1) O costume consiste numa prática social reiterada com convicção de obrigatoriedade jurídica.
2) Alguns autores exigem que o costume seja reconhecido pelo Estado para ser considerado fonte de direito, o que pode ser perigoso em Estados totalitários.
3) Embora o Código Civil Português não reconheça explicitamente o costume como fonte de direito, ele dá algum relevo ao direito consuetudinário.
Original Description:
Texto sobre o papel do costume no Direito Português.
1) O costume consiste numa prática social reiterada com convicção de obrigatoriedade jurídica.
2) Alguns autores exigem que o costume seja reconhecido pelo Estado para ser considerado fonte de direito, o que pode ser perigoso em Estados totalitários.
3) Embora o Código Civil Português não reconheça explicitamente o costume como fonte de direito, ele dá algum relevo ao direito consuetudinário.
1) O costume consiste numa prática social reiterada com convicção de obrigatoriedade jurídica.
2) Alguns autores exigem que o costume seja reconhecido pelo Estado para ser considerado fonte de direito, o que pode ser perigoso em Estados totalitários.
3) Embora o Código Civil Português não reconheça explicitamente o costume como fonte de direito, ele dá algum relevo ao direito consuetudinário.
O costume consiste na observncia constante e uniforme de determinadas regras de
conduta pelos membros de uma determinada comunidade social, com convico de obrigatoriedade. () No basta () que se verifique uma prtica social constante; indispensvel que aquele reiterado modus agendi da generalidade dos membros da comunidade considerada se funde na convico de que juridicamente obrigatrio, de que deve ser observado esse comportamento, por existir ou estar a ser criada uno actu, nessa comunidade, uma regra jurdica correspondente ANTNIO VIEIRA CURA, O Costume como Fonte de Direito em Portugal, Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 1998, p. 241. So, portanto, elementos do costume: 1) Prtica social reiterada (elemento material; corpus) 2) Convico de obrigatoriedade jurdica (elemento espiritual; animus) Faltando o elemento espiritual, no se poder falar em costume, mas sim em uso. Para alm dos dois requisitos referidos, parte da Doutrina tem exigido outros requisitos para se poder considerar o costume verdadeira fonte de Direito. PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA afirmam que o costume constituir verdadeira fonte de direito quando o Estado reconhecer que as normas jurdicas podem nascer directamente da vontade popular, da comunidade social, independentemente de toda a consagrao directa e expressa pelos seus rgos legislativos exigem o reconhecimento por parte do legislador da idoneidade do costume para criar normas jurdicas. CABRAL DE MONCADA afirma que preciso que a regra que ele [costume] envolve tenha j, de facto, obrigatoriedade, possa achar-se garantida pela coaco jurdica exige a imposio do costume pelos rgos pblicos. GALVO TELLES exige que a prtica social reiterada seja dotada de racionalidade e entende ser necessrio que o costume seja admitido como uma fonte de direito positivo pelo Estado, sendo que o costume no fonte jurdica e apenas obriga se o Estado o admitir e nos termos em que o admitir. Estes pretensos requisitos partem da concepo estatista-legalista do Direito, que reserva exclusivamente lei posta e imposta coactivamente pelo poder politicamente legitimado para tal a criao de normas jurdicas, bem como a definio do valor e limites a atribuir a todas as outras fontes (costume, jurisprudncia, doutrina). A exigncia do reconhecimento por parte do legislador da idoneidade do costume para criar normas jurdicas torna-se especialmente perigosa quando se trate de um Estado totalitrio, uma vez que o exerccio do poder pelos representantes do povo livremente eleitos no estar garantido. A exigncia da imposio do costume pelos rgos pblicos remete para a exigncia da coercibilidade como caracterstica da ordem jurdica globalmente considerada e de ao incumprimento de uma norma jurdica estar inerente uma sano. Segundo OLIVEIRA ASCENSO, a coercibilidade no especifica o Direito no plano do ser, no o determina no seu contedo e, portanto, no faz parte da sua essncia. Para BAPTISTA MACHADO, existem normas jurdicas cuja violao no importa a aplicao de uma sano, e no o facto de no poderem ser impostas coactivamente que lhes vai retirar a juridicidade (suponha-se, v.g., que o Presidente da Repblica no cumpre o disposto no n. 3 do art. 198. da Constituio). Assim, a validade do costume no depende da sua imposio pelos rgos estaduais. No captulo I do Ttulo I do Livro I do Cdigo Civil, respeitante s Fontes do Direito, no se encontra mencionado o costume. Segundo o disposto no art. 1., n. 1, so fontes imediatas de direito somente as leis e as normas corporativas. O art. 3. estabelece que
os usos que no forem contrrios aos princpios da boa f so juridicamente atendveis
