Professional Documents
Culture Documents
Matéria: Economia
Prof.: Adaltom
Curso: Direito - 1º Ano - Noturno
Aluno: Ivan Luís Bertevello
RA: 0710528
Sala: 403
Prefácio
Críticos da Veja-(Veja-3/4/96)
Talvez como nenhum outro, 1997 pode ser descrito como o ano da globalização. Dois
fatos deixaram às claras, nos últimos 12 meses, a mudança de patamar em curso na
atual fase de internacionalização: a “megavideomorte” da princesa Diana e o crash
das Bolsas.
No acidente de Diana, a mídia também foi protagonista. Começou como vilã, mas
acabou, afinal, faturando com a surpreendente reação popular britânica e
internacional.
Um jornalista do ''Independent'' disse numa palestra aos jornalistas da Folha que
jamais a Inglaterra assistira a uma reação daquelas. Foi um fato novo na história
do recato saxão.
Mas não só no Reino a turba foi às ruas expressar sentimentos. Do Alasca à
Patagônia, de Tóquio a Berlim, Diana catalisou as atenções, levando jornais,
revistas e TVs a uma massacrante maratona, freqüentemente hipócrita e
melodramática, mas que deixou, afinal, alguma reflexão.
Jornalistas velha-guarda pensam que tudo foi uma enorme bobagem e que a imprensa de
prestígio acabou sendo atraída pelo estilo paparazzi dos tablóides. Não acham Diana
importante.
Não perceberam que ocorreu um fenômeno sociológico com dimensões globais. Diante da
novidade, preferiram a velha ladainha: tudo é ''manipulação'' ou ''invasão de
privacidade''. A mídia séria deveria estar preocupada com coisas mais
''importantes'' _como se a morte de uma pessoa que mobiliza multidões em todo o
planeta não fosse importante. Como se não fosse importante perguntar por que isso
aconteceu.
Se no caso Diana a globalização revelou-se na propagação planetária do
sentimentalismo, pelos meios de comunicação, no caso do crash ela evidenciou-se na
propagação do pânico e da especulação, pelos meios eletrônicos que movimentam on-
line o megacapital financeiro mundial.
Pela primeira vez, o chamado cidadão comum pôde perceber como sua vida não depende
mais do universo local. O mundo é ele mesmo, cada vez mais, o seu local. Um
terremoto em Hong Kong provoca abalos em Nova York e São Paulo. Uma falência em
Tóquio já não é mais um problema japonês.
Ainda que autoridades nacionais tenham reagido e conseguido, em alguns casos,
afugentar a catástrofe de seus quintais, o crash deixou claro que a instância do
Estado-nação vai perdendo autonomia. Torna-se cada vez mais refém de um sistema que
cruza fronteiras sem passaporte, podendo aniquilar um país num teclar de
computador.
Nessa economia cada vez mais globalizada, qual é o caminho para as empresas de um
país emergente como o Brasil? Associar-se com empresas estrangeiras ou tentar
seguir sozinhas?
Depende do setor da economia. Se você atua em nichos de mercado muito fortes, não
há motivos para associar-se com um parceiro estrangeiro. Se você tem marcas que
correspondam a sabores regionais, também não precisa se associar. Em setores que
envolvem tecnologia, deve-se considerar parcerias com firmas estrangeiras. Mas não
seria o caso da empresa nacional ser adquirida pela empresa de fora. Poderia ser
feita uma aliança na área de pesquisa e desenvolvimento ou de produção, marketing
ou de distribuição, por exemplo.
O capital não está escasso no mundo de hoje. Se você tem uma boa idéia, tecnologia,
produto, clientes e quiser produzir, você consegue capital. Para mim, o fator
limitador para o crescimento das empresas é, em primeiro lugar, o gerenciamento.
Depois, a criatividade e a tecnologia. E, por fim, o know-how para a
internacionalização. Se você tiver essas três vantagens, então você vai ao mercado
de ações e consegue todo o capital de que precisa.
