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Estudos em Administração
Marcos Eduardo dos Santos
RESUMO: Este trabalho tem por objetivo compreender mais precisamente o que vêm a ser os
métodos de pesquisa sociais denominados observação participante e pesquisa-ação,
utilizando-se de comparações e inter-relações entre seus diversos aspectos, tais como
conceitos, objetivos e características, visando fornecer uma base referencial a ser aplicada em
estudos de Administração. O estudo inicia-se com um debate filosófico entre pesquisa
quantitativa e qualitativa, visando contextualizar o escopo do estudo sobre os paradigmas
positivistas e interpretativos. Em seguida, são descritos os conceitos, objetivos, características
e etapas dos métodos propostos, além de uma visão crítica sobre os métodos de pesquisa de
aproximação em relação aos positivistas. Concluindo o artigo percebe-se que a singularidade
da pesquisa-ação está em utilizar-se de um processo cíclo interativo a fim de provocar
mudanças num dado sistema sócio-técnico. Já a observação participante, que consiste na
participação do pesquisador no cotidiano de um grupo ou organização, em contato direto com
os observados, como se um deles fosse, permite ao investigador científico captar dados,
símbolos, particularidades que não o seriam em uma observação quantitativa.
1 INTRODUÇÃO
3 OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE
3.1 Conceito
A principal característica que pode ser observada em uma pesquisa que se utiliza da
observação participante é que esta realiza uma análise seqüencial, ou seja, algumas das
análises são realizadas durante o próprio processo de coleta dados; fazendo com que a
próxima coleta tome um sentido a partir de análises condicionais .
A utilização da observação participante requer algumas habilidades adicionais face às
metodologias tradicionalmente empregadas na pesquisa. É necessário operar uma mudança
profunda na postura do pesquisador, que deve assumir a postura do antropólogo,
principalmente durante o trabalho de campo. Esta favorece o desenvolvimento de habilidades
de ordem comportamental.
A observação participante é indicada em situações nas quais a evidência qualitativa é
usada para captar dados psicológicos que são reprimidos ou não facilmente articulados como
atitudes, motivos, pressupostos, quadros de referência ou situações nas quais simples
observações qualitativas são usadas como indicadores do funcionamento complexo de
estruturas e organizações complexas que difíceis de submeter à observação direta (Haguette,
1987).
O método pode ser indicado para testar hipóteses ou estabelecê-las a partir da pesquisa
de campo, ou mesmo, modificá-las no decorrer do processo. Mas de qualquer forma, é
indispensável que o pesquisador tenha uma boa base teórica a respeito do que vai ser o objeto
de estudo. Quanto maior o conhecimento teórico a respeito do tema, mais eficaz será o
trabalho.
Esse tipo de pesquisa permite um aumento da compreensão dos processos
organizacionais, pois possibilita o pesquisador um acesso direto aos dados da pesquisa,
permitindo um maior nível de obtenção das informações pertinentes ao observador; o que faz
desse método de pesquisa ser considerado, por parte dos pesquisadores, o melhor método
dentre os da metodologia qualitativa.
A coleta de dados se dá através da participação do pesquisador na vida cotidiana do
grupo ou organização que estuda, observando as pessoas que está estudando para ver
situações com que se deparam normalmente e como se comportam diante delas; entabula
conversações com participantes e descobre as interpretações que eles têm dos acontecimentos,
isto segundo Becker (1987), ou seja, há a presença constante do observador nas atividades do
grupo ou organização pesquisada a fim de que ele possa “ver as coisas de dentro” (Haguette,
1987). Nesse caso o pesquisador adota dois papéis, participa das atividades da organização ao
mesmo tempo em que as observa (Godoy, 1995). O pesquisador pode ter uma postura passiva
– quando interage com os observadores o mínimo possível – ou ativa – que maximiza sua
participação, no sentido de obter uma qualidade maior de dados.
Entretanto, essa metodologia possui suas desvantagens, pois a partir do momento em
que as informações são filtradas pelo pesquisador, esse passa a assumir praticamente toda a
responsabilidade frente à interpretação, que se baseia na subjetividade e no pensamento
racional de cada entrevistador, podendo assim, distorcer as informações recebidas, além do
que, com o convívio pessoal entre pesquisador e seus pesquisados, poder influenciar
negativamente durante a realização da entrevista e da interpretação dos dados.
Portanto, o reconhecimento dos limites e dos riscos dessa metodologia deve ser
considerado quando o pesquisador vai “a campo”, e fazem parte de alguns entraves dos
processos que a antropologia deve considerar, para estar sempre se evoluindo no conjunto das
ciências humanas.
3.3 FASES
Para tornar uma observação parte de um contexto teórico sociológico, é preciso que
um observador defina conceitos e identifique problemas para serem pesquisados e estudados.
