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Lenio Luiz Streck em Ue mee Le ie RL Rae Tua ttc do poder.% Em trabalhos mais recentes, Warat passa a falar da im- lise textual (¢ da literatura) para a compreenséo do discurso juri Maridos e no Manifesto do Surreatismo Jurfdico. denotacdo pura e a uma espécie de significante primevo/fundante parece ser uma constante no discurso waratiano. Em obras mais pr6- ximas ainda, Warat propde uma Semiologia /Semistica Ecolégica (Por quien Cantan Las Sirenas e Semidtica, Ecologia y Derecho — Los alrededores de una sensidtica de Ia mediacién). De qualquer sorte, redefinida ou nao, a semistica continua na ordem do dia no discurso de Warat. Veja-se a seguinte passagem, em Por Quien Cantan Las Sirenas: “los juristas sostienen la eficacia social de Ia ley en ta ficei6n de sus sentides. Una logica ‘compulsiva de In pura apariencia de sentidos, que opera como una especie de _garantia de obtenci6n, en forma retroactiva, de un significado que ya estaba en In ley desde su promulgacién. Si salva ast la pureze de la ley y se niega a In producci6n de subjetividad su valor jurtdico”.2” Actescente-se que outros juristas trabalham o Direito em uma perspectiva da significacdo e da comunicacio, como, p. ex., Eros Ro- berto Grau (Direito, Conceito e Normas Juridicas ¢ A ordem econdmica na Constituigao de 1988) e Joaquim Carlos Salgado (Princtpios hermenéuti- os dos direitos fundament 10.1.2, A hermenéutica filosfica: a importdncia de Heidegger Gadamer De pronto, & necessério observar/advertir o leitor para a dife- renga que existe entre hermenéutica classica, vista como pura técnica de interpretacdo (Auslegung), e a hermenéutica filos6fica, de matriz gadameriana, que trabalha com um “dar sentido” (Sinngebung), isto porque “en la compreensién hermenéutica entendida al modo gada- meriano se pone también en juego la autocomprensién, revelandose enella la propia dimensiGn del sujeto: ‘Es también ~ (..) ~ siempre la obtencién de una autocomprension (Selisvertiindnisses), més amplia y profunda. Pero eso significa que la hermenéutica es filosofia y, en tan- to filosofia, filosofia practica’. De acuerdo con Gadamer, tal compren- sion posee siempre una dimensi6n lingitistica. comunidad de toda comprensién, que se basa en sua cardcter lingitistico (Sprachlichkeit), 3° Idem,ibidem. 3 Che. Werat, Luis Alberto. Por quien cantan las sirenas. Unoosc /CPGD-UPSC, 1996. me parece que constituye un punto esencial de la experiencia herme- néutica’” 2 Por isto Gadamer™ vai dizer que a hermenéutica como teoria filoséfica diz respeito a totalidade de nosso acesso ao mundo (Weltzu- gang). Pois é 0 modelo da linguagem e sua formacao de realizacdo — ‘ou seja, 0 didlogo - que suporta nao somente o entendimento entre os homens, sendo também o entendimento sobre as coisas de que é feito nosso mundo. A teoria do conhecimento no sentido tradicional tem subvalorizado a articulagao lingtiistica (Sprachlichkeit). Nosso pensa- mento atual, entretanto, encontra-se orientado de modo decisivo ao fendmeno da linguagem. Isto se manifesta, acentua Gadamer, “em minha prépria teoria, no que concemne ao papel que joga a linguagem istico para toda a compreensio e o conhecimento (Verstehent A (nova) hermenéutica pretendida por Gadamer surge no hori- zonte de um problema totalmente humano, diz Fernandez-Largo: a experiéncia de encontrarmos frente & totalidade do mundo como con- texto vital da propria existéncia. A partir disto, a pergunta acerca de como ¢ possivel o conhecimento e quais sao as suas condicées, passa a ser um problema menor dentro da globalidade da questdo referente ao compreender da existéncia no horizonte de que a nova hermenéutica iré questionar é a totalidade do humano e a sua inserséo no mundo. Se Schleiermacher havia liberado a hermenéutica de suas amarras com a leitura biblica, e Dilthey, da dependéncia das ciéncias naturais, Gedamer pretende liberar a herme- néutica da alienagio estética e hist6rica, para estudé-la em seu elemento puro de experiéncia da existéncia humana. E Heidegger seré o corifeu dessa postura que se caracterizaré por explicar a compreensio como forma de definir o Dasein (ser-ai). O que nos é dado a entender acerca da existéneia humana, com sua finitude, sua mobilidade, sua projecéo ara o futuro e, em suma, sua precariedade, tudo isto pertencerd a forma primordial do compreender. Por isto, Gadamer vai dizer, jé no inicio de Verdade e Método, que a compreensio pertence ao ser do que se compreende.* 22. Georg, Hermentt obra interdisciplinar para las ciencis humana. Bilbao, Universidad de Deusto, 1997, p. 228 e229. *® Ce. Fernan« - ddamer. Valladolid, Bspatie, Universidad de gto livre 194 Lenio Luiz Streck ermenduica jriien em) Crise 195 Para desenvolver sua tese, Gadamer™ diz. que Heidegger, quan- do ressuscita o tema do ser e ultrapassa todo o pensamento metafisico, ganha frente as aporias do historicismo uma posigéo fundamental- mente nova, O aspecto da compreensio no € um conceito metédi- co como queria Droysen e tampouco é, como entendia Dilthey, uma operagio que seguiria, em direcdo inversa, ao impulso da vida sobre a idealidade. Compreender ¢ 0 caréter Ontico original da vida humana mesma. Heidegger, assim, registra Gadamer, intenta cumprir a tarefa de ilustrar a estrutura do estar-ai fe uina analitica transcendental do estar-at. ‘Com Heidegger, a hermenéutica deixa de ser normativa e passa a ser filoséfica, para a qual a compreensio é entendida como estru- tura ontolégica do Dasein (ser-af ou pre-senca), em que 0 Da (0 ai) é como as coisas, ao aparecerem, chegam ao ser, nao sendo esse modo uma “propriedade do ser, mas, sim, o préprio ser”. Heidegger situa questo da ontologia fundamental no sentido do ser; a clarificagdo desta questo somente pode resultar do recurso ao tinico ente que compreende ser, que é 0 homem (Dasein), o estar-ai, que € 0 ser-no- mundo, que 6 cuidado (Sorge); cuidado é temporal (zeiflich) 2° 5. Gadamer, Verdad y Método lop. cit, p. ®* Conformese pode perceber pela nota n. 306, 0 Dasein pode ser traduzido como ser- afe como prea que a traduga al; sein=ser). No presente trabalho, Acerca do cuidado (Sorge), Stein acres- sentamn explicitamente o corte com a tui como ser do Dasein porque nele se estabelece uma relagto circular entre afecgto & ompreenst re medi em que ¢ eliinada a dee de repreentacioe subside por um modo de ser-em, de ser-no-mundo e de relacaa do Dasein consigo mesmo cidade e exisiéncia) O euidado 60 5er do Da- Nas palavras de Heidegger, a questéo sobre o sentido do ser 86 & possivel quando se da uma compreensio do ser. O sentido articula- mente, Encontramos o Dasein na estrutura simbélica do mundo. O Dasein se comporta compreendendo. A compreensio do ser pertence ao modo de ser deste ente que denominamos Dasein. Quanto mais originaria e adequadamente se conseguir explicar esse ‘ente, maior a seguranca do alcance na caminhada rumo a elaboragio do problema ontolégico fundamental O conceito de ser é 0 mais, universal ¢ 0 mais vazio, resistindo a toda tentativa de definiga ser o mais universal dos conceitos, prescinde de definicdo. Nao se pode derivar 0 ser no sentido de uma definicao a partir dos conceitos superiores nem explicé-lo através de conceitos inferiores. Por outro Jado, visualizar, compreender, escolher sao atitudes constitutivas do questionamento e, ao mesmo tempo, modos de ser de um determina- do ente, daguele ente que nds mesmos senipre somes. Elaborar a questio do ser significa tornar transparente um ente em seu ser. Esse ente que cada um de nés somos e que, entre outras, possui em seu ser a possi- ‘ado como 0 termo pre-senga, O ser nao ogo, 0 ser nao é um ente.