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Ginecologia infanto-puberal:
puberdade e menarca,
distúrbio menstrual e dismenorréia
Solange Garcia Accetta, Alberto Mantovani Abeche,
Liliane Diefenthaeler Herter e Carla D'Agostini
que a média da menarca foi aos 11,8 anos e a mediana da ocorrência da menarca parece ter diminuído nos últi-
aos 12 anos. mos 100 anos (Rosenberg, 1991; Kaplowitz, 1999). Esses
As meninas ganham cerca de 25 cm em altura du- autores sugerem a associação desse evento com a melho-
rante a puberdade. Elas atingem o pico de crescimento ria das condições de nutrição, saneamento básico, preven-
(6-11 cm/ano) cerca de 2 anos após a telarca e um ano ção de doenças e urbanização. A obesidade é a causa mais
antes da menarca. O principal fator responsável pelo comum de aceleração anormal de crescimento na infân-
crescimento puberal normal é o fator I de crescimento cia. Está também associada com início mais precoce da
insulina-sÍmile (somatomedina-C ou IGF-l), o mediador puberdade e da menarca. Os valores médios aceitos de
da indução do crescimento pelos esteróides sexuais. O crescimento pós-menarca são de 4 a 6 cm. No entanto,
aumento dos esteróides sexuais aumenta a secreção do eles não são absolutos, pois existe urna dispersão muito
hormônio de crescimento, o que estimula a produção do ampla quanto a essa variável. Observa-se que o ganho
fator I de crescimento insulina-sÍmile. A leptina é produ- estatural pós-menárquico associa-se inversamente com a
zida principalmente pelo tecido adiposo branco e regula idade da menarca: quanto menor a idade da menarca,
o armazenamento, o equilíbrio e o uso de energia pelo maior o ganho estatural. A predição do crescimento pós-
organismo. Por isso, ela tem importância na regulação do menárquico é incerta e a menarca indica a fase de desa-
pesocorporal e na informação ao cérebro de que as reser- celeração do crescimento longitudinal, portanto é pouco
vas energéticas são suficientes para sustentar o início da prGvável que uma menina que chegue com baixa estatura
puberdade e a reprodução (Negrão & Licinio, 2000). na menarca possa ter uma alta estatura no final da puber-
Kaplowitz e colaboradores (1999) chamam a aten- dade.
çãopara o aparecimento de caracteres de desenvolvimento
puberal ocorrendo em idades mais precoces nos Estados
Unidos. Sugerem que o critério atual para o diagnóstico DISTÚRBIO MENSTRUAL NA
de puberdade precoce seja a observação de caracteres se- ADOLESCÊNCIA
xuais secundários em meninas brancas com menos de 7
anos e em meninas negras com menos de 6 anos. Esses O marco endócrino final da puberdade é a ovulação,
resultados foram obtidos de um estudo realizado naquele que ocorre com o surgimento de um mecanismo de retro-
país considerando apenas dois grupos raciais. Concorda- controle positivo do estrogênio sobre a hipófise e o hipo-
moscom a discussão encontrada na literatura que consi- tálamo. Isso determina o aparecimento do pico de LH na
dera necessário a realização de estudo randomizado de metade do ciclo menstrual e a ovulação. As menstruações
basepopulacional, incluindo todos os grupos raciais para que se seguem à menarca são geralmente anovulatórias,
postular novos critérios para avaliação de puberdade pre- irregulares e ocasionalmente abundantes. Segundo Spe-
coce.O ponto de corte tradicionalmente aplicado é o de 8 roff e colaboradores (1991), a anovulação prolonga-se até
anose é esse critério que utilizamos até que novos estu- 18 meses após a menarca. O sangramento menstrual na
dosdemonstrem a necessidade de modificação desse cri- adolescência freqüentemente decorre da estimulação es-
tério (Finlay & Jones, 2000; Midyett, 2003). trogênica prolongada sem oposição da progesterona. E
depende da duração e da intensidade do estímulo estro-
Menarca gênico do endométrio. O fluxo pode ser escasso, normal
l
ou intenso e o ciclo menstrual pode ser curto, normal ou
O termo menarca significa a primeira menstruação
longo.
e traduz um importante evento no amadurecimento do
eixohipotálamo-hipófise-ovários (HHO). A menarca su-
cedeo pico de crescimento e ocorre na maioria das meni-
nas no estágio N de Tanner (Marshall & Tanner, 1969).
I passar dos anos DOISterços das meninas
A idade da menarca não é fixa para todas as popula-
ções,pois vários são os fatores que a influenciam: nutri cio-
I":'estabelecem cIcios
Irregularidade menstruais
menstrual regulares
diminUI com oe
ovulatórios dentro de 2 anos após a menarca.
nais,esportivos, geográficos, familiares, etc. Além disso,
adolescentes afetadas por desnutrição crônica e/ou en-
fermidades crônicas graves apresentam uma puberdade Apter (1980) observou 80% de ciclos menstruais
atrasada, fundamentalmente motivada pelo atraso ósseo anovulatórios no primeiro ano após a menarca, 50% no
queapresentam (De La Parra & Arrighi, 1990). A idade terceiro ano e 10% no sexto ano. Aproximadamente to-
GINECOLOGIA INFANTO-PUBERAL: PUBERDADE E MENARCA, DISTÚRBIO MENSTRUAL..
das alcançaram um padrão adulto estável em sete anos sência implica uma investigação diagnóstica. Ao contrá-
após a menarca, e aquelas que permanecem irregulares rio, na adolescência, ela pode ser fisiológica e autolimita-
ou anovulatórias poucas vezes ovulavam espontaneamen- da. Eis a dificuldade: evitar a avaliação em massa e deixar
te. Sabe-se, também, que pacientes com menarca tardia de fazer o diagnóstico de patologias subjacentes. Portan-
apresentam mais irregularidades menstruais. A anovula- to, apesar da anovulação ser a causa mais comum de irre-
ção por imaturidade do eixo HHO deve ser diferenciada gularidade menstrual na adolescência, é necessário afastar
da anovulação crônica patológica. Certamente a distin- outras causas para o distúrbio menstrual (Tabela 4.1).
ção entre ambas não é fácil. O simples diagnóstico de Também convém ressaltar que dietas com baixo teor
anovulação é inespecífico. Tal situação difere da mulher de proteínas, alto teor de carboidratos e com deficiência
adulta porque o padrão normal esperado nesse período é de vitaminas essenciais poderiam colaborar com uma
a presença de ciclos menstruais ovulatórios, e a sua au- maior intensidade do sangramento (Reis, 1998). Pacien-
tes com doença de von Willebrand e fluxo menstrual ex- TABELA 4.2 Dosagens hormonais na
cessivomuitas vezes podem ser equivocadamente diag- irregularidade menstrual na adolescência
nosticadascomo tendo um sangramento disfuncional. Essa
Sem '" Com
doençaestá presente em cerca de 1% da população, sen-
hiperandrogenismo hiperandrogenismo
do, portanto, muito mais comum do que se julga comu-
mente (Choung, 1996). Outras informações sobre LH 170H Progesterona
sangramento patológico estão disponíveis no capítulo so- FSH basal
bre sangramento uterino anormal. Pool de prolactina DHEA
TSH ultra-sensível Testosterona livre
Testosterona
Avaliação
Androstenediona
dosagem de creatinina urinária para garantir a adequa- ores níveis de LH, relação LH: FSH, testosterona e an-
ção da coleta. Outro instrumento é o teste de supressão drostenediona e pode ser um sinal preditivo de SOP (Her-
noturna com dexametasona, 1 mg VO, às 23 horas, e do- ter, 1995; Herter, 1996).
sagem de cortisol sérico às 8 horas da manhã seguinte. A hiperprolactinemia está freqüentemente associa-
Essa dosagem deve ser inferior a 5 g/dL. As dosagens su- da a baixos níveis de gonadotrofinas e pode ter causa pa-
periores a esse valor indicam necessidade de investigação tológica (adenomas, hipotireoidismo), farmacológica
suplementar. (metroclopramida, estrogênios, anticoncepcionais orais,
Em 1990, foi elaborado um consenso do Instituto sulpirida, fenotiazidas, haloperidol, reserpina, metildopa,
Nacional de Saúde dos Estados Unidos, estabelecendo os inibidores da MAO, anfetaminas, cimetidina) e idiopáti-
critérios diagnósticos para síndrome dos ovários policísti- ca. O diagnóstico é realizado por meio de pelo menos duas
cos (SOP), conforme Tabela 4.3. dosagens matinais de pool de prolactina acima de 25 ng/
A SOP costuma apresentar níveis séricos de LH ba- mL. Essas pacientes comumente apresentam amenorréia
sal elevado, relação LH: FSH igualou maior que 2 ou 2,5: e galactorréia.
