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GOVERNANÇA DEMOCRÁTICA:
CONSTRUÇÃO COLETIVA DO
DESENVOLVIMENTO DAS CIDADES
Tradução
João Carlos Vitor Garcia
A minha esposa, Àngels
Guiteras, pelo seu apoio,
confiança e sugestivas
observações quanto ao
conteúdo do texto.
2
Agradeço a confiança das
pessoas e entidades que
promoveram a edição brasileira,
em especial à Fundação
Astrojildo Pereira e a João Carlos
Vitor Garcia, pela tradução e
adaptação do texto. E
minha especial gratidão pelos
comentários e correções do
texto original feitos por Júlia
Pascual.
3
PREFÁCIO
APRESENTACÃO
INTRODUÇÃO À EDIÇÃO BRASILEIRA
INTRODUÇÃO................................................................................................................................9
1.GOVERNANÇA: UMA NOVA ARTE DE GOVERNAR........................................................12
IDEIAS PRINCIPAIS............................................................... ...........................13
GOVERNANÇA: DESCENTRALIZAÇÃO, PARTICIPAÇÃO E COLABORAÇÃO COM A SOCIEDADE CIVIL........14
A GOVERNANÇA DEMOCRÁTICA É MAIS DO QUE UMA DIMENSÃO DA AÇÃO DE GOVERNO .............16
OS MODOS DE GOVERNAR NA DEMOCRACIA: BUROCRÁTICO, GERENCIAL E GOVERNANÇA. .21
A GOVERNANÇA É A ARTE DE GOVERNAR PRÓPRIA DO GOVERNO RELACIONAL EMERGENTE...........25
A GOVERNANÇA É O MODO DE GOVERNAR DA SOCIEDADE DO CONHECIMENTO........................32
2.GOVERNANÇA DEMOCRÁTICA: CONSTRUÇÃO COLETIVA DO
DESENVOLVIMENTO HUMANO.............................................................................................34
IDEIAS PRINCIPAIS .............................................................. ...........................35
A FINALIDADE DA GOVERNANÇA DEMOCRÁTICA É O DESENVOLVIMENTO HUMANO.......................36
A GOVERNANÇA EXIGE E PRECISA DE DEMOCRACIA.......................................................37
A COESÃO SOCIAL É O MOTOR DO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL..........................37
A COESÃO SOCIAL É O PRINCIPAL OBJETIVO DA GOVERNANÇA...........................................40
A GESTÃO RELACIONAL É A MODALIDADE DE GESTÃO CARACTERÍSTICA DA GOVERNANÇA..............42
A GESTÃO RELACIONAL SE ASSENTA EM UM CONJUNTO DE TÉCNICAS E INSTRUMENTOS...............44
PARA DESENVOLVER-SE, A GOVERNANÇA PRECISA TER ÊXITOS ELEITORAIS VISÍVEIS....................47
3.O GOVERNO RELACIONAL E A GOVERNANÇA SE ASSENTAM NAS MUDANÇAS
SOCIAIS E NA EMERGÊNCIA DA SOCIEDADE-REDE.......................................................49
IDEIAS PRINCIPAIS .............................................................. ...........................50
NOVA DESIGUALDADE SOCIAL E NOVA VISÃO DA POBREZA.......................................... .....52
A INDIVIDUALIZAÇÃO DAS RELAÇÕES SOCIAIS E A GERAÇÃO DE CAPITAL SOCIAL........................54
RISCO E VULNERABILIDADE SOCIAL.................................................... ....................56
IMIGRAÇÃO: IDENTIDADE E MULTICULTURALIDADE................................. ........................57
MUDANÇAS NA FAMÍLIA................................................................................ .....59
A CIDADE À MEDIDA DAS MULHERES.................................................. ....................60
UMA NOVA VISÃO DO TEMPO E ESPAÇO...................................................... .............62
A CENTRALIDADE DOS VALORES NA ORGANIZAÇÃO SOCIAL..............................................63
A GLOBALIZAÇÃO DO SOCIAL ............................................... ..............................64
MUDANÇAS NAS FORMAS DE PRESTAÇÃO E GESTÃO DOS SERVIÇOS DE BEM-ESTAR SOCIAL ..........66
CONCLUSÃO: DA GERÊNCIA À GOVERNANÇA............................................... ................67
4.A REVALORIZAÇÃO DA POLÍTICA NO GOVERNO RELACIONAL............................69
IDEIAS PRINCIPAIS............................................................... ...........................70
O GOVERNO PROVEDOR E A CRISE DA POLÍTICA LOCAL ................................. .................71
A DEMOCRACIA É BÁSICA PARA O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO NA SOCIEDADE-REDE .............72
O GOVERNO RELACIONAL NECESSITA DE QUALIDADE DEMOCRÁTICA.....................................74
A POLÍTICA DEMOCRÁTICA COMO CAPACIDADE DE REPRESENTAÇÃO....................................... 75
UM NOVO PAPEL PARA O ELEITO LOCAL.............................................. .....................76
5.A LIDERANÇA DO POLÍTICO ELEITO NA GOVERNANÇA..........................................77
IDEIAS PRINCIPAIS............................................................................ ...............78
CAPACIDADE DE VISUALIZAR OS INTERESSES E HABILIDADES DA CIDADANIA............................79
UMA NOVA VISÃO DO PODER.................................................. ............................81
A LIDERANÇA REPRESENTATIVA É RELACIONAL ................................ ...........................81
A LIDERANÇA REPRESENTATIVA É CAPACITADORA........................................................ ..82
A DISTINÇÃO ENTRE POLÍTICA E GERÊNCIA...................................................... ..........83
O REPRESENTANTE POLÍTICO É O PRINCIPAL AGENTE DE MUDANÇA.................................... ..86
4
A NOVA TAREFA: TORNAR VISÍVEL O APOIO SOCIAL ÀS POLÍTICAS.......................................87
5
Introdução à edição brasileira
2
Ver www.aeryc.org
3
Como definidos pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.
7
democrática é uma opção por valores cívicos e
democráticos.
• A revalorização da política democrática e do papel do
governo representativo. A governança representa uma
mudança no papel do governo em relação à sociedade.
O governo não aparece simplesmente como provedor de
recursos ou de serviços, mas fundamentalmente como
representante da cidade, de suas necessidades e
desafios. O governo não apenas dispõe de
competências, mas também de incumbências. A ele
cabe tudo o que preocupa a cidadania, e por isso ele
assume o papel de estruturador da capacidade de
organização e ação da cidade e das relações entre os
distintos níveis de governo. Portanto, na governança
democrática o papel do governo como representante da
cidadania adquire maior importância do que nas etapas
de governo anteriores.
• A construção compartilhada do fortalecimento do
interesse geral. Na governança, o interesse geral não é
atribuído a um grupo de funcionários ou de políticos. O
interesse geral é uma construção coletiva que deve ser
liderada pelos políticos eleitos como representantes da
cidadania, a partir das necessidades e interesses
legítimos de todos os setores cidadãos. Governança
democrática significa uma ação de governo específica
para que todas as necessidades e desafios dos cidadãos
estejam presentes tanto na deliberação como no
desdobramento das políticas e, muito especialmente,
dos setores mais vulneráveis.
• A transparência e a prestação de contas são também
condições essenciais da governança democrática. Sem
elas dificilmente o governo da cidade poderá articular os
distintos atores em uma ação comum com apoio e
envolvimento da cidadania.
8
Introdução
9
Este livro discute a importância da política para promover a coesão
social nas cidades e nos municípios. Em especial, pretende mostrar o
valor que a liderança política representa para a construção coletiva de
cidades com maior inclusão social.
A política democrática está sofrendo uma crise de legitimidade, não
por ser incapaz de resolver os seus problemas, mas porque a maioria
dos políticos não pode enxergá-los.4 Neste sentido, para contribuir com
o entendimento de aspectos desta questão através da reavaliação da
política e da figura do político como elementos essenciais para o
desenvolvimento humano, o livro trata de um novo enfoque da relação
entre o governo local e a cidadania, de uma nova arte de governar
denominada governança democrática, em cuja base se acha a gestão
relacional ou a gestão das interdependências nas interações sociais.
O trabalho examina uma nova arte de governar e gerir os territórios,
que se assenta nas mudanças em curso na nossa sociedade e nas
transformações que levaram à superação das formas de governar
centradas na prestação e gestão de recursos e serviços. Tais
transformações são analisadas, especialmente, nos seus aspectos
sociais e sua relação com o modo de governar e de entender a política,
como são os casos das políticas de bem-estar social e da liderança
política necessária para articular iniciativas cidadãs de coesão e
inclusão social.
Além de analítico, o livro é fundamentalmente propositivo e destinado
aos políticos e técnicos que atuam na administração dos municípios,
assim como àqueles que prestam serviços aos governos locais. Sua
leitura, entretanto, pode ser útil a todos que se interessam pelo
conjunto dos temas de âmbito local. As propostas apresentadas têm
por base a análise da evolução da sociedade e da crise da maneira de
governar e de entender a política e, especialmente, do papel do
político. Por isso, descreve as características da nova liderança política
e dos apoios e suportes técnicos e organizacionais que a liderança
relacional requer.
Uma vez que um dos seus objetivos é servir como ferramenta para os
políticos com responsabilidades de governo, e como estes, geralmente,
são pessoas muito envolvidas e empenhadas nas tarefas do dia a dia e
com pouco tempo para a leitura, concebemos os capítulos de tal modo
que a sua leitura seja inteligível em si mesma, não sendo necessária,
embora desejável, a leitura dos capítulos antecedentes ou posteriores.
Pela mesma razão, além de elaborarmos um índice detalhado,
enfatizamos no início de cada capítulo as ideias-chave.
O primeiro capítulo, intitulado "Governança: Uma nova arte de
governar", introduz e explicita as diferenças entre os conceitos de
governabilidade, governança e bom governo. É um capítulo analítico e
conceitual, cujo objetivo é distinguir os principais tipos de governo e
modos de governar observados nos regimes democráticos. A conclusão
é que o governo relacional, através do modo de governar denominado
4
A. Einstein já havia observado que “os problemas importantes que enfrentamos não podem ser
resolvidos com o mesmo enfoque de pensamento que tínhamos quando os criamos.” O
especialista em grandes organizações J. Gardner observou, nos anos 60 do século XX, que “a
maioria das organizações doentes desenvolveram uma cegueira funcional em relação aos seus
próprios defeitos. Não sofrem por não poder resolver seus próprios problemas, mas por não poder
vê-los.”
10
governança democrática, em cuja base está a gestão relacional ou a
gestão das interdependências entre agentes e setores da cidadania, é
o governo que corresponde à sociedade do conhecimento ou
sociedade-rede.
O segundo capítulo, "Governança Democrática: Construção coletiva do
desenvolvimento humano", discute a finalidade e as características
distintivas da governança e da gestão relacional como arte de
governar. O terceiro capítulo identifica e descreve as grandes
mudanças sociais em curso nas nossas cidades e municípios e que hoje
estão moldando as novas agendas políticas.
O capítulo seguinte descreve a crise política que as mudanças sociais
têm provocado no modo de governar denominado "gerencialismo", que
esteve em voga até o final da década de 90. Por outro lado, é reforçado
o papel da democracia – entendida, sobretudo, como eleição e
representação –, tanto como valor e fim quanto como meio para o
desenvolvimento social contemporâneo. Também é analisado o novo
papel do político eleito como uma das chaves para a qualidade
democrática.
O quinto capítulo identifica as principais características da liderança
relacional ou representativa, que aparece como o principal agente da
mudança direcionada para o desenvolvimento humano. No sexto
capítulo, com base em uma definição de coesão social, em
consonância com os programas URBAL da União Europeia, são tratados
os pontos-chave para que o governo local possa liderar a coesão social
do seu território e o apoio técnico de que precisa.
O capítulo seguinte descreve o perfil do político necessário para poder
liderar as cidades inclusivas, bem como as principais habilidades e
capacidades requeridas.
No oitavo capítulo são identificadas as razões por que os governos
locais assumem um papel mais importante na sociedade-rede, assim
como a importância dos governos intermunicipais. No nono e último
capítulo, intitulado "A Governança do Bem-Estar Social", é examinada a
reestruturação da gestão dos serviços públicos do bem-estar social na
era da governança. Em particular, são identificados os desafios da
provisão de recursos e da gestão dos serviços por parte das prefeituras
e como eles devem ser abordados.
O livro é complementado por uma bibliografia e alguns links eletrônicos
para quem quiser se aprofundar no tema.
11
1. Governança: Uma
nova arte de
governar
12
Ideias Principais
1. Governança Democrática é:
descentralização, participação e
colaboração com a sociedade civil.
13
Governança: descentralização, participação e
colaboração com a sociedade civil
A governança é um conceito que está se estendendo amplamente na
Europa, especialmente após a publicação pela União Europeia, em
2001, do Livro Branco sobre Governança Europeia, elaborado pela
Comissão Europeia e dirigido por J. Vignon.5
O fato de que tenha sido a Comissão Europeia que promoveu o
conceito de governança como uma forma de governar baseada na
horizontalidade e no acordo está relacionado, precisamente, com a
prática deste governo supranacional, que tem que articular os
interesses dos diferentes governos dos estados-nação. Mas o que o
relatório trata é da incorporação dos governos regionais e governos
locais, além da sociedade civil, na construção da Europa.
R. Mayntz, J. Prats e o próprio Vignon, em textos posteriores ao
relatório europeu, têm definido a governança como uma nova arte de
governar na democracia. J. Prats6 assinala que, apesar dos diferentes
significados do conceito de governança, nos últimos anos está
ocorrendo na Europa um amplo acordo para considerar a governança
como um novo modo de governar. Isto porque vem se constatando,
gradualmente, que a eficácia e a legitimidade dos governos
democráticos baseiam-se cada vez mais na qualidade da interação
entre eles e as organizações empresariais e sociais, bem como em uma
boa gestão das relações entre os diferentes níveis de governo.
A palavra governança7 é frequentemente utilizada, de modo pouco
preciso, como sinônimo de governabilidade ou de bom governo.
Governança é uma nova arte de governar que tem na gestão das
interdependências entre os atores seu principal instrumento de
governo. A governança gere as relações entre os atores para tomar
decisões sobre a cidade e desenvolver projetos complexos com a
colaboração interinstitucional, público-privada ou envolvimento dos
cidadãos. É, portanto, um termo não qualificativo no sentido de que se
refere a um mecanismo de gestão governamental. Bom governo, sim, é
como se pode classificar a ação de um governo através de sua forma
de governar. Esta forma de governar pode ser a governança, de modo
que poderíamos falar de "boa governança" (como também de "má
governança"), mas também pode ser o modo de classificar qualquer
5
No citado Livro Branco, o conceito de governança está associado a cinco princípios
fundamentais: abertura, participação, responsabilidade, eficácia e coerência. Princípios que visam
a reforçar as relações da UE com a sociedade civil e uma maior utilização das capacidades dos
agentes locais e regionais para lançar as bases para uma definição clara dos objetivos políticos da
UE e estabelecer os papéis e as responsabilidades de cada instituição. Governança está
diretamente associada a uma aposta do governo na descentralização, participação cidadã e
colaboração com a sociedade civil.
6
J. Prats, “Gobernabilidad democrática para el desarrollo humano: Marco conceptual y analítico”
em Instituciones y Desarrollo nº 10, 2001, pp. 103 a 148.
7
O vocábulo governança ainda não está inserido no dicionário do Instituto de Estudos Catalães,
mas seu uso foi autorizado como uma tradução de "governance", em 2001. Ele foi, entretanto,
incluído, em 2001, no Dicionário da Real Academia da Língua Espanhola com uma definição muito
genérica, mas de forma correta. Governança é definida como "a arte ou o modo de governar que
se propõe como objetivo alcançar o desenvolvimento econômico, social e institucional
sustentável, promovendo um equilíbrio saudável entre Estado, sociedade civil e economia de
mercado."
14
outra forma de governar diferente da governança, como a gerencial ou
a burocrática. Por governança se entende, em sentido restrito, a
aceitação e o cumprimento de regulamentos, processos institucionais e
de resolução de conflitos, bem como de políticas do setor público por
parte da sociedade civil e, em particular, dos seus principais atores.
Ingovernabilidade é, por outro lado, a desobediência civil, incapacidade
dos mecanismos institucionais para resolver os conflitos sociais, não
aceitação das regras do jogo institucional. A governabilidade é um
atributo ou classificação de uma situação social e, em qualquer caso,
pode ser um resultado das ações de governo, de um bom governo, de
uma boa governança, ou de outro modo de governo bem exercido em
uma determinada situação. Mas é importante não confundir um
atributo ou um resultado com o modo objetivo de governar.
Em algumas ocasiões, também tem sido equiparado a uma concepção
anterior do termo político inglês "governance", que se referia ao
impacto da gestão das políticas e dos recursos do setor público no
desenvolvimento de uma sociedade ou território. Por exemplo, a
Comunidade Autônoma da Cantábria tem um excelente sistema de
indicadores para medir o impacto da ação governamental em sua
comunidade.
