Professional Documents
Culture Documents
.* f
, ,24
~1 8 n 4 c." -*O
i- ir'
i
.'/
Iinpende a esta revista o dever da lembrar-se hoje de quèa Ms-
deira tambem fica situada na Africa, vindó tratar, por excepção,
de importantes e gravissimas questões actuaes que se relacionam
com os destinos da nossa mais bnlla e mais rica ilha adjacente.
'
B1)I AF~ICB-M~FGQ,
PORTUGAL 18SS - VOL. v.
82 POBTUOAL EY AFBICA
das--__
levadas
Xb_"-.- -- _
e pará as soliigùes que teem prociirado,
* &
.
A .q'tzestão juridfca
&a duzia de expio~ad~res
de profiss6es diversas veem tra-
a
*
&s
, e dispondo-se
e. s arminar as levadas, a mais beITá; mais
simples e mais util inâtitiiigZo tradicional da ilha, O assvmpto,
sob o aspecto dos faotos e da legislaçíio, estA exposto desenvolvi-
damante na representa*^ de hereos a que acima alludimos. Tran-
serevamói, pois, o que ella diz n'essa.parte, que foi o seu objecto
principal :
SENHOR. A construcgão das levadas, na Madeira, data do prdprio
seculo xv, h que foi descoberta.
As çonàiç6es naturaes da ilha fizeram comprehender aos seus pri-
meiros povoadores, não só, que *a agricultnra tinha de ser a base da
economia da soeiedade, que iam coilstituir, mas tambern que ella 96
AS AGUAS E AS I AVADAS DA NADEIRA 83
podia tomar grandes proporções e offerecer largos interesses nas en-
costas, collinas e valles da beira mar, onde a composição do solo, a
fertilidade do terreno, a suavidade da temperatura e o regimen brando
dos ventos, assegurariam producções intensas e preciosas, com vanta-
gens infindas para a população, para os donatarios, para a ordem mi-
litar de Christo e para a coroa. Era ahi que estava, especialmente, a
zona das melhores culturas - a da vinha e a da canna de assucar-
que já então foram iniciadas, e que fizeram depois a celebridade, a fama
e a riqueza da Madeira, garantindo á metropole, sem interrupção, avul-
tados rendimentos, ainda nos periodos mais criticos e adversos de Por-
tugal.
Taes terrenos, porém, não podiam ser explorados com intensidade,
constancia e vantagem, sem que fossem dotados com aguas de irriga-
ção, que regularmente hurnedecessem e fecundassem o solo, mantendo
verdes e cheias de seiva a s plantaçijes, for4alecendo-as e opulentando-
as, não só durante o verão, mas ainda em parte da primavera e do ou-
tomno, e em geral durante as estiagens, possiveis no proprio inverno.
Ao mesmo tempo, quasi todas as fontes e nascentes estavam nos pon-
toa elevados, nas serras, correndo para os regatos e ribeiras, e por
meio d'estas para o oceano. Desde logo surgiu a necessidade e o pen-
samento de interceptar, em certas altitudes, o curso natural das aguas,
derivando-as para utilissimos canaes, construidos desde grandes dis-
tancias, ao longo de rochedos escarpados, por sobre abysmos perigo-
sos, atravez de immensos obstaculos apenês venciveis por uma tena-
cidade lieroica, até á s regioes mais ferteis e promettedoras.
Tal é a instituição admiravel e proficua das levadas, factor prima-
cial da agricultura, e portanto de todas as condiç0.e~economicas e fi-
nanceiras da ilha da Madeira. E em favor d'ella tinha de vir bem cedo
evidentemente, e bem cedo veiu com effe~to,9 apoio do poder cen-
tral.
Como de futuro poderiam ser occupados os terrenos altos, onde es.
tavam a s nascentes, convjnha garantir a fruiqão d'estas á zona mais
EsQdiadiiea-dabeira-mar, ~ o'tr;õtR "o-sem~fG~%%~^ãfi~~~~ayI$CTCT9~?~
w - h r a t a r n , c W ~ , ~ ; i _ como.
à o ~ coisa
a ~ distinofa.&&e, assentando
que n u n s estariam comprehendidas na transmissão e acqn~siçãoda
propriedade, pfxfdando-as ao dominio da coroa, e ligando o uso per-
petuo d'ellas ás leva-amasde ITrlgação. Ar, mesmo tempo era necessario
assegurar a estas o direito imprescriptivel d6 livre passagem, %demodo
que a s aguas, por um lado, não podessem ser interceptadas pelos do-
nos dos predios das margens dos regatos e ribeiras, e por outro po-
dessem ser conduzidas, em canaes apropriados, atravez de quaesquer
terrenos, mesmo particulares.
