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Ele avisou tantas vezes que o gerador tinha que ser desligado no registro
geral todas as noites, mesmo que não estivesse ligado. O fogo tomou todo,
não sobrou nada. No primeiro andar a loja, e em cima o duplex simples que
eles viviam com Stan.
Depois disso Stan foi adotado pela cidade. Tinha uma vizinha que o
conhecia desde criança. Deixou que ele ficasse no quarto de hóspedes, sem
precisar sair. Mas era estranho, entrar e sair todos os dias de uma casa que
não era sua, de uma família que não era a sua. Aquele sentimento de estar
em um lugar estranho não passava. Olhava a senhora que o tinha acolhido
e via um sorriso meigo, cheio de carinho. Gostava de sentir aquilo, mas
nada subtituiria o abraco apertado da sua mae toda vez que ele subia
depois de ter fechado a loja.
Eram por volta de 7 da noite ainda, mas estavam todos dormindo na casa.
Seu coracao no peito batia descompassado, não tinha ritmo, não tinha forca
ou tinha forca demais. Andou pelo quarto, deitou novamente, tirou a blusa,
sentiu frio, se cobriu, se descobriu, estava mais agitado que o normal. O
primeiro natal sem seus pais estavam aterrorizando-o. A vontade de chorar
se misturava com a vontade de correr.
Abriu a porta, colocou o tenis na varanda da casa amiga. O vento frio que
vinha de fora balancou o bilhete de agradecimento na geladeira.
As ruas vazias, era cedo ainda, não passava das 9 da noite direito. Mas era
véspera de natal, as criancas foram mais cedo pra cama ansiosas, e os pais
aproveitaram para descansar. Stan podia andar tranquilo, não seria “pego”
por ninguém, a cidade silenciava, o único som que ouvia era a musica no
mp3.
Quando passou pela esquina onde ficava a sua loja parou, chegou bem
perto da porta e deixou um embrulho no chão, era o presente que já tinha
comprado para os seus pais.
Mais tarde a vizinha iria ver o álbum de fotos que Stan tinha montado.
O vento frio e cortante da noite parecia mais um estimulo para Stan que se
via cada vez mais perto de estar longe daquela cidade.
Chegou no ponto de onibus. Olhou os horários, um deles iria passar mais ou
menos por volta de meia noite. Como não tinha horario certo, ia pegar o
que passasse primeiro.
Acabou a bateria, a deixa para Stan tirar os fones e tomar um susto com o
barulho que vinha da cadeira na ponta do ponto de onibus. Só entao ele
percebeu a pessoa que estava ali sentada, parecia estar chorando. Chegou
mais perto com calma e viu os cabelos vermelhos caidos pelo ombro por
baixo do capuz do casaco.
- Está tudo bem senhora? – Stan perguntou, não sabia quem era, só ouvia
os soluços.
- Está sim, desculpe, voce quer sentar? – A voz doce e suave de menina
respondeu tirando a mala do banco ao lado.
- Obrigada – Como perguntar para alguém que voce não conhece o porque
dela estar chorando?
- Não tenho nada que me prenda em dia de natal. Decidi de ultima hora a
viagem. E você? Esqueceu o presente?
- Provavelmente pra onde voce for, eu gosto de falar, preciso de gente por
perto pra conversar. Prazer, sou Ellen.
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-x-
O onibus demorou muito a passar, o que para eles não era problema, eles
tinha muita coisa para conversar. Stan arrancou boas gargalhadas de Ellen
contando das coisas que fazia no colégio com os amigos quando era mais
novo. Já ela se surpreendeu com a maturidade do menino após ter passado
por tudo que ele passou. Ela já sabia da historia assim como toda a cidade,
entao ele contou rapidamente. Preferiram não se prender nos detalhes que
os estavam levando embora.
Quando faltava 10 minutos para meia noite, como em uma peça teatral
ensaiada, os dois foram aos poucos ficando em silencio. Sentados bem
perto, como se para se esquentarem, ficaram olhando o horizonte, o nada.
Alguns brilhos no céu iluminavam os olhos deles e fizeram Stan perceber
pela primeira vez a delicadeza no rosto de Ellen, os olhos claros, grandes,
chamavam a atenção no conjunto do rosto. Os lábios grossos, mas não
muito o faziam ter vontade de tocá-los. As maçãs do rosto estavam
avermelhadas do frio. Apesar de estarem bem cobertos o frio era cortante e
parecia piorar com o passar das horas.
Ellen viu pelo canto dos olhos a fixacao do amigo no fundo de tela, e sem
querer parecer intrometida quebrou o silencio com uma frase simples. “Feliz
Natal”
Stan saiu do transe provocado toda vez que ele via a foto dos pais. Viu que
Ellen estava olhando para ele. Deu um sorriso sem graça e respondeu o feliz
natal ainda com a voz um pouco embargada pela vontade de chorar.
Guardou o celular na mochila. Desligado.
Luz no horizonte, eram por volta de meia noite e vinte. Um onibus vinha
pela estrada escura e deserta, ambos se mexeram. Esperaram o onibus
para no ponto e Ellen tomou a frente e perguntou para onde o onibus estava
indo. Como se fosse o destino o motorista bem humorado respondeu. Nova
York jovens, a cidade onde tudo muda o tempo todo!
Nova York, e agora? Ambos não tinham pra onde ir, estavam perdidos no
centro do mundo, sem rumo e destino, com muita história, pouca
esperanca, e muita fé. Fé na vida, no carinho, no futuro e agora na amizade
que criaram. Tudo ia dar certo, podiam sentir isso, e como se foss
combinado, se olharam, sorriram, entenderam naquele momento que tudo
ia dar certo, que estava tudo bem e que a partir daquele dia a vida deles ia
ser bem diferente.