Também não podemos confundir governança democrática com a
dimensão relacional, ou seja, com a colaboração e a participação da
sociedade civil no modelo de governo atualmente dominante, o
denominado governo provedor ou gestor de recursos e serviços. Ela é
uma nova maneira de governar que implica uma nova forma de
compreensão da política e do papel do político.
R. Gomà e I. Blanco assinalam que entender a governança como uma
arte de governar que se baseia em um sistema de participação e
colaboração e atores significa também reconhecer a complexidade
como elemento intrínseco do processo político, o que situa os poderes
públicos em uma nova posição nos processos de governo. E para
assumir esse novo posicionamento a administração precisa exercer
novos papéis e dispor de novos instrumentos.8
Para J. Subirats, a importância da governança tem tamanho peso que
as diferenças entre as comunidades derivam de sua capacidade de
avançar na governança e, concretamente, da capacidade de suas
instituições representativas disporem de um projeto de futuro
compartilhado e das cumplicidades que este projeto possa gerar no
conjunto da cidadania.9
Enfim, é muito frequente confundir, na ação de um governo, a
governança com a dimensão relacional de participação cidadã ou de
cooperação, seja esta público- privada ou interinstitucional, e não
percebê-la como um novo modo de governar. Por esta razão, é preciso
que vejamos o tema com um pouco mais de cuidado neste capítulo e,
especialmente, no seguinte.
Argumenta-se de modo cada vez mais frequente por parte dos
especialistas em ciências sociais e políticas, particularmente, que o
8
I. Blanco e R. Gomà, “Gobiernos locales y redes: retos e innovaciones”. Instituto de Gobierno y
Políticas Públicas, 2002.
9
Ver J. Subirats, “¿Qué gestión Pública para qué sociedad? Una mirada prospectiva sobre el
ejercicio de la gestión pública en las sociedades europeas actuales”. Instituto de Gobierno y
Políticas Públicas. UAB, 2003.
15
envolvimento da cidadania é fundamental para que um governo atue e
desenvolva serviços em função das necessidades e desafios dos
cidadãos e, desse modo, desenvolva uma gestão de qualidade.
Também se aponta, de modo perfeitamente compatível com a
afirmação anterior, que a participação cidadã é uma garantia para a
melhoria da qualidade democrática de uma administração.
Por outro lado, dada a insuficiência de recursos públicos para fazer
frente às necessidades sociais, bem como o fato de que a sociedade
atual é cada vez mais interdependente, considera-se que são gerados
mais espaços de interação, como é o caso de desenvolvimento de
projetos, em que são necessárias a colaboração institucional e a
cooperação pública e privada. Portanto, conclui-se que esta dimensão
da gestão das interdependências será um tema de grande
desenvolvimento por parte dos governos, especialmente dos governos
locais.
Ou seja, tanto do ponto de vista participativo como da colaboração
entre atores, a governança será a dimensão da gestão governamental
à qual teremos que dar mais atenção a partir de agora. Em minha
opinião, essas afirmações estão corretas, mas são insuficientes porque
tratam a governança simplesmente como mais uma dimensão de
governo, e não como uma nova arte de governar ou modo de governar
que tem na dimensão relacional (isto é, na colaboração
interinstitucional e público-privada e no envolvimento da cidadania) a
sua principal prioridade e o eixo estruturante da ação de governo.
10
Governação é usado no mesmo sentido como definido pelo Dicionário da Real Academia da
Língua Espanhola: "Ação e efeito de governar/exercício do governo." Compreendemos,
naturalmente, por um governo um "conjunto de organizações e indivíduos que dirigem um
território e as funções que eles desempenham". Assim, modelos de governação ou formas de
governar são modelos de exercer a ação dos governos.
11
Quando se fala tanto de modelos de governação ou de governos-tipo se utiliza a metodologia
do tipo ideal de Max Weber, que a define como: "Construção mental para analisar um fenômeno
histórico ou social em que se elegem e enfatizam determinados aspectos do fenômeno. O objetivo
16
razoável, a cada governo deveria corresponder um modo de governar
específico. Mas, como teremos oportunidade de aprofundar, isto nem
sempre foi assim, o que tem causado muitos problemas. Em particular,
no modelo ou paradigma de governo provedor e gestor, ao qual
corresponderam dois modos de governar ou modelos de governação: o
burocrático e o gerencial. O modelo de governação pode ser
implementado tanto por governos supranacionais, nacionais, regionais
ou locais.
Para entender melhor esta tríplice diferenciação começaremos pelo
mais simples ou básico, isto é, pelas funções e dimensões de toda ação
de governo territorial em relação à sociedade.
Existem três grandes funções ou dimensões básicas da ação de
qualquer governo territorial em relação à sociedade: a função legal ou
normativa para regular a atividade da sociedade civil, mas também
política; a função provedora e gestora (direta ou indireta) de serviços à
comunidade; e uma terceira, que podemos chamar relacional – que
inclui todas as atividades relacionadas à participação cidadã, aos
acordos e cooperação com a sociedade civil e também com outras
administrações.
A função legal e normativa (L) é, por exemplo, dar cumprimento a uma
norma urbanística, de ordenamento do uso do solo, de vigilância
sanitária, de mobilidade etc. O cumprimento dessas normas necessita,
além dos órgãos jurídico, administrativo e de fiscalização, de alguns
serviços de polícia municipal, limpeza e coleta de lixo etc.
Portanto, encontramos uma segunda dimensão ou função de gestão de
serviços (G), que foi ampliada na Espanha, sobretudo a partir dos anos
80, com os serviços sociais, desportivos, culturais, educacionais, de
saúde, promoção do emprego e desenvolvimento econômicos etc., ou
seja, com recursos e serviços não apenas associados ao desempenho
da sua competência e função reguladora, e destinados a gerar
proteção ou bem-estar público.
A terceira função, que temos denominado relacional (R), abrange as
questões da consulta, do diálogo, participação, parceria e cooperação
com a sociedade civil, principalmente, mas também com outras
instituições, sejam elas nacionais ou internacionais.
Os modelos de governo ou governo-tipo – ou, ainda, se preferirem,
paradigmas de governo12 – são definidos pelo tipo de relacionamento
que se estabelece entre governo e cidadania. Ou seja, pela principal
finalidade (e não só) que se atribui à ação de um governo para
proporcionar à sociedade, seja ela a garantia da ordem legal ou o bem-
estar a partir da provisão de recursos ou melhoria da capacidade de
organização e ação de uma sociedade.
Todos os tipos de governo desenvolvem as três dimensões ou funções
de governo, mas em cada tipologia ou modelo de governo existe uma
da construção de tipos ideais é o de servir como base de comparação na análise dos fenômenos
históricos e sociais concretos, uma vez que torna possível mostrar a proximidade ou afastamento
deles em relação ao tipo ideal (puro). Ver M. Weber, Conceitos sociológicos fundamentais, edição
de J. Abellán. Madri: Alianza Ed., 2006, p.180.
12
Deve-se o uso do termo paradigma no âmbito científico ao historiador e filósofo da ciência
Thomas Khun, que o introduziu no seu livro clássico A estrutura das revoluções científicas. Nele,
paradigma é definido como "uma constelação de realizações – conceitos, valores, técnicas etc." –
compartilhadas por uma comunidade científica e usadas por ela para definir problemas e soluções
legítimas.
17
função principal ou prioritária distinta, que desempenha um papel
estruturante em relação às outras duas.
Assim, identificamos três governos-tipo na democracia ou modelos de
governo territorial: governo racional ou jurídico, governo provedor e
gestor, também chamado protetor, e governo relacional.
O governo racional-legal tem por finalidade velar ou garantir o
funcionamento do mercado e a sociedade liberal; a função
predominante é a normativa e legal. As outras funções ou dimensões
têm um papel secundário. O esquema básico de articulação das
funções do governo racional-legal é o seguinte:
L
Legal
G R
Provedor e Gestor Relacional
Legal Provisión /
G
Provedor e Gestor
L R
Legal Relacional 18
Legal Provisión
O governo relacional ou promotor é o governo próprio da sociedade-
rede ou sociedade do conhecimento. Sua finalidade é melhorar a
capacidade de organização de uma sociedade e gerir as principais
redes sociais para o desenvolvimento humano. Sua principal função
estruturante é a relacional. O esquema é o seguinte:
R
Relacional
L R
Legal Relacional
Legal Provisión /
19
a classificação feita por J. Prats, em um recente e excelente trabalho,
três modelos de governação: burocrático, gerencial e governança.13
Modelos de Articulação
governo funções básicas
ou (Relação Governo
Governo-Tipo com a cidadania)
- Valores
Modelos de - Gestão: técnicas
Governação - “Papéis”:
(modos de político,
governar) cidadania,
adminisrador
21
processos e regulamentá-los. A tarefa do burocrata é seguir os
procedimentos e não assegurar resultados. Estes, se supõe, resultarão
do cumprimento da regulamentação estabelecida. Nisto, não difere dos
processos próprios do maquinismo industrial, dos métodos tayloristas.
A diferença com a produção de bens e serviços reside em que seu
posto de trabalho não é flexível e que os processos da administração
não estão organizados em função da produtividade. Os serviços, para
garantir a conformidade com os regulamentos, são organizados por
estes mesmos processos.
O modo gerencial de prestação e gestão de recursos públicos. Começa
nos anos 80, tem seu esplendor nos 90 e na atualidade ainda é o modo
dominante.
Os objetivos são a economia, a eficácia e a eficiência (os três “E”) na
prestação e gestão de serviços. Sua preocupação principal é a
produtividade na produção dos serviços e, em geral, do conjunto da
administração.
A gestão específica deste modo de governar é a gestão empresarial
dos serviços. Ou seja, o conjunto de técnicas, instrumentos e processos
através dos quais se enfrenta a prestação e gestão dos serviços são
introduzidos, ou melhor, tenta-se introduzi-los, a partir do mundo
empresarial; e os principais profissionais dirigentes da administração
são buscados no mundo empresarial e, mais concretamente, do mundo
dos negócios. Assim, fala-se da terceirização de serviços, gestão da
qualidade orientada ao cliente-usuário, reengenharia de processos,
marketing de serviços etc. Pretende-se orientar a gestão para os
resultados econômicos e de produtividade.
Acredita-se que a produtividade e os três “E” acima mencionados
devam ser os valores dominantes não apenas em função dos serviços
públicos, mas também do conjunto da administração; e não poucas
vezes se quis aplicar a reengenharia de processos, própria da gestão
de serviços, às funções governamentais destinadas a assegurar os
direitos da cidadania e às funções relacionais, gerando não só colapsos
de governabilidade, mas também importantes colapsos no
funcionamento da democracia.
Entre os profissionais do governo, há uma demanda de formação em
economia, mas é dada prioridade, em especial, à formação nas escolas
empresariais e de administração.
Dada a importância da gestão empresarial dos serviços neste modo de
governar, o papel do político eleito fica desfocado e se confunde com o
de gerente. Desponta e se valoriza, especialmente, o papel dos
administradores ou gerentes, que assumem papéis de maior relevância
à custa dos políticos eleitos, saídos das fileiras dos partidos políticos –
ou acabam predominando os extratos gerenciais dos altos escalões da
direção política.
A governança democrática. É um modo de governar que está
emergindo na atualidade como consequência da crise do
governo provedor e gestor de recursos e, em especial, pela
obsolescência e anomalias provocadas pelo modo gerencial.
22
Nas palavras de D. Inneraty, sua finalidade é “a colaboração entre o
governo e a sociedade civil para a regulação dos assuntos coletivos
com critérios de interesse público”.14
O que caracteriza a governança como modo de governar é a gestão
das interdependências, gestão relacional (ou de redes). É um tipo de
gestão específico que se baseia em um conjunto de técnicas e
instrumentos e processos para alcançar a construção compartilhada do
desenvolvimento humano em um território.
Os valores próprios da governança que a fazem avançar como modo de
governar são: respeito, tolerância, participação, racionalidade,
confiança, compromisso e colaboração.
Ou seja, a governança se baseia na gestão das interdependências, mas
não é igual à gestão relacional, sendo, na verdade, muito mais ampla.
Governança é uma ação de governo que tem múltiplas dimensões:
normativo-legal, provedora e de gestão de serviços; porém, ao ter
como seu principal objetivo a colaboração entre a sociedade civil e o
governo para responder aos desafios sociais, é a gestão relacional que
assume a relevância e o papel estruturante de todas as funções de
governar. As funções legal e de gestão de serviços são reestruturadas
pela governança, de tal modo que as características exigidas das
mesmas serão diferentes das que adquiriram nos modos burocrático e
gerencial.
A governança coincide com o modo gerencial em sua rejeição ao
governo hierárquico, mas, ao contrário dele, não vê no mercado nem
nas técnicas empresariais aplicadas à gestão governamental a
alternativa aos problemas e desafios sociais, identificando na própria
sociedade a solução dos problemas. A tarefa do governo é a de
envolver os cidadãos na resolução dos seus próprios problemas,
cooperando com eles e melhorando a capacidade coletiva de atuação.
A governança também partilha com o modo burocrático a ideia de
legalidade, de controle público e da necessidade de procedimentos
administrativos, mas atribui grande prioridade aos procedimentos
informais de interação cidadã, na qual intervém para mediar e facilitar
a cooperação entre os atores e setores da cidadania envolvidos.
Na governança o político tem um papel de representante eleito, mas
diferentemente do modo burocrático, este papel é muito relevante na
sociedade devido ao fato de que atua como aglutinador e organizador
do interesse geral, a partir dos legítimos interesses e desafios dos
diferentes atores e setores da cidadania.
A cidadania e a iniciativa social e privada têm um papel muito ativo. A
tarefa do governo consiste em articular uma ampla cooperação pública
e privada, e uma intensa colaboração cidadã no desenvolvimento
humano. Ou seja, fortalecer e coordenar as principais redes sociais em
uma determinada direção.
Por sua vez, passa a ter mais valor um tipo de profissional polivalente,
que tem como funções a mediação e a negociação relacional, em apoio
aos políticos eleitos, dotado de amplos conhecimentos na elaboração
de estratégias e possuidor de um enfoque abrangente das ciências
sociais. Esta área das ciências sociais é a que apresenta maior
desenvolvimento na era da governança. Prevê-se que, dada a
complexidade e variedade das situações sociais na governança, bem
14
Ver D. Inneraty, El nuevo espacio público. Madri: Ed. Espasa – Calpe, 2006, p. 209.
23
como a necessidade de amplos conhecimentos e novas técnicas, será
necessária uma ampla terceirização da assistência técnica e, mais
particularmente, com entidades que correspondem à classificação de
“think tanks”.
No quadro I, são apresentadas de maneira resumida as características
diferenciadoras dos distintos modos de governar, em relação às suas
principais variáveis.
Modo de
Governar Burocrático Gerencial Governança
Variáveis
Função ou dimensão Prestação e
estruturante da Normativa / Gestão Relacional
atividade do governo Legal Infraestruturas e
serviços
Gestão de redes
Gestão sociais ou
Tipo de gestão Gestão por Empresarial por
predominante procedimentos relacional
produtividade ou (construção
resultados coletiva do
desenvolvimento
humano)
Legalidade,
Principais valores autonomia Economia Confiança
sociedade civil. Eficácia Compromisso
Neutralidade Eficiência Colaboração
Credibilidade e
Visão da qualidade no Credibilidade e Satisfação do confiabilidade da
exercício do governo confiabilidade cliente e usuário organização das
dos interdependência
procedimentos s
Demandante- Demandante-
Papel do cidadão Peticionário passivo: cliente ativo: cooperador
Administrado ou usuário e corresponsável
Reivindicativo
Papel das associações Reivindicativo Reivindicativo contratado
e empresas contratado externo
24
corresponsável
externo
Líder da
Papel do político Representante Eleito/gerente construção social
do eleitorado (organizador
coletivo)
Fonte: Elaboração própria, inspirado em J. Alguacil (2006), R. Gomà (2003), J. Prats
(2005).
O governo racional-legal
15
Pretendo objetivar ao máximo a descrição e por isso não uso as palavras proteção e bem-estar,
por estarem envolvidas em disputas políticas e gerarem reações imediatas e pouco críticas de
apoio ou rejeição.
16
Max Weber o definiu como tipo de dominação racional-legal, descrito em seu famoso Economía
y Sociedad Madri: F.C.E., 1929, pp. 170-217.
25
Neste modelo existe a função relacional, que consiste em desenvolver
a participação e o acordo da cidadania na elaboração das normas
legais, que o governo deverá fazer cumprir, e na aprovação prévia
pelas câmaras municipais. Não se trata da participação na definição
dos serviços e dos sistemas de qualidade na prestação de serviços
próprias do governo gestor, muito menos da participação cidadã e da
colaboração público-privada para transformar a cidade ou o território,
em geral, na perspectiva do desenvolvimento humano.
No governo racional-legal, a função relacional é muito reduzida; a
cooperação cidadã, em não poucos casos concretos de governo, fica
circunscrita ao diálogo para alcançar a manutenção da ordem pública.