A noção de sistema mundial contempla a presença e a vigência das empresas,
corporações e conglomerados transnacionais. Nesse contexto, os meios de comunicação
revelam-se particularmente eficazes para desenhar e tecer o imaginário de todo o
mundo. A mídia impressa e eletrônica, cada vez mais acoplada em redes multimídias
universais, constituem a realidade e a ilusão da aldeia global
Na base da idéia de que a sociedade mundial pode ser vista como um sistema coloca-
se a tese de que o mundo se constitui de um sistema de atores, ou um cenário no
qual movimentam-se e predominam atores. São de todos os tipos: estados nacionais,
empresas transnacionais, organizações bilaterais e multilaterais, narco tráfico,
terrorismo, Grupo dos 7, ONU, FMI, BIRD, FAO, OIT, AIEA e muitos outros. Mas no
sistema mundial assim concebido, os Estados nacionais continuam a desempenhar os
papéis de atores privilegiados, ainda que freqüentemente desafiados pelas
corporações, empresas ou conglomerados. Polarizam muitas das relações,
reivindicações, negociações, associações, tensões e integrações que articulam o
sistema mundial. Daí a tese da interdependência das nações. Muito do que ocorre e
pode ocorrer no âmbito da globalização sintetiza-se em noções produzidas no jogo
das relações entre países: diplomacia, aliança, pacto, paz, bloco, bilateralismo,
multilateralismo, integração regional, cláusula de nação mais favorecida, bloqueio,
espionagem, dumping, desestabilização de governos, beligerância, guerra, invasão,
ocupação, terrorismo de Estado. Todas essas e outras noções dizem respeito à
interdependência das nações. Aliás, interdependência é uma idéia muito comum em
análises e fantasias produzidas acerca de configurações e movimentos da sociedade
global. Essa interdependência focaliza as relações exteriores, diplomáticas,
internacionais.
A tese da interdependência das nações que tanto expõe o autor é bem uma elaboração
sistêmica de como se desenvolve a problemática mundial. Diz respeito a um cenário
em que a maior parte dos problemas aparece nas razões, estratégias, táticas e
atividades de atores principais e secundários, todos jogando com as possibilidades
da escolha racional. Os estudos realizados na ótica da teoria sistêmica estão
dedicados a esclarecer problemas tais como os seguintes: interdependência e
dependência, alianças e blocos, bilateralismo e multilateralismo, integração
nacional e regional.
No âmbito do sistema mundial, coloca-se também o problema da hegemonia, isto é, do
Estado-nação mais forte e influente, monopolizando técnicas de poder e oferecendo
ou impondo diretrizes aos outros. Em dada época, o mundo pode estar polarizado em
torno dos Estados Unidos e da União Soviética, ao passo que em outra polariza-se em
torno dos Estados Unidos, Japão e Alemanha, ou Europa Ocidental.
Há um evidente ocidentalismo, juntamente com o capitalismo, quando as
interpretações esclarecem o modo pelo qual as partes, as unidades, os segmentos ou
os atores menos desenvolvidos, isto é, arcaicos, periféricos ou marginais são
contemplados na organização e dinâmica da sociedade mundial. Também a teoria
sistêmica do mundo compreende as noções de ocidentalismo e capitalismo. São os
padrões, os ideais e as instituições do capitalismo e ocidentalismo, ou vice-versa,
que comandam a organização e dinâmica da mundialização. E mundialização é também e
sempre modernização, mas modernização nos moldes dos capitalismo ocidental. É
possível dizer que a teoria da modernização mundial adquire mais consistência
quando se complementa, ou sofistica, com a teoria sistêmica do mundo.
A interpretação sistêmica das relações internacionais já está bastante desenvolvida
em estudos e controvérsias sobre a problemática da mundialização. A teoria
sistêmica parece oferecer quadros de referência consistentes, de modo a taquigrafar
aspectos importantes da organização e dinâmica da sociedade mundial.
Sob vários aspectos, as interpretações sistêmicas do mundo constituem-se em
ingredientes não só ativos, mas fundamentais, do modo pelo qual está ocorrendo a
globalização. Constituem um vasto e complexo tecido de interpretações, orientando
as atividades e os ideários de muitos atores e elites presentes e atuantes nos mais
diversos lugares. Ajudam a organizar o mapa do mundo em conformidade com a
perspectiva e os interesses daqueles que predominam no jogo das forças presentes e
atuantes nas configurações e nos movimentos da sociedade global.
Desde que a civilização ocidental passou a predominar nos quatro cantos do mundo, a
idéia de modernização passou a ser o emblema do desenvolvimento, crescimento,
evolução ou progresso. As noções de metrópole e colônia, império e imperialismo,
interdependência e dependência, entre outras, expressam também o vaivém do processo
histórico-social de ocidentalização ou modernização do mundo. A própria atuação da
Organização das Nações Unidas (ONU), por suas diversas organizações filiadas, no
que se refere à economia, política, cultura, educação e outras esferas da vida
social, tem sido uma atuação destinada a apoiar, incentivar, orientar ou induzir à
modernização, nos moldes do ocidentalismo. A modernização do mundo implica a
difusão e sedimentação dos padrões e valores socioculturais predominantes na Europa
Ocidental e nos Estados Unidos. A tese da modernização do mundo sempre leva consigo
a tese de sua ocidentalização, compreendendo principalmente na Europa Ocidental e
nos Estados Unidos.