Ele da vida a um modelo teórico se baseando no caso particular em que se encontra sua
investigação, mas direciona seus prováveis modelos de forma que venha a atender descobertas
futuras.
Este estágio consiste na identificação de possíveis entraves e conceitos, que venham a
promover um maior esclarecimento e conhecimento das organizações que fazem parte do foco
de estudo, e onde o pesquisador procura por “objetos” que o subsidie de importantes
informações, o que seria muito difícil e complicado de ser identificado, caso não houvesse
essa investigação.
“Esteja ele definindo problemas ou selecionando conceitos e indicadores, o
pesquisador está, neste estagio, utilizando seus dados somente para especular
sobre possibilidades. Operações posteriores nos estágios seguintes pode forçá-lo a
abandonar a maioria de suas hipóteses provisórias. Todavia, problemas de
evidência se colocam mesmo nesse ponto, pois o pesquisador precisa avaliar os
itens individuais nos quais suas especulações estão baseadas, de modo a não
desperdiçar tempo seguindo pistas falsas.” ( Becker, 1997)
Os dados adquiridos pela observação participante são dados padronizados que permitem
que se façam observações e perguntas semelhantes a diversos entrevistados, e se não fosse a
existência do campo para a coleta de dados, tais dados poderiam ser considerados
estatisticamente ou como dados estatísticos legítimos, mas são reconhecidos pelos
pesquisadores como dados “quase estatísticos”. Portanto suas conclusões não requerem
quantificação precisa.
Portanto, o observador na hora de determinar sua conclusão, poderá seguir as
características dos estatísticos, os quais usam a probabilidade, baseada em valores de
variáveis de correlação e significância, onde sua conclusão se apresenta sob a forma de poder
ser mais ou menos exata, ao contrário de quando argumenta que sua conclusão é totalmente
verdadeira ou totalmente falsa.
Esta análise final que é feita após todo o trabalho de coleta de dados no campo,
compreende em realizar uma nova conferência e reestruturar os modelos até então
desenvolvidos, e com uma atenção redobrada, pois é uma fase de suma importância para o
observador. Nesse estágio, que muitos pesquisadores denominam de pós-trabalho de campo,
serve para proceder na construção do modelo final. E finalmente, o observador termina seu
trabalho de construção desse novo modelo, quando reestrutura e reorganiza as interconexões
dentre todos os modelos até então desenvolvidos, de modo a obter um resultado final dos
aglomerados de conclusões anteriores.
4 O CONHECIMENTO PELA PESQUISA E INTERVENÇÃO
4.1 O recorte teórico da pesquisa-ação – conceitos e objetivos
Winter (1989), citado por O’Brien (2001), apresenta em seu trabalho seis princípios
que guiam a pesquisa-ação, os quais são sintetizados em seis palavras-chave:
ϖ reflexão crítica – este princípio assegura que os participantes refletem sobre as questões e
processos e tornam explícita a interpretação, vieses, suposições e preocupações sobre os
julgamentos que eles fazem. Desta forma, avaliações práticas podem originar
considerações teóricas.
ϖ crítica dialética – faz-se necessária para entender o conjunto de relacionamento entre o
fenômeno pesquisado e seu contexto, e entre os elementos que o constituem. Os elementos
chaves a serem focados são aqueles que o participante considera instáveis ou contrários a
outros, esses são os que mais provavelmente provocarão mudanças.
ϖ recursos colaborativos – os participantes de um projeto de pesquisa-ação são co-
pesquisadores. Esse princípio pressupõe que as idéias de cada participante são recursos
potenciais para a análise interpretativa, negociada entre as partes. Isto evita a condição de
idéia-proprietária, tornando possível a manifestação de vários pontos de vistas.
ϖ risco – o processo de mudança potencialmente ameaça todos os caminhos previamente
estabelecidos, assim criando um temor psíquico nos participantes. Um dos maiores medos
vem da dúvida de como idéias e julgamentos em uma discussão aberta serão interpretados
por cada participante, ameaçando todo o processo.
ϖ estrutura plural – a natureza deste tipo de pesquisa encorpora uma multiplicidade de
visões, comentários e críticas, conduzindo a múltiplas interpretações e ações. Esta
estrutura plural de investigação requer um texto plural para ser relatado. Isto significa que
haverá muitos apontamentos explícitos, com comentários sobre cada contradição, e uma
série de sugestões a ser apresentada. Um relatório, portanto, agirá como um suporte à
contínua discussão entre os colaboradores, em oposição a uma conclusão final de fato.