As funções estruturadas deste governo, como a prestação de serviços
e a função relacional, são administradas pelo tipo de gestão que já
assinalamos como própria do modo burocrático: a gestão por
procedimentos.
Neste modelo de governo racional-legal o papel do governo é
subordinado sempre aos governos nacionais e regionais. A principal
função é normativa e reguladora e, neste aspecto, os governos locais
são necessariamente subordinados à legislação cujo cumprimento
corresponde ao nível nacional ou federal ou similar, a qual,
logicamente, não podem transgredir.
As alterações nesta forma de governo se originaram nos desequilíbrios
que o próprio mercado gera. A não intervenção dos fundos públicos na
economia e na coesão social levou ao agravamento das desigualdades,
à ampliação da pobreza e à instalação de uma situação de conflito
social permanente. O papel de garantidor do cumprimento de uma
legislação e de manutenção das condições do mercado levou à
percepção de que o governo é um obstáculo e se opõe às
reivindicações sociais dos mais desfavorecidos (ainda que, em não
poucos casos, esta atitude governamental fosse uma vontade
manifesta).
A etapa burocrática
26
O modo burocrático próprio do governo racional-legal foi o que se
aplicou ao novo paradigma de governo a partir dos anos 50, e que se
tornou hegemônico até os anos 80. Ele foi aplicado com os mesmos
valores e com a proteção jurídica dos funcionários públicos, porém
agora já não era somente gerenciar algumas poucas prestações e
serviços ligados às funções de regulação, mas também a prestação de
serviços orientados à satisfação de necessidades sociais, que estavam
se convertendo na função principal e prioritária dos governos.
Os políticos e profissionais da gestão pública não entenderam que se
encontravam ante um novo paradigma de governo, ou seja, ante uma
reestruturação da organização e funções do governo, e agiram como se
fosse tão somente uma ampliação da sua atuação. Não tiveram a
consciência de que era preciso governar de um modo diferente.
Efetivamente, Max Weber (que sem dúvida foi quem melhor
caracterizou o modelo racional-legal, ou modo burocrático de
dominação) considerava que a burocracia era também um modo de
gerir os serviços e não apenas de garantir a legalidade, a
independência e a estabilidade do governo. Porém, era bastante
consciente das limitações de uma gerência ampla dos serviços por este
tipo de gestão. Neste sentido, Giddens17 nos recorda que o principal
argumento de Weber contrário ao socialismo era que este significaria
uma grande burocratização do Estado e, em particular, do governo, o
que acabaria levando à ineficiência na gestão e à autonomia da
burocracia como grupo de poder, que faria o governo funcionar em
função de seus interesses de grupo particular, como efetivamente
ocorreu.
De fato, a gestão de recursos e serviços públicos exige economia,
eficácia e eficiência (os denominados três “E”), que, como já
observado, não são valores próprios da burocracia e nem valores pelos
quais ela é protegida como grupo profissional. A gestão burocrática
aplicada à gestão de serviços foi e é altamente ineficiente, provocou e
ainda provoca significativas deseconomias que devem ser sustentadas
com mais carga fiscal para os cidadãos e, pior ainda, limita o alcance
dos serviços públicos a eles.
O paradigma do governo gestor, ao desenvolver-se com o modo
burocrático, trouxe com ele a necessidade de reforma permanente,
desde o seu começo, para torná-lo mais eficiente. Entretanto, os
distintos instrumentos de reforma – descentralização, centros de
controle, orçamentos-programas etc. – inscreveram-se no modo
burocrático e no tipo de gestão que o caracteriza – a gestão de
procedimentos.
A etapa gerencial
A. Giddens, Política y Sociología en Max Weber. Madri: Ed. Alianza, 1976, pp. 76-82.
17
18
Os autores mais conhecidos desta escola, assim como seu principal livro, são D. Osborne e T.
Gaebler, La Reinvención del Gobierno. Barcelona: Ed. Paidós, 1995.
27
social (serviços sociais, assistência médica, centros culturais,
equipamentos desportivos etc.), como os que apoiam diretamente o
cumprimento de uma norma governamental (coleta de lixo, serviços de
limpeza, estacionamento e, inclusive, alguns tão problemáticos como
polícia, gestão urbana e segurança), pela aposta na terceirização dos
serviços públicos, pela criação de um “mercado” ou “quase-mercado”
de serviços públicos, pela gestão orientada ao cliente ou usuário etc.
Considera-se que a produtividade e os três “E” antes mencionados
devem ser os valores dominantes, não apenas da função da prestação
e gestão de serviços, mas do conjunto da administração.
Nesta etapa, a função relacional e participativa se desenvolve mais que
no modelo racional-legal, mas de forma sempre vinculada e
subordinada ao papel de provedor de recursos desempenhado pelo
governo. De fato, o modelo provedor e gestor teve por base um acordo
social através do qual o setor público proporcionou serviços e
benefícios econômicos que constituem salário indireto. Isso possibilitou
a estabilidade dos rendimentos e dos salários nas empresas privadas. A
participação cidadã, por sua vez, fica restrita ao âmbito das
necessidades e no desenho das políticas e serviços, não se traduzindo
em compromisso de cooperação para dar uma resposta coletiva aos
desafios sociais.
Por outro lado, a concepção gerencial passa a incorporar não apenas a
gestão dos serviços financiados com recursos públicos, mas também a
prestação de serviços pelas empresas privadas e iniciativas sociais. A
justificativa desta incorporação se deu a partir do argumento de que o
governo teve seu peso relativo diminuído, dadas as limitações do
crescimento do gasto público para atender as necessidades sociais. Na
etapa gerencial, não apenas se considera a necessidade de incorporar
novos atores sociais, e em especial as empresas, mas também
prospera a ideia de que o governo deve imitar o modelo de gestão
empresarial. Em última instância, o objetivo era dar maior destaque
aos empresários e às empresas, tanto na gestão e prestação de
serviços como na iniciativa social, como forma de suplementar a ação
de governo, que somente se entendia como prestador de serviços.
A adoção do modo gerencial no paradigma de governo provedor e
gestor, no entanto, tinha igualmente uma justificativa ética baseada na
necessidade de se evitar o desperdício do dinheiro público e,
sobretudo, de criar mais infraestrutura e serviços com uma despesa
pública que se constatava não poder crescer indefinidamente. A
extensão dos três "E" para toda e qualquer ação governamental, como
uma cópia dos métodos empresariais das multinacionais, aliada ao fato
de se enxergar o cidadão como um mero cliente ou usuário, em muitos
casos levou à desconsideração do conceito de serviço público e ao
questionamento das garantias legais e do respeito pelos direitos que a
ação do governo deve proporcionar, o que tem acontecido em muitos
governos, e não apenas na América Latina.
Neste caso, não apenas a prestação e gestão de benefícios e serviços
eram considerados dominantes, mas toda a ação de governo.
Considerava-se que o modo de governar deveria corresponder aos
valores empresariais da gestão de serviços. Desta maneira foi
favorecida a consolidação de uma concepção clientelista da ação de
governo e da política em geral, sobretudo onde os valores
democráticos estavam pouco consolidados.
28
Em suma, o enfoque que estamos expondo, de definir o modelo de
governo como uma maneira de abordar a articulação das funções do
governo, leva a dizer que o lema do governo gestor poderia ter sido
burocracia o quanto for necessário, gestão eficiente o quanto for
possível e, certamente, teria tido menos efeitos perversos do ponto de
vista democrático.
No esquema gestor, as prefeituras têm um papel mais relevante como
prestadoras de serviços do que no modelo racional-legal, porém
secundário em relação aos governos nacionais e federais ou similares;
na maioria dos casos, os governos locais dependem das competências
e transferências de recursos dos outros níveis de governo.
O governo-rede ou relacional
O governo relacional é aquele que tem como finalidade a construção
do desenvolvimento humano de forma compartilhada com a sociedade
civil, e cujo modo específico de governar é o que denominamos
governança democrática.
Como já assinalamos reiteradamente, sempre existiu a governança
entendida, simplesmente, como gestão das interdependências ou das
relações entre o governo e os atores e setores da cidadania. Isto,
porém, de maneira altamente residual e condicionada por outras
funções e dimensões que serviram de eixo vertebrador da ação de
governo.
A novidade, a mudança de paradigma, está no fato de que a
governança torna-se o modo próprio do governo relacional. E este
modo de governar, que se baseia e se estrutura a partir da gestão
relacional ou das interdependências, deixa de ser residual para ser o
modo principal ou estruturante do governo.
Hoje em dia a cooperação entre atores, a participação e a colaboração
da cidadania não são consideradas apenas uma dimensão emergente,
mas uma função estrututurante da ação de governo na sociedade do
conhecimento ou sociedade-rede. Isto se deve, fundamentalmente, à
constatação de que existem cada vez mais desafios e necessidades
sociais que não podem ter resposta em uma ação baseada no gasto
público, por mais eficiente que seja a sua gestão. O governo se vê,
assim, diante da necessidade de propor a melhoria da capacidade de
organização e ação para que o conjunto da sociedade enfrente os
desafios e as necessidades crescentes que condicionam o progresso
humano.
Tal como na última fase do governo provedor, considera-se necessário
incorporar novos atores para a obtenção da melhoria da qualidade de
vida; porém, ao contrário da etapa gerencial, não se trata de reduzir a
relevância do governo democrático, mas de atribuir a ele um novo
papel como organizador coletivo de uma ampla ação social.
Neste contexto, a gestão relacional ou gestão das interdependências
(ou de redes) passa a ser a base da nova ação de governo. Portanto, o
governo relacional deve realizar uma reestruturação das funções de
proteção legal de direitos, da gestão eficiente da qualidade dos
recursos e serviços para colocá-los em função da construção coletiva
do território, que tem na gestão relacional seu principal, embora não
único, instrumento.
29
Reestruturação significa mudança de orientação. A função relacional se
converte em estruturante (porque agora o objetivo do governo
relacional é a melhoria da capacidade de organização e ação dos
territórios) e aumenta sua complexidade e a magnitude de seus
objetivos, assim como os âmbitos em que se aplica. A participação
cidadã (elemento essencial da função relacional) é agora,
fundamentalmente, corresponsabilização e compromisso.
Por sua vez, a gestão de serviços na governança deve ser eficaz e
eficiente, mas não apenas do ponto de vista da redução dos custos e
da produtividade, uma vez que esta mesma gestão deve incorporar
uma melhoria no compromisso de ação comunitária dos usuários e
familiares envolvidos e contribuir para o fortalecimento do tecido
associativo do lugar em que se situa. Os benefícios e serviços se
integram e apoiam os processos de desenvolvimento comunitário.
A função normativa e legal, que sem dúvida deve ser exercida por
funcionários, deve adequar os procedimentos de contratação externa
de serviços às novas finalidades de eficácia e contribuição ao
desenvolvimento comunitário, assim como ao fortalecimento e
ampliação dos novos espaços da cidadania; ou seja, frente aos espaços
de deliberação e acordos entre governo, atores, iniciativa social e
movimentos sociais em geral, o papel singular da função legal ou
normativa em um governo relacional será o de conceber os marcos
institucionais reguladores, assim como os incentivos e restrições da
atuação dos atores e setores da cidadania para estimular, fortalecer e
dar estabilidade à ação coletiva em que os participantes procuram
maximizar suas expectativas no âmbito do interesse geral. Isto é, ter
em conta que o interesse geral é uma construção coletiva na qual
participam.
A seguir, veremos com mais detalhe, aplicada ao setor de bem-estar
social, a reestruturação das diferentes funções no governo relacional e,
especialmente, a orientação que recebem através do seu modo de
governar: a governança.
Neste modelo de governo é fundamental a proximidade às
interdependências dos atores para construir projetos coletivos e
promover uma cultura empreendedora e cívica na cidadania. Por isso, o
papel dos governos locais no sistema do conjunto dos Estados-nação é
claramente emergente e relevante. Também o são os governos
regionais, porém estes entendidos, cada vez mais, como gestores das
interdependências entre os distintos municípios.
Como conclusão desta seção, é fundamental reter a seguinte visão do
governo relacional:
O governo relacional assume um papel renovado e uma centralidade
social na sociedade-rede, ao considerar-se a articulação social, a
melhoria da capacidade de organização e ação das sociedades, uma
responsabilidade pública democrática, com grande impacto no
desenvolvimento humano das cidades e regiões.
No quadro II é apresentado um resumo dos governos-tipo a partir dos
seus principais elementos distintivos.
30
Governo-Tipo
Racional-legal Provedor e Relacional
Elementos Gestor
distintivos
Provedor de Organizador
Relação Regulador/ infraestruturas coletivo do
estruturante com a normativo e serviços desenvolvime
sociedade civil nto
Burocrático (1ª Governança
Modo de governar
Burocrático etapa) (expectativa
Gerencial (2ª racional)
etapa)
Papel do município
Protagonista
no modelo de Subordinado Secundário (expectativa
administração
razoável)
nacional
Fonte: Elaboração própria, inspirado em J. Alguacil (2006), R. Gomà (2003), J.
Prats (2005)
31
Ainda mais quando temos o exemplo de que o governo provedor se
desenvolveu, numa primeira etapa, através do modelo de governação
próprio do governo racional-legal: o modo burocrático.
Ainda que a governança comece a ser um paradigma com progressiva
importância nas ciências sociais como arte de governar, é incipiente e,
em não poucos casos, se desenvolve no interior do modo gerencial de
governar, confundindo-se com uma nova fórmula para dar maior
relevância ao papel dos agentes econômicos. O aparecimento da
governança como prática de governo precisa de êxitos bem conhecidos
e de vitórias eleitorais para aqueles que a implementarem. Para isto
são necessários métodos e técnicas específicas e um novo tipo de
liderança política, que é preciso sistematizar e difundir.20 O predomínio
do modo gerencial atrasa e dificulta a inovação do modo de governar.
O governo local, por sua proximidade com as relações que se
estabelecem entre os atores no território, pode gerir melhor a
complexidade social. Mas isso tampouco significa que venha a ocorrer,
mas simplesmente que, de um ponto de vista racional, existem
condições para que haja um incremento do papel dos governos locais.
Se vão conseguir ou não, vai depender, fundamentalmente, de sua
ação prévia, de que sejam capazes de abrir espaços como
organizadores da coletividade, e dos êxitos que alcancem no
desenvolvimento humano nos territórios em que abram os espaços
mencionados.
22
R. D. Putnam, Making Democracy work: Civic traditions in modern Italy. Princeton: Princeton
University Press, 1993, p.125.
33
2. Governança
Democrática:
Construção coletiva
do desenvolvimento
humano
34
Ideias Principais
1. A finalidade da governança
democrática é o
desenvolvimento humano:
democracia, equidade social,
desenvolvimento econômico.
2. A governança como modo de
governar exige e precisa de
democracia.
35
Ao longo do presente livro serão tratadas mais detalhadamente as
características da governança e, em especial, sua aplicação na área do
bem-estar social. Ao chegar até este ponto, porém, me atrevo a propor
uma definição de governança democrática:
A governança democrática é a arte de governar os territórios do
novo governo relacional, próprio da sociedade do conhecimento,
cujo objeto é a capacidade de organização e ação de uma
sociedade; seu principal meio é a gestão relacional ou das
interdependências e sua finalidade é o desenvolvimento
humano.
Neste capítulo, comentarei os distintos aspectos desta definição, para
uma maior compreensão.
37
para o acesso da cidadania aos benefícios e serviços de bem-estar
financiados com fundos públicos. A coesão social, portanto, era
considerada como um resultado do desenvolvimento econômico,
entendido fundamentalmente como crescimento da renda. Esta é
básica para poder aumentar os impostos e financiar os serviços
públicos de saúde, serviços sociais, educação, cultura etc., que geram
bem-estar social e educação. Neste esquema próprio do modelo de
crescimento da sociedade industrial, ao situar o desenvolvimento
econômico como principal prioridade, justificou-se a sua busca por
qualquer meio, não somente suspendendo os direitos sociais, mas
também os direitos democráticos. O importante e fundamental era que
houvesse investimento, especialmente em infraestrutura, tecnologia e
grandes equipamentos que incrementassem a produtividade.
Na atualidade, o tema está passando por grandes transformações. O
conceito de coesão social foi ampliado e, paralelamente com o
surgimento da sociedade-rede ou do conhecimento, a coesão social
começa a ser entendida como um fator prévio ao desenvolvimento
econômico e social sustentado e sustentável. Vejamos ambos os
aspectos.
O escritório de coordenação do programa Eurosocial observa: “De uma
perspectiva individual, a coesão social supõe a existência de pessoas
que se sentem parte de uma comunidade, participam ativamente em
diversos âmbitos de decisão e são capazes de exercer uma cidadania
ativa.” 23 Acrescenta três novos elementos à coesão social: sentimento
de enraizamento, cidadania ativa e participação social.
No mesmo sentido do programa mencionado, a organização do
governo britânico I&DEA24 define uma comunidade socialmente coesa
através de quatro características:
1. Tem uma visão e um sentimento de enraizamento
compartilhado.
