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GLOBALIZAÇÃO ECONÔMICA1
Reinaldo Gonçalves
E, ainda assim, saibamos todos, os capiaus gostam muito de relações de efeito e causa, leviana e
dogmaticamente inferidas: Manuel Timborna, por exemplo, há três ou quatro anos vive discutindo com um
canoeiro do Rio das Velhas, que afirma que o jacaré-do-papo-amarelo tem o pescoço cor de enxofre por ser
mais bravo do que os jacarés outros, ao que contrapõe Timborna que ele só é mais feroz porque tem a base do
queixo pintada de limão maduro e açafrão. E é até um trabalho enorme, para a gente sensata, poder dar razão
aos dois, quando estão juntos.
João Guimarães Rosa (1946), “Duelo”, em Sagarana, Rio de Janeiro, Editora Record, p. 158.
1
Capítulo 1 do livro de Reinaldo Gonçalves, O Nó Econômico, Editora Record, Rio de Janeiro, 2002.
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economia global. O modo capitalista de produção entra em uma época propriamente global, e
não apenas internacional ou multinacional. Assim, o mercado, as forças produtivas, a nova
divisão internacional do trabalho, a reprodução ampliada do capital, desenvolvem-se em
escala mundial.”
A ausência de um tratamento mais preciso da palavra “globalização” tem implicado no
seu uso abusivo. Assim, a globalização tende a ser um verdadeiro “deus ex-machina”, que
apareceu no cenário internacional no final do século XX para explicar tudo ou quase tudo, da
expansão da televisão a cabo às crises cambiais recorrentes experimentadas pela economia
brasileira. A globalização, também, tem sido usada para justificar o fracasso de modelos
econômicos (neoliberais) na América Latina ou o desempenho medíocre da política externa
brasileira. O uso frouxo e, até mesmo leviano da palavra “globalização” tem provocado o uso
abusivo, quando não ridículo, da famosa expressão que “a globalização trás oportunidades e
riscos”. O uso dessa expressão esconde, quase que invariavelmente, a incapacidade de se
definir claramente a própria natureza do fenômeno.
No entanto, há um grupo de analistas que se coloca no outro extremo e tende a negar o
próprio conceito. Segundo esse grupo, as transformações econômicas do final do século XX
tenderam a reafirmar tendências seculares, isto é, os movimentos de internacionalização ou
mundialização já observados no final do século XIX. Por exemplo, Hirst e Thompson (1996,
p. 16) comparam alguns indicadores de integração econômica a nível mundial nas últimas
décadas do século XIX com indicadores no final do século XX. Eles chegam a conclusão que
as diferenças não são muito significativas. Esses autores argumentam que globalização seria a
predominância do modelo de uma economia global no qual cada economia nacional seria
permeada e transformada pelas relações internacionais. Contudo, eles afirmam que no sistema
atual “as principais entidades são as economias nacionais”. Nesse sentido, tendem a rejeitar o
uso da palavra “globalização” para descrever as transformações das últimas décadas.
Assim, a maior parte da análise situa-se entre aqueles que usam a palavra
“globalização” de forma muito abrangente ou, mesmo frouxa, e os que negam a necessidade
de uma nova palavra para descrever as transformações globais mais recentes (Held e
McGrew, 2001). A situação complica-se quando se tem em mente que essas transformações
transcendem a esfera econômica e têm repercussões tão complexas quanto heterogêneas
(Anderson, 1999). Entretanto, há fenômenos marcantes que ocorreram nas últimas décadas
que merecem ser destacados. E, portanto, a ocorrência simultânea desses fenômenos exige
uma palavra nova para diferenciar o momento atual de outros momentos da economia
mundial.
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financiamento e investimento externo indireto (ou de portfólio). Esse último abarca transações
com ativos financeiros (ações, quotas de empresas ou de fundos de investimento, títulos de
governo, títulos privados, etc), que dispensam o controle sobre o agente econômico receptor
do investimento.
Thatcher na Inglaterra em 1979 e de Ronald Reagan nos Estados Unidos em 1980. Esses
governos conservadores não somente implementaram políticas de liberalização e
desregulamentação dentro dos seus próprios países como também usaram instrumentos de
política externa para promover políticas liberais no resto do mundo.
Temos, assim, a ascensão do liberalismo ou a revitalização de estratégias e políticas
liberais em escala global. Não é por outra razão que a globalização econômica também pode
ser chamada de globalização neoliberal.
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