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AVALIAÇÃO DO ESTADO E USO DAS TRILHAS DO ENTORNO DA ENSEADA

DE DOIS RIOS, ILHA GRANDE, RJ.

Profª MSc Ana Maria de A. Santiago (UERJ): anasanti@uerj.br


Profª Drª Márcia Marques (UERJ): marcia@marques.pro.br
Profª Drª Marilene de Sá Cadei: cadei@uerj.br

A TRILHA
APRESENTAÇÃO ORAL

Introdução

A avaliação do estado e uso das trilhas do entorno da praia de Dois Rios integra
um estudo que visa a proposição de políticas públicas para a gestão do Centro de
Estudos Ambientais e Desenvolvimento Sustentável (Ceads)1, durante a vigência do
Termo de Cessão.2
Entendemos, nesse sentido, que é necessário refletir sobre o turismo e seus
efeitos sobre o ecossistema local e sobre a gestão do espaço público sob a guarda da
Uerj. A partir da descrição das trilhas e do mapeamento das impressões dos usuários
sobre os trechos, pretende-se apresentar um diagnóstico da situação atual, identificar
problemas e potencialidades e propor intervenções para a gestão das trilhas.
A avaliação desses “caminhos” de acesso a enseada de Dois Rios se faz
necessária para embasar as ações da administração do Ceads no planejamento e manejo
das trilhas e na promoção de condições de recepção de turistas, especialmente, no
âmbito do Conselho Consultivo do Parque Estadual da Ilha Grande, cujos limites
englobam grande parte do território em questão.
Nesse primeiro momento, busca-se realizar uma revisão bibliográfica sobre
turismo, ecoturismo e trilhas; levantar os marcos legais que interferem na dinâmica do
turismo e do planejamento e manejo das trilha no eixo Abraão-Dois Rios, abordar
aspectos da apresentação dessas trilhas para o visitante e identificar problemas que se
apresentam no contexto de crescimento do turismo no CEADS, Praia de Dois Rios.

1
O Ceads é a unidade administrativa - departamento da Sub-reitoria de Pós-graduação e Pesquisa - da UERJ
que gere a área e benfeitorias recebidas pelo Termo de Cessão n° 21 de 18/10/2004, anteriormente
pertencentes ao Instituto Penas Candido Mendes.
2
A cessão, celebrada entre a UERJ é o governo do Estado do Rio de Janeiro, tem vigência de 50 anos.

1
O Turismo

O turismo – pode-se dizer – é um fenômeno sócio-econômico do século XX.3 Claro


que em outras épocas as pessoas viajavam, mas foi só recentemente que o viajar tornou-
se uma demanda cultural generalizada, constituindo-se um segmento importante da
produção de riqueza mundial.
Dados oficiais do governo brasileiro evidenciam claramente a percepção do
turismo enquanto “industria”. Informa que o “turismo já é o terceiro produto de exportação
na balança comercial brasileira, atrás somente da soja em grão e do minério de ferro”.
Registra que o turismo receptivo fechou 2005 com a entrada de US$ 3,861 bilhões, quase
20% a mais que em 2004 (US$ 3,333 bilhões), prevendo para 2006, US$ 6,3 bilhões em
divisas. Parece muito, não? Mas, o Plano Nacional do Turismo tem por meta para 2007
marca de US$ 8 bilhões.4
Seguindo o rastro do crescimento do terceiro setor na economia globalizada, o
turismo surge como atividade de massa, gerando oportunidades e atraindo interesses
econômicos cada vez mais complexos.
É nessa perspectiva que percebemos o turismo como fenômeno sócio-econômico
do século XX, podendo ser definido, segundo De La Torre (1992: 19) como

um fenômeno social que consiste no deslocamento


voluntário e temporário de indivíduos ou grupos de
pessoas que, fundamentalmente por motivos de
recreação, descanso, cultura ou saúde, saem do seu
local de residência habitual para outro, no qual não
exercem nenhuma atividade lucrativa ou remunerada,
gerando múltiplas inter-relações de importância social,
econômica e cultural.