quando a lei o determine, ou seja, como fontes mediatas de direito. Por ltimo, o art. 4. determina que os tribunais podem recorrer equidade nas trs hipteses a mencionadas, apresentando a equidade como fonte mediata de direito, embora ela no seja uma verdadeira fonte de direito (modo de formao e revelao de normas jurdicas), mas critrio de deciso de um caso concreto a justia do caso concreto -, tendo em considerao as particularidades deste. Daqui resulta que o Cdigo Civil no reconhece o costume como fonte imediata de direito, nem o inclui nas fontes mediatas. Decorre do disposto no art. 7., n. 1, do Cdigo Civil a negao da importncia do costume contra legem (contrrio lei) com eficcia revogatria da lei: a lei s deixa de vigorar se for revogada por outra lei; tambm a negao do costume secundum (segundo a lei, com o mesmo contedo da lei) e praeter legem (para alm da lei, regulador de matria no disciplinada legalmente e, por isso, integrativo) est presente no Cdigo Civil, uma vez que os arts. 9. e 10. do Cdigo Civil, ao estabelecerem, respectivamente, as regras de interpretao das normas jurdicas e os critrios de integrao das lacunas da lei no incluem o costume. Ainda assim, o Cdigo Civil no deixa de dar relevo ao costume: o art. 348., n. 1, dispe que quele que invocar direito consuetudinrio () compete fazer a prova da sua existncia e contedo; o art. 737., n. 1, al. a) estabelece que gozam de privilgio geral sobre os mveis: a) o crdito por despesas do funeral do devedor, conforme a sua condio e costume da terra. Reconhece, ainda que indirectamente, o direito consuetudinrio estrangeiro no seu art. 16. - a referncia das normas de conflitos a qualquer lei estrangeira determina apenas, na falta de preceito em contrrio, a aplicao do direito interno [pode incluir o costume] dessa lei. Nos termos do estatudo pelo art. 8., n. 1, da Constituio da Repblica Portuguesa, o costume internacional parte integrante do Direito portugus: As normas e os princpios de Direito Internacional geral ou comum [normas de direito consuetudinrio e princpios gerais de direito comuns s naes civilizadas] fazem parte integrante do Direito Portugus, o que significa que so aplicveis directamente pelos tribunais (sem necessidade de qualquer transformao em lei ou em qualquer outro acto de direito interno). A Doutrina GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA - reconhece que o costume internacional assume uma posio relevante na hierarquia das fontes de direito portugus: tem valor superior ao dos actos legislativos (lei, decreto-lei, decreto legislativo regional), mas valor inferior ao das normas constitucionais, o que significa que os tribunais devem recusar a aplicao do direito ordinrio interno que contrarie o costume internacional. A noo de costume constitucional tem suscitado alguma divergncia entre a Doutrina. Aqueles que contrariam a sua existncia so aqueles que apenas admitem como rgo criador de normas constitucionais a assembleia constituinte, na qual se manifestaria a vontade do povo por meio dos seus representantes, e que, depois de elaborada a Constituio, esta s pode ser alterada de acordo com as regras de reviso nela previstas. H, no entanto, juristas que lhe so favorveis, sobretudo ao costume complementar da Constituio. GOMES CANOTILHO afirma que o costume contra constitutionem no deixa de ser inconstitucional e que o costume apenas poder ser secundum constitutionem, admitindo no entanto a relevncia do costume praeter constitutionem na medida em que lhe deve ser atribuda uma importante funo de integrao ou complementao do direito constitucional. MARCELO REBELO DE SOUSA admite como fonte de direito Constitucional material todos os tipos de costume: secundum, praeter e contra constitutionem. JORGE MIRANDA sustenta que o costume tem um relevo bem secundrio no domnio do direito constitucional,
admite o costume secundum e praeter constitutionem e afirma que o costume contra
constitutionem equivale preterio da constitucionalidade. Constitui um exemplo de um costume contra constitutionem aquela prtica social com convico de juridicidade de que o povo quem elege como Primeiro-Ministro o lder de determinado partido, quando na verdade, de acordo com o disposto no art. 187. da Constituio, o PrimeiroMinistro nomeado pelo Presidente da Repblica, ouvidos os partidos representados na Assembleia da Repblica e tendo em conta os resultados eleitorais. Para a teoria tradicional (actualmente dominante) das fontes de direito assente numa concepo estatista-legalista do direito, o problema das fontes de direito redunda na determinao do titular do poder legislativo, uma vez que a lei considerada fonte de todo o Direito, enquanto as outras fontes s o so na medida em que a lei o permitir e com o valor e limites que lhes atribuir. Assim, o costume no uma fonte imediata do direito e, como tal, no vincula autonomamente: como um pobre planeta que s recebe a luz do Sol: a Lei CABRAL DE MONCADA. Sigo a opinio de OLIVEIRA ASCENSO, BAPTISTA MACHADO, CASTANHEIRA NEVES, que entendem que o direito vigente no pode ser constitudo nica e exclusivamente pela Lei emanada de um qualquer poder poltico (o que importaria todos os riscos associados ao totalitarismo da lei); tem de ser aquele que cada comunidade social em cada momento histrico aceite como direito. O no reconhecimento do costume como fonte de direito pelo legislador no pode considerar-se determinante, uma vez que a lei carece de legitimidade para o privar de juridicidade, que alis brota da comunidade onde tem origem. No entanto, o papel fundamental de constituio do direito nas sociedades actuais, que se encontram em permanente transformao, pertence legislao por diversos factores, entre eles a certeza e segurana jurdicas. Por tudo o que acima foi exposto, considero que o costume fonte (imediata) do Direito no Direito Portugus. A lei a fons iuris predominante no nosso Direito, mas no hierarquicamente superior ao costume.