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Insultos, queixas, seducdo e sexualidade: fragmentos de identidade masculina em uma perspectiva relacional Ondina Fechel Leal je Mello Boff {_Género e homens entes pesquisas nossas que tiveram como foco o masculino. O objetivo & E: trabalho pretende ordenar algumas idéias relacionando dados de dife- partilhar idéias e interrogagbes em torno do tema, a partir das investigacies, n sendo realizadas. que foram e vi Ao nos situarmos dentro do campo de estudos de género por uma “entrada”, digamos, um tanto incomum — uma vez que nos identificamos com uma trajetéria de pesquisa que tem tomado 0 “homem” como objeto de investigacao, sobretudo ao concebermos cexualidade como tema central —, ndo poderiamos deixar de tecer algumas consideragdes sobre a nossa insercio e “estranhamento” neste campo. A partir de alguns comentarios a esse respeito e através de material etnogrfico de diferentes pesquisas, tentaremos indicar de forma bastante sucinta pontos —dados — que nos parecem relevantes para o entendimento de identidade masculina, Primeiro, parece-nos fundamental perceber que “estudos de génera” ow a necessidade de “estudos de género” aparecem como uma reivindicaao amadure- Cida dentro de um campo até entao identificado como “estudos de mulheres". No entanto, mais do que, de fato, deslocar preocupacdesou mudarde objeto de estuto, que ocorreu foi uma mudanga de nome (rétulo) para uma drea de estudo, sem de fato ter dado tempo ainda (ou investimento,ou vontade) para que uma tradigio io desfavoravel, mas faz parte, sim, da constatagio deste fato como um chamar atengio para o como é dificil trabalhar com “homem’, de inserir-se necessaria- mente no campo “género” e perceber este campo reificado no "feminino”, quer iabelecida se modificasse. F’sta observacao nao tem o sentido de uma aprecia- 120 Senualidades Brasileeas como seu abjeto, quer como sujeito de investigagao, Ambas as instancias — objeto e sujeito de investigacio — sto quase exclusivamente femininas e teceram uma cumplicidade densa, a qual nfo se pode negar. Nao ha dtivida, do mesmo modo, que tal configuracao € politicamente relevante. Mas 0 que sabemos de fato a respeito de relagies de género? Muito ainda tem que ser pensado a respeito da dificuldade da incorporacao de investigadores-sujeitosmasculinosneste empreen- dimento, Nao seremos nds, atentas as questoes de genero, a negarmos as nuances de género no que se refere as miiltiplas questoes que a investigacio envolve, a comecar pelo tipo de preocupacio que orienta um trabalho. A participacio mas- culina tem muito a contribuir neste campo. Qualquer revisio de estudos de genero aponta também para outra caracteris- tica que vai conformando este campo: uma presenca significativa de estudos sobre homossexualidade, sobretudo homossexualidade masculina, feitos por investiga- dores também homossexuais masculinos, Sio estes estudos — e aqui a referéncia principal é a érea da antropologia — que tem o mérito de centrarem com bastante Enfase a problemética género em dois focus: a construcao social da identidade ¢ 0 aspecto relacional. Através da experiéncia mesmo da homossextalidade & que “sexo” de fato, desloca-se para” género”, enquanto categoria, desbiologizando-se. Eas questoes associadas & identidade de genera passam entao pela relagao entre 0 masculine €0 feminino, se éalguma coisa (ser homtem, ser mulher, ser homossexu- al) vis-a-vis 0 “outro(s}” — negociam-se, constroent-se, mantém-se identidades sexuiais constantemente via modos de interacto e cédigos arbitrérios, que, em riltima andlise (indicava-nos Peter Fry ha tempo), condensam-se em uma gramatica de ativo/passivo. Neste inventario da problematica “géner0” nao podemos deixar de perceber que, se “homem”, como foi dito, esteve ausente deste campo; em contraposicio, ele nao esteve ausente, de forma alguma, das ciéncias sociais em geral, nem como, sujeito, nem como abjeto, O foco dos estudos sobre “cultura popular” e “classe operiria” foram sempre essencialmente masculinos, como se — no nivel