Ponto vital da competição, pátria dos bem-sucedidos, os Estados Unidos abrigam boa
parte dos inventores da globalização. Lá, o espírito internacionalista é tão
arraigado que a decisão do campeonato nacional de beisebol, tradicionalmente o
esporte da massa operária, foi batizada há mais de um século como a World Series. A
Coca-Cola, o automóvel, o basquete, o par de jeans, Madonna e o hambúrguer parecem
confirmar plenamente essa impressão.
O jornalista William Greider ( publicação: exame data: 12/03/1997 edição: 631 pág.:
25) acaba de conquistar atenção e alguma fama com sua volumosa pesquisa sobre os
males da diáspora fabril, One World, Ready or Not (Simon & Schuster, 528 páginas).
Para o hiperativo Greider, antigo repórter do Village Voice que rodou o mundo em
busca de provas para o vaticínio de que sociedades e mercados não podem conviver em
paz, o freio à globalização está no simples fato de que mercadorias e tecnologias
necessárias à sua produção conseguem viajar livremente, enquanto as pessoas estão
presas ao microcosmo onde nasceram. Seu corolário, imaginativo, sugere que os
Estados Unidos ganhariam muito mais exportando a sua democracia do que capitais:
pessoas livres dariam confiabilidade e perenidade a uma integração econômica que
estaria resvalando para uma recessão pavorosa.
A leitura fornecerá casos interessantes, num périplo montado sob medida para
retratar a exploração humana. Mas o essencial está na alma do pesquisador: para
desmontar uma idéia querida e acalentada pelos americanos, um jornalista americano
usa o melhor pensamento americano e constata, desolado, que o mundo não tem energia
para funcionar como desejariam esses mesmos americanos. Quase tudo certo, com
exceção de um detalhe: o pensamento americano desta segunda metade do século XX
padece de esquizofrenia, resultado do encolhimento acelerado da fatia que os
Estados Unidos chegaram a deter no conjunto da riqueza mundial. Essa dieta não
aparece ao primeiro olhar, mas é dramática — dos quase 50% do PIB planetário na
segunda metade da década de 40, a participação caiu para menos de 23% pelo último
relatório do Banco Mundial. Com responsabilidade militar sensivelmente parecida, a
primeira potência está cada vez mais curta de bolso. A globalização é vital para os
Estados Unidos por uma questão de sobrevivência— e nunca de afirmação da supremacia
consolidada duas gerações atrás. Aqui parece que há um confronto de opiniões
comparando com o livro: para Octavio Ianni isso já vinha desde a época que o
jornalista diz que não, ou seja, até mesmo um pouco antes do fim da Segunda Guerra
Mundial, particularmente concordo com Octavio. Ele expõe seus depoimentos de como o
inglês é evidentemente de soberania mundial. O inglês começou a mundializar-se como
idioma do imperialismo britânico; em seguida, desde o término da Primeira Guerra
Mundial (1914-1918) e, mais ainda, desde o término da Segunda Guerra Mundial (1939-
1945), difundiu-se também como idioma oficial do imperialismo norte-americano. Na
época da globalização do mundo, quando se intensificam e generalizam as relações,
os processos e as estruturas do capitalismo, o inglês com o qual se fala, escreve e
pensa adquire novos significados, transforma-se na bíblia para os religiosos, o
idioma da “aldeia global”. Grande parte da produção científica, filosófica e
artística está formulada nessa língua, por suas versões originais ou por suas
traduções. A universalização do inglês, portanto, não significa automaticamente a
homogeneização dos modos de falar, escrever e pensar, ou ser, agir, sentir,
imaginar e fabular. É inegável que as mais diversas modalidades de organizar a vida
e o trabalho continuarão a produzir e a desenvolver as diferenças e diversidades.
A dependência econômica dos Estados Unidos tornou-se progressivamente óbvia com a
ascensão dos Tigres Asiáticos, diz o jornalista William Greider . Depois de quatro
séculos seguidos de unidade absoluta entre o núcleo gerador de capitais excedentes
e o epicentro político-militar, o capitalismo entrou numa fase algo estranha, em
que a força bruta continuou monopolizada na América, enquanto o espaço asiático
passou a irradiar eficiência econômica. Esse fato, incompreensível e inaceitável
para um americano criado depois da II Grande Guerra, não significa decadência da
primeira potência. É provável que o mundo esteja tateando formas de governo
federativo, com uma distribuição de poder ao menos bicéfala, numa espécie de
simbiose entre a espada e o talão de cheques. Quem deu a primeira explicação lógica
para esse movimento foi, por sinal, um italiano, Giovanni Arrighi, que trabalha
numa universidade pública de Nova York e escreveu, em 1994, The Long Twentieth
Century (Verso, Londres, 380 páginas). Essa repartição do poder, mesmo que
circunstanciada e ancorada nas paragens distantes do Nascente, materializaria o
desejo obsessivo dos pequenos povos europeus durante todo este milênio.