ϖ teoria, prática e transformação – para os pesquisadores da pesquisa-ação a teoria instrui a
prática, a prática refina a teoria, em uma transformação contínua. Em alguns grupos, as
ações das pessoas são baseadas em uma estrutura implícita de suposições, teorias e
hipóteses, e a partir dos resultados observados, o conhecimento teórico é desenvolvido.
Isto é necessário para que o pesquisador possa tornar explícitas as justificações teóricas
pela ação, e para questionar as bases destas justificações. Os resultados práticos
decorrentes das justificações apoiam as análises, em um ciclo transformativo que
continuamente alterna ênfase entre teoria e prática.
Para Susman e Evered (1978), o ponto forte da pesquisa-ação é o seu caráter prático.
Para estes autores, suas principais características são:
ϖ orientação para o futuro, facilitando a criação de soluções voltadas para um futuro
desejável pelos interessados.
ϖ colaboração entre pesquisadores e clientes;
ϖ desenvolvimento de sistema, ou seja, o dispositivo de pesquisa-ação desenvolve a
capacidade do sistema de identificar e resolver problemas;
ϖ geração de teoria fundamentada na ação, que pode ser corroborada ou revisada por meio
da avaliação de sua adequação à ação;
ϖ não-predeterminação e adaptação situacional, as próprias relações estabelecidas na
situação de pesquisa variam e não são totalmente previsíveis.
Já para Thiollent (1994) os principais aspectos da pesquisa-ação, considerando-a uma
estratégia metodológica de pesquisa, são:
ϖ há uma ampla e explicita interação entre pesquisadores e pessoas implicadas na situação
investigada;
ϖ desta interação resulta ordem de prioridade dos problemas a serem pesquisados e das
soluções a serem encaminhadas sob forma de ação concreta;
ϖ o objetivo de investigação não é constituído pelas pessoas e sim pela situação social e
pelos problemas de diferentes naturezas encontrados nesta situação;
ϖ o objetivo da pesquisa-ação consiste em resolver ou, pelo menos, e esclarecer os
problemas da situação observada;
ϖ há, durante o processo, um acompanhamento das decisões, das ações e de toda a atividade
intencional dos atores da situação;
ϖ a pesquisa não se limita a uma forma de ação (risco de ativismo), pretende-se aumentar o
conhecimento dos pesquisadores e o conhecimento ou o “nível de consciência” das
pessoas e grupos considerados.
O que distingue este tipo de pesquisa das práticas profissionais de consultoria, ou
resolução cotidiana de problemas é a ênfase no estudo científico, que diz ao pesquisador para
estudar o problema sistematicamente e garantir que a intervenção seja baseada em
considerações teóricas.
Diagnóstico
Planejamento
Aprendizado da Ação
Avaliação Ação
Neste ponto tornam se necessários comentários sobre três aspectos que geralmente são
alvos de críticas de teóricos positivistas, a saber: contingência das descobertas da pesquisa;
baixo controle do ambiente e superenvolvimento pessoal.
Segundo Orlikowski e Baroudi (1991) citados por Kock Jr., McQueen, Scott (2003), a
contingência das descoberta de pesquisa é uma característica criticada devido ao fato de que
relações entre variáveis não são reveladas por métodos determinísticos, assim a pesquisa-ação
seria inapropriada para produzir modelos com alta validade externa, ou seja, resultados
válidos fora do contexto do projeto onde foi aplicada. Para Galliers (1992) citado por Kock
Jr., McQueen, Scott (2003), isto ocorre porque a maioria dos projetos de pesquisa-ação
envolve pequeno número de participantes estudados em profundidade e freqüentemente
estudos longitudinais, e muito raramente o nível de generalização é aceitável.
Baixo controle do ambiente é criticado por Orlikowski e Baroudi (1991) citado por
Kock Jr., McQueen, Scott (2003) como a principal razão da pesquisa-ação ser vista como
inapropriada para testar ou produzir boas teorias, ou reconstruir modelos de pesquisa baseados
em evidências concretas. A influência de uma variável particular pode levar muito tempo até
que seja isolada em estudos de pesquisa-ação; testar e refinar um modelo causal onde uma
variável dependente seja influenciada por um conjunto de variáveis independentes necessita
de um exame cuidadoso.
Orlikowski e Baroudi (1991) citado por Kock Jr., McQueen, Scott (2003), também
comenta que um superenvolvimento pessoal entre pesquisadores e seus “clientes” impede
uma boa pesquisa por introduzir viéses pessoais nas conclusões. Isto é particularmente
verdadeiro em situações que envolvem conflito de interesses.