1, androgênios elevados, prolactina elevada em 30% dos Embora o sangramento anovulatório seja a causa da
casos e teste explosivo ao estímulo do GnRH. Os níveis maioria dos casos de adolescentes admitidas por sangra-
basais de LH 6 mUllmL tiveram valor preditivo positivo mento intenso (Claessens, 1981), devemos lembrar que
de 92% para um teste explosivo ao estímulo endovenoso os distúrbios de coagulação constituem a segunda causa
com 200 mg de GnRH em pacientes hirsutas e no nosso mais comum de menstruações exageradas na adolescên-
meio foram considerados de bom valor preditivo para o cia. As adolescentes que requerem hospitalização por san-
diagnóstico de SOP (Oppermann, 1993). Os microcistos gramento intenso têm coagulopatia subjacente em até 19%
ovarianos na ultra-sonografia são muito freqüentes prin- das vezes. Quando há anemia importante associada à me-
cipalmente em meninas na perimenarca e vão diminuin- trorragia, esse número chega a 28%, A doença de von
do com o passar dos anos. Esses microcistos representam Willebrand e a púrpura trombocitopênica imune são as
apenas um estado de anovulação provavelmente por ima- patologias mais freqüentes nesses casos (Claessens, 1981).
turidade do eixo hipotálamo-hipófise e não podem ser Nas pacientes com sangramento intenso, podemos
considerados como sinônimo de ovários policísticos, Com solicitar os exames citados na Tabela 4.4.
freqüência, esses ovários contendo microcistos são deno- O hipotireoidismo está associado à menorragia, en-
minados de ovários microcísticos ou multifoliculares. Além quanto o hipertireoidismo está geralmente associado à
disso, a hiperplasia do estroma é um sinal identificado amenorréia (Strickland, 2003).
mais freqüentemente na ultra-sonografia transvaginal e As infecções genitais, incluindo as DSTs (doenças sexu-
dificilmente observado em meninas virgens que realizam almente transmissíveis), podem estar associadas com san-
ultra-sonografias pélvicas. Outro sinal a ser observado é o gramento anormal. Comparadas a mulheres adultas, as
volume ovariano, que costuma estar aumentado nas paci- adolescentes têm maior risco de contrair DSTs.As adolescen-
entes com SOP.Entretanto, os limites do ovário normal e tes usuárias de ACO (anticoncepcional oral) com sangramento
do ovário aumentado não estão claramente definidos. A intermenstrual têm infecções por clamídia mais freqüente-
presença de ambos os ovários com mais de 10 cm3 em mente do que adolescentes com padrão de sangramento nor-
adolescentes com distúrbio menstrual foi associada a mai- mal, É importante manter um alto índice de suspeição para
min deveria ser iniciado em adolescentes com diabetes uso do DIU, mio matos e, estenose cervical, pólipo endo~
tipo 2 e seriamente considerado naquelas com intolerân~ metrial, tumor anexial, tuberculose genital, compressões
cia à glicose ou hiperinsulinemia severa. Os clínicos de~ vasculares por tumores e retroversão uterina, As malfor~
vem atentar para o fato de que a mudança no estilo de mações ginecológicas obstrutivas também podem causar
vida é a intervenção mais efetiva (Knowler, 2002) e que, dismenorréia. Pacientes com massa pélvica cística e mal~
apesar de os estudos com o metformin serem promisso~ formações urológicas devem ter sua pelve avaliada por
res, existe um pequeno número de pacientes estudadas ultra~sonografia, tomografia ou ressonância magnética
para endossar seu uso em todas as pacientes com SOP para afastar hematocolpo e/ou hematossalpinge.
(Stafford, 2002), As prostaglandinas apresentam um importante pa~
A obesidade é uma alteração importante a ser trata~ pel na patogênese da dismenorréia. A via cicloxigenase
da em qualquer mulher hiperandrogênica, já que aumen~ do metabolismo do ácido aracdônico produz prostaglan-
ta a resistência insulínica e reduz a proteína carreadora dinas (PGE, PGD e PGF), tromboxane e prostaciclinas.
dos hormônios sexuais (SHBG), Cerca de metade das Essas substâncias produzem hipercontratilidade uterina,
mulheres adultas com SOP são obesas e muitas apresen~ que causa isquemia e conseqüente dor.
tam distribuição central de gordura corporal. Essa condi~
ção freqüentemente tem origem na adolescência. Manifestações c1inicas
A terapêutica das amenorréias hipotalâmicas é o tra~
A dismenorréia primária costuma apresentar -se nos
tamento do fator causal: redução do exercício físico nas
primeiros 6 a 12 meses após a menarca, quando os ci-
esportistas, aumento do peso nas pacientes com perdas
clos ovulatórios são estabelecidos, A duração da dor é
ponderais exageradas, tratamento de tumor, etc. O risco
geralmente de 48 a 72 horas, Habitualmente, a dor ini-
de osteoporose nos casos de amenorréia com baixo nível
cia junto ou após o sangramento, podendo ocasional-
de estrogênios é uma preocupação pertinente. A reposi~
mente se manifestar algumas horas antes do mesmo, O
ção com estrogênios e progesterona deve ser realizada
exame físico é normal. A dor costuma ceder com anal-
nos casos de amenorréia persistente ou quando a causa
gésicos comuns,
básica não pode ser removida, embora persistam contro~
A dismenorréia secundária tem uma patologia como
vérsias a respeito (Robinson, 2000).
causa básica. O desconforto álgico costuma iniciar com a
Dismenorréia menarca ou anos após. Podem-se identificar queixa de
início súbito, febre, tumor abdominal, corrimento vagi-
A dismenorréia, ou menstruação dolorosa, correspon~ nal, infertilidade, dispareunia, sangramento menstrual
de a uma sÍndrome caracterizada habitualmente por dor excessivo, etc, Ao exame físico, podem-se observar massa
em cólica no abdome inferior associada ao fluxo mens~ anexial, útero retroversofletido, endocervicite, aumento
trual. Ocasionalmente é descrita como dolorimento ou uterino, presença de DIU.
peso no hipogástrio, podendo irradiar~se para a região A endometriose é uma entidade pouco freqüente na
lombar ou até a raiz das coxas. Podem associar~se náuse~ adolescência, mas não deve ser subestimada, Devemos
as, diarréia ou cefaléia, A dismenorréia é uma queixa co~ suspeitar de endometriose quando a dor não cede com o
mum em adolescentes: 59,7 a 79,6%. É uma causa tratamento convencional e/ou quando é do tipo surda,
freqüente de abstenção escolar, pois em alguns casos a contínua, progressiva, pré ou intramenstrual. O útero pode
dor é extremamente forte. ser fixo e retroversofletido com mobilização dolorosa, fun-
do-de-saco vaginal doloroso ou nodular e imagens ultra-
sono gráficas suspeitas,
A dismenorréia pode ser classificada em Em adolescentes com história de dor pélvica crônica,
primária (ausência de patologia subjacente) um estudo reporta uma incidência de até 25% de endome-
j
ou secundária (presença de patologia triose (Kontoravdis, 1999), Em pacientes não-responsivas
subjacente). ao ACO e AINEs, a prevalência pode chegar a 70%, justifi-
cando a laparoscopia nesse grupo (Laufer, 1997).
mária. Na presença de achados clínicos sugestivos de os dias de sangramento, sem aumentar o sangramento de
causa orgânica, são solicitadas ultra-sonografia, cultu- escape, sendo uma boa opção para dismenorréias de difí-
ras endocervicais ou laparoscopia de acordo com a sus- cil tratamento, independentemente da etiologia (Miller,
peita clínica. 2001).
Tratamento
Os objetivos do tratamento de adolescentes
Em pacientes com dismenorréia primária, deve-se com endometriose são o controle sintomático,
ter o cuidado de explicar a causa da dor. Muitas pacientes a prevenção da progressão da doença e a
sentem-sealiviadas ao entender o motivo das cólicas mens-
preservação da fertilidade.
truais e optam por medidas gerais quando a dor é leve.
Entre as medidas gerais, recomendam-se repouso, bolsa
de água quente no baixo ventre e estímulo aos esportes. Tratamentos mais complexos para casos de endome-
O tratamento medicamentos o da dismenorréia primária triose resistentes fogem ao objetivo deste capítulo, porém
pode utilizar antiinflamatórios não-esteróides (AINEs) e vale mencionar que as adolescentes estão mais vulnerá-
contraceptivos orais. Boas opções são o naproxen sódico, veis aos efeitos a longo prazo dos agonistas do GnRH,
550 mg, VO, 12/12 horas, ou o ácido mefenâmico, 500 principalmente no que tange à perda de densidade óssea.
mg,VO,8/8 horas. Para que se obtenham melhores resul- Dessa forma, Black e colaboradores (2002) advogam con-
tados, esses fármacos devem ser administrados logo no siderar a terapia com estrogênios conjugados (ou equiva-
iníciodo fluxo e mantidos por dois ou três dias. As maio- lentes) concomitante ao uso de análogo (add -back therapy),
rescontra-indicações dos AlNEs são a presença de úlcera bem como a suplementação com cálcio.
gastrintestinal e hipersensibilidade à droga. O útero é pra-
ticamente insensível ao ácido acetilsalicílico, por isso essa
medicação é pouco utilizada na dismenorréia, além de REFERÊNCIAS
poder aumentar o sangramento uterino.
°contraceptivo oral, entre outras vantagens, pode
ACCETTA,S.G. Pubarca precoce isolada ou associada à hiperplasia
tambémaliviar a dismenorréia. A melhor explicação para
adrenal congênita não clássica em meninas: parâmetros clínicos
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GINECOLOGIA INFANTO-PUBERAL: PUBERDADE E MENARCA, DISTÚRBIO MENSTRUAL ..
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Capítulo 7
Síndrome pré-menstrual
Maria Celeste Osório Wender, Fernando Freitas,
Beatriz Valiati, Solange Garcia Accetta e Luciana Silveira Campos
A cidicidade ovariana parece criar uma vulnerabili- litos. Como o complexo receptor GABAé o maior sítio de
dade inicial para a síndrome pré-menstrual ao modular ação dos benzodiazepínicos, especula-se que alterações
vários fatores endócrinos. Segundo Magos (1990), seria o no sistema gabaérgico induzi das por progesterona pos-
resultado final da influência das várias modificações fisi- sam estar envolvidas na pato gênese da síndrome.
ológicas que normalmente acompanham a atividade cí- Novas hipóteses para o mecanismo dessa doença
dica ovariana em mulheres suscetíveis. surgiram com o uso dos inibidores da recaptação da sero-
Estudos comprovaram que não há alteração na do- tonina (ISRS). As pacientes apresentam melhora dos sin-
sagem sérica dos hormônios sexuais das mulheres com tomas a partir do primeiro ciclo e parece que os melhores
SPM, quando comparadas às mulheres normais (grupo- resultados são com o tratamento intermitente, caracterís-
controle). tica de resposta a essas medicações única dessa síndro-
Estudos anteriores sugeriram que a progesterona me. Isso sugere que a via serotoninérgica esteja envolvida
teria uma produção deficiente na síndrome pré-menstrual, na patogênese da SPM. Outra evidência indireta de que a
porém estudos controlados demonstraram ausência de via serotoninérgica esteja envolvida são os estudos de
diferença na dosagem de E2, progesterona, LH, FSH, concordância em gêmeas em relação aos sintomas de SPM
SHBG, DHEA-S, DHT, prolactina e cortisol entre o grupo e uma correlação de sintomas de SPM com episódio de-
de pacientes e o grupo-controle. Não existe diferença tam- pressivo maior nesses grupos.
bém nos níveis de magnésio, zinco, vitamina A, vitamina
E, tiamina e vitamina B6•
Os opióides endógenos também podem estar envol- DIAGNÓSTICO
vidos na SPM. O nível de ~-endorfinas sérico aumenta na
metade da fase lútea, sendo indetectáveis no período pré-
menstrual. As endorfinas podem afetar o humor. Choung Os quadros sintomáticos pré-menstruais
(Chihal, 1990) demonstrou que mulheres com síndrome podem ser compreendidos como um
pré-menstrual têm níveis menores de ~-endorfinas do que espectro, em um extremo estando a maioria
mulheres-controle normais, embora outros estudos apre- das mulheres, que apresenta algum
sentem resultados divergentes. Esses achados levam al- desconforto pré-menstrual, e no outro, o
guns autores a crer que a SPM seja uma síndrome de re- DDPM.
tirada de opióides.