2. A diferença de circunstâncias, ambiente e culturas é valorizada
como um fato positivo.
3. Independentemente do seu ambiente, as pessoas têm
oportunidades de vida semelhantes.
4. Desenvolve relações fortes e positivas entre pessoas de
ambientes muito diversos, quer seja no trabalho, na escola ou
no bairro.
Neste ponto, e considerando que o programa Eurosocial e, em especial,
o I&DEA definem a coesão social pela qualidade, complexidade e
diversidade das relações entre os cidadãos e vizinhos, antecipo uma
tese: a coesão social, entendida como atributo de relações sociais,
deve ser considerada como fator-chave e desencadeante do
desenvolvimento humano. Isto é, mais do que resultado da distribuição
de renda ou acesso a equipamentos e serviços financiados pelo
desenvolvimento econômico anteriormente ocorrido no território,
defendo que é preciso existir coesão social prévia, concebida como
condição para que ocorra um desenvolvimento territorial endógeno,
sustentável e sustentado no tempo.
23
Ver Fundación Internacional y para Iberoamérica de Administración y Políticas Públicas – FIIAPP,
Documento de discussão da Jornada “A coesão social: um desafio para a Europa e América
Latina”, 2007, p. 1.
24
Ver www.idea-knowldege.gov.uk
38
De fato, como consequência do aparecimento da sociedade-rede ou
sociedade do conhecimento, que transformou tanto a concepção do
desenvolvimento econômico como a do desenvolvimento social,
constatou-se que não são as infraestruturas que geram o crescimento
econômico e a renda. Estas impactam a sociedade gerando
produtividade e alto valor agregado apenas se inseridas na
organização de redes sociais e empresariais. Este novo enfoque serviu
para demonstrar a caducidade do ponto de vista anterior, e pode ser
mostrado que o fundamental e prioritário é conseguir o avanço da
coesão social, entendida como capacidade de organização e ação. Ao
propiciar a utilização dos recursos físicos e humanos disponíveis, ela é
que é capaz de gerar atualmente, por si mesma, não apenas um maior
desenvolvimento da produtividade, e consequentemente da renda e
dos serviços públicos, mas do desenvolvimento humano em geral, uma
vez que promover a coesão de uma sociedade exige democracia e,
naturalmente, sustentabilidade, isto é, capacidade de regeneração dos
recursos do entorno territorial.
A melhoria da capacidade de organização é um valor intangível, com
maior impacto no desenvolvimento humano.
Por desenvolvimento humano (econômico, social, cultural, sustentável
e democrático) de um território, na atualidade, se entende, sobretudo,
alcançar um diferencial entre o que uma sociedade faz e o que é capaz
de fazer em relação ao seu entorno econômico e social. Pode-se objetar
que esta definição é também válida para outros períodos históricos, o
que é absolutamente certo. Entretanto, o predomínio do enfoque do
pensamento da sociedade industrial e dos governos gestores e
provedores, que atribuía o desenvolvimento econômico às
infraestruturas e equipamentos, dificultava visualizar outros fatores
que atualmente podemos identificar. Com as lentes da antiga
concepção, não se podia observar a amplitude dos fatores que geram o
desenvolvimento e, em especial, a importância da capacidade de
transformação da própria sociedade. Como explicaria Einstein, é
preciso um novo enfoque para conseguir um avanço nas ciências,
neste caso, na teoria do desenvolvimento.
As infraestruturas, podemos afirmar claramente, são importantes para
o desenvolvimento econômico, mas não são estritamente necessárias
e em absoluto suficientes. O desenvolvimento depende da capacidade
de organização e ação de uma sociedade. Em outras palavras, da
capacidade de articular seu potencial humano e o capital físico com a
finalidade e objetivo de promover o progresso de modo amplamente
compartilhado. Do mesmo modo que existe uma capacidade de
organização adequada, é possível identificar projetos de capital físico
adequados para melhorar sua competência e a geração de valor. O
esquema é o seguinte:25
25
J. M. Pascual Esteve em La Gestión Estratégica de las Ciudades: Un instrumento para Gobernar
las Ciudades en la Era Infoglobal. Sevilha: Junta de Andalucía, 2002.
39
DESENVOLVI MENTO
TERRI TORI AL
CAPACI DADE DE
CAPI TAL FÍ SI CO E HUMANO
ORGANI ZAÇÃO
40
ao serem capazes de combinar os diferentes interesses e
desafios de objetivos comuns e socialmente úteis.
A estratégia territorial exige o compromisso de ação por
parte dos principais atores do território para desenvolvê-la.
Porém, a partir de uma posição de atores entendidos como
organizações coerentes em si mesmas, com relações entre
elas frequentemente conflitantes, é necessário um processo
de construção de redes até que os compromissos concretos
de ação sejam alcançados. Isto a partir de uma situação
inicial distinta em cada território, até que as relações entre
os âmbitos público e privado, entre administração e
sociedade sejam situadas no terreno da corresponsabilidade.
Este processo de melhoramento relacional27 deve ter um
tratamento coordenado, mas, logicamente, diferenciado do
processo de definição da estratégia territorial. O resultado
do processo é conseguir a identificação de uma estratégia
concreta com um compromisso claro de ação.
Uma cultura de ação e compromisso cívico distanciada tanto
da cultura da satisfação quanto da queixa, do burocratismo
e do niilismo. A cultura de ação deve proporcionar:
• Um sentimento de enraizamento e identificação
com a cidade ou região. Dispor de um sentido
coletivo aberto, não fechado.
• Atitude aberta, tanto à inovação como à
integração social e cultural de novas pessoas e à
inserção em estratégias territoriais mais amplas
que o próprio município, a própria região e nação.
• Esperança realista no futuro, que permita ver
além da realidade, se esta é sombria (“Queremos
promessas, não mais a realidade”, diziam os
argentinos durante uma de suas crises
econômico-financeiras), e que gere expectativas
racionais nas inversões de capitais e nos esforços
humanos.
• Legitimação e reconhecimento social da figura da
pessoa e instituição promotora.
• Respeito e confiança na atuação dos outros
atores, que é a base para a geração do capital
social.
O apoio social e a participação cidadã. As estratégias e os
principais projetos estruturantes devem dispor de um
importante apoio social, e este será mais efetivo se a
participação cidadã for estimulada e garantida, entendida
em dois sentidos: como garantia de que seus principais
desafios e expectativas serão considerados nas estratégias,
e como condição para sua responsabilização e envolvimento
social gerador de capital social.
27
Ver a respeito X. Mendoza, “Las transformaciones del sector público en las sociedades
avanzadas: Del Estado del Bienestar al Estado Relacional”, Papeles de Formación de la Diputación
de Barcelona (1996) e A. Vernis, “La relación público-privada en la provisión de servicios
sociales”, Papeles de Formación de la Diputación de Barcelona (1995).
41
A existência de lideranças formais e informais entre os
atores institucionais-chave, com capacidade de aglutinar e
representar a maioria dos interesses, pactuar e respeitar
institucionalmente suas decisões. A liderança principal deve
corresponder, como já assinalamos, à instituição mais
democrática, isto é, a escolhida por toda a cidadania. Do
contrário, nos encontraríamos com uma liderança
corporativa a partir da qual não é possível construir o
interesse geral, uma vez que se reduz ao corporativo. Como
assinala J. Subirats, “o grau de liderança das instituições
representativas no processo de governança das
comunidades vai derivar de sua capacidade para envolver o
restante dos atores, agentes e pessoas presentes na
sociedade na construção de um modelo de futuro
compartilhado”.28
A articulação de políticas regionais e locais. Trata-se de
conceber a região como sistema de cidades e municípios,
com capacidade de:
• Combinar as políticas regionais e locais com
objetivos e instrumentos no conjunto do território,
com as estratégias locais com capacidade de dar
especificidade e integridade ao conjunto de
ações, fortalecendo a cooperação pública e a
colaboração cidadã.
• Articular os municípios não a partir de uma
organização territorial fixa, mas de uma maneira
flexível e adaptável em função do projeto-rede.
Quer dizer, dos territórios que abarcam o
desenvolvimento do projeto.
• Dispor de regras de jogo formais e informais que
pautem a interação entre administração regional
e as municipais, assim como as intermunicipais.
A habilidade de uma cidade para posicionar-se frente ao
futuro. Isto é, a capacidade de antecipar-se a novos desafios,
renovando permanentemente a estratégia, gerando novos
projetos e dando novos enfoques aos temas sociais.
28
J. Subirats, “¿Qué gestión pública para qué sociedad?. Una mirada retrospectiva sobre el
ejercicio de la gestión pública, en la sociedades europeas actuales” em Instituto de Gobierno y
Políticas Públicas. UAB.
42
A gestão relacional é o tipo de gestão pública que, no nosso caso, é
levada a cabo pelos governos territoriais para incrementar a
intensidade, qualidade e diversidade das interdependências e
interações dos atores econômicos, sociais e institucionais e os distintos
setores da cidadania. Seu objetivo é melhorar a criatividade, a
confiança, a colaboração e a cultura empreendedora e de ação cívica
do conjunto da cidadania para conseguir, coletivamente e de maneira
compartilhada e cooperativa, um maior desenvolvimento humano.
A gestão relacional é própria do que se denominou sociedades
inteligentes, ou seja, aquelas que, segundo as palavras de A. Marina,
incrementam a capacidade de criação e de solidariedade dos
cidadãos.29
Logicamente, a pretensão não é gerenciar todas as relações sociais,
mas tão somente aquelas que têm relação com a construção
compartilhada do desenvolvimento humano. Os âmbitos privilegiados
da gestão relacional entre os governos territoriais e a sociedade civil
são:
Por um lado, as relações com os agentes com maior capacidade de
transformação do território, por seus recursos e competências ou por
sua legitimação social pelo conhecimento e estatura moral. Neste
grupo encontramos:
As relações intergovernamentais: tanto entre
diferentes níveis de governo em distintos âmbitos
territoriais, como relações multilaterais entre
governos do mesmo nível territorial, sejam
intermunicipais ou inter-regionais.
As relações com grandes instituições:
universidades, centros de pesquisa e
desenvolvimento, câmeras de comércio,
fundações culturais e educacionais de prestigio,
igrejas etc.
As relações com o setor econômico privado:
setores econômicos produtivos e financeiros,
empresas de capital de risco, confederações e
associações empresariais etc.
As relações com agentes sociais e profissionais:
sindicatos, agremiações profissionais, associações
de moradores, importantes movimentos sociais
etc.
29
J. A. Marina, La inteligencia fracasada. Barcelona: Editorial Anagrama, 2004.
43
Por último, sem que neste caso signifique em absoluto baixa
prioridade:
Relações diretas com os cidadãos entre os
períodos eleitorais. É importante dispor de
múltiplos mecanismos de informação,
comunicação e deliberação tanto para conhecer
diretamente opiniões, desafios e necessidades, e
conseguir, efetivamente, que as políticas
respondam aos interesses do conjunto da
cidadania, como para fortalecer uma cidadania
ativa.
Participação eleitoral. Deve ser considerado que
são as eleições democráticas o principal e mais
decisivo modo de assegurar que as políticas
governamentais tenham em conta as
preocupações dos cidadãos. A qualidade da
representação é o que há de essencial numa
democracia e a liderança baseada na
representação é o principal fator de êxito na
governança democrática.
31
Para o desenvolvimento desta tese, ver J. M. Pascual Esteve, De la planificación a la gestión
estratégica. Barcelona: Ed. Diputación de Barcelona, 2001.
32
J. M. Pascual Esteve, La estrategia de las ciudades. Los planes estratégicos como instrumento:
métodos, técnicas y buenas prácticas. Barcelona: Ed. Diputación de Barcelona, 1990. Neste livro
exponho um conjunto de métodos e técnicas que são úteis para a elaboração de planos
estratégicos territoriais que servem como início da governança.
45
dois tipos: a gestão da dinâmica da rede, que abarca desde a
inclusão dos atores-chave ao fomento de projetos que
consolidem os interesses comuns. As técnicas de gestão de
estruturas para adequá-las aos objetivos para os quais foram
criadas e permitam fortalecer uma cultura ou uma
perspectiva comum. É particularmente útil para a gestão de
redes o uso das matrizes de atores no marco da gestão
sistêmica por objetivos.33
Gestão da cultura empreendedora e cívica da cidadania. A
tecnologia para fortalecer as características de uma cultura
empreendedora e de ação entre a cidadania é muito recente
e tive a oportunidade de sistematizar os indicadores para o
monitoramento de sua evolução através de pesquisas
aleatórias e por amostragem para o Centro de Estratégias e
Desenvolvimento de Valência (Ceyd, na sigla em espanhol).
O processo de gestão da cultura empreendedora exige, na
perspectiva da governança democrática, uma grande
transparência e um acordo democrático entre os principais
setores da cidadania para desenvolvê-la.
Não obstante, dispomos de instrumentos cujos efeitos podem
ser observados em curto prazo, muito embora sejam poucos
os resultados conjunturais. Referimo-nos às técnicas de “city
ou regional marketing” interno, ou seja, o marketing voltado
para a identificação dos próprios cidadãos com o seu
território.
A respeito do marketing interno, do ponto de vista da
governança, é recomendável o enfoque e as metodologias
propostas por T. Puig, relacionadas à criação de uma marca
do território construída de maneira coletiva e com
capacidade de convencer e comover.34 É aconselhável adotar
o posicionamento do Ceyd relativamente à gestão da
memória, cujo direcionamento deve estar voltado para a
geração de uma consciência coletiva capaz de unir tradição e
modernidade e aproveitar o passado para fundamentar
aspirações e valores democráticos e solidários para o
presente e o futuro, isto é, olhar o passado com os olhos do
futuro, tal como observava H. Arendt.35
“Coaching” para a liderança relacional. Na governança, o que
se fortalece é o valor da representação do político, e dele se
requer capacidade para escutar, dialogar, compreender,
convencer, comover e motivar para a ação coletiva e para a
responsabilização e compromisso social da cidadania.
Por outro lado, na governança os resultados da sua ação já
não são tanto os serviços, e sim o nível geral do
desenvolvimento econômico e social alcançado no território
durante seu mandato e o grau de coesão social alcançado
com a cidadania. É preciso apresentar o balanço da sua
gestão relacional, e para isso são necessárias novas formas,
novas atitudes e novas habilidades.
33
Ver J. M. Pascual Esteve La estrategia de las ciudades: métodos, técnicas y buenas prácticas.
Barcelona: Ed. Diputación de Barcelona, 1999, pp. 157-162.
34
Ver T. Puig, La Comunicación cómplice con los ciudadanos. Madri: Siglo XXI, 2003.
35
Ver J. M. Pascual Esteve, “La gestión de la memoria en la estrategia de las ciudades”. Revista
del CEYD, Valência, 2005.(www.ceyd.org)
46
As técnicas de construção de consensos. Não é necessário
insistir na importância destas técnicas na governança. De
fato, as técnicas anteriormente citadas sobre negociação
relacional e participação cidadã incluem necessariamente o
consenso. Mas existe uma grande pluralidade de
metodologias e técnicas amplamente testadas, além das
citadas, que devidamente adaptadas podem ser utilizadas
nos diferentes âmbitos em que se desenvolve esta nova arte
de governar.
O enfoque abrangente nas ciências sociais. Na governança é
necessário compreender o que diz cada ator em seu contexto
social e poder entender não apenas o que expressa, mas
como e por que o diz. A compreensão dos atores e a análise
dos conflitos a partir das distintas perspectivas das partes
são condição absolutamente necessária, embora
naturalmente insuficiente para o bom desenvolvimento da
governança. Trata-se de fazer inteligível a base subjetiva em
que repousam os fenômenos sociais; a análise objetiva
desses fenômenos é perfeitamente possível e compatível
com o fato de que as ações humanas têm um caráter
subjetivo. Este enfoque, também denominado interpretativo
da ação social, tem em Max Weber seu autor mais clássico, e
está voltado para a compreensão do sentido de uma ação
para um ator, dando a conhecer os motivos entre a atividade
objetivamente observada e seu sentido para o mencionado
ator.36
A direção sistêmica por objetivos.37 As técnicas de
administração por objetivos são um bom instrumento para a
gestão relacional. Não é este o caso da direção baseada em
procedimentos protocolizados para se chegar a um resultado,
uma vez que se trata de estabelecer objetivos comuns a um
conjunto de atores que constituem um sistema social e, de
acordo com eles, concretizar de maneira inovadora seus
objetivos através de projetos cujo gerenciamento deve ser
feito em rede.
47
“gerencialismo” como modo habitual de governar é que se acha
amplamente na consciência das pessoas o modo gerencial como a
forma correta de fazer “política” (confundindo-se a prática dominante e
o hábito com a postura correta e adequada). Considera-se que a
política demanda o cidadão (sem ter em conta que, neste caso, se
observa a lei de Say, que nos diz que a oferta, no caso a política,
condiciona a demanda) e que qualquer posicionamento transgressor do
modo de governar citado tende a ser rechaçado. A governança deve
superar estes grandes obstáculos para se constituir como modo
comum de governar os territórios.