A chave para uma descentralização surpreendente e inesperada está na ampla
supremacia militar americana. Os tigres emergentes formam nada mais que um
arquipélago. Coréia, Japão, Shangai, Hong-Kong, Cingapura, pequenas ilhas de
prosperidade sem a menor possibilidade de cristalizar um espaço contínuo que, algum
dia, poderia se contrapor ao monopólio da força. Os Estados Unidos garantem o bem-
estar de sua população num ambiente tranqüilo, onde seu déficit público crônico
será coberto com parte do excedente controlado do arquipélago. A Organização
Mundial do Comércio tem um papel de intermediário privilegiado nesse arranjo de
conveniência, onde a grande questão aberta é estimar corretamente o papel de alguns
outros grandes contínuos, sobretudo a Rússia e a América do Sul.
Para o cidadão americano que raramente se lembra do resto do mundo, a normalidade
chama-se globalização, no que está absolutamente certo. Vaticinar o fracasso desse
grande movimento é tão estúpido quanto foi a resistência às viagens dos
descobridores no início da Era Moderna. Mas vale a pena perceber que, numa
trajetória lenta e inexorável, os Estados Unidos refluem. Sua gritaria para
acelerar desregulamentação e abertura de mercados é defensiva e um espaço contínuo
e populoso como é o Brasil terá máxima vantagem se esgrimir com o tempo a seu
favor. Difícil é administrar essa oportunidade sem recuar no esforço de impor
competição e eficiência aos produtores locais. Pois autarquias isoladas e
altaneiras só costumam produzir gritaria e muita gente infeliz.
Na época da globalização do capitalismo, entra em cena a ideologia neoliberal, como
seu ingrediente, produto e condição. O neoliberalismo retoma e desenvolve os
princípios que se haviam formulado e posto em prática com o liberalismo ou a
doutrina da mão invisível, a partir do século XVIII. Na época da globalização,
mundializam-se as instituições mais típicas e sedimentadas das sociedades
capitalistas dominantes.
Na medida em que se desenvolvem e generalizam, os processos envolvidos na
modernização ultrapassam ou dissolvem fronteiras de todo o tipo, locais, nacionais,
regionais, continentais; ultrapassam ou dissolvem as barreiras culturais,
lingüísticas, religiosas ou civilizatórias. Esse é o reino da razão instrumental,
técnica ou subjetiva, permeando progressivamente todas as esferas da vida social,
em âmbito local, nacional, regional e mundial.
Há 49 anos, no mês de dezembro, era aprovada a Declaração Universal de Direitos
Humanos, mediante o consenso de 48 Estados, com oito abstenções. A declaração de
1948 nasce como a referência ética de uma nova ordem contemporânea. Afirma a
universalidade dos direitos humanos, que decorrem da própria condição da pessoa.
Afirma também a indivisibilidade desses direitos, conjugando direitos civis e
políticos com os econômicos, sociais e culturais.
A partir da declaração universal, deflagram-se os processos de internacionalização
e globalização dos direitos humanos, na medida em que a forma pela qual um Estado
trata seus nacionais interessa ao mundo. Por sua vez, os indivíduos convertem-se em
sujeitos de direitos consagrados em tratados internacionais de proteção.
Passados 49 anos, da era da globalização dos direitos transita-se para a da
globalização econômica. A ordem internacional passa a se orientar fundamentalmente
pelo paradigma econômico, que estimula a competitividade internacional e a formação
de um mercado sem fronteiras, sob a inspiração do neoliberalismo econômico. Se, por
um lado, esse processo é capaz de reforçar a idéia de ''internacionalização'' e da
conseqüente ''relativização'' da noção tradicional de soberania estatal (que sempre
foi um obstáculo à globalização dos direitos humanos), por outro, contudo, tem
produzido dramáticos efeitos no que se refere à universalidade e indivisibilidade
dos direitos humanos.
A criação do mercado global tem gerado um imenso exército de excluídos, destituídos
de direitos básicos. O paradigma econômico tem implicado a violação sistemática à
universalidade e indivisibilidade de direitos.