A estas necessidades fundamentaes attendeu rigorosamente a legis-
lação.
03"primeiros elementos .dteat;.eendireitoes ecial encontram-se j6 n'um
dos capi&íks de Ü h a carta de ~ & ~ Z E ~ C R ~ ~ B KJÔãci-T~'t~~8C?ipto
-K~TF
n'outra de Ei-Rei D. João 11de 7 de maio de 1493, onde se lê:
."Enas. . . fontes, tornos e olhos de agua . . . particular algum não
'terá jámais em tempo algum poqsa ter nem adquirir dominio nem di-
greito, por titulo algum, nem por posse immemorial, uso nem costume
"em c'ontrario se pogsa filiar nem introduzíir. E de tudo o que dito
Ué concedemos o uso a todos os moradores da dita ilha, para que de
"tudo usem osta mercê que de todas estas cousas faço aos morado-
"res e novos povoadores da dita ilha.. .,
Esta provisão, consagrando a s a uas como propriedade da cor88,
bos - p r e t # ~6ú te'rénos; em-que riasciain,
sepãnrWr--i~s-absolat~ntie~~t~
e dava-os usufructuariamente Bs levadas, em beneficio dos moradores
e povoadores, então estabelecidos nas regiões ttberrimas da beira-mar.
84 POBTUCtAL EM AFRICA
"ás partes de que nós soinos muito encarregado, e algum poderoso lhe
"impedir e prohibir por sua terra passasse e corresse levada que já
"em algum tempo fosse e corresse e que por alguma causa e aconte-
"cimento, negligencia ou por damnificação da levada deixasse de cor-
"rer, vós e os que no officio vos succederem ouvireis com sua razão e
"queixa logo: sem mais delongas nem espirito nem figura de juizo,
"mandareis pôr a dita levada no antigo primeiro estado, passagem e
"corrente, mandando notificar a esse tal poderoso que assim impedir
"a dita levada, ao qual não ouvireis nem consentireis cem admittireis
"a allegar razão de direito em seu favor, porque de todo o hemos por ex-
"cluido a t é que com effeito a dita levada corra e passe p a r a diante,
"mandando com pena de quinhentos cruzados não prohiba nem impeça
"por si nem por outro correr e passar a dita levada, n a qual.pena o
"hemos logo por incorrido, e será applicada nietade para captivos e
"metade para a parte, e se porventura accrescer em contumacia o
"mandareis prender e emprasareis que o dia certo da partida do pri-
"meiro navio que d'essa ilha vier a dois mezes apparega pessoalmente
"n'esta nossa corte a dar a razão que teve para não obedecer ao que
"vós outros lhe mandastes em nosso nome. . . E sabei que isto que aqui
'mandamos é com toda a razão e justiça, porquanto essa ilha não foi
"de vossos antepassados nem d'ella tiveram direito algum ou dominio
'antes de ser desco1)erta e occupada pelo senhor rei nosso bisavô que
'santa gloria haja, o qual fez mercê sómente da terra aos primeiros
"povoadores e m certas condiçces, e esta de dar passagem a regos e le-
"vadas de agua por,suas terras aos visinhos para aproveitariiento de
"suas fazendas, é uma d'ellas . . Em todo o tempo do mundo este tal
"direito s e poderá allegar sem embargo de nenhum e m b a r g e porque
"queremos e nos praz e é nossa vontade que esta e seu cumprimento
"esteja sempre dos sempres em sua força e vigor. . . E de agora para
'sempre derogamos e temos por derogado, quebrado, cassado e an-
"nullado todo e qualquer outro direito que dispozer o contrario em al-
"guma coisa ou em todo ou em parte contra o contheudo n'esta carta...
"E outrosim exc;luimos e hemos por excluidas e inhabeis quaesquer
"pessoas que em juizo qujzerem allegar razão por qualquer via que
"seja contra o contheudo n'esta nossa carta. . ,
Posteriormente, a carta de mercê;. de El-Rei D. Manuel d e 9 de feve-
reiro de 150: confirmou as provisões anteriores, ampliando-as ás pe-
dreiras e barreiras.
