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Num Bairro Moderno

“CESÁRIO VERDE.
UM GÉNIO
IGNORADO”
NUM BAIRRO MODERNO (EST. I-III)

Como uma câmara vai focando


todos os pormenores do espaço
interior e mesmo as referências
ao espaço exterior, que sugerem o  Dez horas da manhã; os transparentes 
bem-estar, o conforto, que se
vivia, num bairro moderno e
Matizam uma casa apalaçada; 
burguês. Pelos jardins estancam-se as nascentes, 
E fere a vista, com brancuras quentes,  Sinestesia.
Cesário comunga também neste
bem-estar, é um homem que vive A larga macadamizada. 
neste conforto.   
É muito mais chique dizer em Rez-de-chaussé repousam sossegados,  Hipálage.
francês. Confere-lhe outro
estatuto.
Abriram-se, nalguns, as persianas,  Cujas persianas se abrem,
E dum ou doutro, em quartos estucados,  possibilitando-nos a
Ou entre a rama dos papéis pintados,  contemplação do seu interior.
Reluzem, num almoço as porcelanas. 
Hipálage.
Este confronto é explicitado por
  
um comentário pessoal. Como é saudável ter o seu conchego, 
E a sua vida fácil! Eu descia, 
Sem muita pressa, para o meu emprego, 
Aonde agora quase sempre chego  Tom deambulatório.
Com as tonturas duma apoplexia. 
Suspensão súbita, completa ou
incompleta do movimento e da
sensação.
NUM BAIRRO MODERNO (EST. IV-V)
O uso do diminutivo –
fragilidade implícita.
Contraste visual entre
 E rota, pequenina, azafamada,  o branco, o negro e o
Refere-se à vendedeira como
se o seu olhar se fixa-se numa
Notei de costas uma rapariga,  colorido das frutas.
imagem, destacando o que o Que no xadrez marmóreo duma escada, 
impressiona, visualmente. Como um retalho de horta aglomerada,  O som vem completar
Pousara, ajoelhando, a sua giga.  todo este quadro.

Impressiona-lhe a vendedeira   
frágil obrigada a um trabalho E eu, apesar do sol, examinei-a; 
pesado. As características
indiciam e reiteram uma
Pôs-se de pé; ressoam-lhe os tamancos;  O motivo do olhar
ideia de debilidade, E abre-se-lhe o algodão azul da meia,  domina a composição.
fragilidade que acentua o Se ela se curva, esguedelhada, feia  São elementos lexicais
peso da opressão de que é que confirmam a
E pendurando os seus bracinhos brancos.  importância que a
vítima.
Tom altivo.    percepção visual detém
Do patamar responde-lhe um criado:  no poema.
"Se te convém, despacha; não converses. 
Eu não dou mais." E muito descansado,  Crítica à desigualdade e
à injustiça social.
Atira um cobre ignóbil oxidado, 
Que vem bater nas faces duns alperces.
NUM BAIRRO MODERNO (EST. VI-VII)
O “eu” lírico.
 Subitamente - que visão de artista! - 
A sinestesia aparece como
Se eu transformasse os simples vegetais,  motor de sensações,
À luz do Sol, o intenso colorista;  transmitindo a visão
Num ser humano que se mova e exista  impressionista da
Cheio de belas proporções carnais?!  realidade.
  
 Bóiam aromas, fumos de cozinha;  (Olfacto)
Com o cabaz às costas, e vergando, 
Tipos sociais Sobem padeiros, claros de farinha;  (Visão)
característicos do E às portas, uma ou outra campainha 
espaço urbano (Audição)
descrito. Toca, frenética, de vez em quando. 
   Gente do povo que
E eu recompunha, por anatomia,  contrasta com a imagem
Pretérito imperfeito – um elegante, requintada do
percurso entre o acto de Um novo corpo orgânico, aos bocados. 
bairro burguês.
imaginar (de recompor a Achava os tons e as formas. Descobria 
realidade) e a existência do Uma cabeça numa melancia, 
real.
E nuns repolhos seios injectados. 
NUM BAIRRO MODERNO (EST. XIV-XV)
A forte consciência da
injustiça e de opressão, que  Eu acerquei-me dela, sem desprezo;
Auxilia a regateira,
parece ser exclusiva do E, pelas duas asas a quebrar,  comungando com ela um
poeta, pois a regateira
enfrenta-o com coragem e
Nós levantámos todo aquele peso  mesmo esforço e tornando-se
alegria. Que ao chão de pedra resistia preso,  como que solidário da sua
Com um enorme esforço muscular.  condição.

A expressividade dos (...) 


verbos, das expressões que    Fica contagiado com a
acompanham os seus E pitoresca e audaz, na sua chita,  força interior da
movimentos.
O peito erguido, os pulsos nas ilhargas,  vendedeira.
Duma desgraça alegre que me incita, 
Ela apregoa, magra, enfezadita, 
As suas couves repolhudas, largas. 
Apesar de feia, desprezada,
… é por ela que o poeta
nutre simpatia.
FORMA DO POEMA

 Co/mo é /sau/dá/vel/ ter/ o/ seu/ con/che/go, 


2º e 3º - rima E a sua vida fácil! Eu descia,  1º e 3º verso – rima
cruzada.
emparelhada. Sem muita pressa, para o meu emprego, 
Aonde agora quase sempre chego  2º e 4º verso – rima
interpolada.
Com as tonturas duma apoplexia. 

Estrofes: 16 quintilhas.
Sílaba métrica: Versos decassilábicos – 10 sílabas métricas.
SÍNTESE DAS CARACTERÍSTICAS LITERÁRIO-ESTILÍSTICAS DE CESÁRIO VERDE

Poetização
Poetização do
do
real
real

A
A dicotomia
dicotomia A
A mulher
mulher em
em
cidade/campo
cidade/campo Cesário
Cesário Verde
Verde

A
A poética
poética Linguagem
Linguagem ee
literária
literária Estilo
Estilo

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