3
O primeiro conceito de turismo, do economista austríaco Hermann von Schullern zu Schattenhofen, data de
1911. Sobre a evolução do conceito conferir BARRETO (2000: 9-15).
4
O informativo Em questão é editado de Subsecretaria de Comunicação Institucional da Secretaria Geral da
os
Presidência da República. Conferir os n 353 e 416, de 8 de setembro de 2005 e 29 de março de 2006,
respectivamente em http://www.brasil.gov.br/emquestao/, acessado em 29 de outubro de 2006.

2
Observamos, portanto, que turismo e lazer são conceitos que se entrelaçam. O
turismo é uma atividade que se coloca no contexto do lazer, entendido como o tempo que
dispomos para além do trabalho, do sono e de obrigações para usufruí-lo de forma livre.
Nesse contexto é que o turismo se insere como uma opção de lazer, que “compreende
uma gama de escolhas e estilos de recreação” (COSTA, 2006: 11).
O crescimento do turismo na Ilha Grande acompanha, portanto, esse processo
internacional, embora tenha suas peculiaridades. Um primeiro aspecto peculiar é que a
presença do turismo foi refreada, de certa forma, pela presença das instituições
carcerárias até o final do século XX. Embora desde da década de 1970 com a construção
da BR 101 e o projeto Turis da Embratur, tenha crescido a visitação na Costa Verde, foi a
desativação e demolição do Instituto Penal Candido Mendes o marco histórico da
explosão das atividades turísticas na Ilha Grande (ARAUJO e outros: 2005, 20-21 e
PRADO, 2003: 3).
É interessante ressaltar que o surgimento de atividades do terceiro setor em torno
do turismo coincide com a decadência econômica da pesca na região. Desta forma, está
presente uma certa ambigüidade do ilhéu em relação o turismo. Se por um lado, a
invasão dos visitantes nacionais e estrangeiros perturba o modo de viver local, por outro,
são as diversas atividades diretas e indiretas que o turismo promove, que geram os
empregos necessários a sobrevivência local (PRADO, 2003: 5).
Outra peculiaridade é que, no contexto da Ilha Grande, a modalidade de turismo
que se desenvolve, pelo menos discursivamente, é a do “turismo ecológico” ou
“ecoturismo”.
Com a finalidade de evitar a interpretação inadequada e oportunista do conceito de
ecoturismo, alguns autores têm optado por incluí-lo na categoria de “Turismo
Sustentável”. É nessa perspectivas que as "Diretrizes para uma Política Nacional de
Ecoturismo" (1994) definem o ecoturismo como

um segmento da atividade turística que utiliza, de


forma sustentável, o patrimônio natural e cultural,
incentiva a sua conservação e busca a formação de
uma consciência ambientalista através da
interpretação do ambiente, promovendo o bem-estar
das populações.

3
De acordo com Silveira, “o princípio da sustentabilidade é definido como algo que
vai além da dimensão ecológica, pois compreende também a melhoria das condições
econômicas e sociais das populações locais e a satisfação dos turistas” (1999: 90).
Desta forma atividades turísticas de ecoturismo devem ter como prioridades usar
de modo sustentável e eqüitativo os recursos naturais renováveis e não renováveis; zelar
pelos ecossistemas e pela biodiversidade; minimizar os impactos ambientais através da
redução do consumo, das perdas e do descarte de materiais; maximizar o uso de
materiais recicláveis ou reaproveitáveis; incentivar a formação parcerias entre instituições;
contribuir para a redistribuição mais eqüitativa das riquezas; atuar na capacitação
profissional para esse tipo de turismo; planejar as atividades turísticas sem perder de foco
as inter-relações entre o local e o global; incentivar e divulgar estudos relativos ao
turismo; minimizar os impactos culturais através do resgate, incentivo e divulgação da
cultura local e; envolver à comunidade local nas etapas de planejamento, execução,
avaliação e replanejamento (SERRANO e BRUHNS, 1997: p. 18-19).
A partir dessa reflexão, observamos que a teoria se confronta com a prática. De
fato, na Ilha Grande, como em outras localidades nas quais essa modalidade turismo
ecológico é praticada, nem sempre é garantido o caráter sustentável da atividade como se
preconiza, sendo a efetivação dessa sustentabilidade um dos desafios a serem
enfrentados na gestão do Ceads.