Nais tarde El-Rei D. José I, pela provisão de 5 de março de 1770,
cleu nova força á doutrina juridica precedente, nos termos seguin-
tes :
"aço saber a vós corregedor da coinarca da ilha da Madeira que
"Leandro Pereira do Couto e Andrade, capitão de infanterja do Porto
"do Paul d'essa ilha, me representou por sua petição que, administra.ndo
*varias vinculos consistentes em bens d e raiz, em alguns nasciam va-
"rias fontes de agua, que juntas com outras de diversas fontes corriam
"para os moinhos da Fajãa da Ovelha, e nos dias santos s e aproveita-
tvam d'esta agua algumas pessoas, vendendo as, por lhes não ser pre-
"cisas para regarem suas terras, do que resultava damno ao suppli-
Ucante, por s e não poder utilisar d'aquella respectiva quantidade de
"agua nativa nas suas terras, pedindo-me fosse servido mandar se
"desse posse ao supplicante das aguas respectivas á s suas fontes. E
"visto o mais que aliegoil, e informação que sobre este requerimento
" m e enviastes: Hei por bem e vos mando que na conformidade da provi-
"são do senhor rei D. Jodo 11,de 1g.93, que por copia vos remetto, taçaes
'executar a divisdo e repartiçc?~das aguas sem nttertçã.~cllgunm ao ~zltucz-
"me&(, que tiverem em terras pnrticulnres ou (c qztalguer posse ou costume
#em contrario, declarando por abusivas as vendas e afotamentos que se
'faslezll d a que 8s congregam ns.levada que se refere, por se deverem
'repartir peb8 moradores iiproporg&odas terras que cultivam. . ,
!hrrí~handoa t a expoai#o do antigo direito, cumpre-nos ainda fa-
zer eferenci up.nrJQgo& ca-_%cte,.qadsinjsfr ativo , ácerca
d e v a d a s d ~ u m e n t o que s representam um&applicação
e desenvo1viment.a dos que temos mencionado, e em parte deixam eii-
trever claramente o pnwunento tundamental de assegurar o usufructo
das agum ás r e g i h s mais fecundas e ricas d a ilha.
A rainha regente D.Catiharina, por alvârti de 26 de setembro de 1562,
ordenou que as levadas da Ribeira dos Soccorridos, dos Piornaes e do
Castelejo, se tirassem e limpassem no devido tempo á custa dos he-
reos e senhorios, sendo a despesa adiantada p e b alfandega até & quan-
tra de l20$QOO r6is. Por irlvará de 19 de outubro do mesrno anno, ge-
nerrtlisou analogrir~ dispo~qões6s out.ras levadas, uvisto se perderem
muitas cannas de asmwr e deixarem de hi.0 plantar outras por se não
tirarem e limparem rn levadas em tempo,, commettendo aos donata-
rios a sugerintendencia d8elIas,tanto para esse fim como para "tirar
novas levadas ou m u d a m , distribuir, as agnas mediante certo preço
de "preferencia Bs gessori;s que tivessem cannavirzes ou engenhos,, e
tomar , "conhecimento .das demcbndas sobre isso, decidindo-as e dando
ârppellagZio e aggravo*,
Um anno depois foram expedidos tres alvarás do infante D. Henri-
que: um para que sob ti superintendencia do vereador mais velho da
camara do Funchttl os visiabos das ribeiras procedessem regularmente
6 limpeza e fortificação d'etlas; outro para qne fossem cumpridas as
provisõ8s anteriores &cerca da Umpeaa annual das levadas; e o outro
para que na distribuição daa agutrs preoudmsem os cannaviaes, sendo
o preço d'elias taxado em cada capitania pelo respectivo capit-ão do-
natario com "uma pessoa honrada e conforme a quantidade e o pro-
seito que fizemem.,
A administração dãs levadas foi posta a cargo dos donatarios, e,
depois, dos capibhe gmerogbg, que,nomwvam p r ã esse fim delegados
seus chamados j~kes.A s carta8 de nomeação d'estes, até 1834, eram,
substancialmente, como a seguinte:
UFaçosaber aos que a presente carta virem, que, havendo-me,S.A. R
' o Prinoipe Regente NWO Senhor-'confiadonas sues regias instrucções
' a , iwspecçráo s-up~crrrada 'd&&i@e das agtscrs destinadas aos çanaes de
"ega ou levadas d'eíita ilha, cacja p r o p W & é da ma real corôa, ficando
' o seu mo ew ap@ic-aqiIa eommasnr aos habittcntm e cdonos que são compre-
"hendidos nos giros estabekihg, na conformidade das Provisões do Se-
"nhor rei D. João, de 7 e 8 de maio de 1493, do Sephor rei D. Manuel
'de 3 de fevereiro de 1502, e do Senhor rei DAJos6 de 5 de março de
'1770, tendo-se desde muito para este fim ordenado haverem juizes,
"ue segundo as praticas louvaveis as faaiam integralmente observar,
=eproporcionalmente repartir a s aguas por uma regular e bem enten-
'dida distribuiqão, sem dolo o u extr~~vio, em commum beneficio da cul-
Utura das terras; e concorrendo na pessoa de. as qualidsdes, etc ,
uHei por bem do Real S e r ~ i ç oe da Publico, nomeal-o. . . juiz da levado
"de. . . etc.,
-mdo a s disposigões substanciaes do direito antigo, atd
aqui exposto, =amos --
os seguintes principias e regras fundamen-
taes.
