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O art. 261 do Código Penal contém o seguinte tipo: “expor a perigo embarcação ou
aeronave, própria ou alheia, ou praticar qualquer ato tendente a impedir ou dificultar
navegação marítima, fluvial ou aérea”. A pena é reclusão de dois a cinco anos.
Sujeito ativo é qualquer pessoa que realizar uma das condutas típicas, inclusive o
proprietário da embarcação ou da aeronave colocada em perigo. Sujeito passivo é o Estado.
39.2 TIPICIDADE
No caput do art. 261, está descrito o tipo básico. No § 1º está definido, como
resultado qualificador do tipo fundamental, o sinistro decorrente da conduta. O § 2º
contém norma que manda aplicar as penas cumulativamente, quando o crime é praticado
com o fim de lucro. O § 3º descreve o crime culposo causador de sinistro. Incide, sobre o
sinistro doloso ou culposo, a regra do art. 258, por determinação da norma do art. 263 do
Código Penal.
Embarcação é o veículo construído para navegar sobre a água, sobre o mar ou sobre
os rios: navio, barco, lancha etc. Aeronave é o aparelho manobrável em vôo, apto a
sustentar-se, a circular no espaço aéreo mediante reações aerodinâmicas e capaz de
transportar pessoas ou coisas (art. 106 da Lei nº 7.565/86). É o avião, o helicóptero, o
balão etc.
Diz a Doutrina que, para que se realize o tipo, é necessário que a embarcação e a
aeronave sejam destinadas ao transporte coletivo de passageiros. É que, sem esse fim, não
haveria o perigo comum. Todavia, não há essa exigência no tipo e é de ver que, criado o
perigo para a embarcação ou para a aeronave, há também perigo para pessoas e bens
patrimoniais que estiverem, no espaço terrestre, em suas imediações ou nas de sua rota.
Assim, penso que a norma alcança também a embarcação ou aeronave destinada ao
transporte de cargas.
A conduta poderá ser realizada por ação ou omissão e através de qualquer meio,
direto ou indireto: danificar partes da embarcação ou da aeronave, modificar seu
funcionamento, desmontar mecanismos, adulterar o combustível, deixar de corrigir defeito
mecânico ou de abastecê-la, enfim, qualquer conduta que a coloque em perigo quando da
navegação.
O tipo emprega o verbo praticar, tendo como objeto um ato capaz de impedir ou
que possa dificultar a navegação. Não empregou os verbos impedir ou dificultar a
navegação. Se o ato praticado tem potencial para impedir ou dificultar a navegação,
realiza-se o tipo.
mestres defendendo que se trata de crime de perigo abstrato, outros defendendo que é de
perigo concreto.
Penso que a razão está com os primeiros. Na segunda parte da norma, não há
qualquer exigência de que o ato praticado pelo agente venha expor a perigo a navegação
marítima, fluvial ou aérea.
Na segunda parte do tipo, basta que o agente tenha consciência de que sua conduta
é apta a impedir ou dificultar a navegação e a vontade livre de praticar o ato, sem qualquer
outra finalidade. Não há punição a título de culpa, a não ser quando do fato resultar
sinistro, como se comenta adiante.
Se, nas duas modalidades típicas, agir o sujeito ativo com o fim de obtenção de
vantagem econômica, incidirá a norma do § 2º do art. 261, adiante analisada.
Pode haver naufrágio com submersão, mas à toda submersão não corresponde o naufrágio,
se a embarcação, tendo submergido, vem a ser recuperada. Encalhe é a retenção da
embarcação por obstáculo natural, impeditiva de sua normal flutuação.
O perigo criado para a aeronave pode causar sua queda ou destruição. Queda é sua
precipitação no solo ou na água, quando em vôo. Não se confunde com o pouso. Destruição
é sua inutilização completa, a danificação total. Pode haver queda sem destruição e
destruição sem queda, como ocorre quando a aeronave encontra-se no solo ou na água,
pousada.
O sinistro pode ter sido previsto e pretendido ou pelo menos consentido pelo agente
quando da realização da conduta. Nesse caso, será um crime integralmente doloso.
A pena cominada é a mesma, nas duas situações, mas o juiz deverá atentar, no
momento da aplicação da pena, para o elemento subjetivo, a fim de considerar mais
reprovável a conduta daquele que, desde o início, pretendia ou aceitava a ocorrência do
sinistro.
Quando o agente tiver realizado qualquer das condutas descritas no tipo com a
finalidade de obter qualquer vantagem de natureza econômica, para si ou para outra
pessoa, o juiz deverá aplicar, além da pena de reclusão, a pena de multa. Basta o
reconhecimento do elemento subjetivo, não sendo indispensável que o agente tenha,
efetivamente, obtido a vantagem econômica.
Deve haver nexo causal entre o perigo criado pela conduta e o sinistro. Aquela deve
ser a causa do sinistro. Além disso, este deve ter sido previsível para o agente que,
necessariamente, terá atuado com negligência, imprudência ou imperícia. O piloto ou
proprietário da aeronave que se esquece de abastecê-la de combustível, antes do vôo, age
com negligência e, se dessa conduta resultar a queda do avião, comete o crime de sinistro
culposo.
Por isso, se do sinistro causado pela conduta dolosa do agente decorrer lesão
corporal de natureza grave, a pena será aumentada de metade. Se resultar morte, será
aplicada em dobro.