A Trilha

Nosso foco de interesse se limita as três trilhas lineares5 do em torno da praia de


Dois Rios, considerando serem essas as vias de ligação do Centro de Estudos
Ambientais e Desenvolvimento Sustentável (Ceads) com Abraão, Caxadaço e Parnaióca.
Dentre essas vias, nesse momento, daremos atenção especial à antiga estrada que ligava
o Instituto Penal Candido Mendes à Vila do Abraão. Atualmente, essa estrada é a
conhecida trilha 14, enquanto os acesso a Caxadaço e a Parnaióca são, respectivamente,
as trilhas 15 e 16. Observe o mapa.

5
A classificação da trilhas em lineares, de acordo com a forma, é baseada em ANDRADE (2005).

4
Mapa 1 - Ilha Grande: trilhas6

Fonte: http://Angra2000.com.br/ilhagrande/trilhas.trilhas.html, consultado em 28/10/2006.

Segundo Salvati (2003:1),

as trilhas são caminhos existentes ou estabelecidos,


(...) que possuam o objetivo de aproximar o visitante
ao ambiente natural, ou conduzi-lo a um atrativo
específico possibilitando seu entretenimento ou
educação, através de sinalizações ou de recursos
interpretativos.

No caso das trilhas da Ilha Grande e, em especial, as do em torno do Ceads a os


caminhos hoje utilizados foram historicamente constituídos e não planejados para
aplicação turística.
Como sabemos, até meados do século XVI, a Ilha Grande foi ocupada pelos
Tupinambás. Após o extermínio dos indígenas, a região passou a ser mais regularmente
ocupada pelos portugueses, apesar da presença constante de ingleses, franceses e
holandeses. As primeiras ocupações coloniais na Ilha se associavam à exploração do

6
Trilhas:1) Circuito do Abraaão; 2) Aqueduto/Saco do Céu; 3) Saco do Céu/Freguesia de Santana; 4)
Freguesia de Santana/Bananal; 5) Bananal/Sítio Forte; 6) Sítio Forte/Praia Grande de Araçatiba; 7) Praia
Grande de Araçatiba/Gruta do Acaiá; 8) Praia Grande de Araçatiba/Provetá; 9) Proveta/Aventureiro; 10)
Abraão/Mangues/Pouso; 11) Mangues/Pouso/Lopes Mendes; 12) Mangues/Pouso/Farol dos Castalhanos; 13)
Abraão/Pico do Papagaio; 17) Saco do Céu/Bananal; 18) Longa/Lagoa do Sul; 19) Proveta/Praia dos Meros;
20) Parnaioca/Praia do Leste; 21) Caxadaço/Santo Antônio.