1.0 A s ribeiras, ribeiros, regatos, fontes, brnos, e olhos de agua são
propriedade da coráa, por todo o sempre, e destinam-se ás levadas de
irrigaçgo;
2.0 A transmissão e acquisição das terras náo envolvem, em tempo
AS AGUAS E A S LAVADAS DA MADEIRA 87
os visinhos não careciam das aguas, e até as vendiam, o que tudo rnos-
tra a força effectiva do systenia juridico vigente, na corte, nos tribu-
iiaes, na opiniáo e nos costumes.
Outras factos foram succedendo com mais alguma frequencia. Por
nin lado, algumas das nascentes de predios situados fóra da l~aciadas
levadas foram sendo n'elles aproveitadas sem reclamação, o que per-
feitamente se comprehende e era razoavel Por outro, alguns donos de
terras queriam impedir a tiragem de regos e aqueductos atravez das
suas propriedades, ou a passagem de aguas nos canaes; alguns dos la-
vradores mais poderosos, ou ainda os habitantes de 10 ares altos re-
centemente occnpados, tendiam ou chegavam mesmo a fazer novas le-
vadas com fontes de levadas primitivas; e alguns hereos foram ven-
dendo, arrendana0 ou aforando aguas que lhes eram distribuidas, ou
por serem superiores ás necessidades das suas culturas, ou por não da-
rem a esbas todo o possivel desenvolvimento. D'estes abusos, contra
os quaes foram terminantes as provisões de 8 de maio de 1493 e 5 de
março de 1770, só o ultimo se tornou frequente, porque não contrariava
directamente os interesses da beira-mar e o direito vigente, ao passo
que 08 primeiros, por estarem na situaçâo inversa e offenderem aber-
tamente as ideias e os costumes, poucas vezes surgiam, e mais raro ti-
nham de sei: corrigidos pela ac@o dos tribunaes. Ainda assim, esses
mesmos foram em parte favorecidos pela negligencia das auctoridades
e das pessoas interessadas.
O resnmo dos factos anteriores a 1834 pode ser formylado da ma-
y---
e)eira82rpit;e:---. . - - . ..- - -- - --- -
1.0Era applicado e observado rigorosamente, em geral, o direito das
levadas;
2.O A s nascentes de predios situados fora da bacia das levadas fo-
mrn sendo utilisadas pelos respectivos proprietarios;
3.0 Foram tiradas algumas levadas novas com aguas de levadas
primitivas ;
4." Acirna das madres das levadas foram interrompidas frequente-
mente, n'algunspontos, aguas das ribeiras a ellas pertencentes, pelos do-
nos dos predios marginaes;
5.1'Foi-se estabelecendo. o USO de venderem ou arrendarem os hereos
amas destinadas aos seus terrenos
SENHOR. Tal era o estado de direito e a situação d&;;jcoisas, no
wau- irn õ@&qt& ~&~+lI@váTG~GaCTêT~x*êriS-es;quando se implantou
o re&en*t?al. Melhor se pede agora aquilatar'o que vemos iio pe-
riodo quê-(ieiile então decorre e determinar a s saluções necessarias no
momento presente. E n'ests parte convem egualmente olhar primeiro
para o campo do direito, e depois para o dos factos.