Por isso, como qualquer paradigma social em fase inicial, a governança
só avança em experiências pontuais. Alguns poucos dirigentes políticos
inovadores, em circunstâncias determinadas, colocaram em prática
processos de governança, muitas vezes sem conceituá-los como tal.
Essas experiências devem ser objeto privilegiado de análise e
divulgação para melhorar o entendimento e possibilitar a concretização
deste modo de governar, sobretudo se com a implantação da
governança for constatado um importante progresso econômico e
social através da colaboração entre governo e sociedade civil. Em
especial, é importante para a superação dos velhos modelos políticos a
análise e divulgação dos êxitos eleitorais obtidos depois da aplicação
das políticas baseadas no novo modo de governar. Estes são os
principais caminhos para gerar um “caldo de cultura” idôneo para o
surgimento de novas experiências de governança, para romper o
obscurantismo na cultura política representado pelo gerencialismo.
A governança como modo de governar tem uma grande autonomia em
relação aos conteúdos das políticas, mas esta autonomia não é total.
Existem as condições especiais, econômicas e sociais, que favorecem
esta nova arte de governar.
Os conteúdos concretos das políticas dos governos territoriais
condicionam o bom desenvolvimento da governança. Sem dúvida, uma
opção por uma cidade compacta, não segregada, baseada na
complexidade e diversidade das relações humanas no espaço público,
favorece a gestão relacional de qualidade. O envolvimento dos
usuários e familiares nos programas voltados para o bem-estar social e
para a educação, a difusão dos valores relacionados ao sentimento de
“pertencer”, o comprometimento e a atribuição de um valor simbólico
aos espaços coletivos, para convertê-los em lugares de encontro e
convivência, são também condicionantes que favorecem o
desenvolvimento do governo relacional e da governança como modo
de governar as cidades.
Os objetivos do Movimento AERYC (América-Europa de Regiões e
Cidades) para a governança territorial têm esta tríplice finalidade:
análise e divulgação das técnicas e instrumentos de gestão relacional e
governança; boas práticas de desenvolvimento humano e êxito
eleitoral baseado na governança; e identificação de conteúdos para a
promoção da governança. Esta última, a partir da perspectiva dos
grandes desafios confrontados pelos territórios: cidades, regiões,
imigração, gestão do tempo etc.
48
3. O Governo Relacional
e a Governança se
assentam nas
mudanças sociais e na
emergência da
sociedade-rede
49
Ideias Principais
50
A mudança nas formas de governar os territórios não se justifica
apenas pela necessidade de governar aprofundando a democracia e
para alcançar maior eficácia e eficiência das políticas públicas, mas
pelo fato de que está ocorrendo uma grande transformação em nossa
sociedade que afeta a economia, a estrutura social, a organização do
espaço, a educação, a cultura e, naturalmente, a estrutura do governo
e o modo de governar.
Estamos vivendo o processo de transição da sociedade industrial para
a sociedade-rede ou sociedade do conhecimento. Isto significa uma
mudança social tão importante como foi a passagem da sociedade
agrícola e artesanal à sociedade industrial.38
A sociedade-rede assentada nas tecnologias da informação e
comunicação tem na geração do conhecimento e na inovação, a partir
da interação de diferentes agentes (pessoas, empresas, atores, setores
produtivos etc.), a principal fonte de valor agregado. A principal fonte
de produtividade é o capital cultural ou intelectual, que é gerado e
fortalecido a partir da qualidade e intensidade das interações humanas
e empresariais, ou seja, da qualidade da organização das redes. Nas
últimas etapas da sociedade industrial, predominava a organização
fordista, e uma de suas principais características era a absorção pela
empresa, na sua própria estrutura, da maioria das funções relacionadas
com a produção (marketing, assistência jurídica, comercialização etc.).
Na atualidade, e dada a necessidade de inovar permanentemente, as
empresas se especializam de maneira flexível naquilo que é a sua
atividade central e terceirizam a maior parte das atividades de apoio à
sua produção específica. Os conceitos de inovação, flexibilidade e
adaptabilidade substituíram a especialização, continuidade e
reprodução de atividades e produtos.
Neste capítulo não vamos descrever todas as mudanças que afetam a
transformação das nossas cidades. Trataremos tão somente daquelas
que atingem mais diretamente a situação social das pessoas e grupos
sociais, particularmente dos que se relacionam mais diretamente com
as políticas de bem-estar social e sua gestão por parte dos governos
locais.
No quadro seguinte, observamos as interdependências das mudanças
tecnológicas, econômicas e sociais e, muito especialmente, das
transformações sociais. Identificamos os principais desafios sociais que
a gestão estratégica das cidades deve se propor enfrentar, isto é,
aquela gestão cujo objetivo seja conduzir a cidade a patamares de
maior qualidade de vida na sociedade global da informação e do
conhecimento.
Para simplificar, só assinalamos no quadro a influência da tecnologia
nos desafios sociais, e omitimos o impacto destes desafios na
tecnologia. Não obstante, devemos ter presente que existe uma
interdependência dos distintos âmbitos estruturais e variáveis que o
conformam.
38
Ver M. Castells, La Era de la Información. Madri: Ed. Alianza, 2000. Vol.I.
51
Os desafios Sociais
Análisedetendências
Estrutura ocupacional
Nova desigualdade
Informaçãoe Economia Mercado de trabalho
comunicação Informacional Individualização das relações sociais
oudo Sociedade risco
conhecimento Nova pobreza
d
-re
Risco e vulnerabilidade
Mudanças na família
Economia Igualdadede gêneros
Global Sociedade-rede
Crise na organização dos
Importância do capital social benefícios
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Reestruturação do Estado do Crise fórmulas de intervenção
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bem-estar
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tc
52
que não o único. Nela, o fundamental é a capacidade de transformar a
informação em conhecimento. Este é o principal gerador de valor
agregado. O capital cultural não são conhecimentos concretos sobre
arte e ciências. Capital cultural é a capacidade socialmente adquirida
de produzir conhecimento partindo do acesso universal à informação.
Capital cultural é proporcionado pelo domínio da linguagem, do
conhecimento de conceitos, das técnicas de raciocínio, da faculdade de
criar e imaginar; é conhecimento e é atitude positiva em relação à
inovação e à aprendizagem constante durante toda a vida.39
O capital cultural é fruto de uma educação em sentido amplo, que
acontece na família, na escola, nas interações sociais. Depende da
intencionalidade educativa que se atribua aos processos de
socialização primária e secundária que acontecem na cidade.
Nem a igualdade de oportunidades nem a redução da pobreza podem
ser alcançadas através da garantia de acesso aos serviços básicos e
níveis de renda mínima. Isto será uma condição necessária, mas não
suficiente. Para garantir habilidades sociais, educacionais e culturais
básicas, será preciso desenvolver uma ação social global. Só assim
poderão ser dadas oportunidades à equidade na sociedade do
conhecimento.
A criação de conhecimento vem sendo o primeiro fator gerador de
renda, e o domínio social e empresarial se consolidam por esta via,
como já observado por sociólogos e economistas como J. K. Galbraith,
A. Gouldner, N. Bentham e A. Touraine. São os novos intelectuais, a
inteligência, ou uma nova classe dirigente, cujos instrumentos de
poder são a capacidade de criar e gerir conhecimentos.
Junto a este novo fator diferencial dos processos de desigualdade
contemporâneos, encontramos outras singularidades específicas. Em
primeiro lugar, a dualização da estrutura ocupacional urbana. A
terceirização nas cidades se desenvolve em dois polos muitos
diferentes, o crescimento dos serviços avançados que requer uma força
de trabalho muito qualificada e, também, o incremento do terciário de
baixa qualificação, muito relacionado com os empregos pouco
qualificados no setor de lazer e hotelaria. Porém, também empregos
relacionados com o que se denomina bolsa de empregos intensivos em
mão-de-obra. Este é o caso dos serviços de ajuda a domicílio,
assistência doméstica, lavanderia, mensagens etc. Os empregos
intermediários diminuem seu peso relativo, correlacionados com a
redução do tamanho da indústria, do impacto das tecnologias da
informação e das técnicas de gestão baseadas na reengenharia de
processos, que reduzem os postos de trabalho intermediários.
A oferta de postos de trabalho de baixa qualificação nas cidades
europeias e norte-americanas constitui um atrativo para imigrantes de
países do Terceiro Mundo, e um incentivo para empregadores abrirem o
mercado de trabalho aos estrangeiros.
39
B. Bernstein, Clases, Códigos y Control. Vols. I e II. Madri: Ed. Akal, 1988 e 1989.
53
A individualização das relações sociais e a geração de
capital social
40
Ver A. Touraine, Igualdad y Diversidad. México: F.C.E., 2001.
41
Ver C. Boix, Introdução ao livro Para que la democracia funcione. Barcelona: Ed. Proa, 2000.
42
Op. cit.
43
Ver Boix, op. cit., pp. 20-29.
55
Dizer cidades da informação e do conhecimento é o mesmo que dizer
cidades da educação, em que a educação geral aumenta notadamente
e, sobretudo, um grupo social cada vez mais numeroso dispõe de
educação superior que se recicla, necessariamente, em períodos
temporais cada vez mais curtos. Isto significa um aumento do que
Giddens denominou reflexividade social da cidadania. Nestas condições
a política democrática mais adequada é sem dúvida a que se baseia na
autonomia dos cidadãos, na sua liberdade, não apenas de eleger, mas
também de produzir a opção mais interessante. A chave consiste na
educação e na cultura de valores e solidariedade que permitam
articular a autonomia como base de uma interdependência geradora
de confiança, colaboração e sentido comunitário, potencializando de
forma equilibrada o reconhecimento de direitos com os deveres ou
responsabilidades cidadãs.
Uma sociedade educadora dificilmente é compatível com a visão de
uma gestão pública distante das preocupações e demandas dos
cidadãos, como tampouco é compatível com um sistema de garantias
de Direitos e Responsabilidades organizado com base no Estado-Nação
e concebido de cima para baixo. A democracia não apenas não corre
perigo em um mundo global na era do conhecimento, como pode ser
fortalecida e aprofundada se o governo democrático for concebido
como um governo de proximidade, capaz de articular interesses e
gerar colaboração e corresponsabilização. Ou seja, a democracia na
nova cidade significa descentralização de competências e recursos
para os governos locais, para que eles possam, como veremos,
inaugurar uma nova forma de governar baseada na gestão de redes
cidadãs.
56
pesquisas e reflexões de U. Beck.44 Este professor da Universidade de
Munique considera o risco como uma característica própria da cidade
que se volta em direção ao futuro e que rompe efetivamente com o
passado, com suas tradições e costumes. Não se trata de um risco
externo à cidade, mas de riscos produzidos pela própria cidade em
transformação, como a mudança nas relações familiares, na produção,
na nossa intervenção no meio ambiente, nos sistemas de proteção e
segurança social, na ruptura com as tradições. Trata-se de um risco
produzido pela própria cidade (desenvolvimento da indústria genética,
insustentabilidade, nova pobreza...).
Sociedade-risco significa que os conflitos sociais deixam de ser
tratados como problemas de ordem e segurança e começam a ser
considerados como problemas de risco. O que significa que não têm
soluções preestabelecidas e inequívocas, mas que se distinguem por
sua ambivalência e podem ter suas “soluções” expressas em termos de
probabilidade.
Assumir socialmente o risco significa optar por inovação45 e criação, e
buscar a segurança assumindo os riscos e abandonando as certezas da
sociedade industrial, afrontando e tentando dirigir as transformações.
Em outras palavras, trata-se de construir um projeto coletivo para dar
intencionalidade às ações dos atores urbanos que são as geradoras de
risco. Não optar por um projeto de futuro integral e integrador significa
dar mais possibilidades ao desenvolvimento, em nossas cidades, das
opções negativas de enfrentamento do risco, como o fundamentalismo
– entendido como defesa de tradições inadequadas, por não serem
mais funcionais para a garantia da qualidade de vida na cidade –, ou o
racismo, como forma de culpar terceiros pelos riscos de perda dos
costumes e tradições supostamente autóctones.
46
Ver, por exemplo, U. Beck, La democracia y sus enemigos. Madri: Ed. Paidós, 2000, e M.
Castells, La era de la información. Vol. II. El poder de la Identidad. Madri: Ed. Alianza, 2001.
58
intolerância às expressões culturais respeitosas dos
direitos humanos dos novos cidadãos.47
Em resumo, a verdadeira globalização cultural acontece nos
municípios, nas cidades, que são o espaço de relacionamento, de
encontro, de formação de amizades e inimizades entre pessoas de
diferentes origens culturais. As cidades se encontram ante um
fenômeno com novas dimensões, e não somente o seu futuro
dependerá do tipo de ação coletiva que triunfe em cada uma delas e
das possibilidades de atuação dos governos locais, como dependerá
também a convivência do planeta, que cada vez mais é um sistema de
articulação de cidades.
Mudanças na família
48
Ver E.W. Soja. “La mujer dominó las primeras ciudades”. Entrevista em La Vanguardia, 8/8/2001.
60
As transformações urbanas anteriormente apontadas, como a
individualização das relações sociais, o aparecimento de novos tipos de
família, a criação de capital social etc. estão intrinsecamente ligadas
ao processo de emancipação da mulher.
Entretanto, o mais interessante é que o movimento de mulheres tenha
se voltado recentemente para a análise da cidade – da sua morfologia
até seus conteúdos, das infraestruturas à cultura, do seu passado ao
seu futuro – e desenvolva suas perspectivas de ação a partir do ponto
de vista da mulher.
A visão da mulher perpassa a cidade em sua totalidade. 49 Os espaços
públicos, a moradia, a mobilidade, a assistência social e a saúde, a
educação e a cultura, o turismo... tudo é repensado a partir do seu
ponto de vista. Estamos diante do posicionamento mais amplo e
integrador que um movimento social jamais fez sobre a cidade,
justamente pela ampla diversidade de “papéis” que as mulheres
assumem na cidade: estudante, trabalhadora, mãe...
Por outro lado, a visão da cidade a partir da perspectiva das mulheres
integra outros pontos de vista sobre a mesma. Este é o caso da cidade
das crianças formulada pela pedagogia ativa; em sua condição de mãe
e educadora, a mulher assume a postura de forjar a cidade a partir da
condição dos meninos e meninas. Ela também assume as posições
sobre a acessibilidade defendidas pelo movimento urbano
protagonizado por pessoas portadoras de necessidades especiais, ao
coincidir no tempo as necessidades de mobilidade de todas as
mulheres no período de gestação e maternidade com as das pessoas
com problemas físicos. Assume, igualmente, as políticas por mais bem-
estar e autonomia dos idosos, em razão da sensibilidade derivada do
seu papel de guardiã da família, que a divisão social do trabalho lhe
impôs.
A emancipação das mulheres e, em especial, os avanços na igualdade
de gênero em que o homem também assume novos papéis e
perspectivas, contribuirão sem dúvida para o fato de que tanto
mulheres como homens assumam um projeto de cidade mais
equilibrada, acessível, sustentável e equitativa, isto é, um projeto de
cidade de todos.
A Cidade do Conhecimento pode encerrar o ciclo que se iniciou logo
depois que as mulheres inauguraram as civilizações, o fim da era
patriarcal, mas o mais certo é que hoje as mulheres já estão
reestruturando as relações sociais e os modos de conceber a vida
cotidiana.
Muito embora para isso a política de igualdade de gênero deva
contemplar hoje, mais do que nunca, ações positivas para os coletivos
de mulheres em posição mais desfavorável do ponto de vista da
emancipação da mulher. Em especial, o impacto na desigualdade das
mulheres imigrantes, que vivem em maior nível de pobreza econômica
e relacional associado a uma maior relação de dependência aos
homens.
49
Ver as conclusões do I Congresso das Mulheres de Barcelona. Prefeitura de Barcelona.
61
Uma nova visão do tempo e espaço
62
A centralidade dos valores na organização social
50
K. Blanchard e M. O’Connor, Dirección por valores. Barcelona: Gestión 2000, 1998.
51
A. Sen, Desarrollo y Libertad. Barcelona: Ed. Destino, 1998.
52
W. Kymlicka explica como coexistem os direitos das minorias com os direitos humanos e
também como os direitos das minorias estão limitados pelos princípios de liberdade, democracia e
justiça social. Ver seu livro La ciudadanía multicultural. Madri: Ed. Paidós, 1995.
63
grande pacto social entre todos aqueles que atuam no espaço das
interações sociais cotidianas: a cidade.
A reafirmação de valores vem, por sua vez, motivada pelo
desenvolvimento da investigação genética humana e, em especial, de
suas aplicações, do desenvolvimento de uma nova indústria e, com ele,
de um novo mercado global: o dos produtos genéticos aplicados aos
homens. Este novo setor econômico provoca, neste caso em escala
global, o estabelecimento dos valores que fundamentam um
comportamento ético e códigos de conduta que permitem diferenciar,
nas áreas da saúde e da agricultura, as aplicações benéficas das
perversas – como a criação de subespécies humanas. O
desenvolvimento desta indústria condiciona a centralidade dos valores
como guia consciente da ação humana nos âmbitos local e global.