Alguns trabalhos têm demonstrado níveis anormais
de precursores de prostaglandinas no soro de mulheres Observa-se uma grande discrepância entre os dados
com síndrome pré-menstrual, quando comparadas a mu- obtidos retrospectivamente pelas pacientes e aqueles ob-
lheres normais. Jacubowicz demonstrou níveis séricos tidos de maneira prospectiva, por meio dos registros diá-
menores de PGEl, PGE2 e PGF2a em mulheres com sín- rios por todo um ciclo menstrual. Portanto, é fundamental
drome pré-menstrual, comparadas com o grupo-controle. o registro dos sintomas, prospectivamente, por, no míni-
Entretanto, ainda não se identificou o exato desequilíbrio mo, dois ciclos. Este é considerado o padrão-ouro para
de prostaglandinas que estaria envolvido na etiologia da obter-se o diagnóstico; em especial quando se trata de
SPM. Embora se saiba que as prostaglandinas interagem pesquisas. Uma variedade de calendários (registros diá-
com os neurotransmissores do sistema nervoso central rios) é usada para a documentação das alterações, como
(SNC), os dados a respeito do papel das prostaglandinas o de Reid (Prospective Record of the Impact and Severity of
na síndrome ainda são contraditórios e inconsistentes. Menstrual Symptoms Calendar), o de Moos (Moos Mens-
Alguns estudos não-controlados indicam que o me- trual Distress Questionnaire - MDQ) e o PAF (The Pre-
tabolismo de ácidos graxos essenciais pode estar alterado menstrual Assessment Form) , porém nenhum deles é o ideal
na SPM. Nutrientes como a piridoxina, o magnésio, o zin- para uso tanto na clínica como nas pesquisas devido à sua
co, a niacina e o ácido ascórbico aumentam a conversão extensão. Alguns questionários possuem em tomo de 95
dos ácidos graxos em PGEl. Apesar disso, o papel dos itens para serem preenchidos. Em 1991, um grupo da
precursores dos ácidos graxos essenciais também perma- Universidade de Minnesota validou, a partir do PAF,o
nece indefinido. Shortened PremenstrualAssessment Form com 10 itens (Sha-
Outro neurotransmissor, o ácido gamabutírico (GABA), ron; Collen; Phyllis, 1991). Talvez com o tempo ele venha
interage com os hormônios esteróides. Os níveis de GABA a suprir essa lacuna diagnóstica. Independentemente de
são afetados pelos níveis de progesterona e seus metabó- qual registro se utilize, o importante é que haja uma in-
ROTINAS EM GINECOLOGIA
tensificaçãode ao menos 30% nos sintomas no período car tratamento médico e poderiam se beneficiar dos tra-
pré-menstrual. tamentos indicados para DDPM (Tabela 7.1). O critério
Alguns autores postulam que os quadros disfóricos de exigência de cinco sintomas do DSM-IV é arbitrário e
pré-menstruais constituem um espectro de anormalida- tem a limitação de minimizar os sintomas físicos, restrin-
des.Em um extremo estão a maior parte das mulheres no gindo a um número pequeno de pacientes o diagnóstico,
menacme, que apresenta algum desconforto, principal- e possivelmente dificultando a compreensão fisiopatoló-
mentefísico, durante o período pré-menstrual. No outro gica da doença. Entretanto, não existem orientações para
extremoestá o DDPM, que representa a forma mais gra- a quantificação do que é "grave" ou "moderado" em rela-
veda SPMe é classificada segundo os critérios do DSM- ção ao compromentimento na qualidade de vida da pacien-
IV.Os critérios do DSM-IV são bastante rigorosos, te nesse período. Não existe uma quantificação objetiva
incluindoneles apenas 5% da população com sintomas, que determine o que seja uma SMP clinicamente impor-
valorizando principalmente os sintomas emocionais em tante, a ponto de requerer tratamento, mas o principal
detrimento dos físicos. Infelizmente, a maioria das paci- seria a presença de sintomas que desaparecem após a
entesque procura atendimento médico está no meio do menstruação que sejam incômodos a ponto de requerer
caminhoentre esses dois critérios e há necessidade de tratamento e que comprometam o funcionamento habi-
padronização do diagnóstico. tual da mulher. Existe uma tendência na literatura de ca-
O diagnóstico da SPM deveria incluir uma determi- racterizar a DDPM a partir dos sintomas emocionais e
naçãoda periodicidade dos sintomas em relação ao ciclo reservar a SPM para aquelas pacientes com sintomas pre-
menstrual,uma mudança significativa na severidade dos dominantemente físicos.
sintomaspré e pós-menstruais e ausência de sintomas fora O diagnóstico diferencial com transtornos psiquiá-
doperíodo pré-menstrual. Embora muitas mulheres não tricos crônicos é muito importante e deve ser feito prin-
preenchamos critérios do DSM-IV para DDPM, elas apre- cipalmente quando o diagnóstico de distúrbio disfórico
sentamuma gravidade de sintomas suficiente para bus- pré-menstrual for considerado. Sabe-se há muito que al-
TABELA 7.1 Critérios para o diagnóstico de distúrbio disfórico pré-menstrual - Diagnostic and Statisticai
Manual of Mental Disorders, 4ª edição (DDPM)
A. Pelo menos cinco dos seguintes sintomas presentes a maior parte do tempo durante a fase lútea e que
começam a desaparecer após a menstruação; pelo menos um sintoma dos quatro iniciais.
1. Humor marcadamente deprimido, sentimentos de desesperança e pensamentos de baixa auto-estima;
2. Ansiedade, tensão, nervosismo;
3. Labilidade emocional extrema (ficar subitamente triste, chorosa ou suscetível à rejeição);
4. Raiva ou irritabilidade persistentes, ou aumento dos conflitos interpessoais;
5. Diminuição do interesse nas atividades usuais (escola, trabalho, amigos, hobbies, etc.);
6. Sensação subjetiva de dificuldade de concentração;
7. Letargia, cansaço fácil ou falta de energia;
8. Mudança no apetite, comer em excesso ou craving;
9. Hipersonia ou insônia;
10. Sensação subjetiva de estar "fora de controle";
11. Outros sintomas físicos como edema, mastalgia, cefaléia, mialgias, artralgias, ganho de peso.
B. Os sintomas são graves o suficiente para interferir no trabalho, na escola ou nas atividades sociais e no
relacionamento com outras pessoas (evitação das atividades sociais, diminuição da produtividade e
eficiência no trabalho e na escola).
C. O distúrbio não é uma exacerbação de sintomas existentes de outra doença como depressão maior,
transtorno do pânico, distúrbio distímico ou transtorno de personalidade (embora possa estar
superajuntado a qualquer um deles).
D. Os critério A, B, C precisam ser confirmados prospectivamente com registros diários por pelo menos dois
ciclos (o diagnóstico pode ser feito provisoriamente até que seja confirmado.
gumas pacientes com patologias psiquiátricas apresen- seu lugar no tratamento dos sintomas pré-menstruais.
tam exacerbação dos seus sintomas durante o período Ainda que essas medidas careçam de estudos para deter-
lúteo. minar seu real papel no tratamento da SPM, são extrema-
Não existe marcador biológico para a sÍndrome pré- mente válidas como orientação global de saúde e devem
menstrual, de modo que seu diagnóstico é clínico. É im- ser recomendadas aos pacientes.
portante salientar que existem patologias clínicas com A complementação com progestagênio foi avaliada
sintomas semelhantes aos da SPM e que devem ser exclu- por vários estudos duplo-cegos controlados com placebo.
Ídas, tais como doenças da tireóide, adrenal, hiperprolac- Nenhum mostrou melhora significativamente superior à
tinemia, sÍndrome da fadiga crônica, fibromialgias, causada pelo placebo, ou seja, muitas das pacientes que
sÍndrome do cólon irritável e anemias. Exames laborato- utilizam progestagênio e que referem melhora da sinto-
riais poderão ser realizados excepcionalmente quando for matologia da sÍndrome pré-menstrual podem estar se be-
necessário afastar outras patologias. neficiando somente do efeito placebo. Em uma metanálise
de 2001, há uma melhora estatisticamente significativa
dos sintomas pré-menstruais comparados com placebo,
TRATAMENTO mas essa melhora é tão pequena que foi considerada cli-
nicamente irrelevante, e os autores concluíram que não
existem evidências que corroborem o uso dos progestagê-
nios nos quadros de SPM.
