, tratamento ortodôntico e ortopédico;
356 PROMOÇÃO DE SAÚDE BUCAL - PARADIGMA, CIÊNCIA E HUMANIZAÇÃO
- Auxiliar na estabilização dos resultados obtidos pela O ajuste em RC será considerado concluído quando
cirurgia bucomaxilofacial; for obtida a estabilidade condilar e sua contenção, pelo
- Como coadjuvante no tratamento periodontal, nas maior número possível de contatos oclusais bilaterais
situações de trauma oclusal primário e secundário. (cúspides funcionais versus fossas oclusais antagonistas)
Na distribuição dos esforços quando da mobilidade sem contato dos dentes anteriores. Se estes ocorrerem,
dental. devem ser simultâneos aos contatos dos dentes posterio-
O ajuste oclusal: res, o que significa a obtenção da oclusão em relação cên-
- não deve ser feito profilaticamente (sem que o pa- trica - ORC. E o ajuste nos movimentos excêntricos estará
ciente apresente sinais e sintomas de oclusão trau- concluído quando as guias anteriores de protrusão e late-
mática ou patológica), ralidade estiverem efetivas em desenvolver a desoclusão
- não deve ser executado sem o diagnóstico da causa dos dentes posteriores, protegendo-os de sobrecarga late-
do distúrbio, o porquê desta causa e a maneira cor- ral. Este padrão oclusal é chamado de oclusão mutua-
reta de como fazê-lo. Um mau ajuste pode piorar o mente protegida. A seguir sugere-se regras para o ajuste
quadro. cêntrico e excêntrico, lembrando que o posicionamento
dental e as restaurações presentes, bem como outros fato-
São objetivos do ajuste oclusal: res poderão alterar as regras, que por isto são sugeridas e
não absolutas.
- eliminar os contatos que defletem a mandíbula da
posição de relação cêntrica para a máxima intercus- AJUSTE EM RELAÇÃO CÊNTRICA
pidação habitual;
- dirigir os vetores de força para o longo eixo dos dentes; Contato deflectivo com deslize em direção
- evitar sempre que possível, qualquer redução na al- à linha média
tura das cúspides funcionais;
- estreitar a mesa oclusal ao invés de alargá-la; Sempre que houver um contato deflectivo entre uma
- uma vez obtida a estabilidade em relação cêntrica, cúspide funcional e uma não funcional, este ocorrerá en-
não tocar mais nas cúspides funcionais. Muitas ve- tre uma vertente lisa da cúspide funcional (vestibular infe-
zes no ajuste excêntrico nós desgastamos estas cús- rior ou palatina superior) versus uma vertente triturante
pides sem alterar a dimensão vertical; da cúspide não funcional (vestibular superior ou lingual
- Fazer os ajustes excêntricos após o ajuste cêntrico inferior).
com o cuidado de não alterar a dimensão vertical.
Local de desgaste
O local do desgaste na superfície oclusal deve restrin-
gir-se única e tão somente à área demarcada pela fita mar- Em se tratando de estruturas de diferentes importân-
cadora, utilizando-se de uma broca diamantada ou carbide cias funcionais, opta-se prioritariamente pelo desgaste na
tipo 12 lâminas em alta rotação cuja forma melhor se adap- vertente lisa até que o contato ocorra na ponta da cúspide
te à face do dente a ser ajustada, optando sempre pelo funcional. Em seguida desgasta-se o contato na vertente
desgaste da estrutura menos importante na estabilidade triturante da cúspide não funcional, Figura 17.23.
oclusal.
O ajuste oclusal é sempre realizado em relação cêntri- Contato deflectivo com deslize em direção
ca – RC, visto que o que se busca é o restabelecimento da contrária à linha média
oclusão em relação cêntrica – ORC.
Observam-se três posições distintas do relacionamento Sempre que houver um contato deflectivo entre
oclusal antes e após o ajuste cêntrico: duas cúspides funcionais antagonistas, este ocorrerá en-
tre uma vertente triturante de uma cúspide funcional
- Máxima intercuspidação habitual - MIH, é uma versus vertente triturante de uma cúspide funcional anta-
posição adquirida em que se tem uma estabilidade gonista.
oclusal independente da estabilidade condilar - RC,
ou seja, máxima intercuspidação - MI diferente de Local de desgaste
RC antes do ajuste;
- Relação cêntrica - RC é uma posição de estabilida- Por se tratar de estruturas de mesma importância fun-
de condilar independente da estabilidade oclusal - cional, desgasta-se o contato que se localizar mais próximo
MI, ou seja, MI diferente de RC antes do ajuste; da ponta da cúspide. Assim que conseguir o contato na
- Oclusão em relação cêntrica - ORC é uma posição ponta da cúspide, desgasta-se a vertente triturante antago-
em que se tem uma estabilidade condilar - RC coin- nista. Quando os dois contatos se localizarem à mesma
cidente com a estabilidade oclusal - MI, ou seja, é a distância da ponta da cúspide, desgasta-se no dente em po-
posição almejada ao concluir o ajuste. sição mais desfavorável, Figura 17.24.