A globalização do social
53
Dados do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD.
54
Dados da Cepal, 1998 e 2006.
64
pluralidade de vias para organizar a crescente interdependência das
distintas partes do mundo. As estratégias de ação são hoje possíveis e
devem ser dirigidas para a transformação necessária e eficaz da
organização social do mundo. Um dos principais atores desta
transformação são as cidades, e, muito especialmente, as políticas e
estratégias urbanas.
Já afirmamos que o global emerge do urbano. Por isto, com a
organização da cidade e com o modelo de desenvolvimento que nossas
cidades escolherem, é possível contribuir de maneira decisiva à
organização da sociedade futura em nível mundial. As cidades formam
uma rede de nós urbanos, com distintos níveis, com distintas funções,
que se estendem por todo o planeta e que funcionam como centro
nevrálgico da nova sociedade mundial.
Deste ponto de vista, é um erro de graves consequências sociais fixar-
se apenas nos aspectos da concorrência entre as cidades, como tantas
vezes se faz, e deixar de contemplar e fortalecer as relações de
complementaridade e colaboração entre elas.
As cidades, e em especial os governos urbanos responsáveis, devem
assumir de maneira progressiva a gestão dos processos de suas
próprias mudanças e, de maneira coordenada entre elas, o avanço na
direção de uma maior coesão social em nível continental e
intercontinental. Os governos das cidades devem articular a ação local
com a global.
Neste sentido, na primavera do ano 2000, as principais federações e
associações internacionais de cidades se reuniram em Valência a
convite do governo da cidade, no contexto do seu Plano Estratégico. Ali
criaram as bases de um movimento internacional de cidades, que inclui
as associações mencionadas ou redes mundiais de cidades existentes,
com o objetivo comum de assumir como prioridade sua ação de
globalização do social, para que as cidades assumam uma posição
relevante na construção da solidariedade mundial.
Construir uma globalização mais integradora a partir das cidades
significa que cada cidade adote uma visão ampla do desenvolvimento
urbano, tecnológico, econômico, social, cultural e educativo, guiado por
valores de sustentabilidade, equidade e pluralismo, e baseado na
colaboração e confiança entre os atores urbanos e no envolvimento da
cidadania.
Os desafios sociais urbanos que um movimento internacional e
pluralista de cidades deveria priorizar, por serem os mais comuns, são
os seguintes:
A política de moradia e, em especial, a reabilitação e
revitalização dos bairros urbanos.
A segurança cidadã que contemple aspectos de
prevenção e promoção social.
A geração de oportunidades de emprego.
A convivência na diversidade cultural.
Segundo a área de Análise e Previsão da Unesco, dar um teto digno a
todos significaria construir nos próximos 40 anos o equivalente a mil
cidades de três milhões de habitantes, ou reconstruir boa parte das
cidades existentes.
65
É necessário desenvolver políticas de moradia a preços reduzidos e
para todos, e fazer isto do modo mais sustentável do ponto de vista
ambiental. É preciso criar espaços públicos de qualidade que atuem
como lugar de encontro, convivência e colaboração entre os cidadãos,
e nos quais se pratiquem a democracia e o respeito à diversidade como
forma de enriquecimento cultural.
Os governos locais devem contribuir para reduzir e superar o apartheid
urbano. A polarização social de muitas cidades e a segregação social
do espaço urbano estão na base do surgimento dos “enclaves
privados” protegidos por forças de segurança próprias. Estes enclaves
são social e culturalmente homogêneos, como o são os subúrbios
pobres, e a ampliação de uns e outros significa o desaparecimento dos
espaços públicos que são a base da cidadania.55
Superar estes enclaves de exclusão significa proporcionar segurança
cidadã. A segurança urbana tem três componentes – os três “P” da
segurança: Proteção aos cidadãos, porém num sentido amplo. Que os
cidadãos se sintam seguros ante o delito e a violência, mas também
frente a catástrofes, enfermidades, envelhecimento etc. Para isto é
necessária a prevenção, no sentido da antecipação, mas também a
promoção social dos socialmente segregados. Devemos ter sempre
claro que são os processos de marginalização e exclusão social que
explicam em grande medida a delinquência urbana.
Reduzir as condições de exclusão significa, além disso, gerar novas
oportunidades de ocupação e de coesão no tecido social para inserir as
pessoas na comunidade. Para o primeiro, é necessário gerar
investimentos produtivos e desenvolver a educação. Educação
permanente ao longo de toda a vida para todos os cidadãos e cidadãs,
baseada nas quatro aprendizagens que o informe Delors para as
Nações Unidas aponta: aprender a fazer, aprender a conhecer,
aprender a ser e aprender a conviver.
Esta última aprendizagem é a que permite que o agrupamento de
pessoas de diferentes procedências geográficas e origens culturais
construa a nova cultura urbana, transformando com criatividade e
pluralismo cultural, e em convivência com a diversidade, o que poderia
se tornar um choque entre culturas.
Os desafios sociais urbanos são interdependentes, condicionam-se,
razão pela qual é preciso, como dito anteriormente, dar-lhes uma
solução integral em um projeto de desenvolvimento urbano. Este
projeto deve aglutinar e coordenar os esforços de todas as
administrações envolvidas, de todos os atores privados e de toda
iniciativa social que interfira na transformação da cidade. Logicamente,
a direção deste projeto deve ser exercida pelo governo democrático
mais próximo dos cidadãos, que é o que melhor pode organizar a rede
de atores envolvidos.
67
Tudo isso exige um novo posicionamento do governo local. Este deve
priorizar seu papel de organizador de uma resposta coletiva. O novo
papel do governo é o de promover e articular a construção coletiva da
cidade, especialmente do bem-estar social.
Assumir esta posição exige, como veremos, atuar em muitas direções e
dimensões. Uma delas é a dimensão política. A necessidade de
qualidade da representação política e da cidadania, o novo papel que
deve ter o político eleito com responsabilidades de governar e o tipo de
liderança que deve exercer são exigências das quais não se pode
escapar para alcançar o desenvolvimento da governança, embora em
muitas ocasiões se tenha evitado o tema e privilegiado as abordagens
técnicas, metodológicas ou da organização da participação social. Por
isso vamos tratar em detalhes estes temas nos próximos capítulos.
68
4. A revalorização da
política no Governo
Relacional
69
Ideias Principais
4. A política democrática é
entendida, prioritariamente,
como capacidade de
representação.
5. A participação é básica para
assegurar a boa representação.
70
A governança democrática requer a revalorização da política e do
político eleito, ao situar as relações entre o governo e a política de um
modo muito diferente do governo provedor e gestor e, muito
especialmente, do modo gerencial de governar.
56
Outra razão da crise da política, porém desvinculada do governo provedor, é a existência de
instrumentos políticos dos partidos, sem dúvida necessários à democracia, que não levam em
consideração a cidadania. O fato de que as cadeiras sejam em número fixo e, portanto, a
abstenção seja desconsiderada, leva a que a luta frontal entre os partidos não tenha muito em
conta a participação eleitoral e a opinião dos cidadãos. Chega-se, inclusive, a desenhar
estratégias eleitorais para aumentar a abstenção, o que é sem dúvida uma perversão. Para uma
estreita relação entre partidos e cidadania, assim como para limitar a luta virulenta pela vitória ou
a derrota apenas para o outro, talvez fosse conveniente vincular, em alguma medida, o número
de eleitos ao nível de participação eleitoral. Desse modo, havendo incremento do número de
eleitos pelo aumento da participação, existiria um motivo para os partidos colaborarem entre si e
uma maior sensibilidade em relação às preocupações cidadãs.
57
Ver especialmente o livro Desarrollo y Libertad. Barcelona: Ed. Destino, 1998.
72
Castells observou, como principal fator da evolução dos
países da antiga URSS58 para a democracia, que os
regimes autoritários não podiam fazer frente ao novo
desafio da economia informacional, que exigia liberdade
de informação para poder produzir conhecimentos e
inovação.
No mesmo sentido, Prats59 mostra como as relações
institucionais entre os atores ou, o que é o mesmo, o
modelo de interação deles, incide diretamente no
desenvolvimento econômico. O modelo de interação
revela a capacidade de inovação, a flexibilidade para a
incorporação de novos atores e a reforma das estratégias
dos atores tradicionais. O marco de interação determina a
classe de conhecimentos e habilidades necessárias para
adaptarmos à era infoglobal. As características do modelo
de interação hoje necessárias são: abertura, flexibilidade
e integração. Estas, como é óbvio, se baseiam nos
mesmos valores da democracia política.
Putnam demonstrou que a maior capacidade de
colaboração entre os atores, que é o que se denomina
capital social, nas cidades do Norte da Itália, é o fator que
explica o desenvolvimento diferenciado em relação às
cidades do Sul.60 A democracia não só facilita a geração
destas vantagens colaborativas, mas também o capital
social, ao significar participação e colaboração cidadã,
que é condição para que a democracia funcione.
O bom funcionamento das instituições facilita o
desenvolvimento econômico, como bem registrou o BID
em seu informe: “Mais além da política”, de 2000.
Concluindo, são justamente as instituições democráticas
as que melhor facilitam o desenvolvimento, ao possibilitar
uma representação efetiva e permitir o controle dos
políticos e governantes.
Em um importante estudo empírico em 90 países, entre
1960 e 1989, Rodrik61 mostrou que os sistemas
democráticos contribuíam com quatro vantagens
econômicas frente aos autoritários: a variação do
crescimento a longo prazo era menor, a estabilidade a
curto e médio prazos era maior, as crises exógenas eram
melhor controladas e o nível de salários era mais elevado.
Ainda que Rodrik não aponte, estas vantagens sem
dúvida podem ser consequência das razões antes
enunciadas.
As razões pelas quais as democracias permitem articular o
desenvolvimento econômico com equidade e sustentabilidade são
ainda mais evidentes:
As democracias, por respeito aos direitos civis e políticos
de toda a população, permitem levar em consideração os
58
M. Castells, La Era de la Información. Vol. 3. Madri: Alianza Ed., 2000.
59
J. Prats, Bolivia: El desarrollo posible, las instituciones necesarias. Barcelona: Instituto de
Gobernabilidad, 2003.
60
D. Putnam. Making Democracy Work. Princeton: Princeton University Press, 1990.
61
D. Rodrik, Democracy and Economic Performance. 1997.
73
interesses e necessidades dos grupos sociais mais
desfavorecidos. De fato, com as mobilizações dos
trabalhadores na Europa, foram incorporados os direitos
sociais aos direitos políticos e civis democráticos.
Na busca da estabilidade política, os governos
democráticos tentam estabelecer amplos acordos e
alianças sociais, para o que devem articular diferentes
interesses sociais.
Dotados de um maior poder político, os movimentos
sociais pressionaram para uma maior equidade na
distribuição da renda, no acesso igualitário aos serviços e
no respeito à sustentabilidade.
As oportunidades observadas nas democracias para impulsionar o
desenvolvimento econômico e social estão diretamente relacionadas
às possibilidades que oferecem para articular formas de interação
flexíveis e estáveis, baseadas na confiança e na cooperação, nas
possibilidades de articular diferentes interesses em amplos projetos,
na capacidade de mobilização e responsabilização da cidadania a
partir de valores compartilhados.
Em conclusão, o aproveitamento das potencialidades e oportunidades
do desenvolvimento econômico e coesão social depende da
capacidade de gestão das interdependências dos atores sociais e
institucionais. Esta gestão das interdependências é precisamente,
como vimos, o que caracteriza a nova arte de governar: governança ou
governo-rede, tal como indicou Mayntz, entre outros.62
63
M, Zafra, El Ayuntamiento como Gobierno Facilitador de Consensos. Barcelona: F. Pi i Sunyer,
2003.
75
Um novo papel para o eleito local
64
Vereador, que na Espanha tem função executiva. No original, consejal, quer dizer o que rege ou
governa. Dicionário da Língua Espanhola.
76
5. A liderança do Político
Eleito na governança
77
Ideias principais
3. A liderança representativa é
capacitadora e não dominadora.
78
Capacidade de visualizar os interesses e
habilidades da cidadania
Existe uma infinidade de definições de liderança. Covey 65 seleciona 15,
mas elas se referem, em sua grande maioria, a lideranças em
empresas e grandes organizações. Para encontrar uma definição
adequada a um líder democrático é preciso recorrer ao que há de mais
elementar. Líder é aquele que conta com seguidores. Para um líder
democrático, os seguidores são os eleitores. Portanto, a liderança
política representativa será aquela que dispõe de eleitores que
consideram que seus interesses estão representados pela política da
pessoa a quem denominamos líder.
Isto significa que um líder político representativo não é tanto o que
conhece e oferece programas atraentes para ter um eleitorado, mas
uma pessoa capaz de fazer com que os atores sociais e o conjunto da
cidadania compreendam seus verdadeiros interesses, assim como suas
capacidades, de tal modo que sejam assumidas como próprias.
Para isto devemos saber fazer a distinção entre posicionamento e
interesse. Posicionamento é a reivindicação que um ator ou um grupo
social formula para defender seus interesses. O interesse é o que o ator
social realmente busca e deseja. Frequentemente, posicionamento e
interesse se confundem. O interesse poucas vezes é claramente
identificado em um conflito social. Nele, costumam entrar em
contradição os posicionamentos, mais do que os interesses. Apenas em
relação aos posicionamentos a luta é inevitável; com os interesses, o
acordo é possível.
Vejamos um exemplo. Um grupo de cidadãos de um bairro popular se
opõe à abertura de um centro de tratamento para dependentes
químicos. E a Prefeitura, apoiada pelas associações de familiares de
pessoas dependentes e outras associações civis, não quer desistir de
implantar o centro em um dos poucos espaços adequados existentes
na cidade. A partir daqui aparecem as acusações de que uns querem
prejudicar o bairro e de que aos outros faltam compreensão e
solidariedade, e o conflito acaba tomando corpo. Na verdade, os
interesses dos dois grupos são mais complexos e diversos e poucas
vezes aparecem expressos em conflitos. Os moradores do bairro estão
preocupados com a possível desvalorização de sua região e das suas
casas, o que é muito compreensível dado o preço da moradia e os
esforços necessários para pagá-la. Também estarão preocupados pelo
possível aumento da insegurança, devido a ser frequentemente
associado, no imaginário coletivo, o consumo de drogas com a
delinquência. Possivelmente também estarão preocupados com a
sujeira, pela deterioração dos padrões de comportamento atribuída a
essas pessoas e, obviamente, pelo aumento do tráfico de drogas no
bairro e que o consumo acabe chegando a seus filhos. Por outro lado, a
Prefeitura e as associações de familiares e outras organizações sociais
consideram que é necessário que a cidade disponha deste tipo de
equipamento e canalize suas esperanças de reabilitação, e que são
poucos os locais adequados e disponíveis na cidade para tal prática.
65
S.R. Covey, El 8º hábito. Barcelona: Ed. Paidós, 2005, pp. 391 a 400.
79
Estes interesses podem ser compatibilizados em um projeto integral
que dê segurança e contrapartida aos moradores do bairro para que
seus interesses sejam assegurados. Como, por exemplo, através da
construção de elementos simbólicos, espaços públicos, subvenções
para reabilitação de construções, medidas para melhoria do trânsito,
enfim, medidas que repercutam na manutenção ou melhoria do valor
do patrimônio imobiliário dos moradores. Além disso, podem ser
tomadas medidas que assegurem a implementação de políticas que
melhorem a segurança e desestimulem o consumo de drogas e,
também, de políticas que melhorem a limpeza no bairro.
Esta tarefa de identificar, através de espaços de deliberação e
mediação, projetos que compatibilizem interesses é, sem dúvida, uma
das principais responsabilidades da liderança representativa na
governança. Esta tarefa de identificação de interesses e mediação
deve ser uma função regular do governo local, sem circunscrevê-la ao
fato de que na situação conflituosa estejam envolvidas competências
legais ou recursos municipais. Ao contrário, é necessário que este tipo
de intervenção se torne referência para a criação de espaços de
intermediação sempre que as contradições entre atores tenham
impacto na configuração física ou cultural da cidade, ou ainda na
convivência entre grupos e setores da cidadania.
A tarefa de representação cidadã com base em interesses implica,
obviamente, a criação de espaços de cidadania, de participação, nos
quais haja deliberação e construção de conhecimento mútuo, confiança
e compromisso de ação. Neste sentido, a participação é um espaço
necessário e que torna possível a representação. Nunca pode ser
concebido, na democracia, como substituto da representação cidadã.