5
pau-brasil; contudo, foi a instalação de fazendas de cana-de-açúcar, no século XVIII, que
consolidou o processo de colonização. Na segunda metade do século XIX, a grande
agricultura e o destacado comércio de escravos entraram em decadência. Só a pesca,
importante desde o século XVII, manteve-se como atividade econômica destacada.
No século XX, a Ilha Grande tornou-se referência, em virtude da instalação de
presídios. A primeira tentativa de estabelecimento de um sistema carcerário foi na praia
de Dois Rios, em 1894. Contudo, por problemas estruturais, o cárcere foi fechado em
1897, mas reaberto em 1903, funcionando, com diferentes perfis e nomes até 1994,
quando o Instituto Penal Candido Mendes foi desativado. O fim da instituição penitenciária
tornou o acesso à Ilha mais fácil e atrativo.7
Por esse breve histórico, pode-se perceber que a ocupação da Ilha Grande é
antiga, tendo se constituindo ao longo do tempo caminhos que interligavam enseadas e
povoados. Hoje, grande parte desses caminhos foi ressignificado, tornando-se trilhas a
serviço do crescente movimento turístico.
Retomando a definição de Salvati, podemos dizer, entretanto, que as trilhas 14, 15
e 16, embora aproximem o visitante do ambiente natural e, também, o conduzam a
atrativos que viabilizam seu entretenimento, pouco apresentam de caráter educacional, já
que, lamentavelmente, as sinalizações são efêmeras e não existem recursos
interpretativos disponíveis ao caminhante.
Por outro lado, sabemos que o visitante que chega a Ilha Grande traz na sua
bagagem informações sobre esses “caminhos”. Uma pesquisa através do site
denominado Google forneceu dados interessantes, por exemplo, sobre a trilha 14. As
páginas de agências de turismo, pessoais e de prestadores de serviços turísticos foram
descartadas e selecionadas 5 (cinco) de destacada recorrência e abrangência de
informações .8
Em todos os sítios a distância entre Abraão e Dois Rios é registrada como de
6.800 a 7.000 m, sendo o tempo estimado do percurso avaliado entre 2h30 e 3h. Aliás,
essa é, também, a informação que o turista recebe no painel oficial, no qual um imenso
mapa identifica as trilhas, suas distâncias e estimativas de tempo situado no Abraão.

7
Para o histórico ver CADEI, 2004: 16-39 e RAMUZ, 1998: 111-120.
8
Realizamos uma pesquisa avançada, buscando os endereços dos últimos 3 (três) meses, que
apresentassem a palavras-chaves Ilha Grande – Dois Rios – Trilhas. O resultado da pesquisa forneceu cerca
de 380 endereços. Os 5 (cinco) endereços selecionados foram: http://br.ilhagrande.com;
http://www.ilhagrande.org; http://www.ilhagrandeon.com.br; http://www.angra2000.com.br e http://www.angra-
dos-reis.com.

6
Em apenas 2 (duas) páginas, a trilha é classificada por nível, sendo considerada
pesada.9 Os textos ressaltam que a trilha é a antiga estrada do presídio, informando, por
exemplo, que “é necessário ir até o campo de futebol da Vila do Abraão e seguir a
Estrada para Dois Rios”.10
Chama a atenção que mesmo nos endereços em que a trilha é classificada como
pesada, há em seus textos considerações que podem promover uma avaliação ambígua
do percurso. A trilha é dita “fácil”, pois basta apenas seguir a estrada. Em outra passagem
destaca-se: “A mata praticamente forma uma cobertura, tornando a caminhada agradável
e protegida do sol. Pequenas nascentes cortam a estrada, respeitando os canais e
refrescando ainda mais a trilha”.11
As páginas selecionadas apresentam, portanto, informações que no mínimo geram
uma má avaliação do trajeto, pois a estrada é íngreme, sinuosa e acidentada, sendo de
dificílimo trânsito nos momentos comuns de chuva forte.
Medições pouco precisas realizadas pela Uerj indicam que o percurso supera a
distância informada. No relatório “Melhorias Operacionais da estrada vicinal Abraão – Vila
Dois Rios – Ilha Grande/RJ”, apresentado por José Alexandre Pimenta de Carvalho
(Departamento de Construção Civil e Transporte da Faculdade de Engenharia da Uerj), é
informada uma extensão aproximada de 11 km. Já os veículos registram em seus
marcadores de quilometragem um percurso de cerca de 13 km.
Por outro lado, apenas parte do trajeto possui cobertura vegetal. O acesso
presumido a água não é tão fácil e regular como apresentado e a duração do percurso
dependerá, em muito do preparo físico do visitante. Os únicos atrativos do percurso
mencionados são a vista panorâmica da enseada do Abraão que se tem da “Curva da
Morte”, os muros de contenção em pedra construídos na época do presídio e a chamada
“Piscina dos Soldados”, que não se encontram perfeitamente sinalizados.
Assim, embora não haja possibilidade de estadia nos domínios do Ceads –
inexiste hotel e camping –, diante dos atrativos naturais e históricos anunciados, o afluxo
de visitantes tem sido cada vez maior entre Abraão e Dois Rios, através da trilha 14. Em
2005, cerca de 19.000 turistas visitaram Dois Rios.