Juntamente com a modernização em marcha com o capitalismo e o ocidentalismo,
generaliza-se o predomínio das mais diversas tecnologias de produção e controle
sociais. Ainda que a modernização tenda a impor-se às mais diversas formas de
organização social da vida e trabalho, isto não se dá de modo abrupto, inexorável,
monolítico. Enquanto processo civilizatórios abrangente, tem convivido com os mais
diferentes padrões, valores e instituições. São múltiplas e diferenciadas as formas
sociais e culturais, ou civilizatórias, com as quais se defrontam os padrões,
valores e instituições modernos ou modernizantes.
Ainda que os processos de globalização e modernização desenvolvam-se e
reciprocamente pelo mundo afora, também produzem desenvolvimentos desiguais,
desencontrados, contraditórios. O que cria a ilusão da integração, ou
homogeneização, é o fato indiscutível da força do ocidentalismo, conjugado com o
capitalismo. Fala-se de pós-modernidade tanto em Paris como na cidade do México, em
Nova York como na cidade do Cabo, em Moscou como em Nova Delhi, em Tóquio como em
Pequim, em Hong Kong como em Porto Príncipe. Quando se confundem modernização e
modernidade, logo fica fácil falar em pós-modernidade, esquecendo que ainda não é
possível falar-se em pós-modernização. A modernidade pode ser algo que subsiste e
desenvolve-se de permeio às mais diversas modalidades de modernização. Mas a
modernização está predominante determinada pela racionalidade do capitalismo,
enquanto racionalidade pragmática, técnica, automática.
A noção de aldeia global é bem uma expressão da globalidade das idéias, padrões e
valores socioculturais, imaginários. Pode ser vista como uma teoria da cultura
mundial, entendida como cultura de massa, mercado de bens culturais, universo de
signos e símbolos, linguagens e significados que povoam o modo pelo qual uns e
outros situam-se no mundo, ou pensam, imaginam, sentem e agem.
Os meios de comunicação de massa rompem ou ultrapassam fronteiras, culturas,
idiomas, religiões, regimes políticos, diversidades e desigualdades sócio-
econômicas e hierarquias raciais, de sexo e idade. No âmbito da aldeia global,
prevalece a mídia eletrônica como um poderoso instrumento de comunicação,
informação, compreensão, explicação e imaginação sobre o que vai pelo mundo. A
mídia global não é monolítica, com certeza, e verdade também que a indústria também
adquiriu alcance global.
No âmbito da sociedade mundial em formação, quando se revelam cada vez mais
numerosos e generalizados os sinais da globalização, também multiplicam-se os
pastiches, os simulacros e as virtualidades. A aldeia global pode ser uma metáfora
e uma realidade, uma configuração histórica e uma utopia. Em um nível mais do que
evidente, o principal tecido da aldeia global tem sido o mercado, a mercantilização
universal, no sentido de que tudo tende a ser mercantilizado, produzido e consumido
como mercadoria. Ela seria ininteligível, como realidade ou imaginação, sem a
colaboração ativa de toda uma multidão de intelectuais trabalhando em todo o mundo,
nas mais diversas organizações e corporações públicas e privadas, nacionais,
regionais, transnacionais e propriamente globais. Estes intelectuais representam
uma argamassa importante, muitas vezes não só indispensável, mas decisiva para a
operação das organizações e corporações, em escala local, nacional, regional e
mundial. É como se todo o mundo, em sua organização e dinâmica, em suas
articulações, tensões e fragmentações, fosse continuamente, minuto a minuto,
descrito e interpretado, fotogrado e divulgado, taquigrafado e codificado ou
representado e imaginado por uma coletividade de intelectuais especializados em
traduzir fatos, acontecimentos, crises, impasses, realizações, façanhas, revoluções
e guerras.
Aquele que trabalha com os meios de representação, principalmente quando pode
manipular as mais diversas linguagens e as mais diferentes técnicas, pode levar as
representações a extremos de paroxismos. Como cita Tzvetan Todorov “A linguagem
sempre foi a companheira do império”, formando-se neste contexto as hegemonias de
alcance mundial, os projetos de gestão dos problemas e orientações de âmbito
mundial.
Na época da Guerra Fria, ao longo dos anos 1946 a 1989, já em franco processo de
globalização, a mídia construía uma visão do mundo bipolarizada, maniqueísta. O
capitalismo e o socialismo eram contrapostos em termos de “mundo livre e mundo
totalitário”, “democracia e comunismo”, “sociedade aberta e fechada”, “reino do bem
e mal”. Depois, a partir de 1989, quando a mídia impressa e eletrônica globalizada
invade ainda mais todas as esferas da vida social, em todo o mundo, nessa época o
que prevalece é a idéia de “nova ordem econômica mundial”, “fim da história”, “fim
da geografia”. Há sempre alguma influência, mais ou menos decisiva, no modo pelo
qual a mídia registra, seleciona, interpreta e difunde o que vai pelo mundo.
