CYAN MAGENTA AMARELO PRETO
Vida
Saúde&Ciência
A30
JORNAL DO BRASIL
ECOLOGIA I Produção do etanol exige cuidado para não comprometer alimentação ou natureza
Fontes de produção de etanol
trituração
Cana de açúcar
trituração
Milho
trituração
Celulose
(bagaço e palha da cana
casca do milho, gramíneas,
resíduos agrícolas e madeira)
Alternativa verde traz armadilhas
Juliana Anselmo da Rocha
Apresentado como alternativa
energética limpa, o etanol – ou ál-
cool, para os brasileiros – traz ar-
madilhas que podem comprome-
ter sua vocação verde. Teme-se
que a ampliação das áreas de culti-
vo de cana-de-açúcar, principal
fonte para produção no país, amea-
ce regiões ricas em biodiversidade
como a Amazônia e o Pantanal e
traga falta de alimentos.
– A vantagem de renovabilidade
desaparece em caso de desrespeito
ao meio ambiente no ciclo produtivo
– observa Gilberto Brasil, do Núcleo
de Energia e Mudanças Climáticas
do ministério do Meio Ambiente. –
Se as áreas de cultivo forem expan-
didas às custas do desmatamento,
aumentaremos as emissões de gás
carbônico em vez de reduzi-las.
Autor de Globalização da na-
tureza e natureza da globalização,
o professor da UERJ Carlos Wal-
ter Porto-Gonçalves argumenta
que a suspeita do aumento da
produção de etanol ameaçar o
cultivo de alimentos surgiu de-
pois da subida de 40% no preço da
tortilha, base da dieta mexicana,
em dezembro. O país direciona
sua colheita de milho para a pro-
dução de etanol e a população in-
satisfeita com a falta do grão para
o preparo das tortilhas tomou as
ruas, obrigando o presidente Fe-
lipe Calderón a intervir na econo-
mia e tabelar os preços.
– Não é uma abstração. É um te-
mor baseado em exemplos práticos
– garante. – Em São Paulo, o au-
mento da demanda do etanol tem
forçado à plantação da cana em áreas
de pastagens. Para onde irá o gado?
Alexandre Strapasson, coor-
denador-geral de açúcar e álcool
do ministério da Agricultura e Pe-
cuária, garante que a expansão
não ameaça o meio ambiente ou a
segurança alimentar brasileira.
– A cana realmente ocupou
áreas de pastagens, especialmente
em São Paulo, onde está concentra-
da 60% da produção de etanol na-
cional – concorda. – Mas eram
áreas sub-aproveitadas. O número
de cabeças de gado não diminuiu ou
DOMINGO
22 DE ABRIL DE 2007
saude@jb.com.br
mosto
rico em sacarose
(um tipo de açúcar)
fitomassa
rico em amido adição de ácidos ou enzimas,
(um tipo de carboidrato) compostos responsáveis por
transformar o amido em açúcar
fitomassa
rico em celulose adição de ácidos ou enzimas,
(um tipo de compostos responsáveis por
carboidrato complexo)
migrou para outras regiões. Ao
contrário, conseguimos criar os
animais com maior eficiência em
regime de piquetes e aumentar a
produção de carne e leite.
Jair Ramalho, diretor da UFRRJ
em Campos do Goytacazes, reforça
a posição de Strapasson e diz que
“hectares desocupados e subutiliza-
dos servem tanto ao plantio de olea-
ginosas, para gerar biodiesel, como
ao de cana, para gerar álcool, sem
risco à produção de alimentos”.
Dados do ministério da Agricul-
tura e Pecuária mostram que exis-
tem 90 milhões de hectares usados
em atividades agrícolas no Brasil.
Desses, 6,5 milhões são ocupados
por plantações de cana. As pasta-
gens cobrem 220 milhões de hecta-
res do território nacional.