9
Existem diversos métodos de classificação segundo o grau de dificuldade. Uma trilha pesada genericamente
poderia ser entendida como um percurso longo (mais de 10 km), com obstáculos e/ou subidas complexas
COSTA, 2006, 18-22.
10
Em http://br.ilhagrande.com/sys/index.php?option=content&task=view&id=133&Itemid=152, consultado em
28/10/2006.
11
Em http://www.ilhagrande.org/sys/s.ig?a=140&p=14&npage=3, consultado em 28/10/2006.

7
O pernoite é permitido apenas com autorização da unidade administrativa da Uerj,
desta forma, predomina, nesse contexto, o excursionista, visitante que pretende apenas
passar o dia, retornando no final da tarde ao Abraão. Em proporção bem menor transitam
os turistas que se encaminham para Parnaióca, onde é possível acampar.
A administração do Ceads mantém, na entrada do CEADS, um posto de vigilância
que registra a entrada e saída dos visitantes, anotando no livro de ocorrência da
Segurança o quantitativo diário de visitantes. Embora haja falhas nas anotações, a série
de dados é longa e permite um acompanhamento da evolução da visitação ao longo de
uma década. Nesse momento, busca-se recuperar as anotações dos livros das empresas
contratadas de segurança patrimonial que não foram repassados para a administração do
Ceads. Desde de dezembro de 2004, entretanto, o controle de acesso passou a ser
registrado, diariamente, pela administração local, evitando a perda de dados. Cabe
ressaltar que o Parque Estadual da Ilha Grande não possui nenhum tipo de estatística de
visitação, o que torna mais significativos os dados coletados pela Uerj.
O Parque Estadual da Ilha Grande (PEIG) foi criado em 1971 e encontra-se sob o
controle da Fundação Instituto Estadual de Florestas do Rio de Janeiro (IEF-RJ). Apesar
dos mais de trinta anos, o PEIG ainda não funciona da forma desejada, não possuindo
sequer um pórtico que sinalize sua presença. De fato, é difícil saber onde começa e
termina o PEIG, diante dos problemas fundiários existentes e a falta de consolidação de
sua gestão.
O PEIG, apensar das recomendações do Sistema Nacional de Unidades de
Conservação, não apresenta ainda um Plano de Manejo. Em 1993, a Universidade
Federal Rural do Rio de Janeiro elaborou um Plano Diretor do Parque Estadual da Ilha
Grande, em parceria com o IEF e o Pró-Natura, iniciativa que ficou no papel, sem ter sido
implementada. Recentemente, na posse do Conselho Consultivo do PEIG, em 20 de
outubro de 2006, a presidência do IEF reiterou a promessa de apresentação do Plano de
Manejo.
Embora caiba, teoricamente, ao IEF o planejamento e manejo das trilhas que
cruzam o PEIG, contraditoriamente, na clausula Quinta, inciso I, do Termo de Cessão
n° 21, de 18/10/1994, a Uerj, na qualidade de concessionária, “responsabiliza-se pela
manutenção da infra-estrutura material (...) inclusive quanto à estrada que liga a Vila Dois
Rios à Vila Abraão”.
ARAUJO, CARVALHO e SILVA (2005) destacam, em seu estudo comparativo
entre Abraão e Dois Rios de percepção do turista, que o grande problema identificado