HARMONIA OCLUSAL PARA A PROMOÇÃO DE SAÚDE 357
FIG. 17.24
FIG. 17.23
FIG. 17.25
358 PROMOÇÃO DE SAÚDE BUCAL - PARADIGMA, CIÊNCIA E HUMANIZAÇÃO
FIG. 17.27
FIG. 17.26
FIG. 17.29
FIG. 17.28
FIG. 17.30
360 PROMOÇÃO DE SAÚDE BUCAL - PARADIGMA, CIÊNCIA E HUMANIZAÇÃO
PROCEDIMENTOS CLÍNICOS PARA O AJUSTE interferentes e o relaxamento muscular que facilitará a ma-
OCLUSAL POR ACRÉSCIMO OU DESGASTE SELETIVO nipulação mandibular pela técnica de eleição.
A. Obtenção e montagem dos modelos de estudo em Existem duas técnicas de manipulação mandibular
articulador semi-ajustável, para a obtenção da relação cêntrica:
B. Análise Funcional da Oclusão,
C. Ajuste Oclusal Clínico - Técnica frontal de manipulação de Ramfjord
- Técnica bilateral de manipulação de Dawson.
MONTAGEM DOS MODELOS DE ESTUDO EM
ARTICULADOR SEMI-AJUSTÁVEL O importante não é a técnica empregada, mas sim a
precisão obtida, o que poderá ser confirmado pela reprodu-
Após a montagem do modelo de estudo do arco supe- ção da manipulação e a marcação repetitiva do ponto de
rior no articulador com o auxilio do arco facial, o paciente contato do incisivo inferior sobre o jig com uma fita marca-
usará então um jig por aproximadamente 5 minutos. O que dora para ajuste ou a reprodução de qualquer outro contato
propiciará a perda da memória proprioceptiva dos dentes de referência.
FIG. 17.31
Ajuste oclusal em relação cêntrica: Paciente com JIG –
desprogramação neuromuscular.
FIG. 17.36
Ajuste oclusal em relação cêntrica: Ramos superior e infe-
rior, após montagem dos modelos, ao lado fita
evidenciadora de contatos, e instrumental para desgaste
no gesso.
FIG. 17.39
Ajuste oclusal em relação cên-trica: Contato marcado no
arco superior, vertente triturante mesial da cúspide pala-
tina do segundo molar superior direito.
FIG. 17.44
Ajuste oclusal em relação cêntrica: Desgaste sendo feito no
dente através de broca carbide 12 lâminas, eliminando
desvio contrário a linha média.
Este procedimento de marcação e eliminação das versus fossas oclusais antagonistas) eliminando assim as
prematuridades se repetirá até que seja obtida a estabili- discrepâncias em cêntrica e harmonizado a MI com a
dade condilar e sua contenção, pelo maior número possí- RC, o que significa a obtenção da oclusão em relação
vel de contatos oclusais bilaterais (cúspides funcionais cêntrica - ORC.
FIG. 17.47
Ajuste do movimento de lateralidade esquerdo: fita
evidenciadora de contatos, em posição durante o movi-
mento – notar que todos os dentes do hemiarco estão
cobertos pela fita.
364 PROMOÇÃO DE SAÚDE BUCAL - PARADIGMA, CIÊNCIA E HUMANIZAÇÃO
FIG. 17.52
Ajuste do movimento de lateralidade esquerdo: trajeto da
guia canina, demarcado pelo movimento do canino infe-
rior na concavidade palatina do superior, quando da
interposição da fita evidenciadora de contatos.
HARMONIA OCLUSAL PARA A PROMOÇÃO DE SAÚDE 365
FIG. 17.59
Ajuste cêntrico de uma restauração onlay: contatos
cêntricos marcados em vermelho nos dentes vizinhos ao
preparado – o isolamento absoluto não desfaz as marcas.