Podemos sintetizar a liderança representativa no seguinte esquema:
Conhecer desafios,
demandas, expectativas,
interesses…
ELEITO CIDADANIA
Transmitir a
potencialidade e
capacidade de ação
(possibilitar a ação da
sociedade)
Para uma tarefa de representação cidadã que tenha por objetivo o
envolvimento da cidadania no “fazer a cidade”, o eleito precisa de
métodos de participação que o ajudem a identificar os interesses que
se escondem por trás dos posicionamentos, e que os próprios
interessados possam reconhecê-los. Por sua vez, precisa ter
capacidade de análise e conhecimento dos conteúdos, para poder
desenhar os projetos de futuro que integrem de maneira complementar
e sinérgica os distintos interesses em jogo. O importante destas
técnicas não é que o político eleito tenha um conhecimento direto das
mesmas, mas que lhe sejam proporcionadas por profissionais da
gestão relacional que, sem dúvida, nos governos relacionais terão
80
maior relevância que os gestores de serviços, para poder dar apoio ao
trabalho de liderança, que é a tarefa própria e insubstituível do político
eleito.
Entretanto, em uma tarefa de gestão relacional, e em circunstâncias
em que não há prestação de serviços públicos, é essencial a
legitimidade do político eleito, que repousa na revalorização da política
e dos políticos, no comportamento como expressão de valores éticos e
na eficácia baseada no uso de novas metodologias e técnicas.
84
quais esta construção deve basear-se. Porém, em caso algum pode se
entender que o interesse geral consiste no desenvolvimento de uma
prestação de serviços e sua gestão eficiente.
O papel do gerente é, precisamente, preocupar-se com uma gestão
eficiente, isto é, com a produtividade; porém uma produtividade posta
a serviço do cumprimento de objetivos sociais, cuja identificação tenha
sido liderada pelo representante eleito.
Em seu papel de líder capacitador, o que o preocupa,
fundamentalmente, é o significado que as coisas e projetos têm para
as pessoas. Procura que elas sejam identificadas como um direito e um
dever. Quer dizer, evitará que seja vista como favor e, muito menos,
como uma ação clientelista ou, ainda, como uma ação que provoque
dependência ou subordinação. Deve ser uma ação realizada pelo
governo que corresponda à satisfação de direitos sociais, que reverta
em maior compromisso com a autonomia pessoal e coletiva dos
cidadãos, e que esta autonomia se expresse em compromisso ativo e
solidário com o conjunto da sociedade. Já a preocupação do gerente é
fazer bem as coisas, mas no marco político estratégico e com
significado para a cidadania estabelecido politicamente.
Em última análise, a tarefa do governante eleito é articular
coletivamente a estratégia. Ou seja, “o quê” e o “quando”. E, ao
considerar esta estratégia, competências e recursos municipais, o
profissional da gestão ou o gerente estabelecerá o “como”, isto é, os
procedimentos e metodologias; e o “onde”, o lugar mais adequado
entre os possíveis.
68
Ver N. Bobbio, “Gramsci y la Concepción de la Sociedad Civil” em Gramsci y las Ciencias
Sociales. Mexico: Ed. Pasado y Presente, 1997, pp. 65-94.
85
e priorizar os valores e atitudes democráticas de fortalecimento dos
direitos humanos e as atitudes de respeito, tolerância, abertura e
criatividade. O mais importante é que hoje a democracia não pode ser
entendida simplesmente como um meio, mas como meio e fim. Por
último, já não se vê o partido como o grande organizador desse amplo
acordo social, mas sim os líderes eleitos no exercício das funções de
governo, a pessoa eleita como representante pela maioria dos
cidadãos, seja para governar o conjunto da população que vive em um
território, seja para assumir a responsabilidade de uma política setorial,
como é o caso da política de bem-estar social. Entretanto, para isto, é
imprescindível que o governante eleito não realize sua tarefa tendo em
conta apenas seus eleitores, mas todo o conjunto de habitantes do
território ou cidade, ainda que possa partir dos interesses (não dos
posicionamentos) de seus eleitores aos quais, sem dúvida, deve
corresponder à confiança nele depositada.
Estamos, pois, em sintonia com Gramsci no sentido de que, na
governança democrática, a construção coletiva do desenvolvimento
humano deve ser realizada através de valores, atitudes e
responsabilidade. A estratégia compartilhada e os projetos baseados
em um compromisso coletivo de ação estão fundamentados no
conhecimento e guiados por valores.
A direção política se refere, na governança democrática, ao governo da
pólis, isto é, ao conjunto da cidade. No estabelecimento de alguns
objetivos para a sociedade e no desenvolvimento de políticas ou
projetos para alcançá-los coletivamente. Assim como no
estabelecimento de metodologias precisas para distinguir entre
interesses e posicionamentos, e do conhecimento dos conteúdos das
políticas para poder desenhar os cenários de futuro e os projetos que
permitam articular os interesses e compromissos de ação. Para isso, o
político eleito necessita ampliar e fortalecer sua capacidade estratégica
e relacional. Não bastam a ele suas qualidades pessoais; ele necessita
de apoio e assistência técnica especializada em gestão de serviços,
procedimentos legais e administrativos. Necessita de assessoramento
específico em gestão relacional. Este tipo de assessoria, dado que se
desenvolve em um ambiente em mudança permanente, e de grande
complexidade e diversidade, precisa de serviços contratados
externamente (ainda que coordenados internamente), de think tanks,
isto é, de serviços de alta inovação política e social, que possam dar ao
dirigente apoio à sua tarefa de construir o interesse geral através da
confiança, do acordo, da colaboração e do compromisso.
86
observado anteriormente, uma das tarefas prioritárias para a
governança democrática é o fortalecimento da organização dos grupos
e comunidades vulneráveis, para que participem de pleno direito na
construção do interesse geral em seu território. Daí decorre a
importância do trabalho social comunitário como prioridade crescente
na perspectiva do futuro imediato.
Porém, como no caso do gestor ou gerente, a tarefa se inscreve no
marco das políticas de construção coletiva do bem-estar, que deve,
sem dúvida, ter como protagonista o político, o representante da pólis
ou cidade.
Podemos dizer, com toda clareza, que o agente principal de mudança,
já que não existe um agente único na democracia consolidada, é o
político eleito. É desejável que ele seja o principal líder da capacidade
de organização e ação de um território. Qualquer enfoque que coloque
em um profissional o papel de agente de mudança em uma democracia
só pode ser entendido como uma relíquia do pensamento tecnocrático
e autoritário.
69
N. Maquiavel, El Príncipe. Barcelona: Ed. Veron, 1974, p. 24.
87
A construção do interesse geral em cada política setorial, em cada
projeto, significa que é preciso entender os espaços de participação e
de deliberação cidadã de maneira ampla e muito flexível, tal como
vamos expor nos capítulos seguintes. De modo que, efetivamente,
sejam visíveis os acordos sociais, que se visualizem de maneira clara
os setores que deles se beneficiam e, muito especialmente, aqueles
setores vulneráveis cuja situação possa ser melhorada.
A liderança do representante eleito em espaços de ampla deliberação e
colaboração é, sem dúvida, uma das tarefas básicas em um governo
que se defina como relacional.
88
6. Fundamentos para
liderar a coesão social
a partir do governo
local
89
Ideias Principais
90
- Exista um processo mais intenso e extenso de redução das
desigualdades sociais e geração de novas e maiores oportunidades
vitais para o desenvolvimento de projetos de autonomia individual
ou grupal ao alcance da cidadania, independentemente de sua
procedência, origem e ambiente cultural.
Nesta perspectiva, e tendo em conta que no território se produzem
processos complexos de coesão-desintegração social, o governo local
que tenha como objetivo o desenvolvimento de um território
socialmente mais integrado deverá exercer seu trabalho em uma
dimensão dupla. Por um lado, uma tarefa de dar impulso aos fatores
que geram coesão, e, por outro, um trabalho de prevenção e
canalização de situações conflituosas, que sempre são geradas em
uma cidade ou município.
Trata-se de uma lei espanhola que garante os direitos das pessoas com necessidades especiais. A
sigla significa Ley de Integración Social del Minusválido. (Nota do tradutor)
94
Prevenção. O espaço aberto permite identificar situações de
risco que possibilitam um tratamento social. É importante
tratar os temas com sentido de antecipação para a melhora
da convivência. Por exemplo, o tratamento de grupos de
jovens “desajustados”, o aparecimento de “bêbados” etc.
Segurança. Conseguir espaços públicos seguros não significa
cercá-los nem privatizar o seu uso. Têm que ser levadas em
conta a iluminação e a visibilidade em todos os lugares, para
que gerem ambientes seguros. É preciso assegurar que os
moradores possam facilmente chamar a polícia caso
necessário.
Integração. Conseguir que as pessoas de origens diversas
participem no uso do espaço público.
De modo semelhante, estes critérios devem ser aplicados ao conjunto
dos departamentos municipais e, assim, contando com os mesmos
recursos, mas orientados por critérios sociais, sejam alcançados
avanços importantes na coesão social dos municípios.
Foi dito acima que, para liderar a coesão social, era preciso
desenvolver um trabalho em duas dimensões. Uma, desenvolver os
pilares sobre os quais repousa a coesão, e outra, prevenir e canalizar
as situações conflituosas entre diferentes grupos sociais ou setores da
cidadania.
Os processos de coesão social podem ser obstaculizados ao
aparecerem conflitos que, se forem indevidamente canalizados, levam
à segregação mútua entre setores comunitários.
A exclusão social é definida por dois componentes: uma situação social
diferenciada em função de uma ou mais variáveis (procedência
geográfica, cultural ou social, valores e crenças, opções e atitudes
sexuais, gênero, nível de renda etc.) em relação ao grupo social mais
amplo (definido em função das variáveis sociais consideradas), e uma
reação de rejeição ou segregação do grupo social mais amplo com
respeito ao minoritário em todos ou alguns dos níveis ou âmbitos de
uma sociedade (econômicos, sociais, territoriais ou políticos).
A diferença social, a desigualdade ou mesmo o desvio em relação a
atitudes e condutas predominantes e suportadas pelos costumes ou
normas geram exclusão social se não for criada uma reação social
segregacionista ou excludente. Determinadas situações sociais
condicionam, sem dúvida, o aparecimento da reação de exclusão:
elevados níveis de desemprego, a insegurança cidadã, situações de
miséria econômica e de habitação, a ocupação exclusivista do espaço
público etc. Porém, a reação excludente tem seus mecanismos próprios
de geração: desconhecimento do outro, incompreensão de atitudes e
reações, medo do diferente,72 cultura não pluralista73 etc. Em geral, a
72
Neste sentido, recomenda-se o livro de Z. Baugman, Confianza y Temor en la Ciudad. Barcelona:
Ed. Arcadia, 2006.
73
É comum os meios de comunicação difundirem a opinião de políticos e profissionais europeus
demandando que os imigrantes de terceiros países aceitem os valores e atitudes das sociedades
receptoras, do mesmo modo que os europeus deveriam assumi-las no caso de emigrarem para
seus países de origem, esquecendo que as sociedades europeias se definem como pluralistas.
95
reação social excludente é antecedida pela sistematização de
preconceitos sociais ou etiquetas que um grupo social elabora em
relação aos “outros”.
Uma ou um político que lidere processos de coesão ou inclusão social
deverá atuar, com apoio do governo municipal, de modo a antecipar
situações para reduzir as desigualdades sociais e os desequilíbrios
territoriais entre os bairros, mas também, e sobretudo, na prevenção e
redução dos obstáculos intangíveis à coesão social e dos mecanismos
que geram a exclusão social.
Pela importância deste segundo aspecto, assim como pela sua
novidade e por esta tarefa inscrever-se plenamente na gestão
relacional, são identificadas a seguir as tarefas a serem empreendidas
pelo político com responsabilidades de governo para prevenir e
canalizar os conflitos enfrentados por grupos e setores do município.
- Uma das principais tarefas é, sem dúvida, facilitar a informação
clara, documentada e confiável sobre os diferentes grupos sociais
que, por procedência geográfica e cultural, se localizam no
território. Em especial, proporcionar informação sobre as principais
contribuições positivas que o grupo em questão (e em perigo de
sofrer reação excludente) faz à sociedade e ao município em
particular, e difundi-las de maneira massiva e permanente.
- Dispor de espaços de encontro entre os principais agentes
responsáveis por processos de socialização: igrejas, universidades,
escolas, associações de moradores e de imigrantes, sindicatos de
trabalhadores e empresários, que realcem os valores e
características comuns que podem favorecer a interação e relação
estável entre setores da comunidade. Fazendo declarações
conjuntas na celebração das diferentes festividades, perante
eventos locais e externos que podem inibir a segregação mútua, e
mediando conflitos locais.
- Assegurar que todos os moradores e moradoras participem das
políticas cidadãs e municipais sobre o território, para que
acumulem o conhecimento de todo o município e articulem as
respostas às necessidades e desafios de todos os setores da
cidadania.
- Promover e fortalecer redes associativas que integrem pessoas de
diferentes procedências geográficas, culturais e sociais, com a
prefeitura atuando como liderança comunitária.
- Dispor de amplos, flexíveis e fortes vínculos entre a prefeitura e as
entidades do terceiro setor em todos os bairros do município.
- Fazer, sempre que possível, pactos para a inclusão social com todas
as forças sociais e políticas democráticas do município e, em
especial, nos temas relativos à imigração.
Estes mecanismos preventivos funcionam com grande eficácia nos
casos de aparecimento de conflitos entre grupos de vizinhos. É muito
importante que os eleitos tenham uma atitude aberta em relação ao
conflito e uma consciência clara tanto frente aos riscos como às
oportunidades. Esta é a melhor forma de prever e gerir os conflitos,
incrementando a consciência das interdependências dos grupos.
Líderes políticos sem capacidade para identificar tanto as
interdependências internas como as externas à Prefeitura e ao
96
município são um freio para as sociedades complexas e abertas em
que vivemos.
Em qualquer caso, o líder político relacional nunca buscará o domínio
dos valores e comportamentos de um grupo social sobre outros,
tampouco o isolamento ou a segregação cultural dos grupos sociais. Ao
contrário, buscará o máximo apoio e colaboração para o predomínio
dos valores que favoreçam a maior interação possível baseada na
comunicação aberta e no conhecimento e compreensão mútuos, assim
como no estabelecimento de relações estáveis entre os distintos
grupos sociais no território.
97
7. Perfil político para a
liderança
representativa na
governança: Valores,
habilidades e
atributos
98
Ideias Principais
74
K. Popper, La sociedad abierta y sus enemigos. Barcelona: Ed. Paidós, 2006.
99
Hoje há também uma crise de valores, como nas primeiras décadas do
século passado. Em especial, ressalta um questionamento generalizado
dos políticos e dos valores éticos que devem presidir a atuação da
denominada classe política democrática. Mas este lamento
generalizado de quebra moral e perda de valores não pode ser
atribuído a casos concretos de corrupção política; como observou D.
Innerarity, essas crises de valores acompanharam sempre o processo
de modernização social e política.76 Hoje, como já dito, estamos ante
uma necessidade de mudança nas formas de governar dado o
esgotamento do modelo de governar baseado na prestação e gestão
de recursos, assim como em uma forma de fazer política própria de
sociedades bem delimitadas territorialmente e integradas
politicamente no marco do Estado-nação.
As metodologias e técnicas da gestão relacional se inspiram e só
podem desenvolver-se em um contexto de valores e virtudes próprios
das sociedades abertas. De outro modo, é muito difícil identificar
estratégias compartilhadas, estabelecer a negociação relacional, ou
desenvolver o enfoque abrangente em ciências sociais etc.
A governança requer duas condições para ser considerada como um
novo enfoque em ciências sociais, e como um modo apropriado de
governar na sociedade-rede: que a verdade ou a falsidade de suas
teses principais, das bases detalhadas e explicativas, seja
demonstrável pela lógica e que suas explicações se adaptem aos fatos
e sejam, portanto, suscetíveis de prova. Porém, o fato de que este novo
enfoque de governar seja considerado objetivo ou racional-científico
não significa que esteja livre de valores, como lembra Hempel. 77 Pelo
contrário, como já observamos, existem valores e condições sociais e
econômicas que permitem um maior/menor desenvolvimento desta
teoria, tanto em nível conceitual quanto prático.
Neste sentido, deve entender-se que as políticas estão condicionadas
pelo ambiente econômico, social, tecnológico e institucional em que se
inscrevem. Porém, condicionadas não quer dizer determinadas, posto
que as decisões políticas são também fruto da liberdade e
responsabilidade de quem decide.78
A governança democrática, como seu nome indica, necessita das
regras e procedimentos democráticos e se consolidará à medida que os
valores e atitudes próprias da sociedade aberta e democrática sejam
interiorizados pela sociedade e seus líderes políticos sejam sua
expressão prática, e não apenas pelo respeito às regras do jogo
democrático. A organização atual da sociedade-rede, baseada nas
interdependências, requer um marco democrático de responsabilidades
que não pode ser assegurado de maneira centralizada nem hierárquica
pelos governos; precisa, sim, de uma responsabilidade com cooperação
entre os atores e setores da cidadania, definida e organizada de forma
plural.79
75
Ver J. Ortega i Gasset, Meditación sobre la técnica y otros ensayos. Madri: Revista de Occidente,
Alianza Ed., 2002, pp. 53-55.