Mesmo pacientes que não preencham os
Um estudo recente avaliou a eficácia do danazol
critérios do DSM-IV para DDPM podem se
durante a fase lútea no manejo da SPM e da mastalgia
beneficiar do tratamento.
cíclica. Esse estudo foi o que teve o maior número de
mulheres incluídas e, embora o danazol tenha se mostra-
do eficaz no alívio da mastalgia, não houve melhora esta-
o manejo inicial consiste em educação e orientação. tisticamente significativa nos sintomas da SPM no grupo
As pacientes e seus familiares devem conhecer as caracte- tratado com danazol, em relação ao grupo placebo.
rísticas da sÍndrome pré-menstrual, pois ela é uma pato- Os diuréticos têm sido muito usados para tratar as
logia endócrino-ginecológica de causa incerta e não pacientes com sÍndrome pré-menstrual, particularmente
proveniente da imaginação da mulher. Apoio médico, aquelas com queixas de retenção líquida, ganho de peso e
empatia, discussão e paciência parecem ser bastante úteis. aumento de volume abdominal. Na fase lútea do ciclo, a
O desconhecimento da causa da SPM se reflete no grande progesterona inibe o efeito da aldosterona no túbulo dis-
número de tratamentos (mais de 300 opções) descritos tal, porém esse fenômeno ocorre indistintamente nas pa-
na literatura. Apesar disso, a maioria carece de evidênci- cientes com e sem sÍndrome pré-menstrual. Dos ensaios
as, sendo que poucos estudos foram realizados com a clínicos controlados com placebo, somente dois demons-
metodologia adequada. traram benefício com o uso do diurético. Portanto, eles
As modificações dietéticas são amplamente indica- têm um papel limitado como tratamento, sendo mais in-
das, apesar de não terem sido avaliadas em grandes tra- dicados para mulheres com queixas de aumento do volu-
balhos controlados. Recomenda-se que as pacientes devam me abdominal e edema periférico pré-menstrual. A
alimentar-se de forma equilibrada - proteínas, fibras e espironolactona 50 a 100 mgldia é o diurético mais utili-
carboidratos adequados e baixa ingestão de gorduras sa- zado.
turadas; alimentos muito salgados ou muito doces devem Os anticoncepcionais orais eliminam a ciclicidade
ser evitados por poderem produzir retenção hÍdrica e con- ovariana e poderiam ter eficácia terapêutica, principal-
seqüente desconforto. Bebidas como café, chá e à base de mente para aquelas mulheres com dismenorréia e mas-
cola devem ser evitadas, pois são estimulantes, podendo talgia pré-menstrual, embora os resultados na literatura
agravar a irritabilidade, a tensão e a insônia. Também o sejam controversos e não haja evidência de que possam
álcool e outras drogas podem piorar os sintomas psicoló- aliviar os sintomas pré-menstruais. Uma possibilidade seria
gicos. Muitas mulheres obtêm alguma melhora com mo- a tomada de contraceptivo oral contínuo. Um novo con-
dificações dietéticas, por isso o aconselhamento nutricional traceptivo contendo 30 11 de etinilestradiol e 3 mg de um
é um componente da terapia. O exercício aeróbico pode novo progestagênio, a drospirenona, tem sido preconiza-
elevar os níveis de endorfinas e com isso melhorar o hu- do como eficaz no tratamento dos sintomas pré-menstru-
mor. Várias evidências reforçam que a atividade física tem ais. A drospirenona é um progestagênio derivado da
ROTINAS EM GINECOLOGIA
como a venlafaxina. Como os ISRS são bem-estudados, profissional de saúde mental para receber tratamen-
têm seus efeitos positivos bem-documentados e podem to concomitante.
ser usados apenas na fase lútea, constituem-se na primei- 4. Embora as respostas com os ISRS costumem ser rá-
ra escolha, baseado nas melhores evidências disponíveis pidas, a orientação atual, ainda que careçam de evi-
atualmente. dências científicas, é que um ISRS seja tentado por
Sedativos como os benzodiazepínicos (alprazolam pelo menos três ciclos antes que outra alternativa
0,25 mg, 2 vezes ao dia na fase lútea) fazem parte dos seja tentada. Embora nenhuma evidência corrobore
recursos terapêuticos da síndrome pré-menstrual e são essa recomendação, tendo em vista o perfil extre-
comprovadamente eficazes, mas é preciso levar em conta mamente seguro dos ISRS, a segunda opção seria
os riscos de dependência e a rápida tolerância induzida um outro fármaco do mesmo grupo.
por essas medicações. Esses estariam indicados em situa-
ções de extrema ansiedade, sempre com muito critério. Evidências em medicina complementar
Outra opção terapêutica eficaz - ainda que extre-
ma - são os agonistas do GnRH. Por provocar uma cas-
Estudos sugerem que a maioria das pacientes
tração médica, os sintomas da síndrome pré-menstrual
utiliza alguma forma de medicina
melhoram significativamente. Como o medicamento ne-
complementar, mesmo quando satisfeitas com
cessita ser usado por tempo prolongado, pode-se provo- seus tratamentos.
car aumento do risco de osteoporose à paciente. Além
disso, em geral há queixa de fogacho e atrofia urogenital.
É importante salientar que a SPM tem uma melhora
Há uma infinidade de tratamentos descritos para
conhecida com placebo. Um estudo se propôs a avaliar
a SPM, a maioria deles sem um grupo-controle. As abor-
esse fenômeno e detectou uma melhora sustentada (3 a 4
dagens em terapia complementar são extremamente po-
meses) em 20% das pacientes e uma melhora em pelo
pulares e existem estudos indicando que mulheres
menos um ciclo entre 30 e 49%. Esse dado deve ser leva-
portadoras de SPM fazem uso de medicina complemen-
do em conta na avaliação da resposta das pacientes.
tar para alívio dos seus sintomas, mesmo quando estão
recebendo alguma medicação e estão satisfeitas com ela.
Um dos poucos estudos controlados na literatura foi rea-
RECOMENDAÇÕES
lizado com cápsulas de castanha-da-índia (Vitex agnus
castus) comparado com placebo, demonstrando melhora
1. Nos dois ciclos em que a paciente preenche os seus
dos sintomas superior ao placebo. O grande problema
diários para adequada avaliação dos sintomas, ela
desse estudo foi que o diagnóstico de SPM era realizado
pode ser orientada a iniciar as medidas dietéticas e
de forma retrospectiva. Uma metanálise localizou 27 es-
a atividade física e um teste terapêutico pode ser
tudos controlados em medicina complementar. A maioria
realizado com carbonato de cálcio ou vitamina B6,
deles apresentava problemas meto do lógicos, e a conclu-
levando em conta a segurança dessas medicações nas
são dos autores foi de que atualmente não existe evidên-
doses adequadas. Vale salientar que alguns suple-
cia corroborando o uso de medicina complementar/
mentos multivitamínicos apresentam doses de vita-
alternativa para o tratamento da SPM.
mina B6 por volta de 600 mg/dia, doses no mínimo
seis vezes maiores do que a que seria indicada.
2. Caso seja feito o diagnóstico de DDPM ou os sinto- REFERÊNCIAS
mas de SPM sejam, a critério clínico, graves o sufici-
ente para requerer tratamento e não tiver havido APTER, D. et aI. Effect of na oral contraceptive containing drospire·
resposta com vitamina B6 ou cálcio, a escolha seria none and ethinylestradiol on general well-being on general well-
um ISRS na fase lútea. Como a determinação do dia being and fluid-related syndrome. Eur. 1. Contracep. Reprod.
Heath Core, v. 3, n. 8, p. 37-51, 2003.
da ovulação é pouco prática, a paciente pode ser
CH!HAL, H.J. Premenstrual syndrome: an update for the clinician.
orientada a iniciar a medicação 14 dias antes do dia
Obstet. Gynecol. Clin. North Am., v. 17, n. 2, p. 457-479, 1990.
em que a menstruação é esperada. DEUSTER, P.A.; ADERA, I; SOUTH-PAUL, J. Biological, social, and
3. Caso haja a suspeita de qualquer patologia psiquiá- behavioral factors associated with premenstrual syndrome. Arch.
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Capítulo 8
Para uma melhor compreensão deste capítulo, suge- SANGRAMENTO UTERINO ANORMAL
re-se a leitura prévia do capítulo sobre ciclo menstrual
normal. A etiologia do sangramento uterino anormal pode
ser dividida em duas grandes categorias: orgânica ou dis-
funcional (ou endocrinológica). As causas orgânicas de
PADRÕES NORMAIS DE SANGRAMENTO SUA são discutidas em outros capítulos e serão aqui bre-
vemente citadas. No Quadro 8.1, encontram-se os princi-
• Quantidade: perda sangüínea em torno de 40 mL pais diagnósticos diferenciais de SUA.
(25 a 70 rnL). Os exames laboratoriais serão solicitados de acor-
• Duração do fluxo: 2 a 7 dias. do com a história e a suspeita clínica, podendo orien-
• Freqüência dos fluxos: entre 21 e 35 dias. tar o diagnóstico em direção a uma ou outra causa espe-
cífica.
Obs.: O mais importante é a queixa de mudança de padrão, pois,
em geral, uma paciente apresenta os mesmos parâmetros durante As causas ginecológicas vaginais ou cervicais podem
toda a sua menacme. ser identifica das pelo exame especular ou colposcópico.
ROTINAS EM GINECOLOGIA
SANGRAMENTO UTERINO
DISFUNCIONAL Também é de vital importância o diagnóstico de
coagulopatias em crianças e adolescentes, responsáveis
Por definição, é a perda sangüínea oriunda da ca- por 20% dos casos de SUA nessa faixa etária, principal-
vidadeuterina e de origem endometrial, na ausência de mente púrpura trombocitopênica idiopática, apesar da
doençasorgânicas, atribuída às alterações nos mecanis- principal causa ainda ser a anovulação.
mosneuroendócrinos que controlam a menstruação. É, As três principais categorias de sangramento endo-
portanto,um diagnóstico de exclusão, podendo ser fei- metrial disfuncional são:
tosomentequando todas as causas orgânicas forem afas-
tadas.Manifesta-se mais freqüentemente como uma 1. Sangramento por deprivação estrogênica: ocorre
hemorragiauterina irregular e fora dos padrões normais após ooforectomia bilateral, irradiação de folículos
dapaciente. maduros ou descontinuação de estrogenioterapia em
Normalmente está associado à função ovariana anor- paciente ooforectomizada. Sangramento no meio do
male anovulação, podendo, porém, ocorrer em ciclos ovu- ciclo pode ser conseqüência da queda pré-ovulató-
latórios. ria de estrogênio.