HARMONIA OCLUSAL PARA A PROMOÇÃO DE SAÚDE 367
FIG. 17.68
Ajuste excêntrico de uma restauração onlay: repetição do
movimento de lateralidade esquerdo com o lado vermelho
da fita evidenciadora de contatos voltado para a restaura-
ção, a ausência de marcas vermelhas indica uma correta
guia canina com ausência de interferências oclusais, o
mesmo processo deve ser repetido para o movimento de
lateralidade direito e guia anterior.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. ASH, M. M., RAMFJORD, S. P. Introdução à oclusão 12. NEFF, P. E. TMJ Occlusion and Function. Washington:
funcional. Traduzido por José dos Santos Jr. Guarulhos George-town University - School of Dentistry, Seventh
SP: Parma, 1987. 276 p. printed, Washington, D.C. 1993. 60 p.
2. CELENZA, F., NASEDKIN, J. N. Occlusion The state 13. OKESON J. P. Fundamemtos de Oclusão e desordens
of the art. Chicago: Quintessence, 1978. temporomandibulares. 2. ed. traduzido por Milton Ed-
3. DAWSON, P. E. Avaliação, diagnóstico e tratamento dos son Miranda. São Paulo: Artes Médicas, 1992. 449 p
problemas oclusais. 2 ed. Traduzido por Silas Cunha Ri- 14. PAIVA, H. J. et. al. Oclusão Noções e Conceitos Básicos.
beiro. São Paulo: Artes Médicas, 1993. 686 p. São Paulo, Santos Liv. Editora. 1997. 336 p.
4. EYZAGUIRRE, C., FIDONE, S. J. Fisiologia do sistema 15. POKORNY, D. K., BLAKE, F.P. Principles of Occlusion.
nervoso. Traduzido por Aglai Penna Barbosa de Sousa. 2ª Detroit: University of Detroit, s.d. 56 p.
ed. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan. 1977. 398 p. 16. RAMFJORD, S. P. & ASH, M. M. Oclusão. 3. edição,
5. GUICHET, N. F. Occlusion. Anaheim, California: De- Trad. Dioracy Fonterrada Vieira. Rio de janeiro: Intera-
nar Corp., 1977. 117 p. mericana, 1984.
6. HOWAT, A. P. et. al. Atlas colorido de oclusão e maloclu- 17. RUBIANO,C.M. Placa Neuromiorrelaxante – confecção
são. São Paulo: Artes Médicas, 1992. 240 p. e manutenção (passo a passo). Tradução por Fer-nando
7. JANSON, W. A. et. al. Introdução ao estudo da oclusão, Luiz Brunetti Montenegro. São Paulo: Editora Santos,
enceramento das superfícies oclusais. Bauru - S.P.: Uni- 1993. 191p.
versidade de São Paulo, Faculdade de Odontologia de 18. SCHILLINGBURG JR, H. T. Fundamentos de Prótese
Bauru, 1977. 78 p. Fixa. São Paulo, Quintessence, 340 p., 1983.
8. JANSON, W. A. et. al. Introdução à oclusão ajuste oclu- 19. SCHLUGER, S., YUODELIS, R. R., PAGE, R. C., Pe-
sal. Bauru: Universidade de São Paulo, Faculdade de riodontia: fenômenos básicos, tratamento e interrelações
Odontologia de Bauru, 1986. 55 p. oclusais e restauradores. Rio de Janeiro: Interamericana,
9. JIMÉNEZ-LOPEZ, V. Próteses sobre implantes: Oclu- 1981. 701 p.
são, casos clínicos e laboratório. 2ª ed. Tradução por Zu- 20. SENCHERMAN, G. et. al. Manual sobre neurofisiolo-
lema Eugênia Goldsztejn Batista. São Paulo: Quintes- gia de la oclusion. Bogota, Pontificia Universidad Javeri-
sence, 1996. 264p. ana, 1975. 66 p.
10. MADEIRA,M.C. Anatomia da face. Bases anátomo-fun- 21. THE ACADEMY OF PROSTHO-DONTICS. The
cionais para a prática odontológica. 2ª ed. São Paulo, glossary of prosthodontics terms., 6th ed. Journal of Pros-
Sarvier Editora, 1997. thetic. Dentistry St. Louis, 1994. 112 p.
11. MOHL, M . D. et. al. Fundamentos de oclusão. Traduzi- 22. THOMAS. P. K., TATENO, G. Gnathological Occlusion.
do por Milton Edson Miranda. São Paulo: Quintessen- Tokyo: Shorin, 1979. 235 p.
ce, 1989. 449 p.