Pode-se equiparar o capitalismo em desenvolvimento com a palavra racionalização,
ocorre o desenvolvimento de formas racionais de organização das atividades sociais
em geral, compreendendo as políticas, as econômicas, as jurídicas, as religiosas,
as educacionais e outras. A rigor, os desenvolvimentos das ciências ditas naturais
e sociais, traduzidos em tecnologias de todos os tipos, revelam-se simultaneamente
condições e produtos de um vasto complexo processo de racionalização do mundo.
Desde que se formou o moderno capitalismo, o mundo passou a ser influenciado pelo
padrão de racionalidade gerado com cultura desse mesmo capitalismo.
Se é verdade que o capitalismo nasceu na Europa Ocidental, ambientando no
protestantismo, desenvolvendo-se inclusive nos Estados Unidos impregnados desse
mesmo protestantismo, é também verdade que o capitalismo tem se expandido
progressivamente por outras nações e nacionalidades. O que parecia característico e
peculiar do Ocidente, logo se revela compatível e até próspero no Oriente;
parecendo característico do hemisfério norte, também expande-se pelo hemisfério
sul. Em certos casos, como no do Japão, o capitalismo tanto floresce, que até mesmo
inova e desafia as próprias matrizes originais desse modo de produção.
Note-se que o contraponto “religião-capitalismo”, envolvendo ética religiosa e
comportamento econômico, ou visão religiosa do mundo e racionalização do trabalho e
da produção, não se desenvolvem em abstrato, mas mo âmbito do jogo das relações,
processos e estruturas sociais, culturais e outras que constituem a sociedade.
Cabe sempre reconhecer e reiterar que a sociologia das religiões mundiais
desenvolvida por Weber é também e principalmente uma sociologia da cultura, uma
sociologia de estilos de vida e visões do mundo constituídos culturalmente e
sintetizados nas religiões.
De fato, o capitalismo pode ser visto como um processo de amplas proporções e
acentuadamente expansivo, inaugurando e desenvolvendo uma época excepcionalmente
singular da história européia e mundial. O capitalismo, como produto e condição da
ampla e generalizada racionalização do mundo, logo se impõe ou sobrepõe às mais
diversas formas de organização da vida social. Tanto pode conviver como absorver,
tanto pode modificar como recriar, as mais diferentes modalidades de organização
social do trabalho e da produção.
As tecno-estruturas podem ser vistas como organizações sistêmicas, expressando
muito do que é a racionalidade instrumental ou técnica predominante no capitalismo.
Elas podem ser locais, nacionais, regionais e mundiais, operando em esferas como as
da economia, política, cultura, geopolítica, geoeconomia, indústria cultural e
outras. Juntamente com a racionalização do mercado, da empresa, de cidade, do
Estado, do ensino, da cultura e da religião, desenvolve-se e generaliza-se o
direito racional. Talvez se possa dizer que o direito racional é o coroamento do
processo de racionalização inerente ao desenvolvimento do capitalismo como processo
civilizatório. Esse é o universo que predomina o princípio da quantidade. Aos
poucos, o princípio da qualidade subordina-se ao da quantidade. Ainda que a
qualidade jamais seja suprimida, ela perde prerrogativas na maioria dos espaços
públicos, e tende a perdê-las também em espaços privados.
Sob todos os aspectos, pode-se dizer que o conceito de racionalidade está na base
do pensamento de Weber, tanto no que se refere as suas reflexões teóricas como no
que diz respeito as suas análises históricas. Tudo que é social, em qualquer época
ou lugar, pode ser analisado em termos de formas e gradações de racionalidade das
ações sociais de indivíduos, grupo ou coletividades; para ele o socialismo
distingue-se principalmente como uma forma ou gradação de exercício da
racionalidade na organização das atividades econômicas, políticas, culturais e
sociais, caracterizando-se por criar novas formas e gradações de racionalização das
atividades, instituições e organizações, o que reforça o poder da burocracia e do
burocrata, tanto no que se refere à gestão do aparelho estatal e da empresa como no
relativo à estrutura de aço na qual o trabalhador é inserido.