8
pelos moradores do Ceads é a ocorrência do lixo, que afeta tanto o vilarejo quanto às
trilhas. De fato, esse impacto é o mais visível.
Precisam ser avaliados adequadamente, entretanto, outros impactos e
deficiências, já que não existe infra-estrutura apropriada para atendimento dos
excursionistas que chegam ao povoado de Vila Dois Rios. Não existe, por exemplo,
nenhum Centro de Informações Turísticas. Os poucos serviços encontrados são
precários, improvisados e não regulares. Uma relação das fragilidades encontradas pode
dar melhor dimensão dos problemas a serem enfrentados.
a) A número de placas explicativas é ínfimo;
b) Os moradores não recebem formação específica para o trabalho com o
turismo;
c) O acesso a bebidas, sanduíches e refeições é garantido por dois bares e pelo
serviço de “comida caseira” oferecida por duas famílias. Todos esses pontos
de comércio são “informais”, necessitando de legalização tanto no âmbito da
Uerj quanto das posturas municipais;
d) Não existem pontos de venda para a comercialização de artesanato ou
produtos locais;
e) O posto médico local encontra-se desativado. As opções, em caso de
emergência, são a Defesa Civil e o Posto Médico de Vila do Abraão.
Regularmente, a Uerj assume a responsabilidade pelo translado de
excursionistas necessitando de socorro até o posto médico do Abraão;
f) Não há na localidade banheiros públicos, sendo comum que visitante utilize as
instalações sanitárias das residências, cujas fossas sépticas não foram
projetadas para o quantitativo de pessoas recebidas em certos períodos.
Estudos nesse sentido são necessários e, preliminarmente, a própria
observação, já indica que precise se instalar sanitários públicos com
planejamento adequado para o afluxo irregular de visitantes.

Muitos excursionistas chegam ao povoado achando que poderão alugar um barco


ou conseguirão um apoio motorizado para retornar, o que não é possível. A falta de guias
e de placas explicativas sobre os aspectos históricos, culturais e ambientais do local é
uma reclamação constante. A falta de manutenção, especialmente das ruínas do presídio,

9
chama a atenção dos visitantes.12 As reais dificuldades das trilhas e os cuidados que
deveriam ter ao utilizá-las, também só são percebidos pelo excursionista durante sua
visitação.

Conclusão

Muitos são os desafios a enfrentar para uma gestão sustentável do Ceads. Talvez
o maior deles seja o controle do acesso concentrado em curtos espaços de tempo, sem
privatizar o espaço público através da seleção pelo poder econômico. O turismo que
vivenciamos na Ilha Grande como um todo é sazonal. Dois Rios não está livre dessa
oscilação, sofrendo, também, com ela. De fato a “temporada turística” concentra-se de
dezembro a abril, com picos expressivos no Carnaval e na Semana Santa. O espetáculo
das quaresmeiras e aleluias em flor, contrastando com os diversos tons de verdes da
mata, demarcam, poeticamente, o fim do ciclo anual do turismo na bela Ilha Grande.
Com certeza, uma outra faceta da construção dessa sustentabilidade é aquela que
envolve a implantação de equipamentos e infra-estrutura básica que dêem suporte a
vocação turística. Por outro lado, a incorporação da comunidade local através de um
projeto de formação continuada voltada para o turismo é urgente.
O desdobramento desse trabalho necessita, entretanto, de outro dados que serão
obtidos através da aplicação de um questionário para visitantes e moradores; da coleta de
depoimento de autoridades ambientais; do levantamento de dados estatísticos; da
visitação e documentação fotográfica; da elaboração de um diagnóstico do estado de
conservação e intensidade de uso das trilhas do em torno do Ceads.

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de Janeiro,17: 18-26, setembro 2005.

12
A Uerj vem buscando recursos para realizar obras de recuperação parcial das ruínas a fim de instalar a
unidade musicológica Museu do Cárcere, integrante do projeto Ecomuseu, elaborado por Miriam Sepúlveda e
Mario Chagas. A instalação do museu é uma obrigação estabelecida pelo Termo de Cessão.

10
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11
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