I~_ SANGRAMENTO UTERINO ANORMAL
Ultra-sonografia
Outro tipo de sangramento é o ocasionado por de-
privação progestogênica, como na remoção do corpo lú- É um dos primeiros passos diagnósticos que permite
teo, que leva à descamação do endométrio. Pode ser avaliar a espessura da lâmina endometrial, assim como o
simulado administrando e após retirando progesterona miométrio, a forma e o volume uterino e dos anexos. Con-
ou análogo sintético. Como já mencionado anteriormen- segue determinar com alguma precisão pólipos, miomas
te, só haverá sangramento por deprivação progestogêni- submucosos e tumorações.
ca se houver ação prévia estrogênica sobre o endométrio. Um estudo que avaliou 1.415 pacientes submetidas
Mesmo mantendo o estrogênio, haverá sangramento se for à dilatação e curetagem (Anastasiadis et aI., 2000), entre
retirada a progesterona. Isso só não ocorrerá se a concen- 23 e 85 anos, que previamente haviam realizado ultra-
tração de estrogênio for 10 a 20 vezes superior à normal. sonografia (US) transvaginal por SUA, demonstrou que o
Haverá, portanto, sangramento sempre que existir procedimento tem valor diagnóstico limitado para pólio
desequilíbrio entre esses dois hormônios, principalmente pos e hiperplasia em pacientes pré-menopáusicas, enquan-
ROTINAS EM GINECOLOGIA _
Gestação?
to nas pós-menopáusicas tem mais sensibilidade e especi- pondem a tratamento medicamentos o, é um método com-
ficidade. Nesse mesmo estudo, 157 pacientes foram sub- plementar custo-efetivo como teste inicial (Medverd et
metidas à histerossonografia (SIS - saline infusion aI., 2002).
sonohisterography) e comparadas ao ultra-som transvagi-
na!e à curetagem, este demonstrando ser um método mais H isterossonografia
sensívele específico que a US transvaginal para a detecção
dessetipo de lesão. Método introduzido na década de 90. Trata-se de
Considera-se ponto de corte a US endometrial na pós- instilação de solução salina durante US transvaginal, cha-
menopausa de 0,5 cm de espessura para determinar a mada também de SIS (saline infusion sonohisterography).
necessidade de outro método diagnóstico (Grio et aI., Permite clara visão do complexo endometrial, podendo
1999). Na pré-menopausa, o ponto de corte fica em torno diferenciar uma patologia endometrial focal de uma glo-
de 1,2 cm. bal. A SIS foi objeto de uma série de ensaios clínicos, que
Em média, a sensibilidade da ultra-sonografia trans- comprovaram sua maior sensibilidade para a detecção de
vaginal é de 90%, mas sua especificidade pode ser tão anomalias endometriais.
baixa quanto 30% (Valenzano et aI., 1999). Em particu- Foi realizado um estudo prospectivo, cego, que ava-
lar,além de pólipos e hiperplasia, a US transvaginal tam- liou 39 pacientes por SUA, que realizavam US transvagi-
bémnão tem boa acurácia para diagnosticar adenomiose nal, após SIS cega, e depois eram submetidas ou à histe-
comsensibilidade de apenas 30%, chegando a uma espe- roscopia ou à histerectomia. Em nenhum caso a SIS fa-
cificidadede até 100% (Kim et al., 2000). A US tem maior lhou em diagnosticar a condição patológica, sendo que
sensibilidade (96%) na detecção de adenocarcinoma en- uma SIS normal sempre foi compatível com achados trans
dometrial (Tabor et aI., 2002). ou pós-operatórios normais (Williams et al., 1998). Em
Em pacientes com baixo risco para adenocarcinoma outro estudo, foi avaliada a sensibilidade da SIS em rela-
endometrial, com sangramento anormal e que não res- ção à US transvaginal: 93 e 90% respectivamente (Valen-
SANGRAMENTO UTERINO ANORMAL
zano et a!., 1999). A maior sensibilidade da histerossono- de 100 e 99% e da biópsia por Pipelle 24 e 10% em 375
grafia se dá principalmente em lesões focais nas quais a pacientes.
cavidade uterina, o volume e as margens da lesão são
melhor visualizadas. As alterações endometriais difusas Citologia endometrial
tornam-se particularizadas, bem como nos casos de en-
Originalmente descrita para detecção precoce do
dométrio atrófico e em pacientes usuárias de tamoxifeno
adenocarcinoma endometrial. É um procedimento sim-
nas quais a US transvaginal tem valor limitado.
ples, seguro e de baixo custo, realizado em consultório,
Em metanálise que considerou 24 estudos publica-
podendo ser indicado na investigação inicial do sangra-
dos entre 1992 e 2002, envolvendo 2.278 procedimentos
mento pós-menopáusico. Só deve ser valorizado nos ca-
(que foram bem-sucedidos em 95% das pré-menopáusi-
sos de positividade para células malignas.
cas e 87% das pós-menopáusicas), a sensibilidade na de-
tecção de patologias uterinas variou de 80 a 100% e a
Curetagem uterina
especificidade, de 50 a 100% (De Kroon et a!., 2003).
Uma proposta é realizar a medida endometrial por É um método diagnóstico e muitas vezes terapêuti-
US transvaginal, e reservar a SIS para pacientes que te- co. Assim como a biópsia de endométrio, não fornece
nham espessura endometrial > 5 mm ou alguma anor- amostra endometrial adequada, subestimando principal-
malidade intracavitária visualizada ao US transvaginal mente os miomas submucosos, pólipos, hiperplasias e car-
(Vries et a!., 2000). cinomas focais. Apesar de fornecer maior quantidade de
material que a BE aspirativa, necessita geralmente de anes-
Biópsia de endométrio tesia geral, o que aumenta muito seus riscos e custos, não
compensados pela sensibilidade e especificidade baixas
A avaliação histológica é o padrão-ouro para o diag-
desse exame. No entanto, muitas vezes é um dos últimos
nóstico de patologias endometriais. A maneira como a
recursos terapêuticos em sangramentos volumosos e agu-
biópsia é realizada, no entanto, modifica completamente
dos, ou na tentativa de conservar o útero.
o valor do exame.
Um estudo comparou dilatação e curetagem com
É enfática a necessidade de amostragem endometri-
achados histeroscópicos em 131 pacientes pré-menopáu-
al, e vale lembrar que não é a idade da paciente que guia-
sicas com SUA, sendo que o procedimento de curetagem
rá a indicação de uma biópsia de endométrio (BE), e sim
não teve valor diagnóstico estatisticamente significativo
o tempo de exposição a um ambiente hiperestrínico ao
tanto para a presença quanto para a ausência (valor pre-
qual a paciente ficou exposta. Então, pacientes de 35 a 40
ditivo positivo e negativo) de anormalidades na cavidade
anos devem realizar BE, assim como pacientes mais jo- uterina.
vens com hiperestrinismo e queixas de SUA (SOP' ovários
androgênicos, etc.) ou ainda pacientes de baixo risco que
H isteroscopia
não respondem ao tratamento medicamentoso.
Geralmente é realizada às cegas, por aspiração com É considerado exame de escolha para avaliação da
cânulas pequenas e flexíveis, cateter de Pipelle ou cureta cavidade uterina, pois, além da visualização direta do
de Novak. A principal desvantagem desse método é que endométrio e da cavidade, permite biópsia dirigida, po-
não fornece uma amostragem de todo o endométrio, po- dendo ser também terapêutica na medida em que permi-
dendo lesões focais passarem despercebidas. Nos casos te a excisão de pólipos, mio mas e sinéquias e a realização
em que há forte suspeita de malignidade, um resultado de ablação endometrial.
histológico negativo não deve interromper o seguimento A histeroscopia diagnóstica pode ser realizada sem
da investigação. A vantagem é que pode ser realizada em anestesia, no consultório, com óticas menores e em nível
consultório, com baixo custo, sem anestesia e com boa ambulatorial, diminuindo assim os custos e minimizando
tolerabilidade da paciente, minimizando assim os riscos. os riscos para a paciente.
O método ideal é a biópsia endometrial dirigida por Nenhuma técnica disponível supera a sensibilidade
histeroscopia. O estudo de Pasqualotto e colaboradores e a especificidade da histeroscopia com biópsia dirigida
(2000) demonstrou a sensibilidade para pólipos e mio- (Cooper et a!., 2000).
mas respectivamente em US transvaginal de 74 e 39%, da Estudos mostram a alta taxa de concordância entre o
SIS de 96 e 96% e da histeroscopia com biópsia dirigida diagnóstico histeroscópico e o resultado anatomopatológi-
ROTINAS EM GINECOLOGIA __
Antifibrinolíticos
TRATAMENTO DO SANGRAMENTO
UTERINODISFUNCIONAL O endométrio possui um sistema fibrinolítico ativo.
Um aumento nos níveis de ativadores de plasminogênio,
Muitas pacientes que apresentam pequenos sangra- grupo de enzimas que causa fibrinólise, tem sido encon-
mentosdisfuncionais não necessitam de tratamento, sen- trado no endométrio de mulheres com sangramento mens-
dosuficiente o esclarecimento da causa básica. trual aumentado. Os antifibrinolíticos inibem esses
O objetivo principal é restaurar o controle natural ativadores do plasminogênio. O ácido tranexâmico reduz
hormonal sobre o tecido endometrial, reestabelecendo o sangramento menstrual em média 50% e também deve
eventosendometriais sincrônicos, universais, com estabi- ser considerado como primeira opção no tratamento (Lee
lidadeestrutural e ritmicidade vasomotora. Na grande et aI., 2000). A redução do sangramento menstrual após
maioriados casos, o tratamento conservador hormonal é o tratamento com o ácido tranexâmico mostrou-se supe-
suficiente.O tratamento cirúrgico é a segunda opção, em rior à de outros tratamentos (antiinflamatórios não-este-
casode falha do tratamento clínico, quando este não é róides ou progestogênios orais na fase lútea). Os
bem-tolerado ou por opção da paciente. para efeitos gastrintestinais estão presentes em cerca de
um terço das pacientes e são dose-dependentes. O princi-
pal fator limitante ao seu uso é o receio de um aumento
Lembrar que um SUD recorrente, agravado ou da atividade trombótica, apesar da incidência de trombo-
persistente deve sempre levar o médico se ter se mostrado similar ao de não-usuárias (Rybo et aI.,
assistente a exames complementares na 1991) .
procura de patologia que possa estar
causando o sintoma. Pacientes com mais de
35 anos DEVEM ter o diagnóstico de TRATAMENTO HORMONAL
patologia endometrial excluído.