Ketchum e Trist (1992) vêem a freqüência das interações no ciclo da pesquisa-ação
como melhoria da concepção do pesquisador sobre o sistema sócio-técnico, Figura 2,
expresso nas descobertas da pesquisa e no estágio de aprendizado em cada ciclo. Isto pode ser
obtido devido à expansão do escopo da pesquisa e reconstrução de resultados por meio da
identificação de padrões invariáveis, consequentemente incrementando o rigor metodológico
e a validade externa da pesquisa.
ac av
Escopo da
Pesquisa pj ap
ciclo n
di
ac av
pj
ciclo n-1 ap
di
ac av
pj
ciclo 2 ap
di
ac av
pj ciclo 1 ap
di Generalização
do modelo
À luz das pressuposições de Ketchum e Trist (1992), não temos como interesse
fornecer uma justificativa ao uso da pesquisa-ação para que seja tolerada pelos positivistas,
mas em melhor demonstrar que esse método possui vantagens que tornam infundadas
algumas de suas críticas.
A validade interna é uma medida da consistência dos resultados da pesquisa e não é
necessariamente relacionada com a validade externa, que uma medida do grau de
generalização dos resultados do estudo. Dizer que os resultados de uma pesquisa são
altamente contigenciais é o mesmo que dizer que eles têm uma baixa “validade externa”.
Porém, a principal razão de confiança na alta validade externa dos resultados de
pesquisa citados por Kock Jr., McQueen, Scott (2003) foi a observação fundamentada nas
interações. De acordo com a aproximação cíclica descrita pela pesquisa-ação, as sucessivas
mudanças através das interações auxiliaram a expandir o escopo da pesquisa, incrementando a
generalização dos resultados. Este efeito é análogo ao escolher uma amostra em uma
população em estudos estatísticos. A vantagem extra desta aproximação é que a experiência
adquirida em interações prévia pode ajudar o pesquisador a melhorar os efeitos da intervenção
em futuras interações, através da coleta de dados sobre as mesmas unidades de análise em
situações relativamente independentes.
Quanto ao baixo controle do ambiente, Kock Jr., McQueen, Scott (2003), comentam
que é inegável que um baixo controle sobre as variáveis de um sistema sócio-técnico que está
sendo estudado pode impedir testes causai entre estas variáveis. Testes entre variáveis, no
entanto, requerem que ambas variáveis sejam claramente definidas antes do pesquisador
iniciar seu projeto. Isto é comumente limita os resultados de pesquisa ao focar a pesquisa em
um conjunto de variáveis, abandonando outras que poderiam ser relevante para o
entendimento do evento considerado. Em alguns casos este caminho guia o estudo sobre
questões que são irrelevantes para uma perspectiva organizacional, enquanto em outros
poderá guiar para resultados que não apoiados pela situação real porque eles são influenciados
por outros efeitos que não foram considerados no estudo original. Isto pode ser uma das
razões para o relato de um grande número de efeitos controversos na literatura de pesquisa
empírica referente a organizações em rede, que predominantemente utilizaram pesquisa
experimental, por exemplo (DeSanctis et al., 1993, citados por Kock Jr., McQueen, Scott,
2003).
Como Mintzberg (1979) e outros apontam, o comportamento humano não é previsível
como o comportamento do rato, e portanto muitas das descobertas baseadas em análise
estatísticas de relacionamentos simples de causa-e-efeito que ingenuamente desprezam este
fato têm sido irrelevantes.
Dados estes problemas, podemos dizer que o baixo controle sobre o ambiente
estudado, característica da maioria dos projetos de pesquisa-ação, são mais uma vantagem do
que uma desvantagem na generalização de relevantes e válidos conhecimentos.
Quanto ao superenvolvimento pessoal do pesquisador causar um viés nos resultados
da pesquisa, Kock Jr., McQueen, Scott (2003) ressaltam que isto é inerente tanto nesse
método como em qualquer outro método de aproximação, porque é impossível para um
pesquisador, segundo eles, ter uma posição neutra e ainda exercer uma intervenção positiva
no sistema sócio-técnico estudado. Isto é particularmente verdadeiro quando o número de
situações experimentadas pelo pesquisador é pequeno e a intensidade deste envolvimento é
alta. Pesquisadores da cognição humana tem demonstrado não somente que o ser humano tem
confiado mais no aprendizado experimental para aquisição de conhecimento, mas também
que essas experiências que são acompanhadas por intensiva descarga emocional são
relembradas mais claramente que aquelas em que há pouco envolvimento emocional.
O principal benefício para os praticantes da pesquisa-ação, resultante das sucessivas
interações no ciclo da pesquisa-ação é que futuras interações podem ajudar a corrigir
distorções nos resultados das primeiras interações.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar de autores como Green e Merce (2001) citados por Cappelle (2002)
defenderem que as pesquisa-ação é sinônimo da observação participativa, há algumas
diferenças entre as duas como mostra essa mesma autora no Quadro 1.
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