Frederico Durães, chefe-geral
da Embrapa Agroenergia, explica
que cada região deve funcionar
como um pólo de desenvolvi-
mento: as que tiverem potencial
energético podem comprar ali-
mentos das que não o tem.
De acordo com o ministé-
rio de Minas e Energia, no ano
passado o Brasil produziu 17
bilhões de litros de etanol – 14
bilhões consumidos no mer-
cado interno e os 3 bilhões
restantes exportados.
– Para dobrar a produ-
ção não precisamos de
muito mais cana – expli-
ca Durães. – Temos tec-
nologia para extrair etanol
não só do gomo, mas do baga-
ço e da palha, aumentando a pro-
dutividade de etanol por hectare.
Porto-Gonçalves alerta que o
lobby para o uso amplo do etanol
vem de produtores de combustíveis
fósseis, que buscam alternativas pa-
ra um futuro com menos petróleo.
– Basta olhar o Oriente Médio.
Toda região que se torna estratégica
para a energia não vive em paz.
Durães argumenta que “qual-
quer empreendimento envolve ris-
cos e possível crescimento”.
– O mapeamento do potencial
produtor das regiões e o conhe-
cimento da produção de etanol
minimiza as chances do erro –
tranqüiliza.
TAB SAÚDE, CIÊNCIA & VIDA 30
Carruagem dos
trácios é escavada
O arqueólogo Veselin Ignatov
analisa uma carruagem dos trá-
cios, depois incorporados aos ro-
manos, encontrada próxima à ci-
dade búlgara de Nova Zagora, a
260 km de Sofia. A carruagem es-
tava junto aos esqueletos de três
cavalos e data do fim do século 3.
hidrólise fermentação
adição de leveduras, Etanol
microorganismos responsáveis CH CH OH
por quebrar a sacarose em 3 2
açúcares ainda mais simples
como a frutose e glicose
hidrólise
transformar a celulose
em açúcar
REUTERS
ISuspeito de
contribuir
para mortes
De acordo com Mark Jacob-
son, da Universidade Stanford,
aos 4.700 mortos ao ano nos EUA
por problemas respiratórios se-
riam somados mais 200 pessoas
se a frota do país rodar só com eta-
nol em 2020.
– Os poluentes vêm da parte
do etanol que não é consumida pe-
lo motor e lentamente se trans-
forma em acetaldeído, formaldeí-
do e outros hidrocarbonetos – ex-
plica Jacobson. – A luz favorece
sua conversão e também aumenta
a concentração de ozônio.
Brasil alerta que “o ozônio é be-
néfico nas camadas altas da atmos-
fera por reter a radiação solar, mas
nas baixas é prejudicial à saúde”.
– Rio e São Paulo sofreriam tanto
ou mais que Nova York pela lumino-
sidade – diz Jacobson.
Luciene Lara, professora de físi-
ca da atmosfera na USP, discorda e
diz que os níveis de hidrocarbonetos
liberados na atmosfera pelo consu-
mo do etanol são baixíssimos.
Para Antonio Ponce de Leon, co-
ordenador do programa Ares-Rio do
Instituto de Medicina Social da
UERJ, o problema está nas áreas
produtoras de cana-de-açúcar.
– Quando não há mecanização,
queima-se a plantação para facilitar
o corte, aumentando a poluição do ar
no campo – completa. – Não só os
trabalhadores, mas a população, es-
pecialmente crianças e idosos, so-
frem com irritação dos pulmões.
Fernando Calmon, colunista do
caderno Carro&Moto do JB pon-
dera que Jacobson parte de pre-
missas equivocadas e, por isso,
tem conclusões inconsistentes.
– Esqueceu que a tecnologia
evolui e usou dados antigos. Se fos-
se de uma universidade menor não
atrairia atenção – critica. – Além dis-
so, ninguém almeja substituir com-
pletamente a frota. O petróleo não
morrerá de um dia para o outro.
Queima para colheita e para novas áreas libera gás do efeito estufa