Progesterona e progestagênios
1
Fatores de risco para carcinoma de endométrio:
anovulação crônica, obesidade, nuliparidade,
idade> 35 anos, diabetes melito, uso de tamoxifeno
I
1 1
Tratamento clínico Investigação endometrial
I
~
Parada Sangramento
do sangramento continua
Observar Investigação
endometrial
FIGURA 8.2 Sangramento uterino disfuncional em idade reprodutiva com risco para carcinoma de
endométrio.
gramento quando utilizada na fase lútea. No entanto, di- significativa na quantidade de sangramento quando com-
versos estudos têm mostrado que mulheres com sangra- parado com os níveis pré-tratamento (Irvine, 1998).
mento menstrual excessivo apresentam ciclos ovulatórios
normais. O uso de progestágenos nessas pacientes persis- Anticoncepcional oral
te controverso (Oehler; Rees, 2003).
Existe uma grande variedade de formas de adminis- O anticoncepcional hormonal combinado reduz a
tração e dosagens, cada uma delas com eficácia diferente quantidade de sangramento nos casos de SUD. Um único
em situações clínicas distintas. O resultado de estudos estudo comparativo existente não mostrou diferença sig-
randomizados controlados mostra que o uso de progestá- nificativa entre o anticoncepcional hormonal, ácido me-
genos sintéticos tem sido largamente empÍrico (Oehler; fenâmico, danazol em baixa dose ou naproxeno. A indução
Rees, 2003). de atrofia endometrial parece ser o modo de ação dos
É difícil determinar o valor do uso de progestágenos ACOs na redução do sangramento.
sistêmicos para tratamento da menorragia, pois não exis- Não está claro se as doses muito baixas de etiniles-
tem estudos randomizados contra placebo, no entanto tradiol podem ser efetivas na redução do sangramento
vários estudos comparam o seu uso com outros tratamen- ou se algum tipo de progestagênio em particular é pre-
tos medicamentos os (Lethaby et aI., 2000). ferível. É uma opção muito boa quando a contracepção
O uso de progesterona dclica oral por curtos perío- é desejada. Deve-se lembrar que a idade superior a 35
dos (5 a 10 dias) tem se mostrado inefetivo em controlar anos, associada ao tabagismo, doença tromboembólica
sangramento uterino quando comparado aos AINEs, áci- prévia ou história familiar, contra-indica o uso de ACO,
do tranexâmico, danazol e mu com levonorgestrel (Oeh- assim como pacientes com enxaqueca (risco aumentado
ler; Rees, 2003). de acidente vascular cerebral- AVC).
O tratamento com noretisterona 5 mg, três vezes ao É possível que o uso do ACO continuadamente (sem
dia, do 5º ao 26º dia do ciclo, tem mostrado uma redução o intervalo de 4 ou 7 dias entre as cartelas) constitua-se
ROTINAS EM GINECOLOGIA __
emuma opção de tratamento (lembrando a falta de evi- É boa opção para pacientes com doenças sistêmicas,
dênciade qualidade até o momento). ou para pacientes com ciclos ovulatórios e sangramento
importante.
Estrogênios
Antiandrogênicos
O sangramento vaginal intermitente (spotting) está
freqüentemente associado a baixas doses de estrogênio, O danazol atua no eixo hipotálamo-hipófise-ovário
levandoa um mínimo estímulo endometrial: disruptura suprimindo a ovulação e levando à atrofia endometrial.
porestrogênio. Nessas circunstâncias, em que há uma fina Reduz em até 80% o fluxo e causa amenorréia com doses
camada de endométrio, a progesterona não tem efeito, diárias acima de 400 mg. Seu uso é muito limitado pela
poisnecessita de uma ação proliferativa estrogênica pré- ocorrência de paraefeitos androgênicos em até 75% dos
viapara atuar. casos, como: ganho de peso, acne e voz grave. Portanto,
Quando o sangramento é moderado, pode-se utili- tem pequeno espaço na terapêutica, exceto em pacientes
zarestrogênios conjugados (EC) 1,25 mg ou estradiol 2 aguardando cirurgia.
mgVO4/4 h por 24 h, e após EC 1,25 mg ao dia ou 2 mg A gestrinona tem efeito antiprogesterônico, anties-
deestradiol ao dia por 7 a 10 dias. trogênico e androgênico. Reduz o sangramento e provoca
Qualquer terapia estrogênica deve ser seguida por amenorréia em 50% das pacientes. Assim como com o
umacobertura progestagênica e um sangramento de de- danazol, o principallimitante ao uso são os efeitos andro-
privação. gênicos inaceitáveis pela maioria das pacientes.
As doses mencionadas, exceto 1 cp ACO ao dia, de-
vemser consideradas altas doses estrogênicas, e sua indi- Agonistas do GnRH
caçãodeve ser cuidadosamente estudada. Não há dados
disponíveisna literatura para quantificar o risco para even- Atuam por meio da inibição das gonadotropinas,
tostromboembólicos de tal terapia. Sugere-se que as pa- ocasionando um hipogonadismo. Podem levar à melho-
cientes com passado ou história familiar de eventos ra do sangramento a curto prazo em pacientes com in-
tromboembólicos não devam utilizá-Ia, e que as pacien- suficiência renal ou discrasia sangüínea, por exemplo.
tes com risco aumentado de eventos vasculares, porém Após transplantes, principalmente hepáticos, a toxici-
semhistória pregressa, possam utilizar baixas doses de dade das drogas faz o uso de hormônios esteróides pou-
estrogenioterapia. co desejável. Entretanto, seu alto custo e os efeitos
colaterais (menopausa medicamentosa) não os tornam
DIU com levonorgestrel praticáveis em terapias prolongadas, sendo reservados
a pacientes com SUD grave, que não respondem a ou-
O DIUcom levonorgestrel fornece quantidade cons-
tras terapias e que desejam ainda gestar no futuro. Se
tante do progestagênio diretamente ao endométrio,
essa for a escolha, após atingir a supressão gonadal (2 a
diariamente, suprimindo o crescimento endometrial.
4 semanas), é sugerido iniciar com TH (add-baek thera-
Aredução do fluxo menstrual em um estudo que o com- py), simultaneamente, para prevenir efeitos colaterais
parou a um inibidor das prostaglandinas e a um agen-
(fogachos, desmineralização óssea e alteração do perfil
te antifibrinolítico foi de 96% em 12 meses com o DIU
lipídico).
comlevonorgestrel. Algumas pacientes (l5 a 20% em
umano) tornaram-se amenorréicas, mas várias mulhe-
resapresentaram sangramento intermenstrual nos pri- TRATAMENTO CIRÚRGICO
meiros meses após a inserção. Este DIU teve eficá-
ciasuperior ao da noretisterona dclica (usada por 21
Ablação endometrial
dias/mês) no tratamento do SUD. Em comparação
à ablação endometrial, os resultados sintomáticos e a Indicada em casos de persistência ou agravamento
satisfação das pacientes foram semelhantes: 20% do sangramento apesar da terapia hormonal. Também
amenorréicas e 50% com fluxo significativamente re- deve ser considerada em pacientes que não desejam his-
duzido. terectomia ou não tenham condições clínicas para uma
Osprincipais paraefeitos são mastalgia e sangramen- cirurgia de tal porte. Tem por objetivo a destruição ou
tointermenstrual. Seu custo não é baixo, porém tem du- remoção da camada basal do endométrio, até 3 mm do
raçãode cinco anos. miométrio e pode ser realizada via histeroscopia ou não.
SANGRAMENTO UTERINO ANORMAL
A ablação endometrial histeroscópica para coagula- ser o único procedimento que garante solução definitiva
ção ou vaporização do tecido pode ser realizada com la- para o sangramento anormal.
ser, radiofreqüência, energia elétrica ou térmica (ablação O Quadro 8.2 apresenta as possibilidades de trata-
endometrial de primeira geração). mento do SUD.
A ressecção endometrial eletrocirurgica é a mais re- Na Figura 8.3 apresentamos uma sugestão de abor-
alizada, com a utilização de ressectoscópio ou rollerball. dagem do sangramento uterino anormal de acordo com a
A redução do sangramento chega a 90%, com amenorréia faixa etária da paciente.
em 40 a 50% dos casos. O método requer cirurgião ex-
periente, pois o risco de perfuração uterina é maior com
esta técnica. Outras complicações são relacionadas à REFERÊNCIAS
absorção do meio de distensão (glicina ou sorbito!), com
sobrecarga hídrica, edema cerebral (0,14-4%). A ablação ANASTASIADIS,P.G.et aI. Endometrial polyps: prevalence, detec·
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que buscam fugir das complicações da histeroscopia ci-
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rúrgica. Como não são realizadas concomitantes à histe- n. 1, p. 53-58, Jan. 1997.
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antes do procedimento. Pode ser realizada nos casos de ding: meta-analysis. BJOG, v. 110, p. 938-947, 2003.