A lei de 12 de novembro de 1841, no. seu art. 3.0, estabeleceu o se-
nte: 'A legislação sobre aguas e arvoredos (relativa á Madeira),não
6 alterada pelas disposiqões.d'esta lei, mas continua em vigor., O go-
verno constitucional, ao mesmo tempo que operava uma grande tran-
sformar;%~ no organismo social, sob a influencia da escola individualista,
reconheceu a necessidade de respeitar e manter o direito historico e
tradicional das levadas d'esta ilha.
Posteriormente o cadigo civil. regulando em geral o regimen das aguas
no paiz, assentou a seguinte doutrina:
"Art." 434. O s donos ou posauidores de predios, que são atravessa-
dos por quaesquer aguas correntes, não navegaveis nem fluctuaveis,
teem o direito de usar d'ellas em proveito dos mesmos nredios, com-
tanto que do refluxo das ditas aguas não resulte prejuizo aos predios
que ficam superiormente situados, e que inferiormente se não altere o
ponto d r sahída das aguas remanescentes.
" j ) unico Entende-se por ponto de sahida aquelle onde uma das mar-
gens do alveo deixa primeiramente de pertencer ao predio.
AS A G U A S E AS LAVADAS D A MADEIRA 19
correntes passarem por entre dois ou mais predios, podem ser usadas
pelos donos ou possuidores d'estes, na medida que lhos convier, se fo-
rem sobejas, e proporcionalmente á extensão e precisões dos seus ter-
renos, s e o não forem,-desde logo se comprehende q u e o regimen do
mesmo codigo, n'este assumpto, foi destinado ao continente do reino,
e não é applicavei aos regatos, ribeiros e ribeiras madeirenses.
Com effeito, outra é aqui a situação das coisas e d a s aguas. Estas
nunca foram, nem são hoje, nem podem ser comrnuns, no sentido indi-
cado Tambem não podiam nem podem ser usadas n a forma de quaes-
quer regulamentos pelos habitantes de uma circumscripção adminis-
trativa, ou pelos individuos que fazem parte de uma corporagão pu-
blica, m a s sim apenas pelos membros da associação privada dos he-
reos da area que cada levada irriga. Não atravessam só terrenos mu-
nicipaes, parochiaes ou particulares, mas Lambem terrenos do Estado.
Acccesce que não v&o lançar-se no mar, ou em correntes navegaveis
ou fluctuaveis, que a s n5o ha na Madeira, mas em aquêductos cons-
truidos em certas altitudes. Egualmente não poderiani, quando usadas
pelos predios marginaes, produzir refluxos prejudiciaes aos predios
superiores, porque esses pequenos fios de agua descem por leitos de
terrenos e rochas de grande declive. Finalmente dá-se a circumstancia
de que, em tal hypothese, rarissimas vezes poderiam dar sobejos, e em
geral só poderiam ser fruidas por poucos proprietarios limitrophes,
tendo de haver a interrupçgo das correntes.
Se considerassemos a Iogislação das aguas como assumpto em si
mesmo especial, isto é s e a hermeneutica exigisse n'esta questgo que
se não levasse a especialisa@o juridica até ao regimen das aguas da
Madeira, corno tal materia é abrangida pelo codigo civil dever-se-iaen-
tão dizer que o direito antigo relativamente a esta ilha está revogado
pelo art." 5 d a carta d e lei de 1 de julho de 1867. Estia interpretação,
que não é rigorosa, e muito menos justa, e que lucta com as conside-
rações decisivas acima apontadas, adapta-se a certas tendencias e opi-
niiJes communs, que n'este caso, como em muitos outros, não são as
mais solidas e razoaveis.
Mas, e m t a l hypothese, cumpriria logo notar-se q u e o s artigos 438 e
444 8 unico do codigo civil salvaguardarn~osdireitos adquiridos, ao
tempo d a s u a promulgação, por lei, uso e costume, concessão expressa,
sentença ou prescripqão Ora os direitos adquiridos d a s levadas, n'essa
data, pela lei antiga, são os que acima indicámos e pódem syntheti-
sar-se no usufructo perpetuo e imprescriptivel de todas a s nascentes
que vão n a direcção dos regatos, ribeiros e ribeiras d a s bacias de taes
aqueductos: e das correntes dos mesmos regatos, ribeiros e ribeiras,
sem que os donos dos predios onde brotam as fontes podessem utili-
sar-se d'estas, ou adquirir sobre ellas propriedade, o sem que os dos
terrenos marginaes podessem interceptâr aguas. E portanto, ainda
quando se applicasse o codigo civil, a situação juridica d a s levadas se-
ria, pelas s u a s disposiçõ\es, a mesma que pela velha legislaqão.