O que era um processo circunscrito a alguns países da Europa, e transplantado para
os EUA, logo se revela mais ou menos generalizado e, às vezes, avassalador, em
escala mundial. À força de desenvolver-se por todos os cantos e recantos da vida
social, o processo de racionalização passa a submeter o indivíduo, singular e
coletivamente, aos produtos de sua criatividade. À medida que ocorre o século XX,
atravessando guerras e revoluções, nacionalidades e nações, culturas e
civilizações, o capitalismo intensifica e generaliza o desencantamento do mundo.
Desde o princípio, o capitalismo revela-se como um modo de produção internacional.
Ainda que tenha sido sucessiva e simultaneamente nacional, regional e
internacional, juntamente com sua vocação colonialista e imperialista, o
capitalismo se torna no século XX um modo de produção não só internacional, mas
propriamente global. Acontece que o modo capitalista de produção funda-se no jogo
das forças produtivas liberadas com o declínio do feudalismo, a aceleração da
acumulação originária, a reprodução ampliada do capital, o desenvolvimento
intensivo e extensivo da produção, da distribuição, da troca e do consumo. O modo
capitalista de produção está sempre em movimento, no sentido de que se transforma e
expande, entra em crise e retoma sua expansão, de maneira errática mas progressiva,
com freqüência inexorável. É claro que toda essa dinâmica é comandada pelo capital,
pelos que detêm a propriedade e os movimentos do capital, em âmbito nacional e
mundial.
O predomínio do modo capitalista de produção traduz-se nos processos de
concentração e centralização do capital. A dinâmica da reprodução ampliada realiza-
se pela contínua concentração e centralização, ou absorção de outros capitais pelo
mais ativo, forte ou inovados. Na medida em que se desenvolve, o capitalismo tanto
revoluciona as outras formas de organização social e técnica do trabalho e da
produção com os quais entra em contato, como transforma reiteradamente as formas de
organização social e técnica do trabalho e da produção já existentes em moldes
capitalistas. O que já se revelava uma característica fundamental de gênese do
capitalismo europeu no século XVI se revela também no século XX, a continuidade
geral e reiterada do divórcio entre a força de trabalho e as condições de trabalho.
No fim do século XX, reabrem-se espaços e fronteiras, inesperados ou recriados,
disponíveis ou forçados. Juntamente com a desagregação do bloco soviético, com a
dissolução do mundo socialista, universalizou-se mais do que nunca o modo
capitalista de produção; e o capitalismo como processo civilizatório. Nota-se a
adoção da economia de mercado por praticamente todas as nações do ex-mundo
socialista; nessa época ocorre uma transformação quantitativa e qualitativa do
capitalismo, como modo de produção e processo civilizatório.
Ocorreu também a diáspora da industrialização pelo mundo, inclusive provocando uma
crescente dissolução do mundo agrário. A nova divisão internacional do trabalho,
agilizada pelos meios de comunicação e transporte, cada vez mais apoiados em
técnicas eletrônicas, transformou o mundo em uma fábrica e um shopping center
globais. São globalismos decisivamente baseados na organização e dinâmica das
corporações transnacionais, que desenvolvem suas geoeconomias e sua geopolíticas em
moldes mais ou menos independentes dos Estados nacionais.
A globalização do capitalismo reaviva a controvérsia mercado ou planejamento ao
nível dos setores produtivos, das economias nacionais, dos blocos regionais e,
obviamente, da economia mundial como um todo. A controvérsia mercado ou
planejamento foi colocada de forma particularmente estridente com a desagregação do
bloco soviético e do conjunto do mundo socialista, quando se colocaram em causa as
economias centralmente planejadas. A globalização do capitalismo contempla, todo o
tempo, o contraponto mercado-planejamento. O pleno predomínio do princípio do
mercado seria o caos. Para evitar que o caos irrompa de modo avassalador,
governantes, proprietário de meios de produção, gerentes técnicos, organizações
multilaterais, ou seja, tecno-estruturas transnacionais ou propriamente mundiais
planejam a expansão e a consolidação dos empreendimentos, a competição e a política
anti-cíclica, o certo e o incerto.
Esta pode ser considerada uma das características mais notáveis da globalização do
capitalismo: as técnicas eletrônicas, compreendendo a micro-eletrônica, a
automação, a robótica e a informática, em suas redes e vias de alcance global,
intensificam e generalizam as capacidades dos processos de trabalho e produção.
Observa-se que as maravilhas da ciência e da técnica não se traduzem
necessariamente na redução ou eliminação das desigualdades sociais entre grupos,
classes, coletividades ou povos.
Fechando a dialética sobre o tema globalização, o autor encerra com os pensamentos
de Marx: O capitalismo para ele é um processo civilizatório mundial. Ainda que
desenvolva pólos mais ou menos poderosos, esses mesmos pólos formam-se e
desenvolvem-se com base em um vasto sistema de relações com povos, tribos, etc.