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ROTINAS EM GINECOLOGIA
Oligomenorréia • ACO
• Progestagênios de 2ª fase
Polimenorréia • ACO
• Progestagênios de 2ª fase (fase lútea curta)
• Estrogênios conjugados 0,625 mg do 3º ao 10º dia do ciclo (fase folicular
curta)
• TH seqüencial
Hipomenorréia • ACO
• TH seqüencial
Hipermenorréia • ACO
• Progestagênios de 2ª fase
Sangramento ovulatório • Estrogênios conjugados 0,3 ou 0,625 mg nos 5 dias antes do fluxo
previsto
• Estrogênios transdérmicos 50 J..lgpor uma semana
Menorragiaj metrorrag ia
Fase aguda • ACO: 2 a 4 cp ao dia nos primeiros 5 dias, 1 cp ao dia após
• TH seqüencial
• Estrogênios conjugados: 1,25 mg 2 vezes ao dia, por 3 dias; após, 1,25
mg do dia por mais 20 dias, e associar progestagênios nos últimos 10
dias
• Curetagem uterina: se não houver resposta ao tratamento clínico
• Se há sangramento volumoso com repercussão hemodínâmica
geralmente é necessário transfusão sangüínea
Manutenção • AINE
• Antifibrinolítico IV
• Progestagênio de 2ª fase
• DIU com progestagênio
• Danazol (2 mg ao dia)
• Gestrinona (2 cp por semana)
• Agonistas do GnRH
• Ablação endometrial
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SANGRAMENTO UTERINO ANORMAL
Excluir endocrinopatias
Excluir doenças hematológicas e SOP
(PRL e TSH)
Não-resposta ao tratamento
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Capítulo 47
Amenorréias
Fernando Freitas, Eduardo Pandolfi Passos,
Carlos Augusto Bastos de Souza e Cristiano Caetano Salazar
Amenorréia é definida como a ausência de menstruação dores (1986) relataram que 12% dos casos resultaram de
no período da menacme, e é classicamente dividida em alterações ovarianas, 62% de causas hipotalâmicas, 16%
dois tipos: primária e secundária. Denomina-se ameno r- de problemas hipofisários e 7% de patologias uterinas.
réia primária a não-ocorrência de menarca aos 14 anos
de idade em meninas sem desenvolvimento de caracteres
sexuais secundários, ou aos 16 anos em meninas com de- INVESTIGAÇÃO
senvolvimento sexual normal. Amenorréia secundária é a
ausência de menstruação por seis meses ou por um perí- Todas as mulheres que buscam atendimento devido
do equivalente a três ciclos habituais, em mulher que pre- à amenorréia secundária deveriam iniciar investigação,
viamente menstruava (Speroff; Glass; Kase, 1999). ou no mínimo receber orientações adequadas, mesmo
Períodos menores de ausência de mênstruo são referidos antes de decorridos seis meses de ausência de mênstruo.
comumente como atraso menstrual. Fazem parte da avaliação inicial da amenorréia a anam-
A amenorréia pode ser fisiológica (gestação, lacta- nese cuidadosa e o exame Hsico completo. Informações
ção, menopausa) ou patológica (atraso do desenvolvimen- sobre estilo de vida, estresse e exercícios Hsicos, medica-
to puberal, pseudo-hermafroditismo, sinéquias uterinas), ções em uso, descontinuidade recente de contraceptivo
sendo apenas um sintoma de várias entidades clínicas pos- hormonal, história de manipulação uterina, infecção pél-
síveis. vica importante e doenças de sistema nervoso central po-
Para que ocorra o fluxo menstrual, é necessária a dem dirigir a investigação. Relatos de ondas de calor,
integridade do sistema reprodutor feminino, anatômica e secura vaginal e redução no volume das mamas ajudam a
fisiologicamente, dividido didaticamente em quatro "com- estimar a deficiência estrogênica.
partimentos": 1) a vagina, que deve ser patente para ex- Deve-se considerar a possibilidade de gestação, a exis-
teriorização do fluxo, e o útero, que além de patente deve tência de genitália anatomicamente normal, o estágio do
ter endométrio responsivo às variações hormonais cícli- desenvolvimento puberal e os estigmas de síndromes gené-
cas; 2) o ovário, que normalmente secreta estrógenos e ticas. A introdução de pipeta ou similar através do hímen
progestágenos, em resposta às gonadotrofinas; 3) a hipó- em pacientes sem atividade sexual, para verificar o compri-
fise anterior, que, como resposta ao hormônio liberador mento normal da vagina ou sua atresia, pode fazer parte da
de gonadotrofinas hipotalâmico (GnRH), secreta os hor- propedêutica inicial. Respeitada a individualização dos ca-
mônios folículo-estimulante (FSH) e luteinizante (LH), sos, geralmente não é necessário o toque retal sem ativida-
atuantes no ovário; e 4) o hipotálamo e o sistema nervoso de sexual por ser desagradável e de pouca informação
central (SNC), que representam o controle primário do ci- adicional quando comparado à ultra-sonografia pélvica.
clo menstrual, sofrendo influência endógena (esteróides A investigação das amenorréias classicamente segue
sexuais e outros hormônios, por mecanismos de feedbaek) e um "roteiro" didaticamente estabelecido, como veremos
também do ambiente externo. Em uma revisão de 262 pa- a seguir (Figura 47.1). Os "tempos" de investigação de
cientes com amenorréia secundária, Reindollar e colabora- amenorréia são uma orientação que não necessariamente
ROTINAS EM GINECOLOGIA
I Causa uterina
Investigação adicional:
• teste de gravidez
• TSH, PRL
• neurolmagem
• cariótipo
Testedo GnRH Causa ovariana • doenças auto-imunes
Como descrito adiante, as etiologias prováveis após Se não ocorrer fluxo, uma anormalidade no primeiro com-
uma prova de progesterona positiva são a síndrome dos partimento está diagnosticada. Caso ocorra menstruação,
ovários policísticos, a interferência de medicações, a per- pressupõe-se cavidade endometrial normal (apesar de
da de peso, o estresse ou exercícios físicos moderados, ou poder ocorrer sangramento de privação em alguns casos
a disfunção hipotálamo-hipofisária autolimitada sem causa de sinéquias uterinas) e passa-se ao tempo seguinte.
específica.
Caso não ocorra hemorragia de privação, o teste é Terceiro tempo
considerado negativo. Isso acontece por algum dos seguin-
Uma prova de progesterona negativa sem suspeita
tes motivos: a) gestação; b) obstrução nas vias de drena-
de manipulação/infecção uterina, uma resposta positiva
gem ou ausência de útero; c) inexistência de endométrio
(fluxo menstrual) ao teste com estrógenos e progestáge-
ou ausência de receptores endometriais para estrogênio
nos ou um nível sérico de estradiol abaixo de 40 pg/mL
(amenorréia primária); ou d) ausência de atividade es-
trogênica (hipogonadismo: estradiol abaixo de 30 ou 40 permite afirmar que existe um hipoestrinismo (hipogona-
pgJmL). Uma vez afastada a primeira possibilidade, pro- dismo), mas não identifica o estado das gonadotrofinas.
cede-se ao passo seguinte. Nesse tempo, avalia-se principalmente o resultado de FSH
Como comentado anteriormente, a prova de proges- plasmático (caso a dosagem de gonadotrofinas não tenha
terona é uma maneira indireta e clássica de determinar sido solicitada previamente, deve-se aguardar ao menos
duas semanas para coletá-Ias, devido aos efeitos de feed-
se há suficiente estrógeno para produzir proliferação en-
back negativo do estrógeno e progestágeno exógenos so-
dometrial; hoje em dia, entretanto, com a grande dispo-
bre o eixo hipotálamo-hipofisário).
nibilidade dos ensaios para estradiol sérico, o teste de
Se o FSH estiver elevado (acima de 30 mUlImL),
progesterona pode ter pouco valor, visto que uma coleta
única para verificar os níveis basais de determinados hor- existe um hipogonadismo hipergonadotrófico, que suge-
re um defeito funcional nos ovários (falência ovariana
mônios (estradiol, FSH, prolactina e hormônio estimulante
da tireóide/TSH) pode ser rapidamente elucidativa. O precoce, destruição gonadal). Se o FSH estiver baixo ou
teste é valido, sim, no sentido de reafirmar à mulher que normal, nos limites inferiores, temos um hipogonadismo
ela tem condições de menstruar novamente, que a secre- hipogonadotrófico, e a etiologia é hipotalâmica ou hipo-
fisária.
ção de estrógeno não é marcadamente reduzida (geral-
mente acima de 40 pg/mL), e que a causa da amenorréia
provavelmente não é tão séria. Preferimos atuar dessa Quarto tempo
forma em nosso serviço: conforme o quadro clínico, soli- Realiza-se o teste de estímulo com GnRH: adminis-
citamos já na primeira consulta os hormônios supracita- tra-se esse hormônio ou seu análogo, observando-se a res-
dos e procedemos à prova de progesterona somente após posta das gonadotrofinas hipofisárias (ver Capítulo 54,
a coleta. Assim, na reconsulta da paciente, podemos mais "Testes funcionais em endocrinologia feminina"). Se ocorre
agilmente confrontar os resultados basais desses hormô-
elevação de FSH e LH, o defeito situa-se no sistema córti-
nios com a resposta clínica ao progestágeno.
co-límbico-hipotalâmico (lesão do SNC ou adjacente, tu-
mores, medicações, hipotireoidismo, hiperprolactinemia,
Segundo tempo estresse/exercício/perda de peso severos); caso as gona-
dotrofinas continuem em níveis baixos, o problema é hi-
Serve para determinar se o fluxo menstrual é ausen- pofisário (tumores hipofisários ou nas adjacências,
te por inoperância dos órgãos-alvo ou por ausência de
isquemia).
proliferação endometrial induzida pelo estrogênio. Do
ponto de vista prático, em paciente com amenorréia se-
cundária sem história de infecção ou manipulação uteri- CAUSAS
na (que possa explicar a existência de sinéquias uterinas),
esse passo pode ser omitido.
Anovulação
Administra-se um estrógeno para induzir prolifera-
ção, seguido de um progestágeno para decidualização: A ovulação normal depende da coordenação dinâ-
por exemplo, estrógenos conjugados 1,25 mg/dia ou es- mica de várias ações complexas; diferentes alterações
tradiol 2 mgJdia por 21 dias, com adição de acetato de nesse mecanismo podem causar anovulia. Nesse caso, não
medroxiprogesterona 10 mg/dia nos últimos cinco dias. há formação de corpo lúteo, não há produção de proges-
terona, não ocorre transformação secretora do endomé-
ROTINAS EM GINECOLOGIA -I
norréia secundária, como craniofaringiomas, doença gra-
trio e, portanto, não há decidualização e menstruação. nulo matos a (tuberculose, sarcoidose) e seqüelas de ence-
Ocorre naturalmente nos primeiros anos de maturação falite (ver Capítulo 43, '~traso do desenvolvimento pube-
do eixo hipotálamo-hipófise-gonadal, em mulheres com ral"). Do mesmo modo, níveis elevados de prolactina (hi-
alterações em outros hormônios correlacionados (p. ex., perprolactinemia) podem causar amenorréia primária ou
hipotireoidismo), em climatéricas, esporadicamente em secundária, por uma ação direta no hipotálamo, reduzindo
mulheres na menacme, etc. A maioria dos casos de ano- a liberação do GnRH (Gross; Azevedo; Tavarone, 2001),
vulia tem como mecanismo central alguma disfunção hi- (ver Capítulo 48, "Hiperprolactinemia"). Além dos níveis
potalâmica, por vezes transitória, mas alterações ovarianas de prolactina, faz-se necessária a investigação de lesões cra-
e hipofisárias também são comuns (Stenchever et aI., manas por meio de tomografia ou de ressonância nuclear
2001). magnética (RNM) em casos de amenorréia hipotalâmica.