** bilidade de questionar, é desi pode ser concebido como ent eis, fazem parte do modo-de-ser-no-mundo, ¢, portanta, do mundo em sua ide, Mas, como 0 Dacein, enquanto cuidad Spent ay Manet cee cigar Ba teres RecA re hea se {Spies OAR CO ends adie gee ironic ® Cle. Heidegger, Ser e Teny Cle, Heidegger, Ser e Tempo I op. 27-29. Hm nota exp! espe Stra ah ao ScRSg cen ree) ee seers ite tthe See tl Sanne terns oe eeoartghe aia ravés das localizagoes; 3) para ia caso permanesa 196 Leni Luz Streck ‘Heermenéutica Juridica em) Crise O homem é definido, pois, como existéncia, como poder-ser. & aj que entra a nogio de ser-no-mundo. Se 0 estat-ai é ser-no-mundo, 10, 0 resultado da anélise da mundanidade devera refletir- ‘nago das estruturas existenciais do Dasein. O Dasein est no mundo, antes de mais e fundamentalmente, como com- preensdo, além de também como afetividade. O Dasein, nas palavras do préprio Heidegger, na sua intimidade com a significatividade, ¢ 1 condigiio Gntica da possibilidade de descobrir o ente que se encontra no ‘mundo, no modo de ser da prestabilidade, Dai que para o estar-af, ser- no-mundo equivale a ter originariamente intimidade com uma totali- dade de significados. O mundo nao Ihe é dado primariamente como um conjunto de “objetos” com os quais, num segundo momento, se jonaria, ao atribuir-lhe os seus significados e fungées. As coisas dotadas de uma funcio, isto é, de um significado e podem festar-se como coisas, unicamente enquanto se inserem numa talidade de significados de que 0 Dasein ja dispoe. O mundo s6 se di para nds na medida em que j4 temos sempre certo patriménio de idéias, é dizer, certos pré-jufzos que nos guiam na descoberta das coisas. O s io nada tem daquele “sujeito” do cogito da filesofia moderna, porg iogio pressupée precisamente que 0 sujeito € algo que se contrapoe a um “objeto” entendido como simples-presenca. O estar-ai nunca é algo de fechado de que ha que sair para ir-ter com o mundo; 0 Dasein jé & sempre e constitutivamente relagdo com o mundo, antes de toda a distingio artificial entre sujeito e objeto. O conhecimento como inter- pretagao nao é 0 desenvolvimento e articulagao das fantasias que Dasein, como sujeito individual, possa ter sobre © mundo, mas, sim, a elaboragio da constitutiva e originéria relagao com o mundo que o constitui. B essa idéia do conhecimento ~ como articulagéo de uma pre-compreensio (Vorverstiindnis) originaria ~ que Heidegger chama de “cérculo hermenéutico” ‘Assim, a compreensio, para Heidegger” é o ser™ de um “po- der-ser” que nao € preciso reportar a um dado que ainda subsiste, ¢ 4) pre-senga nfo 6 sind- légica de homem, ser ‘seu modo de ser, a 2 a que tem aliés, por esséncia, nao “poder” subsistir e ser com 0 Dasein ¢, portanto, existir no mesmo sentido que este. O Dasein de tal maneiza que sempre “soube” (compreendew) - ou nao “soube” (compreendeu) =ser tal ou tal. © Dasein 6, pois, pré-ontol6gico, isto porque o sentido de ser que é buscado jé é alcancado pré-ontologicamente na compre- ensio do Dasein. O Dasein pré-domina o processo de compreensio. Por isto, a compreensio é um existencial. E no pré-dom{nio e no pre- domfnio do Dasein que residem as possibilidades da compreensio. Semelhante compreensio permite-Ihe “saber” onde estd por si mesmo, isto é, 0 que é, segundo o seu saber-ser. Este “saber” ndo ¢ proveniente de al- guma percepcio imanente; pertence ao ser do af que é essencialmente compreensio. E & porque o ser-ai é 0 seu “ai” sobre 0 modo da com- preensio, que pode se perder e se desconhecer. Se, além disso, esta compreensdo é marcada pelo sentimento da situagio, e, por este, existencialmente submetida derelicao, serd ver- dade que o ser-af sempre-jé se perdeu, sempre-jé se desconheceu, diz. o mesire. Ea situagio hermenéutica que permite determiner 0 sentido do ser do ser-ai. No seu saber-ser, 0 ser-ai esté, pois, confiado A sua capa- cidade (possibilidade) de se re-encontrar nas suas possibilidades. A compreensio 6, enfim, aduz Heidegger, o ser existencial do saber-ser inaliendvel do proprio Dasein, de tal modo que este ser (a compre- ‘ensdo) revela por si mesmo como esté a respeito do seu ser consigo mesmo. Ou seja, no Dasein reside uma pré-compreensio. O Dasein 6 hermenéutico; 0 poder-ser-do-Dasein reside na compreensio. Por ium ente como o ser fundamental ou substancia, aquilo que langa as fundagbes pare coisa, Platio denominou este fundamento ma eterna das coisas; Arisié- Teles, como a sua substincla; os toblogos medievais, como o seu Criador. Recusan- do conceber 0 conceito de ser como uma espécie cle ente superior, um fundamento tetemo, base, causa ou-origem das coisas, Heidegger argumentow que para algo ser Significa revelar-se ou apresentar-se. Por forma a que esta presenca (Amesen) Ou au- tomanifestagio ocorra ¢ necessfria uma clareira, ums ra, um vazio, um nada, inwesen). A existencia humana constitu: a abertura necessitia para gh a presence (se) dos eres tena nga. Quan se dente prsenga aes da abertura que sou, deparo-me com um ente enguanto um ente; do 0 que a rece fm enquanto tal. Nunca vemos o tempo ‘ou focrmos a presenga ramos a8 coisis que se manifestam ou se ‘apresentam” Zimmerman, Mi Heidegger, budismo e ecologia profunds. In: huignon, Chatles (org). Poliadro Heidegger. Lisboa, Instituto Plage, [s4.] p. 268 Leo Luz Streck Rea ‘Hermend iridiea e{m) Crise 199 isso, Heidegger vai dizer que o mensageiro jé deve vir com a mensa- gem; mas ele também jé deve ter ido em diregao a ela. ‘A compreensao é um elemento que faz parte do modo de ser-no- mundo, que estd presente na propria estrutura do ser humano (Da- sein), explica Emnildo Stein: a partir desse elemento da compreensdo € que Heidegger estabelece todas as determinagdes que ele entende por interpretacéo.” Gadamer leva isto adiante e, na sua obra, tenta aplicar aquilo que Heidegger fez. Toma, & verdade, aduz 0 filos6fo gaticho, como fundamento de seu livro Verdade e Método sobretudo 0 segundo Heidegger." Portanto, no é simples dizer que as verdades 59 Heidegger diz que toda interpretagio se funda na compreensio. O sentido € que Tomo fal na interpreagio'e que, na commpreeneo, jk cede atculngh. © fla Ca de sn au ee Pe tris” dela ou que pair nao se sabe ermeditrio". Somente 0 Dasein pode Ser com ser sentido, o que significa dizer que 0 seu proprio ser e 6 ente que se Ihe abre podem ser apropriados na compreensto ou recusados na incompreensio, Dai que todo ente Aesprovido de todo e qualquer sentido, Gadamer sereacentn que 0" sentido td excrlto, condo em todas as crags ma fela hermentutien. Cle. Gadamner, Vededy Hl mere queromnon Shem nao ésimpleamente 0 proces culrra, historic, ey tae &exatamente it: Delo fato de verdad ter ia do eno verdade ¢ apresentada como verdade finita, ngo apenas ‘mas enquanto 0 Dacein 60 lugar de emergéncia da hie ve presnoto do Ser". C oes, 1533p. 29. Beato, obra, “lamb Sere Tempo d decisive em Verdade ¢Méiado, mas tater ion da fi dnt ie ue Gea pet Assim. Gadamertomou do spur Heidegger, depots de Ser e Tempo, ete ita de que ns Somos, desde compre rt jogs jgadoe qu na hermeneutics nance recperames ido € por rmenGitico no € 0 discurso manifestador apenas, 0 iscuiso £0 discurso interpretative, Go discurso que fem que intrepre- tar. E por isso que a hermentutica é, de certo modo, uma forma decaida de conheci- Sere Tempo pat veo Contd part lesie ere Tempo pata o livto Contibugdes pana * Sucgimento Ga chamada Hermentutica Filosdicn, AG mente, em se livo,aquilo que queremos e fazemes, mas oq ‘nao interessa propria= ‘que, para atém do 200 Lenio Luiz Streck % que fazem parte do universo hermenéutico ou as verdades de um tex- to que é produzido no universo da hermenéutica sao verdades que se resolvem a partir de um universo ingénuo, a partir de uma afirmacio ametédica. Somos incapazes de expor todos os pressupostos que es- tdo no universo hermenéutico. Algo sempre escapa. A compreensio, que faz parte do modo de ser-no-mundo, antecipa qualquer tipo de explicagéo légico-semantica, nao no sentido temporal, cronolégico. Porque estamos no mundo hd wna compreensiio que se antecipa a qualquer tipo de explicagto, Temos uma estrutura do nosso modo de ser que é a interpretacao. Por isto, sempre interpretamos. O horizonte do sentido é- nos dado pela compreensio que temos de algo. O ser humano é compreender. Ele 66 se faz pela compreensio. Ele s6 se dé pela compreensiio. Compreendi l, que € uma entegoria pela qual 0 i, cidade, a possibilidade, a compreensio sio