AS A G U A S E A S LAVADAS D A M B 1 ) E I R A 91
438.O do codigo civil, pelo qual "a prescripção só será attendida para os
effeitos d'sster artigo, quando recáiâ sobre opposição nQo seguida, ou
sobre a constrz(cção de obras no predio superior de que possa iftferirse nban-
dono do primitivo direito.,
Esta interpretaç&o é pbantwtica e erronea. Com effeito, ainda
quando supponhamos sujeito o assumpto ao codigo civil, o direito dos
hereos, pelo proprio art. 438.0 fundar-se-ia sempre lia lei antiga., que já
se examinou, e nunca na prescripçdo. Esta é visivelmente mencionada
no $ unico do mesmo artigo, para outros casos, e até apenas em favor
de quem usa das aguas contra os direitos dos donos dos predios mar-
ginaes, e não em favor d'esfes, que em seu beneficio teem as regras ge-
raes dos art. 434." a 436.0,sendo de futuro irnprescriptivel o respectivo
uso, segundo o art. 433 E as expressões - ou sobre a construcção de
O.
O regabofe hydraulico
ção dos terrenos, ou para melhor regihen das aguas, devam ser arbori-
sadas, simpiesmente enrelvados ou cultivados em socalcos;
2.0 Qual o perimetro que limita o terreno adjacente ás correntes de
a p i , vdlaa, canaes, esteiros, pantanos ou lagoas, não navegaveis nem
fluotuaveis, cuja conservação e regimen possa interessar os proprieta-
rios confinantes, quer para o aproveitamento e exgoto das aguas, quer
para a sua colmatagem, quer para a irrigação, executando-se a s res-
pectivas obras e occorrendo-se ao seu pagamento, nos termos do regu-
lamento que faz parte d'este decreto;
3.0 Qual a largura que deverão ter as margens da corrente, valla, ca-
nal, esteiro, pantano, lago ou lagoa;
4.0 Quaesquer outras designações e esclarecimentos concernentes á
baa applicaçào d'este decreto e regulamento que d'elle faz parte.
o q~ t ~ m
iangnl! de ser reconduzido e o qvre 7Go poderá spr reeleito.
Art 55.0 As funcções de vogaes dos gremios serão gratuitas
# unico. Quando, porém, algum ou alguns 'dos vog ies dos gremios
tenham prestado serviços dignos de especial consideração, a reunião
dos interessados poderá, mediante informação do director da respectiva
circumscripçào hydrhulica, conceder a esses vogaes urna gratificação
extraordinaria pelos serviços prestados. (Combine-se com o art. 43," 9
2.0, acima transcripto.)
, Art. 56 Os gremios eleitos não carecem de approvagão do governo
para poder funccionar ; mas, este em qualquer occasião, sob proposta d o
director da circumscri~)çãohydrarrlica, ou a reqtrerimento documen-
meP1qe7~heiro
tado de um terço, pelo menos, dos proprirtarioo interessados, com ii~fornrcip%o
d'aqvellr rrtge~heiro,tem a faculdade de Ihes mandar suspender as attri-
buições, e ordenar nova eleição dentro do praso de trinta dias contados
da data dasuspensão effectiva (combine-se tarnbem como a r t . 43.0 5 2.0),
assumii~doo director as attribuiçGes do qremio a t é se verificar a eleiçgo e
posse do novo gremio.
5 unico. A dissolução dos gremios, quando fôr ordenada, será inti-
mada a cada um dos seus membros, não podendo ser reeleitos os iudividuos
que .faziam parte do gremio dissolvido.
Art. 57.u Aos vogaes dos gremios novamente eleitos será conferida
a posse pelo director da respectiva circumscripção hydraulica, e dadas
a s instrucções convenientes ácerca das obras e trabalhos que lhes com-
pete administrar, execiltar. conservar ou fiscalisar. . .
Art. 58." 5 unico. Quando os gremios expressamente e por escripto
,declararem que preferem que a direcção da respectiva circumscripção
hydraulicíl execute os projectos e obras que teem de fazer-se, os gre-
mios serão considerados como nko existentes, excepto no que respeita
á distribuição e cobrançq das quotas e pagamento das despesas com
os projectos das obras e com a sua execução e administração.
