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CYAN MAGENTA AMARELO PRETO STANDARD SAÚDE, CIÊNCIA & VIDA -75

Saúde
Ciência&Vida Citadela inca de
A25 DOMINGO
Choquequirao é
18 DE JUNHO DE 2006 reaberta ao
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PSIQUIATRIA I Estudo britânico questiona a prescrição de medicamentos para o tratamento da depressão

Tristeza é uma resposta ao mundo DIVULGAÇÃO

Juliana Anselmo da Rocha

Os antidepressivos criam
ou curam um desequilíbrio
químico no cérebro? De acor-
do com estudo de uma pes-
quisadora da University Col-
lege London, na Inglaterra,
tratar a depressão com re-
médios impediria o indivíduo
de encontrar soluções dura-
douras para os problemas.
– Os humores, tanto a tris-
teza quanto a depressão, são
respostas das pessoas ao
mundo – disse Joanna Mon-
crieff, autora do estudo sobre
a ação dos antidepressivos,
publicado no PLoS Medicine.
Para ela, não existe evi-
dência que comprove a ação
dessas drogas na elevação do
humor a longo prazo.

A preocupação em
estar sempre bem
causa ansiedade e
estresse e se torna
Alegria e melancolia são itens de consumo, diz Tom Zé
fonte de doenças

– Ajudar quem experimen- Ramos acredita que existe porânea de estar sempre bem
ta dificuldades com suas res- uma zona de penumbra entre não traz felicidade. È mais
postas é descobrir quais as- o comportamento sadio e o uma das várias fontes de es-
pectos de sua vida são causa patológico. Para ele, tudo o tresse, ansiedade e tristeza.
de estresse – explicou Joanna. que acontece na mente cor- A opinião dos especia-
– Isso pode envolver psico- responde a uma alteração listas encontra eco no pen-
terapia, mas passa por alter- neurofisiológica. Mas não há samento de Tom Zé.
nativas como encontrar ati- relação de causa e efeito, seja – Quem gruda à nossa cara
vidades prazerosas, novos no pensamento cotidiano ou a máscara obrigatória da fe-
amigos e resolver conflitos no na dor intensa e prolongada. licidade é o ideal de consumo.
relacionamento e trabalho. Ele destaca que fatos con- Imagem também é consumo –
Fernando Ramos, vice-di- siderados habituais há duas diz o artista. – É um ideal
retor do Instituto Philippe Pi- décadas hoje são tidos como eficiente, que não deixa de
nel, no Rio de Janeiro, vê no sofrimentos pesados que le- lado o infeliz. Ele tem chance
uso de medicamentos uma vam à depressão. Ramos diz de ser assimilado: variação da
estratégia válida de tratamen- que a saúde passou a ser um mesma coisa-nenhuma.
to para depressão. Mas ele produto para consumo e ga- Embora não haja consen-
alerta para o cuidado no diag- nhou gradações. A preocu- so sobre o uso de antide-
nóstico. A prescrição de an- pação em estar feliz acaba pressivos, a sociedade atual
tidepressivos deve considerar sendo uma fonte de doenças. nega espaço para a dor.
a eficiência, os efeitos co- A mesma reflexão faz An- – Não existe lugar no
laterais e a opinião do paciente dré Martins, filósofo e psi- mundo moderno para a tris-
sobre o uso dos remédios. canalista da Universidade Fe- teza. Por isso o sentimento
– A farmacoterapia é ne- deral do Rio de Janeiro. é patologizado. As pessoas
cessária, mas não se basta. A – A “condenação” a ser- estão menos tolerantes a
associação com a psicoterapia mos felizes é uma quimera, debilidades em seu funcio-
traz resultados melhores. pois a necessidade contem- namento – diz Joanna.

I Uma forma melhor de encarar a dor


Se o que causa sofrimen- da médica passa por sofri- depressão – ponderou André
to profundo varia não só de mento psíquico intenso. Martins, da UFRJ. – Os afe-
um indivíduo para o outro, – Percebi que estava sen- tos são a verdadeira causa da
mas também na história e na tindo mais que a tristeza co- doença. Os remédios, mesmo
cultura, é preciso discutir mum, de qualquer pessoa. quando eficazes, tratam ape-
quais as melhores maneiras Era uma angústia tão pro- nas dos efeitos, que são os
de cuidar da dor. funda que atrapalhava meu sintomas. (J.A.R.)
– A classe médica, pacien- sono, meu trabalho e meus
tes e a sociedade devem se relacionamentos afetivos –
manifestar para tornar mais diz Mônica Surrage, livreira
claro o que é um compor- de 27 anos.
tamento inadequado quanto as Ela conta que iniciou o
formas de o abordar e o tratar tratamento em agosto do ano
– considera Fernando Ramos, passado. Mas só notou me-
do Instituto Philippe Pinel. lhora do humor há dois me-
Marta Zappa, também do ses, quando mudou de mé-
Instituto Philippe Pinel, com- dico e de remédios.
plementa que é preciso en- Os antidepressivos, surgi-
contrar tempo para elaborar dos a partir da década de 60,
as tristezas, com ou sem a têm espectro de ação amplo e
ajuda de um especialista. Sob variado em cada paciente.
pena de “sofrer mal” e pro- Além dos efeitos esperados,
longar o mal-estar. como a sedação, podem trazer
– Somos uma complexidade reações adversas. Entre elas,
de corpo, mente, sujeito e ci- perda de libido e irritabili-
dadão. Sem o cérebro não há dade. A única forma de des-
psiquismo, mas este não se cobrir sua utilidade no tra-
reduz ao órgão – explica Marta. tamento de uma pessoa é pela
– Nossa forma de ser, pensar e tentativa e erro.
agir é, ao mesmo tempo, pro- – O principal é que, com ou
duto e produtora da organi- sem antidepressivos, seja
zação social. E ela pode ser feito algum tipo de psico-
mais ou menos tolerante. terapia para entender melhor
Quem decide procurar aju- quais afetos estão levando à

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