alguns des O fundamento do compreender é o proprio homem. Compreender do homem, e que é preciso entender 2 estrutura do medida em que o compreender se explicita, ele é interpretado. De tal maneira que o interpretar 6-0 expor, 6 0 desdobrar das préprias possibilidades, Desse modo, para Heidegger, 0 ser humana é um ser para possibilidades, e, portanto, um ver a compreensio como uma estruturn aatecipadora. O comprender vem a ser algo que se pode explicar pela Tinguagem, que manifesta algo; 0 compreender também é algo que faz. parte do modo de ser-no-mundo, resume Stein." A compreensdo como tot \guagem como meio de acesso ao mundo e aos seus objetos so, assim, questées centrais na hermenéutica filos6fica de Heidegger, por ele denominada de Feno- menologia Hermenéutica. Como 0 compreender s6 é possfvel se o homem € um ser-no-mundo, nosso acess0 a esse 6 € posstvel pela lingua ‘gem. Por isto vai dizer, mais tarde, na Carta sobre 0 Humanismo, que a Tinguagem é a casa (morada) do sex°?e que nela mora o homem, que ue queremos ¢ fazemos, nos ac Siew em Sere Tempo, mas 86 buigdes para a Filosofia”. Cte. St 58 Cle, Stein, Aprozinnasdes, op. . ¥8.Na Carta sobre o Humanism, Heidegger val dizer que & nest ser —em que mora o hamem. Os pensidores os poctas sto as. ‘A guarda que exercem & 0 consumar @ manifestagto do ser, na media em gy {guigem enelaa conseronm. Nao é por ele irradiar um efeito ou por ser aplicado, que 0 a-se em agao. O pensar age enquanto exerce como pensar. i ‘o mais elevado, porque interessa rém, funda-se no sore espraia- delxa-se Fequisitar pelo ser para dizer a ver- ace @ que se efere a clementos que em gé am totalmente desenvolvidos depois, em proxinasies, op cit, . 6 tagao—a casa do das desta habitat sobre 0 ente. O pensat, pelo contri ‘Hermenéutica Juridica e(m) Crise 201 6-0 curador do ser. Aliés, como bem complementa Oliveira," “se @ Tinguagen: €« casa do ser, entdo ela é a nossa morada, porgus somos 00, dings Tossa compreensio do mundo é, sempre, lingiisticamente interpre rae quanto lugar do evento do ser, a linguagem & aquele acontecimento originariamente tnico, no qual o raundo se abre para nds". "A linguagem, endo, é totalidade; é abertura para o mundo ¢, entire contigho de possibilidade. Melhor dizendo, a linguagem, mais do que eondicto de possibilidade, é consttuinte e constituidera do asa e, portanto, do nosso modo-de-ser-no-mundo, que imprica 08 sav aligdee de possibilidades que temos para compreender © agit. 15t0 porgue 6 pela linguagem e somente por ela que podemos ter mundo e chegar a esse mundo, Sem linguagem 10 1 ‘mundo, enquanto mun- speGeNao hf coisa alguma onde falta a palavra. Somente quando se cevontra a pelavra para a coisa & que a coisa é uma coisa. A palavra, Gio Heidegger, nomeia o Ambito aberto onde habita o homem, 0 abert0 Se ee eceda torna manifesto aquilo que vem ao encontro da essen Gado homem e assim, aproximando-se, demora-se e conserva em ua ‘proxdmidade; a morada do homem contém e conseron 0 advento daguilo a gue o homem pertence em sua eséntcia™ Somente quando se ncontron a Hora para a coisa, € esta uma cofsa;somente ent é, uma bez que a palours Co que proporciona o ser a cosa.** Sema palavra, set a linguiagem, nto fa ceidhencia, Nao falamos sobre aguilo que vemos, mas sim 0 contrario; ‘vemos o que se fala sobre as coisas.°? ‘O Dasein tem linguagem e por isto tem mundo. Chegamos 20 mundo e 208 objetos enguanto alguma coisa que estes abjetos $80, & Mae como objetos puros. Chegamos a algo enguanto algo (Etwns als shuns, nas palavras do proprio Heidegger)? E por isto que o cético cchega sempre tarde, diz o filésofo alemio. O Dusen o ser-al, 0 ho- cheb Me ecipa as condicées para a chegada a um sentido do mundo. ‘hicompreensio desse sentido do mundo, & dizer, a compreensio do seer dado pelo modo de ser-no-mundo; ¢ o Dasein seré esse modo de ser mormundo, Por isto, acertadamente Vattimo diz que “nia inf ny, in” 28 A linguagem como totalidade no implica dizer que ela ~ linguagem ~ cr este existe independentemente de ns. Are coisas do mundo 96 existem se contpreendidas, interpretadas. A lingua jgem sempre nos precede; ela nos é anterior. Estamos sempre ¢ desde Sempre nela. A centralidade da linguagem, isto é, Sua importincie seeeMcondigio de possibilidade, reside justamente no fato de que 0 oe solo eomente sera mundo, como mundo, se onomearmos, € dizer, marteo Edtore, 1987, p23 @ ie is ani, LoyOrC=D Soci. Olivera, Reirvata, opty p- 216. 3 En Maldrnin yn sei de posts, Fieger 3 Ges Heidegger, Carta sobre o Humanismo, op cit p85. 2 Cle, Heidegger, Unterwegs zur Sprache. Ph 99 Gfe, Heidepget, Prolegonena aur Geschichte del semestre de verano de 1920. Gesemtausgabe vol tenhamos ete ur sisogo corn pasado que ChEgA a pal oy Pe end eat psd 6 asi cau aE ea pera nos precten eH mo not Zana Costas porque né mulls pron sepaar star, vale razer um exer dado 2% Fac usta ag, Quando veros pa primeira vor ete fl ct, nos ann de 1390 / epracieo wer pico que & wa a, ina easéncia da ‘ex-sistencia, com ¥ da ex sistencia”. Mais ainda, imeiramente do lado de cf do muro unc & tambér: primeiranaente € ‘Bm que sabemos previamente 0 que Cems diante nos resulta vistvel no que ele é In: que ns Waar (lradugao castelhada La pregunta por la cose, Buenos Ares, Sun essénci, ex-siste ‘ser’ uma ‘relagdo' de sujetoe objeto". io,0 omentprineiro em ‘vente’ em cxjo seio pode 202 ‘Leni Laie Steck “Hermendiatica Juridica e(mm) Crise 203 se Ihe dermos sentido como mundo. Nao hé mundo em si O mun- do e as coisas somente serdo (mundo, coisas) se foremn interpretados (como tais). Apagar (um)a linguagem, ow seja, esquecer as condigves de sua surgéncia, de sua nome-acio, nao faz as coisas (como tais) de- saparecerem. Assim, em Heidegger! hermenéutica é levar o ser do ente a se manifestar como fendmeno (phainonenon = 0 que se manifesta), sendo a ontologia (fundamental) a interrogacéo explicita e tedrica pelo sen- tido do ser. A ontologia 36 € possivel, aqui, como fenomenologia,* que terd como temética o ser dos entes, 0 sentido dos entes. Nao mais, pois, a ontologia classica, isto porque enquanto a metafisica é uma fa- talidade porque suspende as coisas humanes no interior do ente, sem que o ser do ente possa ser jamais conhecido, a ontologia (fundamen- lal) vai se preocupar com o ser. Nao mais o ente enquanto ente, mas, sim, o set (e o sentido) do ente, uma vez. que o ser sempre se manifesta nos entes. $6 ha de ser no ente. A metafisica sempre pensou o ente, ‘mas nunca pensott o ser que possibilita 0 ente, aduz o fildsofo, jo scja mais am uma concepgto de mundo, Eolas acepeb Doo ote rattvag to sent de ques cas fonseposteloporseo pean ere somo oe a concepgto correa pulse alcangar posigio exterior 20 mundo hamano-lingattco, pretende demonstrar a si mesmo stia prop Inteizo deve Ihe obedecer, ¢ enti 0 ser em sido mundo sera para ele urna restrigéo da ‘nipoténcia de sua imaginacio, arremata o mestre. Cfe. Gadamer, Verdad y Metodo, I, p. 536. 1 Ver Heidegger, Martin. “Sobre a essncia do fundamento”. In: Conferéncias e es- losficos. Trad. e notas: Eenildo Stein. S30 Paulo, Nova Cultui , 2 Ontolog logia néo 40 duas disciplinas diferentes da filosofia ao lado de outras. Ambas caracterizam a prépria filosofia em seu objetivo e om seu modo de tratar, A filoso réutica do Dave Honamento filos. Sere Tempo, |, op. 204 Como visto, entdo, para Heidegger compreender nfo é um modo de conhecer, mas é um modo de ser, isto porque a epistemologia é substituida pela ontologia da compreensio (0 homem j@ sempre compre- ende o ser). A verdade ndo é uma questo de método. Seré, sim, uma questo relativa 4 manifestacao do ser, para um ser cuja existéncia consiste na compreensio do ser. Ser, verdade, vida e historia so con- cebidos a partir da temporalidade absoluta, e nao da temporalidade enquanto qualidade de um eu a-histérico e transcendental, préprios da metafisica. Na ontologia da compreensio, a vida é historia, onde o pr6prio ser se desvela no horizonte da temporalidade. O préprio ser ¢ tempo. Por isto, a vida, a existéncia conereta, emerge na compreensio do ser. Ela mergutha na temporalidade porque compreende o ser. A vida, dizer, a existéncia, j6 €, desde sempre, porque o Dasein é pré- ontolégico, compreensao do ser. Hermenéutica & assim, existéncia, sendo a verdade a verdade do enunciado. O acontecer fenomenol6- gico da verdade éntica ~ essa ¢ a esséncia da verdade em Heidegger. Verdade seré, assim, des-velamento, des-ocultacao (alétheia = isto at que foi arrancado da ocultagio).