Art. 67: Quando os gremios eleitos não vierem tomar posse, não s e
reunirem, ou náo cumprirem com as obrigações que lhes são impostas
pelo decreto n o 8 de 1de dezembro de 1892 e por este regulamento, o
engenheiro director da respectiva circumscripçâo hydraulica assumirá
para todos o s effeitos, pelo tempo que ainda faltar para a nova elei-
assiirripto nZo se poderia attingir novos fins sem novos meios. Tal
diploma nao se eseciitoii, por isso mesmo e por tudo o mais, no
distrivto do Funchal.
O que a t e aqui temos dito nao inhibe, por&m, que n'unia certa
ordem de assumptos e para attender a uma certa classe de ne-
cessidades se lance mão de alguns principios do decreto e do re-
regulamento, applicando-os com simplicidade, economia e bom
senso A Madeira.
A representaçso dos hereos, embora primacialrnente subordinada
á questiio do direito das agiias, manifesto11 o desejo de que se
reorganisassem os servigos hydraiilicos, fóra da espherei. privativa
das levadas. Começava por dizer o seguinte:
Primeiramente, Senhor, devemos mostrar a situação dos serviços
hydraulicos do districto, que é precaria e lastimavel. O melhoramento,
a conservaç80, o aproveitamento e a policia das nascentes e correntes
de agua destinadas aos usos domesticos, hy&ienicos,agricolas e indus-
triaes, dos terrenos a ellas sobranceiros ou adjacentes, dos alveos ou
leitos e margens das ribeitas, e das mathas e arvoredos que podem in-
fluir na consolidaçiio das vertentes e collinas e no regimen hydrogra-
phico, teem sido infelizmente descurados pelo Estado, pelos municipios
e pelos particulares, com prejuizo de todos e perigos irnrnensos, que
ámanhã podem ceder o logar a factos e acontecimentos funestos.
As vertentes das ribeiras, nas regiões onde se acham a s nasçentes,
ou onde não é conveniente a lavoura por degraus e socalcos, esdião tran-
formadas em taboleiros mal seguros de culturas ephemeras, Ou se apre*
sentarn sem nenhuma vegetaçàto, ou são' arborisadas e desarborisadas
á vontade dos donos das terras, sem obedieacia aos príncipios de. um
bom systema hgdraulico.
Bem grandes sào os males, que d'aqui resultam. A falta de mattas
esta exercendo uma influencia nefasta no regimen pluvial, determi-
nando longas estiagens, operando modificações nocivas no clima, e cau-
sando graves advereidades á agricultura. As chuvas não encontram nos
declives das montanhas um meio penctravel e absorvente, n&o abaste-
cem os reservatorios interiores das fontes, que vão diminuindo ou sec-
cando umas após outras, e lavam em torrente a superficie do solo, pre-
cipitanda-se as enxurradas enormes nos valles profundos. As aguas das
correntes, no verão, cada vez mais reduzidas, são desviadas subrepti-
ciamente, em grande parte, para irrigações anomalas n'essas altitudes,
e escasseiam de um modo assustador nas levadas que vão fecundar as
zonas ,das producções riquissim3s.
Em muitos pontos não se sabe bem onde são os leitos ou afveos e
as margens das ribeiras. O s proprietarios confinantes roteaq e culti-
vam os areiaes por onde a s aguas das cheias passaram já e podem pas-
sar ainda. Não se limitam a fazer ali sementeiras transitorias e de pe-.
queno porte, mas chegam a plantar arvores de grande duraçgo e des-
envolvimento e famm arrumações obstructivas de calhaus e entulhos
em todos os sentidos. Junto das correntes, em muitas partes, as obras
de defesa são empilhamentos desmoronadiços de pedras, ou barrancos
revestidos d e vegetações precarias.
Os ribeiros ,e corregos, que por todos os lados atravessam as colli-
nas e encostas, acham-se n'uma situação semelhante. Não teem, mui-
tas vezes, paredes de defesa sufficientemente altas ou segufas, são
transformados, com frequencia, em receptaculos das escolhas e limpe-
112 PORTUGAL EM AFRICA
emigrar para o Urazil, qiie com certeza, lhe não pode offerecer urn fu-
turo tào prospero como esta parte da Africa, onde se paga a uin pe-
dreiro ou carpinteiro regular uma libra por dia!