das categorias sociol6gicas — eles (os homens) tivessem consciéncia ¢ n6s (mulheres) tivéssemos “identidade”. Isto implica o seu inverso, o que talvez seja uma equaca0 ‘mais perversa ainda, ou Seja eles (os homens) nao tém identidade e n6s (mulheres) nao temos consciéncia. Ainda uma observacao se faz necessaria: tematicas como “reproducio” estruturaram-se, solidificaram-se e cristalizaram-se com a auséncia do masculino. Nao teriamos nés enquanta pesquisadores faked for granted 0 espaco social da reproducao como restrito ao doméstico — espaco social familia — e este essencialmente feminino, coma se a reprodugio se desse a revelia do homem? Ou, ainda, com muita dificuldade (quem sabe por nossa heranca marxista) ordenado vinculos da reproducio biolégica com a reproducao social? De outro lado, quando, — ainda que escassos — estudos sobre homens comecam a surgir enfatizando identidade de género, 0 foco é sextalidade, e nao reprodugdo. Seré este um. problema nosso (pesquisadores) ou algo que os nossos objetos nos impdem? Sexualidade ests para o homem assim como reproducio ests paraa mulher? Como pensar estes dois temas (sexualidade e reproducio) senao de uma perspectiva relacional? Como pensé-los em uma perspectiva relacional se toda a ciéncia social queconstea vento € irate se adharmo= Seale Nossoe to relacbes stangues d Sep, calino, Nest emer" nto de: doesn 1 Insultos Bsta tra tem cerca de (1984). Trat meédia, a re pecifico de do tipo det Quen fi Senta ac Aoque Quem fi Ja botei Aanal estabelecet significade dades —¢ sedéemu toliminar constri € identidad cenquanto verbais ct piiblico, « jas objeto sceram uma ssmo modo, vs de fato a respeito da teempreen- as nuances envolve, a Pacio mas caracteris. tudos sobre rinvestiga- referencia mbastante atidade eo lade & que izando-se io entre o smossexu- tentidades » que, em gramatica perceber ‘aposicio, 1em como e “classe nivel das nulheres) Lequacio nutheres) auséncia oespaco —eeste em? Ou, rdenado quando tizando ste um 1poem? ?Como pectiva 2 social Inultos, qusinas, sedugio esexualidade wt que construimos jd os consagron como categorias estanques ¢ auténomas? Estaria a énfase em sexualidade, no que se refere a0 masculino, histdrica e irremediavel mente comprometida com a “entrada” do homem neste campo, que se deu, primeiro, com os estuelos de homossextalidade masculina, onde a énfase — faz sentido — € sexualdade, e ndo reprodugio? Trata-ce apenas de quest6es. QuestOes que, se permanecerem adliadas, isto é, se adiarmos a reflexio a respeito da constituicao do proprio campo género & sexualidade, permaneceremos insistindo em uma perspectiva um tanto niiope Nosso esforco de pesquisa vai neste sentido: primeiro, abordar género enquan: to relagies e nao simplesmente masculinidades e feminilidades como esferas estanques, dissociadas e sem relagio uma coma outra na sta propria constituicao. Segundo, nao negligenciar empiricamente, enquanto universo dle andlise, o mas- culino, Neste sentido, conforma-se, no sul do Brasil, uma tradigao em “estudos de homens”, que passa a ter visibilidade, talvez mais do que por seu proprio mérito, pela auséncia radical de trabalhos nesta area. Estas pesquisas tém operado no sentido de observar uma demand, assim como tem lancado questoes, alimentan- dlowagrapando-se ao conjunto de investigacbese discussdes produzidas no nivel nacional {_Insultos masculinos _ ee Bsta tradigao de estudar 0 masculino localizada, e certamente ainda incipiente, tem cerca de 10 anos, Como marco de nossas preocupacoes, vale a pena referir Leal (1984). Trata-se de um trabalho, realizado em 1984 cont homens urbanos, classe média, a respeito de duelos verbais: trocas rimadas de ofensas, um género es- pecifico de folclore peculiar a adolescentes masculinos. $6 para dar um exemplo do tipo de material, um menino diz: Quem faz assim & teco-teco Senta aqui no meu boneeo Ao que outro deve responder: Quem faz assine é vio Ji ote no teu busulio Aanslise deste material ¢ das situagdes cotidianas onde estes “

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