* O des-velamento do ser é 0 que pri- meiramente possibilita o grau de revelagao do ente. A verdade (des- coberta) deve sempre ser arrancada primeiramente dos entes. O ente ¢ retirado de velamento. Esse des-velaniento ocorre na clareira do ser. A 5% Ver Heidegger, "Sobre a esséncl tain, Compreenso¢ nitude, op. wdamento", op. Introdugao ao pena iginalmentea nogio corrente de verdade ‘como conformidade de enunciagao, no sentido, ainda incompreendido, do cardter de ser desvelado e do desvelamento do ente. Cie. Heidegger, Martin, “Sobre a esetncia dda verdade”. In: Conferéncins e escrito ilosificos, Trad. enotas: Eniide Stein, Sao Pats Jo, Nova Cultural, 1989, p. 128. im dos ans 50, ‘os dois termos sto empregados conjuntameste. A pastr deta data, nomendamonte em Hegel nd ie Crcenee O98). © Zu Sin 196), pala nso sembora nto sondo sbandonnda vse ts daramene sop pelo menos neses ‘expres Unvertorgenl Tudo se passa como se palavta Enbergungtvese side Intioduzida tendo om vista uma hag pret, ¢ der, carficar Goanido da outs Hermentutica Juridica e(on) Crise 205 proposicao é yerdadeira significa deixar ver o ente em seu ser e estar des-coberto. E a prépria eclosio do ente no seu ser. Enquanto o ente € (porque des-velado), coloca-se ¢ mantém-se no des-velamento. O ser verdadeiro da proposigao deve ser entendido no sentido de ser descobridor. Enquanto ser-descobridor, 0 ser-verdadeiro 36 é, pois, ‘ontologicamente possivel com base no ser-no-rundo. Este des-vela- mento (Unverborgenheit) /des-cobrimento (Enidecktheit) como verdade sobre o ser é chamado verdade ontolégica. Des-velamento do ser é, sempre, verdade do ser do ente. No des-velamento do ente ja sem- pre reside um des-velamento de seu ser. Verdade 6ntica e ontolégica ‘sempre se referem, de maneira diferente, ao ente em seu ser e a0 ser do ente. Blas fazem essencialmente parte de uma outra em azo de ‘sua relacéo com a diferenca ontologica (de ser e ente).* Assim, a es- séncia dntico-ontolégica da verdade em geral, desta maneira neces- sariamente bifurcada, somente ¢ posstvel junto com a irrupgio desta diferengn ontol6gicn. ‘A diferenga ontoldgica é, a0 lado do cfrculo hermenéutico, um dos dois teoremas fundamentais (E. Stein) heideggerianos para supe- rar a metafisica. A metafisica, seja na sua versdo aristotélico-tomista, seja no modo como é tratada a questio do conhecimento no para~ digma da filosofia da consciéncia, abandona o pensamento da diferenca a vez. cumprida essa funcdo, delxasse de ser necesséria. De ‘qualquer modo, torna-se cada ver mais nitidamente visivel, no decurso da evolucao ddo seu pensamento, que as expressbes ndo dizem a mesma colsa: se Linverborgenheit 1ce-se por formula a esséncia desta, porque agile que Ueerbrgene 6 frmulavn negativamente, cone lane, Heidegger e as palacras da origem. Lise iaget, 1990, p. 85 e 86, om especial nota n. 57. sta presente no modo da passagem parno ent, 6 nga tren merament, oa ‘sobrevenienca que desalberga um ente {sere nde d sem ger, mas coma ene sempre tim char ao iberga-se nl, chegda estar presente (dem Ibidem, p- 62). is deren. ota dlterenga nfo estabelece de duss maneiras tina de outa, mas abre o ente no seu ser, wie consigo mesmo ne ‘esta mesmidade, A diferenga de sere ente € enquanto a diferenga ‘ chegada a resolugo desilergente-altergante de ambes (idem 1 ‘Otto. A Vin do Pensemento de Martin Hetegger. Lisboa, Instituto ontolégica para se transformar em uma (mera) reflexito sobre a temética da diferenea, concebendo a diferenca éntica como simples diversidade dos fenémenos para a subjetividade, e a identidade do ente consigo mes- mo como identidade e permanéncia da esséncia dos fenémenos para o pensamento.*” Nesse sentido, ¢ preciso ter claro o relevante fato de que a metafisica — que na modernidade tem sua forma de aparecer na subjetividade, na representacio e na objetificacao -, conforme bem Iembra Emnildo Stein, entificou o ser. Nao entificar 0 ser, identificando- © com o ente ou um ente significa, para Heidegger, superar a meta~ fisica’® Nesse sentido, Heidegger vai esta transformacao do ente em objeto de representagao (Vors que esti a disposicéo, como Anwesenheit e Zuhandenheit, que iré sus- tentar a contemporanea cisio entre ser ¢ dever-ser, entre fato e valor, entre questio de fato ¢ questo de direito, cisio essa que se sustenta numa concepsio de neutralidade axiolégica do ser e entende os valo- res como produto da st losofia da consciéncia).* Releva notar - e aqui vem a explicagéo da origem da metodolo- gia modema - que, para sustentar os seus dualismos, a subsungdo e 0 dedutivismo, a metafisica apela para a especializacio, 0 método, a técnica. O método ~ supremo momento da subjetividade ~ vai ter, ass fungiio de encobrir, na ciéncia, a diferenga ontol6gica. Nesse exato sentido lizer que a esséncia da ciéncia moderna fundamenta- Ea figura na qual impera o ser na era da técnica " "© dispositivo € a esséncia da técnica. (..) Aesséncia da téen’ converte sempre em objeto a preciso ter claro que a diferenca ontolégica é 0 suporte do ser e do ente. No ente é pensado e dito o ser. O ente niio existe como ente, ou sea, 0 ente nao existe ~ no sentido de sua existéncia - sem estar junto 39 Ver, ness sentido, Trotignon, Pierve. Heidegger. Lisboa, Edighes 70, 1990, p. 25 ‘Tempo, op o. Diferena emetaisie, Ensais sobrea desconstrugo. Porto Alegre, aipucrs, 2000, p. 67 «segs 88 «50g > Cie. Heidegger, Ser ¢ Tempo, ‘segs Hotzoege. Frankfurt, «/M, Hermendutinejurisprudénct, Li 38 Cfe, Heidegger, Martin. Bremer wed Feturger Vortrige. Frankfurt 0/M, 1994, Vit- torio Klostermann. 1 Che, Stein, Dferenene Metafisca, op. cit, p. 88 «segs. °8.Cfe, Heidegger, Bremer und Frefburger Vortrge op Lenio Luz Strec Hermendutica Juridica e(m) Crise 207 a0 ser (0 ente s6 é no seu ser e o ser & sempre ser-em,* ser-junto (Sein- bei). Esse “teorema” heideggereniano, como bem assevera Stein, mos- tra aquilo que o proprio Heidegger denominou de “o incontornavel” para a ciéncia. A diferenca ontoldgica como incontorével ocorre “no aberto entre” o que é 0 Dasein compreendido “no sentido do ambito extético do desvelamento e do velamento do ser”, onde toda a relagio ‘com 08 entes passa por esse incontornavel, sendo ele inacessi ‘08 meios das ciéncias”. Assim, aprender a guardar (proteger) a ontolégica & 0 que preserva a ciéncia da total objetivago, o que somente resulta da destruicéo, desconstrugio e superagio da metafisica, que entificow 0 ser e assim encobri a dferensa, sobretudo na moderni- lade, Estes pressupostos heideggerianos serdo fundamentais para dar substncia ao projeto hermenéutico gadameriano. Embora a frase “ser que pode ser compreenclido é linguagem” nao esteja no inicio de Verdade e ‘Método, entendo que é por ela que se pode/deve comegar a analisar a sua obra e a sua pretensio hermenéutica. De pronto, a partir disso, ¢ possivel dizer que Gadamer parte (heideggerianamente) da premissa de que a linguagem nao é uma terceira coisa que se interpde entre ¢ objeto, ou seja, na concepcao hermenéutica de Gadamer no hd espago para a dicotdmica relagao epistemolégica sujeito-objeto,™ na qual 35 Que significa sor-om? pergunta Heidegger. Primeiramente,completando o ser-em com ser-osmindo, somes lovados a caneber 0 serem como "set-dento.