A maior parte das mulheres com anovulação crônica
enquadra-se na síndrome dos ovários policísticos (SOP),
um problema endocrinológico com disfunções em vários Um inventário das medicações utilizadas é
pontos do eixo hipotálamo-hipófise-gonadal (ver Capítu- essencial ao abordar a paciente com
lo 46, "Síndrome dos ovários policísticos"). Em geral, os amenorréia. Várias medicações de uso comum
níveis de LH estão tonicamente aumentados, bem como podem agir no hipotálamo, depletando a
os androgênios; a maioria das (mas não todas) pacientes circulação da dopamina (inibidor da secreção
apresenta sinais de hiperandrogenismo (hirsutismo, obe- da prolactina) ou ocupando seus receptores,
sidade, acne), além da amenorréia, e muitas têm subfer- resultando em hiperprolactinemia:
tilidade. Uma paciente amenorréica com normoestrinismo fenotiazinas, antidepressivos tricíciicos,
(estradiol acima de 40 pg/mL ou prova de progesterona opióides, benzodiazepínicos, haloperidol,
positiva) que apresenta à ultra-sonografia mais de 10 fo- hormônios femininos, metildopa, verapamil,
lículos em cada ovário provavelmente apresenta SOp,
~etociopramida, sulpirida, cimetidina, etc.
mesmo não se identificando hiperandrogenismo. Sugere-
se avaliar o nível sérico de testosterona e de sulfato de
deidroepiandorosterona para melhor caracterizar o qua- Quando o eixo hipotálamo-hipófise permanece blo-
dro clínico. Essas pacientes merecem atenção especial, pela queado por longo período de tempo, seja por fatores fisio-
associação mais freqüente com hiperplasia e carcinoma lógicos (gestação) ou medicamentos os (anticoncepção
de endométrio. hormonal), pode não haver o retomo imediato da função
O manejo da paciente com anovulação freqüente- hipotalâmica quando é cessado o bloqueio. Após o parto,
mente baseia-se na orientação e no manejo expectante, pode ocorrer amenorréia prolongada, mesmo na ausên-
conforme o período de vida da paciente e o quadro clíni- cia de lactação. Pode haver amenorréia após interrupção
co associado. Muitas vezes realizamos a prova de proges- do uso do anticoncepcional, sendo fisiológico até seis
terona para induzir a menstruação e tranqüilizar a meses após o último comprimido ou doze meses após a
paciente. Nos casos de anovulação crônica, a abordagem última injeção de medroxiprogesterona de depósito (Spe-
é mais específica, considerando o objetivo do tratamento: roff; Glass; Kase, 1999).
resolver a irregularidade menstrual, o hiperandrogenis- A atividade física intensa e constante pode provocar
mo ou a infertilidade. oligomenorréia ou amenorréia secundária. O estresse fí-
sico (bem como o emocional) aumenta os níveis sistêmi-
Causas hipotalâmicas cos de betaendorfinas e de catecolestrógenos, que inter-
ferem em substâncias que inibem o hipotálamo (Stenche-
Nas pacientes com amenorréia hipotalâmica, temos ver et aI., 2001). Dessa forma, é freqüente a ocorrência
uma prova de progesterona negativa, juntamente com de amenorréia em atletas e em mulheres que enfrenta-
níveis baixos das gonadotrofinas (hipogonadismo hipo- ram situações muito estressantes.
gonadotrófico), mas que se elevam após um teste com Mulheres com perda de peso ou restrição dietética
GnRH. importantes, como aquelas com desnutrição ou anorexia
As mesmas lesões anatômicas no tronco cerebral e nervosa, também podem ficar amenorréicas. Em indiví-
no hipotálamo que produzem amenorréia primária por duos com redução importante da gordura corporal, ob-
interferirem com a secreção de GnRH podem causar ame- serva-se uma redução na freqüência dos pulsos de LH,
AMENORRÉIAS
reflexo da diminuição ou ausência de secreção de GnRH sas condições é medicamentos o (reposição hormonal) e
(Stenchever et al., 2001). Em casos mais graves (bloqueio eventualmente cirúrgico ou radioterápico.
prolongado da liberação do hormônio hipotalâmico), pode
haver inclusive disfunção hipofisária concomitante, resul- Causas ovarianas
tando em uma prova do GnRH sem elevação de gonado-
trofinas. Modificações no estilo de vida (às vezes com ajuda Na investigação das amenorréias, as causas ovarianas
de tratamento psiquiátrico) e nutrição adequada são in- caracterizam-se por níveis basais elevados de FSH e LH,
dicadas para reverter a situação. mas níveis baixos de estradiol (verificados pela dosagem
Há mulheres com amenorréia secundária que não sérica do mesmo ou pela prova de progesterona negativa):
têm histórico de uso de medicações, não realizam exercí- assim, temos um hipogonadismo hipergonadotrófico.
cios extenuantes, não estão sob estresse, não perderam Os ovários podem deixar de produzir estrógeno sufi-
peso e que não apresentam nenhuma anormalidade nos ciente para o crescimento endometrial como resultado de
ovários, útero ou hipófise. Essas pacientes são designadas irradiação gonadal, quimioterapia sistêmica, infecção (p.
como portadoras de amenorréia hipotalâmica funcional, ex., abscesso tubo-ovariano), alterações no seu suprimento
ou disfunção hipotálamo-hipofisária de etiologia incerta sangüíneo (p. ex., após cirurgia pélvica, miomectomia)
- uma disfunção caracterizada pela perda das variações ou depleção de folículos (p. ex., após cistectomias bilate-
cíclicas que ocorrem normalmente nos pulsos de GnRH, rais). A amenorréia secundária resultante pode surgir
talvez como conseqüência da produção inadequada de dentro de períodos variáveis de tempo após tais eventos.
neurotransmissores do SNC (Stenchever et al., 2001). Essa Quando os ovários deixam de produzir estrogênios
condição é geralmente autolimitada e sem maiores preju- antes dos 40 anos de idade, temos uma falência ovariana
ízos à saúde, mas talvez demande algum tipo de controle prematura (FOP), ocorrendo em cerca de 1% das mulhe-
ou intervenção (indução da ovulação) quando se almeja res nessa faixa etária (Stenchever et al., 2001). Associa-
a reprodução. dos à amenorréia, sintomas climatéricos comumente
ocorrem (fogachos, secura vaginal, diminuição de libido),
Causas hipofisárias havendo maior risco de osteoporose no futuro. Com fre-
qüência a FOP é transitória, ou passa por um período va-
Quando o centro da disfunção é hipofisário, não ocor- riável de transição, antes de o ovário entrar em falência
re hemorragia de privação após a prova de progesterona, permanente e levar à menopausa precoce.
os níveis basais de LH e FSH são baixos (hipogonadismo Histologicamente, há dois tipos de FOP: no primeiro
hipogonadotrófico), e permancem reduzidos mesmo após deles, que ocorre na maioria dos casos, o ovário apresen-
o teste com GnRH. ta esclerose generalizada, semelhante à gônada na pós-
Apesar de a maioria dos tumores hipofisários secre- menopausa; no segundo tipo, que ocorre em 30% dos
tarem prolactina, alguns podem causar amenorréia sem casos, observam-se numerosos folículos primordiais sem
causar hiperprolactinemia, como adenomas cromófobos progressão de estágio. Essa última condição é chamada
(secretores de hormônio adrenocorticotrófico/ ACTH ou de síndrome dos ovários resistentes ou hipofoliculogêne-
hormônio do crescimento/GH). se ovariana (Stenchever et al., 2001); as mulheres com
As células hipofisárias podem ser lesionadas ou ne- essa patologia podem ter amenorréia primária, mas ge-
crosadas em virtude de anóxia, trombose ou hemorragia. ralmente há produção suficiente de estrogênio para que
Quando isso ocorre após episódio hipotensivo da gravidez menstruem por vários meses ou anos, para então entra-
ou puerpério, chamamos de síndrome de Sheehan; quando rem em amenorréia secundária permanente.
não é relacionado à gravidez, denominamos síndrome de Em 30 a 50% das FOP em pacientes cromossomica-
Simmond. Como pode ocorrer lesão de toda a glândula, o mente normais, sem história de irradiação ou quimiote-
pan-hipopituitarismo é possível, tendo como resultado a rapia, se encontra também uma doença associada à
redução de outros hormônios (ACTHe TSH, além de FSH e auto-imunidade (tireoidite de Hashimoto, hipoparatireoi-
LH) e desenvolvimento de suas respectivas patologias. dismo, doença de Addison, miastenia gravis), indicando
Para o diagnóstico das situaçãoes acima, são impor- uma ooforite auto-imune (Stenchever et al., 2001). A bi-
tantes os exames de imagem (radiografia de sela túrcica, ópsia de ovário mostra folículos aparentemente normais,
tomografia computadorizada, RNM) e dosagens dos de- mas infiltrado leucocitário perifolicular; os auto-anticor-
mais hormônios hipofisários, especialmente a prolactina pos podem ser específicos contra a gônada, mas se encon-
(ver Capítulo 48, "Hiperprolactinemia"). O tratamento des- tram com freqüência anticorpos antinucelares e fatores
ROTINAS EM GINECOLOGIA
DII
reumatóides. Por isso, recomenda-se pesquisar doenças REFERÊNCIAS
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