Trata-se de um processo civilizatório que “invade todo o globo”, destruindo ou
recriando outras formas sociais de trabalho e vida, outras formas culturais e
civilizatórias.
Não se trata de pensar que a sociedade global já estava em Marx. Trata-se apenas de
reconhecer que algumas das instituições e interpretações marxistas contemplam as
dimensões mundiais do capitalismo, como modo de produção e processo civilizatório.
Este é o horizonte a partir do qual se pode reler o passado, interpretar o presente
e imaginar o futuro.
As relações, os processos e as estruturas característicos da globalização incutem
em praticamente todas as realidades preexistentes novos significados, outras
conotações. Na medida em que se dá a globalização do capitalismo, como modo de
produção e processo civilizatório, desenvolveu-se simultaneamente a sociedade
global, uma espécie de sociedade civil global em que se constituem as condições e
as possibilidades de contratos sociais, formas de cidadania e estruturas de poder
de alcance global. Desde que se acelerou o processo de globalização do mundo,
modificaram-se as noções de espaço e tempo. A crescente agilização das
comunicações, mercados, fluxos de capitais e tecnologias, intercâmbios de idéias e
imagens, modifica os parâmetros herdados sobre a realidade social, o modo de ser
das coisas, o andamento do devir. As fronteiras parecem dissolver-se, obliteraram-
se as barreiras, equalizaram os pontos dos territórios, harmonizaram os momentos da
velocidade, modificaram os tempos da duração, dissolveram os espaços e tempos
conhecidos e codificados; o mundo transforma-se em território de todo o mundo.
Esse é o clima da pós-modernidade: a história substituída pelo efêmero, pela imagem
do instante, pelo lugar fugidio. Privilegia-se o dado imediato, evidente,
cotidiano, inesperado, prosaico, surpreendente, fugaz. Quando o mundo não se
conforma com a pós-modernidade imaginária ou sonhada, o mundo articula-se cada vez
mais de acordo com as exigências da razão instrumental. Aos poucos, a razão
instrumental articula os espaços e tempos, modos de produzir e consumir, ser e
viver, pensar e imaginar. No mesmo ambiente em que se solta a pós-modernidade,
solta-se a racionalidade.
Nesse universo de coisas, gentes, idéias, realizações, possibilidades e ilusões, o
autor frisa mais uma vez que o mercado global é tecido principalmente pelo idioma
inglês. Em geral, ele diz, o inglês traduz o pensamento e o pensado, a informação e
a decisão, a compra e a venda, a possibilidade e a intenção. O inglês pode ser o
idioma da globalização. A maior parte dos acontecimentos, relações, atividades e
decisões expressa-se nesse idioma, ou nele se traduz.
Quando se globaliza o mundo, quando a máquina do mundo passa a funcionar em sua
globalidade, o andamento de cosas, gentes e idéias, províncias e nações, culturas e
civilizações adquire outras realidades, diferentes possibilidades. Pode-se pensar
tudo novamente.
Finalizando seu livro, Octavio Ianni fala sobre as ciências sociais, afirmado até
que a sociedade global é o novo objeto destas ciências, no tocante de serem pela
primeira vez desafiadas a pensar o mundo como uma sociedade global. A sociedade
global apresenta desafios empíricos e metodológicos, ou históricos e teóricos, que
exigem novos conceitos, outras categorias, diferentes interpretações. É um grande
momento em que o conhecimento sobre a sociedade nacional não é suficiente para
esclarecer as configurações e os movimentos de uma realidade que já é sempre
internacional, multinacional, transnacional, mundial ou propriamente global.
Como integrantes de um mesmo todo e por si só, facilitando um prévio entendimento,
o autor registra cinco características provenientes do estudo da sociedade global,
são elas:
Baseiam-se principalmente nos ensinamentos das seguintes teorias, muito correntes
nas ciências sociais: evolucionismo, funcionalismo, sistêmica, estruturalista,
weberiana e marxista.
Priorizam determinados aspectos da sociedade global: econômicos, financeiros,
tecnológicos, informáticos, culturais, etc.
A maioria situa-se em perspectiva que se pode denominar de convencional
O método comparativo evidentemente está na base de praticamente todos os estudos e
interpretações.
São poucos, muitos poucos, os que se posicionam nos horizontes da
desterritorialização, uma perspectiva que pode passar pelas convencionais, mas não
se fixa em nenhuma, como a que seria prioritária, privilegiada ou mais avançada.