-”. Bla txpreso visa so mado de ser de um ents que es “dent” de um outro, ‘gin “dene oo ga 0" do armro. Bste “dentro” Te ensarnumna relagio de ser de dois entes eatendidos “dentro” do expago 08 quals se Exlacionam entre a, tomando em coraderagto 0 eu lugar reese espaco, A esto todos da mesma mancia nar hig, 0 e9paGo ie noed do", sea, “dentro do espogo tanita coho estando um “dentro” do outro posse Sistente, como colsas que acontecem “no interior” do munda,O veraubsi ti em subsistente, sersubsisentscom algo diferente do mesmo modo de ot, srg ema ei dein ds ope eceres li he afogoril, Ar categorns sto propras doer que nfo € segundo 0 modo de ser ede he attedace Mavuk bre Temp LPetopls, Vass 1335, 1036 gs pr lbs creoent-ce que tna an pretenses cen FTempm eranctftca 8 superego do paradigina oviiae Sar no staque’ da lilosofia da conscitneia, ¢ dizer, oesquem 208 Lenio Luiz Streck ‘© sujeito se contrapde a um objeto entendido como simples-presenca. ‘A linguagem é totalidade, no interior da quai o homem, o Dasein, se localiza e age." Ou seja, a existéncia de uma relacéo com o mundo (relagéo Ssujeito-sujeito) pressupde a anierioridade do Dasein. Daf que a apro- priacdo dessa totalidade (lingtiistica, é dizer, a lingitisticidade ~ Spra- Chlichkeit - do ser) é possivel, entao, pela interpretacko. Nisso reside a propria pretenso de universalidade da hermentutica de Gadames, Para comegat, em face da frase-chave “ser que pode ser compre- endido & linguagem”, (Sein, das verstanden kann, ist Spracke) é possivel dizer que aquele que nao tem linguagem ou as condigdes de fazer a nomeacio de algo (ettuns) ndo tem acesso a esse algo, porque nao haa necesséria (e condido de possibilidade para a) compreensio. Como diz Gadamer, 0 modo como algo se apresenta a si mesmo forma parte de seu proprio ser;o que pode compreender-se é linguagem. Assim, passa no ter sentido perguntar sobre a efetiva existéncia do ser; somente ter sentido perguntar acerca do ser enquanto compreendido/sentido/in- terpretado. Sem a campreensio do ser, este ser nio é, embora ndo se posse dizer nada sobre o ser que nao 6, eis que nao é possivel falar sobre algo ‘que nao se consegue simbolizar pela linguagem. Se nao consigo dizer algo sobre algo, esse nao-dito é real (Lacan), pois 0 que sobra.™ Isto ‘dor stwada frente a um mundo entendido como a totalidade dos ents. O enfrentamento ‘da conseiénela ae dé em dois pasos, it epistemelégico FRermen modo do Drs 3o possive extras us tess que, de certo modo, Gadamer defend hhermenéutico é determina. caren, "éconstituldo pela lingualidade; rocesso amipém determinado pel fefonoalinguagen forma o horlzonte de uma ontologia hermenbutica So. Aproximagae sobre hermenduten. Porto Alegre, Edipucrs, 1996, p.74) Sizer que sem linguagem do hé mundo, e que a palavra tem uma fungio cia sori SUhremode Heidegger de Liane oer Tnto aparece bom em Bruce qu lade’ portant ser pensadoc falado. A construgto social da realidade’ implica um mando re pode serClesignado e falado com as palaveas fornecidas pela linguagem de urn fae aoc Cou st Sito der ser dito a sua lingtagem nto parte da re date de rar Ne terninologin de Lacan, a exstoncia € umn pro~ dlutoda inguagersa linguagem iia cotsas (ornando-ns parte da ealidade humana) Hermentutica Juridica e(m) Crise 209 Porque é pela linguagem que, simbolizando, compreendo; logo, aquele real, que estava fora de mex mundo, compreendido através da linguagem, passa a ser realidade, Dizendo de outro modo: estamos mergulhados em um mundo que somente aparece (como mundo) na e pela linguagem. Algo s6 é algo se podemos dizer que € algo. Esse poder-dizer ¢ lingiiisticamen- te mediado, porque nossa capacidade de agir e de dizer-o-mundo 6 limitada e capitaneada pela linguagem. Como diz Heidegger, todo © processo de compreensio do ser € limitado por uma historia do ser que limita a compreensao, Gadamer, assim, eleva a linguagem ao mais alto patamar, em uma ontologia hermenéuticn, entendendo, a partir disto, que éa linguagem que determina a compreensio e o proprio objeto her- menéutico. 0 jé é um ato de compreender e um interpretar. Em decorréncia, Gadamer vai dizer que a interpretacdo trabalha sempre com conceitos prévios, cuja tendéncia é a de ser substituidos progressivamente por outros mais adequados, Este constante repro- jetar~no qual consiste o movimento no sentido de compreender e in- terpretar ~ constitui o proceso que descreve Heidegger, que somente entra na problematica da hermenéutica e criticas da hist6ria com 0 fim de desenvolver a partir delas, desde 0 ponto de vista ontolégico, a pré-estrutura da compreensio. Gadamer, pelo contrétio, persegue & questo de como, uma ver liberada das inibig6es ontolégicas do con- ceito cientifico de verdade, a hermenéutica pode fazer juistiga & histo- Hidade da compreensio. Desse modo, aquele que intenta compreender esté exposto aos erros de opinides prévias que nio se comprovam nas coisas mesmas. Elaborar os projetos corretos e adequados as coisas, que, como projetos, sto antecipagées que devem confirmar-se nas coisas, éa tarefa constante da compreensio. A compreensdo s6 alcanga as suas verda- dciras possibilidades quando as opinides prévias com as quais ini ‘nao séo arbitrérias, Em razao desta circunstancia, é importante que © intérprete rido se dirija aos textos diretamente, desde as opinides prévias que lhe subjazem, senio que examine tais opinides enquanto a sua legitimagdo, isto é, enquanto a sua origemte validade. Frente a todo 0 texto, ‘gue nfo tinham existéncia antes de serem cifradas, simbolizadas ou verbalizadas. O real, enti, nfo existe, uma vez que ele precede a linguagern. Lacen reseroa um ferme rao para cle, enprestado de Heidegger: le ‘exsist’. El existe fra ou sepavado da nossa realidade, Obviamente, na mediida em que nomeamos elalamos a respeito de real ¢o poramos em um discurso tedrico sobre a linguagem e sobre o tempo ant ‘Palavra’, empurramo-la para dentro da linguagem o, desse modo, damas un ti nossa tarefa nao ¢ introduzir direta e acriticamente nossos préprios habitos lingiisticos; contrariamente a isto, Gadamer reconhece como tarefa fundamental o conseguir a compreensio do texto apenas desde © habito lingiifstico do sett tempo ou do seu autor. Quem quer com- preender um texto realiza sempre um projetar, acrescenta.” Quando se ouve alguém out quando se empreende uma leitura, nao é que tenhamos que esquecer todas as opiniées prévias sobre seu contetido, ou todas as opinides proprias, diz o mestre. O que se exige € que simplesmente temos que estar abertos @ opiniéo do outro ou do texto. Entretanto, essa abertura implica sempre que se coloque a opiniao do ‘outro em alguma classe de relagto com 0 conjunto de opiniges préprias ‘ow que um se coloque em certa relaciio com as do outro. Para Gada- mer, aquele que pretende compreender nao pode entregar-se desde © principio a sorte de suas préprias opinides prévias e ignorar a mais obstinada e conseqientemente possivel opinido do tex pretende compreender um texto tem que estar em principio di texto Ihe diga algo. Uma consciéncia formada hermene\ que se mostrar receptiva desde 0 inicio para a condicio do texto. En- tretanto, esta receptividade nao pressupde nem neutralidade frente as coisas e nem autocancelamento, sendo que inclui uma matizada in- corporagio das proprias opinides prévias e pré-juizos. O que importa, aduz 0 autor, € que se faga a mediagio das préprias mediacdes com a finalidade de que o texto mesmo possa apresentar-se em sua condicao e obtenha, assim, a possibilidade de confrontar a sua verdade objetiva com as prdprias opinibes prévias.# ‘Toda compreensio tem uma inexordvel e indissocidvel condigao histérica, que faz a mediacdo entre o sujeito e a coisa a ser compre- endida. Alinal, o Dasein, conforme Heidegger, sempre possui a sua hist6ria e pode possut-la porque o ser deste ente constitui-se de histo- ticidade. Esta tese deve-se justificar com vistas & exposigao do pi ma ontolégico da historia enquanto problema existencial. O ser-ai se compreende a partir do que vem ao encontro no mundo circundante ¢ daquilo de que se ocupa numa circunvisio, Esta compreensio nao 6 um mero registro de si, que apenas acompanharia todos 03 compor- tamentos do ser-ai. A compreensdo significa o projetar-se em cada Possibilidade de ser-no-mundo. O acontecer na histéria & 0 acontecer do ser-no-mundo. Com a existéncia do ser-no-mundo hist6rico, tanto 0 manual quanto o ser simplesmente dado sempre jé estio inseridos na histéria do mundo, Em razio da transcendéncia do mundo, que 32 Cfe. Gadamer. Verdad y Método I op. cit, p. 201 © seg. dem, ibidem, p-335 e 336. 