Os que se dedicam á agricultura vêem tambem o seu trabalho re-
pyinpensado em demasia, recebendo por uma couve 500 r&s e mais!
lodos os legumes produzidos encontram facil venda por preços eleva-
dissimos, em FClacequece, Mutali ou Beira.
O s que viessem dedicar-se á creação de gado, tirariam tambem lu-
cros enormes.
0 s commerciantes ganham tanto, que ouvi, ha dias, dizer a um iie-
gociante de vinhos que não tornaria a trazer, para cá, vinhos de 1..
qualidade, porque, apesar de os vender todos immediatamente, apenas
ganhava 25 p. c. !
Este pouco intelligente portuguex prefere, como a maioria dos nos-
sos patricios, vender-nos pessimos vinhos, que nos envenenam e des-
acreditam.
A maioria dos negociantes extrarigeiros pensam e bem que se de-
7em coiitentar com um lucro moderado, pois qiie, assim, vendem mui-
tissimo e a final veem a ganhar muito mais. &s, deixando este assutn-
pto, em, que falei por incidente, eu gostaria de convencer os capitalistas
e operarios do meu paiz de que os seus esforços e capitaes teriam aqui
liicros remuneradores e certos e que estes veriam o seu trabalho mais
bem pago.
As condições sanitarias, que podem aterrar muitos, são incompara-
velmente melhores dib que ahi se suppõe. Sobretudo na Beira e Manica
todos se dão, em geral, bem, sendo de notar-se que isto se dá niesmo
corri a s mulheres e creanças- o que é devido, na Beira, á proximidade
do mar e solo arenoso, em Manica á elevada altitude e pureza das
aguas.
Perto de Mecequece, sobre o monte Vumba (1600" de altitude), estd-
se construindo, por ordem do sr. coronel Gorjão, um sanatorio, onde
com certeza, se restabelecer80 os que adoecerem n'outros pontos do
territorio. Por todas estas razctes, julgo prestar iim serviço aos meus
patricios aconselhando-os a vir para cá. Capitalistas, commerciantes,
artistas, lavradores todos aqui, teem vasto campo para o seu trabalho,
e uma larga e certa remuneração. Não duvido dizer que todos os homens
honestos e trabalhadores, aqui encontrarão riqueza, ou abastança para
si e suas farnilias.,
Casnimigas D'uma carta com data de 12 de dezembro, escripta por
um missionario de Cassinga, extrahimos as seguintes noticias:
'A famosa Rittder-Pest fez aqui a sua apparição na semana passada.
De 32 bois e vacas que havia n'esta missão apenas restam dois, que
provavelmente morrerão d'um dia para o outro. Ficamos sem bois, sem
vaccas o sem bezerros! Os rebanhos dos indigenas estão egudlmente
atacados pela Rinder-peat. Esta terrivel molestia foi aqui transmittida
por bois infectados, vindos dos Cuanhamas, em cuja região essea arii-
maes teem morrido á s centenas, e até aos milhares E o mesmo tem
acontecido no Humte, Cuamati e Quitete. Parece que os bois infecta-
dos passaram tamhem o Cunene, para os lados de Caconda; se assim
8, estamos sem meios de transportes. Actualmente todos os bois de
C apemb6 estão a caminho de Caconda, com destino a Benguella. Se a
peste chegou tambem a Caconda, seremos obrigadds a renunciar a
qualquer viagem a Benguella, e a quaesquer serviços em que seja ne-
cessario o auxilio de bois.
Se por um lado esta terrivol epidemia nos causa tantos prejuizos,
por outro lado produz effeitos salutares entre os indigenau de todas a s
tribus, que attribuem este Ragdlo a um espirito qualquer, que, por esta
forma quer punil-os pelas suas guerras injusta^.
A triste praga (10s gafanhotos continua a fazer destroqos. nao só eni
Cassinga mas em toda a provincia de Angola.
-"A 19 de riovembro tivemos aqui a visita do principe Boris, da
ltuusia. li um homem muito instruido, extremamente aniavel e deli-
cado e d'uma sympathia attrahente. Ficou muito penhorado com a re-
cepção simples, mas franca e cordeal que aqui se lhe fez. Visitou as
minas d'ouro, e disse que, se ellas prometterem, fornecerá capital para
a sua exploração. Convidei-o a visitar toda a missão, começando pela
capella, onde elle ajoe:hou deante do S.S., bem como deante da imagem
de N. S. das Victorias, fazendo em amlbos os alliares uma pequena ora-
ção.