210 Lenio Luiz Strock Hocmenéutica Juridica e(en) Crise 211 se funda no tempo, uma histéria do mundo jé esta sempre “objetiva- mente” pre-sente no acontecer do ser-no-mundo. Assim, a historia é a condigao prévia para que o ente seja um ser-no-mundo. Nao ha uma contraposigio entre sujeitoe objeto, es. fusito entre ambos a partir de sua historicidade. O existir do “s ‘um existir hist6rico, enquanto ser-no-mundo, em que o “objeto” nao é construido pelo “cogito” e tampouco é refletido na consciéncia, mas, sim, se desvela pela linguagem. O desvelamento do ser de um ente passa pela possibilidade de seu existir, que 86 acontece na histéria lingiiisticamente apreendida. Quem compreende no tem uma mente em branco, como uma fibula rasa, e sim jé tem, desde sempre, uma prévia compreensio das coisas e do mundo; jé tem (sempre) uma pré- compreensio, algo prévio que vern com o ente, como curador/¥: ante do ser. Desde sempre, 0 sujeito da compreensio ja esta jogado no mun- do, dentro do qual as suas condigdes de possibilidade estao defini- das (e se definem cotidianamente) na e pela linguagem. O sujeito da compreensio recebe o legado da tradicéo; esse legado é compul nfo hé possibilidade de a ele renunciar. Como bem diz. Heidegge “a tradig&o nao nos entrega a coergao do passado e do irrevogavel. Transmitir, délivrer, significa por na liberdade do didlogo com aquilo que jé foi”. Por isto a forte eritica de Gadamer & ingenuidade do his- toricismo,7 que pensava que 0 suijeito cognoscente, como uma ména- da psfquica, podia ficar imune aos fatos da hist6ria, (re)contando-os desnu(da)dos. Vé-se, assim, a importincia que Gadamer atribui A tradigdo, en- tendida como 0 objeto de nossa (pré)compreensio. O legado da tra digdo vem a nés através da linguagem, cujo papel, como jé se viu, é central/primordial na teotia gadameriana. A linguagem nao é s0- mente um meio a mais dentre outros, diz ele, senéo o que guarda igo, a gual, como pols um obstdco paa comprecnde? en compreensi. Quando fata o tempo ea Fernandez-Largo, op. cl, p.58, Também Lenio Luis Streck ‘uma relagio especial com a comunidade potencial da razio; é a razio © que se atualiza comunicativamente na linguagem (R. Hénigswald): a linguagem nao é um mero fato, ¢ sim principio no qual descansa a universalidade da dimensio hermenéutica Por evidente, destarte, que a tradigao tert uma dimensio lingiiéstica. Tradigao é transmissio. A experiéncia hermenéutica, diz 0 mestre, tem direta relagdo com a tradig&o. E esta que deve anuir & experiéncia. A tradigao néo é um. simples acontecer que se possa conhecer e dominar pela experiéncia, sendo que é linguagem, isto é, a tradicao fala por si mesma. O trans- mitido, continua, mostra novos aspectos significativos em virtude da continuacdo histérica do acontecer. Através de sua atualizagao na compreensio, os textos integram-se em um auténtico acontecer. Toda atualizagio na compreensio pode entender a si mesma como uma possibilidade histérica do compreendido. Na finitude histérica de nossa existéncia, devemos ter consciéncia de que, depois de nés, ou- tros entenderdo cada vez. de maneira diferente. Para nossa experiéncia hormenéutica, ¢ inquestiondvel que a obra mesma ¢ a que desdobra asua plenitude de sentido na medida em que se vai transformando a sua compreensio. Por outro lado, a histéria é somente uma; seu sig- -ado & que segue se autodeterminando de forma incessante, Por fa Gadamer, « redugio herme) a opinio do autor & tao ina- -omo a redugdo dos acontecimentos histéricos a intengio dos que O carater da interpretagio de Gadamer é sempre produtivo. # im- possivel reproduzir um sentido. O aporte produtivo do intérprete forma inexoravelmente parte do sentido da compreensio. Como jé se viu, € im- possivel o intérprete se colocar em lugar do outro. O acontecer da interpretacéo ocorre a partir de uma fusio de horizontes (Horizontvers- chmelzung), porque compreender é sempre o processo de fustio das supostos horizontes para si mesmos, acentua. Compreender uma tradic&o requer um horizonte histérico. Um texto histrico somente ¢ interpretavel desde a historieidade (consciéncia histdrico-efetual) do intérprete. ‘A fusio de horizontes ocorre sempre que compreendemos algo conceito de fuséo de horizontes gadameriano encon- -a da participagdo e da distanciaco. Se a condicéo conhecimento hist6tico exclu todo 0 sobrev6o, toda a sintese final A manera hegeliana, essa fiituce no implica que eu me feche num ponto de vista. Onde quer que haja situagdo, hi horizonte sus- cettvel de se reduzir ou de se alargar.” A fusdo tem lugat constantemente 37 Che, Gadamer, Verdad y Mito, Il, op. ci, ps 113. 2 Neste sentido, ver Ricouer, Paul. Do texto apie Porto, RES Ed, 6/d,p 106. Hermendutica Juridica e(n) Crise 213 no dominio da tradigéo, uma vez que € nela que o velho ¢ 0 novo crescem juntos para uma valida outro cheguem a destacar-se em realidade nao existem explicitamente estes horizontes que se des- tacam uns dos outros, por que, pergunta Gadamer, falamos entio de fusto de horizontes, e nao da formacao de um horizonte tinico que vai remontando sua fronteira na direcio das profundidades da tradi¢ao? Colocar esta questdo implica admitir a peculiaridade da situacao na qual a compreensio converte-se em tarefa cientifica e admitir que é necessério chegar a elaborar esta situacao como hermenéutica, Todo encontro com a tradicéo realizado com consciéncia histérica experi- ‘menta por simesma a relacdo de tensao entre texto e presente. A tarefa hermenéutica consiste enti, explica o mestre alemdo, em nao ocultar esta na assimilagio ingénua, e sim em desenvolvé-la conscientemen- razao é que o comportamento hermenéutico esta obrigado ‘a projetar um horizonte histérico que se distinga do presente. A cons- ciéncia histérica € consciente de sua prépria alteralidade e por isto destaca o horizonte da tradicéo com respeito a si proprio. Por isso, acrescenta Gadamet, 0 projeto de um horizonte hist6ri- co é, portanto, uma fase ou um momento na realizacéo da compreen- so, endo se consolida na auto-alienagdo de uma consciéncia passada, sendo que se recupera no préprio horizonte compreensivo do presen- te. Na realizagéo da compreensio, tem lugar uma verdadeira fusio hhorizéntica que, com o projeto do horizonte histérico, leva a cabo, si- multaneamente, a sua superacio. A essa realizacéo controlada dessa fusio é que Gadamer dé o nome de "tarefa da consciéncia hist6rico-cfetu- al” (Wirkungageschichtliches Bewusstsein),-” que, em um primeiro lugar, a consciéncia de uma situacio hermenéutica.”" O fazer-se consciente ‘esse mesmo momento que su Ricouer, uma pergunta: como é possivel ‘ho, na autoridade, no pré-julzo? Estamos A mercé da histéria efet =r camninha por mostrar a dialética que existe entre estranhamento e perten- ' umna tensdo ou distancia que posebilita a tomada de coneciéncia histrica *Situagao hormenéutica 6 “uma esp ‘vee dos instrumentos te luma avaliagio do campo ternatico”. Cle. Stein, Aproximagies, op ci, 63. ugar que cada investigador atingeatra- jc08 que tem & disposicio para a partir dele poder fazer - de uma situagdo é uma tarefa que, em cada caso, reveste-se de uma dificuldade prépria. O conceito de situacao caracteriza-se porque al- guém nao se encontra frente a ela e portanto nao pode ter um saber Objetivo dela. Se esté nela, este alguém se encontra sempre em uma situagio cuja iluminagao é uma tarefa que ndo pode ser desenvolvida por inteiro. Isso vale para a situago em que nos encontramos fren- te & tradicéo que queremos compreender. A iluminacao da situacéo acerca da reflexk sobre a histéria efetual também nao pode ser completa. Essa impossibilidade no defeito da reflexio, mas, sim, faz. parte de nossa historicidade. Ser hist6rico, diz Gadamer, quer dizer ilo se esgotar nunca no saber-se, porque todo saber-se provém de um dado istorico prévio®* A fusdo de horizontes se da pela aplicacéo. O ato de interpretar implica uma produgfo de um novo texto, mediante a adigio de sentido que 0 intérprete the dd.** Essa adicdo de sentido decorre da consciéncia histérico-efetual na qual o intérprete esté possufdo. Isto porque hi um cardter construtivista na histéria. Toda a compreensio hermenéutica pressupde uma insergio no proceso de transmissio da tradiggo. Hé um movimento antecipatorio da compreensio, cuja condicao ontolégica é 0 circulo hermenéutico. 55 Che. Gadamer, Verdad y Método, |, op. 1p-377, 378 €372. ‘mas esté incorporada ao texto, Essa figura caracieriza a relagio nts texto enerretgio em seu agpecos mals gras, Agul aparece um momento dda estrutura hermenéutica que convém ressatar, Essa linguagem mediadora poss, tla propria, uma estrtura dalogal. O Intzpreie que faz a IntermediegSo entre a ‘duas partes do diflogo nati pode fazer a nfo ser considerar sua di femaranhedo de ambas as posigBes como uma espécie de superioridade. Por isso, sa ajuda no entendimento no se limita ao plano de linguagem, por uma intermediagao real que busca equtliorar 9 ditelto e os ti ‘partes. O “intermediador do discurso’ converte-se em ‘negociador’ {ima relagdo muito parecida entre o texto e oleitor. Aps superar o elemento estra- ho de um texto, audando assim o leitor @ compreendé-lo, a ‘do intérprete ‘io significa desaparecimento em sentido negative. Significa ‘comunicagio, esolvendo assim a tensdo entre o horizonte do texto eo horizonte do Teitor. Bo que chamo de fusio de horizontes. Os hosizontes separados como pontos de ‘vata diferentes fandem-se num. Por isso a compreensio de tm texta tende a integrat 0 leitor no que diz o texto. E justamente af que o texto desaparece” (Das Verstind- nis eines Textes tendiert deher dahin, den Leser (tir das einaunehmen, was der Text sagt, der eben damit selber vers i, PetrOpolis, Vores, 2002, p. 405; ubingen, Mohr, 1930, p. 30 e 351. ind Me-thode Il. Erganzungen Register. 214 Lenio Luiz Streck ‘Hermendittica Juridica e(m) Crise 215 reconhece que a co: temente pelo movi Heidegger assi consciéncia histéria. Trata-se de mpreensio do imento antecip: descreve néo é sendo a tarefa de coneretizagao da descobrir as proprias prevencies e Lenio Luis treck Préjulzos e realizar a compreenséo desde a consciéncia hist6rica, ae forma que detecar’o historicamente diferente e a aplicagio dos fiétedos histéricos nio se limitam a uma confirmacio tas Proprias hipoteses ou antecipagdes, conclu, Por derrai que deve ser ressaltado na teoria gadameriana igent e a contribuicdo para o avanco do que se con Hie nou, chamar de giro lingttistico da filosofia ocorrida no século XX, Fie mesmo reconhece a proximidade de suas teses com oe cetera originatias da flosofia analitca, justamente pelo papel quea lingua- fem desempenha tanto na hermenéutica filosbfies como te somite, jesse sentido, disse ele que “entre la criticn a la semantion anglosajona Hevada a cabo a través de Wittgenstein y Ia crftca a la descripeién historica propia de la fenomenologia, levada a cabo por medio de Ia tutocrlier Tin aiistien pero, como consecuencia de elo, por media de la consclencta her néutica, iste algo asf como una convergencia” 3 juridica gudameriana: a tarefa criativn e pro- 0 Alcando a linguagem a condigéo de possibilidade, Gadamer nos dew, com sua hermenéutica filosstica, “urna lggo nova c detieiinc, cpl gaa gstabelecer uma préxis de interpretagao opaca como prin, Gio, ¢ outra coisa bem diferente é inserir a interpretagto mun ere (Moot de carater existencial, ou com as caracterieticas dosonteccy da tradicdo na historia do ser — em que interpretar permite ser conn pieendiclo progressivamente como tuma auttocompreensso de quem interpreta. B, de outro lado, a hermenéutica filosdfica nos ening que sosimn Wo Pode ser compreendido em sua tolalidade, nao podencio, assim, haver uma pretensao de totalidade da interpretagio, © fide, Produtciu realmente uma virada hermengutica do texto para a cute, Se reercensio do intérprete que como tal autocompreensio somente i forma na interpretacio, nio sendo, portanto, possivel decoevan inlerpretar como produgdo de um stjeito soberako” 2 Em Gadamer, 0 primado da linguagem 6 0 sustentéculo de seu Projeto Hermenéutico, Esse lugar cimeito assumido pela linguagem £0 sinal para o desencadeamento do giro lingiifstice, Een no prin- 2 Cle. Gadamer, Verdad y Método Cle. Gadamer, Hermenéutica ciencin, Barcelona, 196 Che, Stein, Emildo, Lop. In: La razon en ta bpoce de ta 242. Hermenéutica juriiea elm) Crise 217 les que, de bragos com Heidegger, consideram errdnea esta volta tividade da intencéo.™ Sustentado no paradigma da linguagem e na medida em que rompe com a possibilidade de saberes reprodiuti -a muito claro ue 2 tarefa de interpretar a lei passa a ser uma atribuicao de sentido jebung). Neste contexto, Gadamer acentua que a interpretacio da lei é uma tarefa criativa. Os diversos principios que deve aplicar, por exemplo, 0 da analogia, ou o de suprir as lacunas da lei, ou em tltimo extremo o principio produtivo implicado na mesma sentenga, isto é, dependente do caso jurfdico concreto, no representam somente problemas metoroldgicos, mas, sim, entram a fundo na matéria juridica mes- ma, Evidentemente, uma hermenéutica juridica nio pode contentar- se seriamente em empregar como padrao de interpretacio o principio subjetivo da idéia e intencao originérias do legislador. Em muitos ca- s0s, ndo pode evitar ter que aplicar conceitos objetivos, wridica que se expressa em uma lei. Aparente1 prio de profanos imaginar a aplicacfo da lei a um caso conc: Processo logico de submissao do particular para o geval. O positivismo legal, que pretende reduzir a realidade juridica ao Direito positivo ea rxeta aplicacéo, sofre duras ponto concepgio acerca do Direito nao tem, atualmente, lério. Isto porque, continua Gadamer, a distincia en- ide da lei ¢ a situacio jurfdica conereta que projeta cada caso particular é essencialmente insuperével.* Aparentemen- 2% Cfe. Gadamer, Verdad y Método, I, ap. © Veja-se aqui como cai por lades de jun versal” e tampouco de um “particulat-eny ser do ente se este sopeto, ambém 6 al” no qual s¢ “subsume” o particular, a part ignificantes”, que pré-cominain o processo interpretativa dos jurist cfonam” como veictilo de “esstncias”. Nesse universo metafisico, 0 Dieito passa a 220 Lenio Luiz Streck nem sequer bastaria pensar, em uma dogmatica ideal, que a forga inerente ao caso particular est predeterminada camente, no sentido de que caberia imaginar uma dogmitica que contivesse ao menos potencialmente todas as verdades juridicas em um sistema coerente. A simples idéia “de uma tal dogmatica comple- ta parece absurda, e isto sem levar em conta que, de fato, a capacidade ctiadora de direito de cada caso est constantemente preparando a base a novas codificagoes”.™” Para Gadamer, a situacao hermenéutica ¢ similar para o historia dor e para o jurista: frente a um texto, todas nos encontramos em uma determinada expectativa de sentido imediata. Nato ha acesso imediato 420 objeto historico, capaz de proporcionar-nos objetivamente seu lugar de valoragio. $6 hd valor essencial que a lei vincule por igual a todos os membros da comunidade. A tarefa da interpretagio consiste em concretat a lei ‘em cada caso, isto é, na sua aplicagao.”® A compreensio como mola mestra do interpretar aparece na dis- cusso acerca da hermenéutica juridica gadameriana como fazendo parte do contetido universalizante do seu projeto hermenéutico, ao dizer que 0 modelo da herm a juridica tem-se mostrado efetioamen- te fecundo, Assim, aduz o mestre, quando 0 juiz se sabe legitimado para realizar a complementacao do. dentro da fuuncao judicial e frente ao sentido original de um texto legal, 0 que faz éo que de todos os ‘modos ten lugar em qualquer forma de compreensio. Esta compreensao se da no modo de ser do intérprete. F este intérprete é um ser-no-mun- do, um ser-com-os-outros. Por isto a hermenéutica serd filosofia, € nao método. Ser existéncia. Serd faticidade. Dai, a velha unidade das disciplinas hermenéuticas recupera seu direito na medida em que se reconhece a consciéncia exposta aos efeitos da histéria (Wirkungs- sgeschi ) em toda tarefa hermenéutica, tanto na do fil6logo como na do historiador. ser “compreendido” a partir de um conjunto de “eoncetos lexicogrsicos”, Desse Indy atiando-se dee “part de cones" ia " de uma opera i yezes indutivita)~ fee er poston! * sentido. como se 0 texo “categasie” issem a essenca das coisas designadas ‘oncepgio realist da inguagem). A segranga dessn “verde” slcangan “méiodo” emprega 2 Gadamer, Verade e Método top 2 idem, tbider, p. 398-405. Hermentutica Juridieae(en) Crise 221 A applicatio hermenéutica de que fala Gadam interpreta por partes ~ nao i uma universalidade /gener além dos dualismos met coisa, texto e norma, ete. A com applicatio, unindo as partes do todo, Nao ha uma questio de diclts< Bde (pada 2 uma questio de fato e vice-versa. A atribuigae dene ‘ido (Sinngebung) dar-se-a nessa fusdo, nessa sintese hermentonce Com o giro hermenéutico proposto por Gacamer, a hermeeu- do. Inserido nesse mundo, isto é, na linguisticidade dene mundo, 0 piibrele falaré a partir da tradicéo, de uma situagio hermond avec £ impossivel 0 intérprete situar-se fora da tradicio. O mundo dizi- Yel é0 mundo lingttisticizado. Daf a nocéo de compreensao enquan- [0 gandisdo de possibilidade da interpretagao, No comproontiieny) texto srerdedor. Cada interpretagio é uma nova interpretagao, Cala texto juridico gera novos sentidos. Por isto ¢ imposs/vel reproduzir sentidos; sempre atribufmos (novos) sentidos, E nao se diga que a hermenéutica venha a favorecer um conser- {adotismo, jé que a fuséo de horizonte dara passagem a algo sempre inprevisivel e novo. Em diltima anélise, a continuidade ne tradigao cbrigard a uma justificagio dialogada, controlada e confrontein, com Fhe ge adicao, o que exclui qualquer resultado e circunsereve a fea da compreensio legitima, Isto ser mais conete que se aban- donar, com os bracos cruzados, a uma metodologia que talvez nos fonduza a resultados eficazes, poréin, quem conttola (essa) metado- logia?™ A resposta a essa pergunta ¢ que a tradigio terkoroa por ue métodos ja com: las inranecendentes ou hits, Como corer bo area Seeeeeeeeeeeeeeaneaaee Lenio Lutz Streck ima repeticio produtiva relacionada “io. Entretanto, ele rechaga o recurso habitual lades entre intérprete e criador. O que o mo- tende é uma apresentagao do texto histérico de uma maneira inovadora: a maxima fidelidade a letra de um texto nio é garantia de sua (cor)reta compreensio.” Alguns autores, como Konrad Hesse, partindo de Gadamer, pro pdem novos horizontes para a hermenéutica . Para Hesse, 0 teor da norma somente se complementa no ato interpretativo. A con. , Ver Schier, Paulo Ricardo, A hermen splementagéo de uma nova dogma 1997, p. 38-57, Sociais nao esto mais separados do intérprete. Isto ocorre porque nao mais se pode falar de uma relacéo sujeito-objeto, passando-se a falar de uma relacao sujeito-sujeito. Uma hermenéutica juridica de cariz ontol6gico-existencial impli- ca uma postura de comprometimenio do intérprete. As verdades juri- dicas nao dependem, nesse novo paradigma, de métodos, entendidos ‘como momentos supremos da subjetividade do interprets. Antes de a metodologia tradicional ter a funcao de dar seguranca ao intérprete, € ela o seu verdadeiro calcanhar de Aquiles, porque nda hé como sus tentar meta-critérios que possam validar ou servir de fundamento ao inétodo empregado. Como jé explicitado, s6 € possivel interpretar se existe a compre- ensdo. E esta depende da pré-compreensao do intérprete. Por isto a compreensiio necessariamente serd um existencial. O intérprete no se per gunta porque compreende, porque ao compreender, ja compreendeu. Daf a importancia da tradicdo, higar de insercdo do homem, como ser-no-mundo e ser-com-os-outros. Impossivel negar a faticidade, Ao tentar negé-la, esta jé atuou no modo de compreender-interpretar 0 mundo. Portanto, a partir dessa (nova) hermenéutica, vigéncia e le {de um texto) no podem mais ser entendidos de forma entificativa, {sto ¢, no é mais possfvel pensar na equiparagto entre vigéncia e validade, como se a vigéncia fosse 0 ente, ¢ validade, o seu ser. Tampouco 0 texto sera equiparado 4 norma. Nao! A norma seré sempre 0 resultado da interpretacdo do texto, Mas, ¢ aqui reside o plus que a ontologia fun- damental pode trazer a esse debate, o texto nao subsiste separadamente da norma, donde é necessério nao confundir a equiparagao entre texto £ norma, com a necesséria diferenea (que € ontolégica) entre ambos. Vigéncia ¢ validade, texto e norma nao podem ser entendidos como se fossem duais (no sentido metafisico). O fato de existir uma dife- yenca entre eases ambitos (vigéncia e validade, texto e norma) nio istir a vigéncia como vigéncia ou o texto como . Explico: Heidegger sempre deixou bem claro - no que nao Tecebe qualquer contestacio de Gadamer ~ que querer compreender 0 ente como ente é proprio da metafisica. O ente s6 existe no seu ser. Eo ser € sempre o ser de um ente. O ente como ente ¢ inacessivel, sendo essa inacessibilidade incontornavel. Transportando essa questio para a hermenéutica juridica nos Pardmetros aqui propostes, fica facil perceber que, quando quero di- zer que a norma é sempre o resultado da interpretagdo de um texto, quero dizer que estou falando do sentido que esse texto vern a asstt. ‘enio Luiz Steck ‘Hetmenéutica Juridica om) Crise 225 sale CaprOcess0 compreensivo. A norma de que flo & 0 sentido doserdo Podem ser demarcadas da seguinte manei Pak Leet) O texto s6 ex-surge na sua “normnagao”. valon ie © mesino (método hermenéutico) Zaciocinio para a “dicotomia” vigéncia-validane Fundamentalmente é preciso compreender que, nesse paradigms Bara o presente; a hermenéutica critica (mnt suet EclacHo. Assim, acentua o autor, a prince assenta sua base de Sustentasdona existéncia de um “conseneode apoio” dado pela eatra- Ws da linguagem; os novos conhecimentos age adquiridos com base darter oneeitos que se submetem aos processes Me aprendizagem durante a “fusio de horizontes”. Bete elemento transcendental en. ditivo na fungio desempenhada pelos “intense ‘cidos pela comunicacao; 0 “interesse emancipador”, esta subjacente a critica do presente ¢ a antecipagao de ce livre. Jd @ hermenéutica critica, contines a autor, é Ma Pelo uso de diretrizes formais, isto é pela iaén regu- m verdadeiro consenso. Enquanto est, abordagem, por i em termos cognitivos, se alimentou Dato necessério cuidado que devemos ter em relagio Aquilo que reso a Pagar por pretender algo melhor do gee tent sido entendico como fazendo parte de “nowes Paradigmas inter- Presente, a hermenéutica flosbheg v entender que ndo sio a mesma coisa tekioe ones nao é Se na linguagem e na tradigdo, 28 expert Telacio sujeito-objeto. “sua ontologizacao, conclui. texto. Ao contréio disto, quando me deparo day 6 texio, ele jé ex-surge rormuado, a partir de minha condigao de ser-normunela Essa operacio Ccorte gracas a diferenca ontoldgica. E ela que faz a diferenca. Por isto, Repito, € impossivel negar a tradigho, a faticidadle historicidade, sm due a fusio de horizontes é a condigéo de Possibilidade dessa “normagao”. Importante referir que Habermas, embora as criticas que dirige a Gadamer, tem profundo respeito pela pon, Supetagio do paradigma epistemolég: a, ¢ ultrapassando a polémica Habermas Possivel dizer que as teses mais se apro 'm (E. Stein) - 6 relevante acentuar que t n Neate etna ttica podem ser pensadas a partie do reflexo. Nesse debate tao bem delineade Por Bleicher,” as pi dines cites & eora do discrsohabermasinna ¢sobto 9 ‘seu modelo proce- primate © ler 20 meu Verde e Consens, 2° ad, Rio de Jena eee, Bleicher, op. ft. 226 Lenio Luiz. Streck assim, que Habermas rejeita a Prelensdo de Gadamer de universalidade de compreensao hermenéu- Ef3; Sustentando que hé algo para além do “ce logo que nés somos”. Gadamer, a seu tuo, sustenta que este didlogo constitui o limite de nossa compreensio! Aliés, Gadamer indaga a Habermas sobre Aue este pode querer dizer quando fala de tesa Posic&o fora da lin- ica e(m) Crise 227

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