76
D. Innerarity, El Nuevo Espacio Público. Madri: Ed. Espas Calpe, 2006, p. 188.
77
“A adequada solução para um problema não só exige o conhecimento dos meios técnicos, mas
também de padrões para avaliar os meios alternativos à nossa disposição; e este segundo
requisito coloca problemas reais.” Em La explicación científica. Barcelona: Paidós Ed., 2005, p.
118.
78
Ver J. Prats, “Ética del oficio político”, em Instituciones y desarrollo. Nº 14-15 Nov. 2003, pp.
205 a 209.
79
D. Innerarity, op.cit., p.199.
100
A argumentação anterior também nos serve para destacar que a
governança democrática é uma forma de governar própria de
determinadas ideologias políticas ou partidos políticos. Com efeito, a
partir da aceitação das regras do jogo democrático, qualquer opção
política pode desenvolver as metodologias da gestão relacional ou das
interdependências, uma vez que estas são objetivas. As opções
políticas, portanto, não se distinguem pelo uso das técnicas de gestão
nem pelo modo de governar adotado, mas pelos valores que
perseguem com o modo de governar, e que se expressam pelos eleitos
e representantes políticos.
No paradigma do governo como gestor do gasto público, a distinção
não se devia ao tipo de gestão, mas, sobretudo, à finalidade do gasto;
se era prioritariamente militar ou social, e se a decisão do gasto
correspondia a maior ou menor proximidade com o cidadão. Na
governança, a distinção se fará em função da prioridade acerca das
finalidades do progresso humano, seja o desenvolvimento econômico,
a equidade ou a coesão social, a sustentabilidade ou o
desenvolvimento da ética democrática ou republicana. Todos eles são
valores compatíveis e interdependentes, mas também sujeitos à ordem
de prioridade, em especial se consideramos conjunturas concretas nas
quais é preciso optar pelo que tem um valor predominante. Dito com
toda clareza, a construção coletiva e consciente do progresso humano
nos territórios será feita em função de alguns valores ou em função das
pessoas e grupos políticos que tenham sido eleitos democraticamente.
101
factíveis em que todos possam ganhar de maneira correspondente ao
esforço ou investimento.
A gestão das expectativas cidadãs é uma habilidade muito importante.
Gerar expectativas que não se realizam provoca frustração. Sua
consequência é a desmobilização da cidadania e a geração de
desconfiança política. Tão importante como a não realização efetiva
das expectativas é a percepção de que estas não se cumprem; os
resultados são os mesmos. Esta segunda modalidade é mais frequente
na realização dos projetos estruturantes na cidade, uma vez que a sua
realização não é imediata. Um projeto complexo percorre
necessariamente diferentes etapas (formulação, estudo prévio,
desenho do projeto executivo, orçamento, início de execução) que se
estendem por um tempo que pode ser excessivo e pode ter seus
avanços não percebidos. É preciso não gerar expectativas irrealizáveis,
mas também dispor de uma política de comunicação adequada para
que os avanços sejam percebidos.
Existe uma fórmula que, se bem que não seja exata, é preciso ter
sempre em conta como referência: satisfação é “igual” ou semelhante
à percepção das realizações menos as expectativas que a cidadania
tenha criado. Ou seja, quanto maiores as expectativas em relação à
percepção, menor será a satisfação ou maior será a frustração.
De todos os modos, para que uma cidade possa avançar, necessita de
expectativas razoáveis e críveis, pois do contrário não se avança. Vale
lembrar o caso extremo do lema que apareceu pintado nas ruas de
Buenos Aires quando se desvalorizou sua moeda: “Queremos
promessas, não mais realidades.” À realização de expectativas, cabe
responder imediatamente com outras novas. Para gerir expectativas é
aconselhável ter em conta, além da que acabamos de mencionar, o
caso das corridas de cachorros galgos: quando a lebre se encontra
muito longe, o galgo não corre, não avança, mas se a lebre fica mais
perto, o galgo a agarra e também não corre; é preciso situá-la a uma
distância adequada para que o galgo acredite “razoavelmente” que a
agarrará, mas não consegue alcançá-la e continua correndo. A lebre é
a expectativa e o galgo a cidade, e o que importa é que a cidade
sempre corra, sempre avance.
Iniciativa para a gestão da mudança: gerir as expectativas significa
tomar a iniciativa para começar e dar continuidade às mudanças. É
evidente que não basta apenas vislumbrar, mas iniciar os processos de
mudança para que, a partir da situação atual, se atinja a situação ou
cenário futuro considerado possível e desejável. Para isto é preciso
dotar-se de uma estratégia e colocá-la em prática. As forças de
transformação devem ser identificadas, e definidos os objetivos
compartilhados de maneira clara e factível, assim como deve ser
iniciada, de maneira exemplar e com visibilidade, a gestão da
mudança.
O desenho de processos para a participação cidadã e a realização de
acordos é uma aptidão necessária para gerir a mudança corretamente.
A participação deve assegurar o conhecimento permanente dos
desafios e necessidades dos diferentes setores para conseguir apoio
da cidadania, se a estratégia e os projetos adotados assumirem os
desafios e necessidades identificados. Os processos de mudança não
seguem trajetórias fixas; os próprios avanços introduzem mudanças na
situação de partida, o que significa que a estratégia ou projeto
102
identificado aparece com maior clareza e riqueza de matizes que, sem
dúvida, exige a reprogramação não só dos conteúdos estratégicos, mas
também dos espaços organizacionais em que se canaliza a cooperação
pública e privada e a participação.
A comunicação e motivação cidadã80 para conseguir deslanchar com
maior plenitude a capacidade de ação da coletividade. Comunicar
objetivos percebidos pela população como respostas a suas demandas,
que por sua vez são factíveis e necessários, sem dúvida convence.
Porém, a razão não basta para a ação. É preciso também canalizar os
sentimentos em uma mesma direção. Por isto, a possibilidade de
comover é inseparável da de convencer. Uma sem a outra não
consegue envolver a cidadania em seu conjunto.
A construção de alianças é condição necessária para a governança. A
identificação das interdependências dos atores é condição necessária,
porém o que é realmente crítico é passar desse reconhecimento à
construção de alianças, isto é, à geração de compromissos de ação. A
esta condução que vai da identificação de interdependências ao
compromisso chamamos de gestão relacional. Ela deve partir do
reconhecimento mútuo pelos atores de suas interdependências,
promover ou fortalecer a confiança recíproca para poder chegar a
compromissos sólidos de ação.
103
Habilidade no trato: gerar confiança significa um tratamento
respeitoso e compreensivo com os outros, e saber incorporar
todas as sensibilidades aos compromissos de ação.
Curiosidade para conhecer todos os pontos de vista: entendê-
los a partir dos contextos e situações em que são produzidos é,
sem dúvida, uma condição importante para a sua modificação a
partir da compreensão dos envolvidos e conseguir, assim, sua
compatibilização.
Aprender de maneira continuada: é uma atitude essencial para
dispor dos conhecimentos necessários para construir novos
cenários ou projetos que incorporem a grande maioria dos
interesses e pontos de vista dos atores e setores da cidadania
envolvidos.
Encontramos, também, atributos pessoais necessários a toda e
qualquer liderança, tais como integridade, serenidade,
responsabilidade, proatividade, sentido de humor, preocupação com os
demais etc. Sem dúvida, ajudam a liderança representativa como
qualquer outra atividade na vida em que se aspire a ser feliz, porém
não são específicos para a liderança própria da governança
democrática. Entretanto, é preciso levar em conta que, muito
frequentemente, confundem-se, com pouco rigor profissional, os livros
sobre liderança com receitas de autoajuda.
104
8. Os Governos Locais:
Protagonistas na era
da governança
105
Ideias Principais
106
A gestão relacional ou de redes própria da governança posiciona os
governos locais em uma situação ímpar para ser o governo
protagonista desta nova arte de governar. Dito de outro modo, o local
pode ser o nível de governo característico e chave do modo relacional
de governar. Porém, dispor de oportunidades não significa que elas
sejam aproveitadas. A identificação deste novo papel e as condições
para o seu aproveitamento são tratadas neste capítulo.
107
A prefeitura como organizador coletivo
108
O que hoje deve ser fixado é que o desenvolvimento dos territórios
depende fundamentalmente dos governos locais – municipais e
intermunicipais. Seu papel de organizador coletivo das redes e
interações sociais no território é, como já observado, sua dimensão
mais singular e influente no desenvolvimento econômico, social e
humano.
A modernização da Espanha é, sem dúvida, a modernização das suas
cidades, e o mesmo poderíamos dizer da modernização da Catalunha.82
Os governos locais na Espanha são os principais responsáveis pela
inovação urbana. É certo que a porcentagem dos recursos públicos nas
mãos das prefeituras não chega a 13% do gasto público total, e é o
mesmo desde o início da democracia, após o fim do franquismo. O
desempenho das prefeituras na Espanha na transformação das cidades
foi dado pelo seu papel relacional. De fato, os cidadãos foram aos
governos locais com suas reivindicações e demandas, e estes, ao não
disporem das competências e recursos, não puderam responder
diretamente às mesmas. A falta de resposta poderia ter levado à sua
deslegitimação, porém boa parte deles respondeu pondo em marcha o
planejamento estratégico da cidade em conjunto com os principais
atores econômicos, sociais e institucionais. Também foram feitos
planos setoriais para promover o bem-estar social, educação, esporte e
saúde etc., as agendas 21, assim como foram desenvolvidas múltiplas
experiências de participação e envolvimento da cidadania, processos
de cooperação público-privada que, sem conceituá-los deste modo,
serviram para dar início à governança.
Esta tarefa inovadora de protagonizar e articular a construção coletiva
da cidade deve ser o principal objetivo dos governos locais, que desse
modo passarão a ser o nível de governo fundamental na sociedade-
rede.
Os municípios autoinssuficientes
82
G. Clark em La gobernanza territorial: un nuevo arte de gobernar. Sevilha: Junta de Andalucía,
2007.
109
em uma temática concreta. Gerir a qualidade de vida da população de
um município também é a gestão das relações externas
intermunicipais.
111
9. A governança do Bem-
Estar Social
112
Ideias Principais
5
. O apoio social às estratégias e
políticas.
113
O Bem-Estar Social: vanguarda da governança
116
Políticas Bem-estar Políticas Bem-estar
Social Social
Damos-nos conta de que a prestação de serviços públicos deve
impactar o desenvolvimento comunitário, e, por isto, o envolvimento
social é um critério essencial para abordar a eficácia dos serviços na
perspectiva da governança.
A eficiência se relaciona diretamente, na governança, com o custo dos
serviços que não são eficazes. Quer dizer, que incidem diretamente
tanto na satisfação das necessidades dos usuários como no
desenvolvimento da capacidade da comunidade no território em que se
situam.
Em qualquer política pública em um governo relacional, a governança –
e, naturalmente, a área de bem-estar social – responderia ao seguinte
esquema:
Âmbito legal-
(1)
burocrático
(2)
Provisão e
Gestão relacional ou gestão de
(1)
(3)
estratégica recursos
Capacidade de
organização do território
Progresso econômico e (1) A posição da função de âmbito legal gerida pela burocracia
social profissional e a provisão da gestão e recursos gerida por
profissinais não burocráticos são suporte da gestão estratégica.
A linha pontilhada significa que a gestão relacional e de
recursos têm que responder à legalidade e normas
democráticas.
A seta 3 significa que os recursos próprios devem articular-se
nos objetivos da gestão estratégica.
117
O âmbito relacional, que assume na governança o papel estrutural de
todas as funções de governo, é o que terá maior nível de
desenvolvimento, uma vez que consiga apoiar-se em um conjunto de
metodologias e técnicas específicas que constituem a gestão
relacional.
No âmbito da função de prestação e gestão de serviços, a passagem
do modo gerencial para a governança deve significar a promoção das
seguintes mudanças mais importantes:
De perspectiva: será contemplado, por parte do governo, o
conjunto da oferta de serviços de bem-estar social no
território.
De concepção da qualidade: será priorizada a qualidade das
redes – a intensidade e qualidade das interações entre
serviços para assegurar uma ação integral.
De contratação de serviços: importância da gestão
comunitária.
118
interdependências dos atores para atingi-los. Assim, no mesmo
município do exemplo anterior, detecta-se que o nível de cobertura
necessário é de 6%, a oferta financiada é logicamente a mesma, 2%,
mas na nova perspectiva identifica-se que outros 2% são cobertos pela
iniciativa social e privada, e, além disso, 75% da população
dependente está sob o cuidado de familiares. No novo modo de
governar, o que procede é constituir um grande acordo estratégico
entre a prefeitura, a iniciativa social e empresarial e os demais níveis
de governo para desenvolver ações coordenadas destinadas a alcançar
os 6% de cobertura necessários.
A aplicação da “Lei de Promoção da Autonomia Pessoal e Atenção a
Pessoas em Situação de Dependência”, denominada coloquialmente
“Lei da Dependência”, está significando um aumento da oferta de
serviços nos municípios. Dada a procedência distinta dos fundos
públicos, a terceirização da gestão dos serviços e o incremento da
variedade dos mesmos, torna-se necessário assegurar a coordenação e
a complementaridade da oferta de serviços. Não fazê-lo (a capacidade
de conseguir maior bem-estar pelo aumento da oferta) diminuirá em
função da muito provável fragmentação da oferta. A tarefa de liderar a
constituição de um marco referencial para a colaboração e
complementaridade dos serviços no município é um novo tipo de ação
que corresponde à prefeitura, para o que necessitará de nova
capacidade de organização.
Um objetivo se destaca de maneira especial na governança: a oferta de
serviços públicos deve contribuir para o fortalecimento da sociedade
civil e, em particular, de sua capacidade para assumir maiores
responsabilidades sociais. As políticas de oferta de serviços públicos
devem contribuir para a melhora da qualidade de vida da população
com necessidades e também dos familiares e vizinhos que assumam
tarefas de solidariedade social.
Trata-se de evitar que o compromisso social da sociedade civil seja
debilitado por uma configuração inadequada de políticas de bem-estar
social. Um exemplo de má política se produziu em alguns municípios da
Província de Barcelona, ao contratarem externamente, sem analisar as
redes sociais do território, e com fundos públicos, a figura dos
profissionais de atividades recreativas para a infância nos bairros
(monitores), cujo efeito foi o contrário do que se pretendia: destruíram
a atividade profissional, e também a voluntária, que se desenvolvia nas
paróquias e entidades de moradores. O conjunto da oferta para a
infância diminuiu. Em troca, a introdução dos serviços municipais que
dão suporte às famílias acolhedoras, denominadas “respir”,∗ está
favorecendo a incorporação de pessoas acolhedoras e a qualidade de
sua atenção, ao disporem de diversas atividades para as pessoas
assistidas. Deste modo, familiares e voluntários acolhedores podem
combinar suas atividades cotidianas com a solidariedade familiar e de
vizinhos.
Centros de descanso de curta permanência para idosos ou pessoas com problemas físicos ou
psíquicos, para dar um tempo para "respirar" aos familiares que se encarregam do seu cuidado,
para permitir-lhes tirar férias, alguns dias de descanso ou mesmo um dia para cuidar de algum
assunto pessoal. (Nota do tradutor)
119
O novo modo de governar implica integralidade na concepção das
necessidades das pessoas e, portanto, precisa da articulação do
conjunto de serviços para que representem uma oferta de qualidade.
Em outras palavras, que o conjunto de serviços públicos e de iniciativa
das organizações sociais possa cobrir todas as necessidades das
pessoas, no caso em que elas sejam de natureza pública – objetivo das
políticas sociais.
Uma pessoa com necessidade de assistência em um momento
determinado pode precisar de ajuda domiciliar e teleassistência. Em
outro momento, pode precisar do seu ingresso em um centro de
descanso, ou em uma residência assistida e, outra vez, de uma
assistência domiciliar etc. A atenção integral, portanto, precisa de uma
coordenação de serviços baseada na qualidade. Dado que a oferta de
serviços para propiciar a atenção integral em um município se acha
fragmentada em uma pluralidade de instituições, torna-se necessário o
estabelecimento de uma marca que englobe o seu conjunto.
Na Espanha, as autoridades portuárias são exemplos do bom
funcionamento de uma marca. Os portos precisam, para sua
competitividade, assegurar objetivos, como garantir, por exemplo, que
um carregamento de calçados chegue a seu destino no prazo de sete
dias. Para conseguir isto, um porto precisa coordenar a ação de
diferentes operadores e atores, tanto na cidade de origem como no
destino: consignatários, transportadores, agentes aduaneiros,
empresas de contêineres, estivadores, rebocadores, operadores
ferroviários, entre outros.
Para alcançar tal coordenação, organiza-se uma marca de qualidade. A
marca tem um conselho de direção formado pela autoridade portuária,
o Estado e a prefeitura da cidade. Os operadores também integram a
marca, desde que cumpram uma série de condições e compromissos
operacionais. Por sua vez, os clientes que contratam os serviços da
marca têm a garantia do cumprimento dos mesmos. Em caso de
descumprimento por parte de algum operador, a marca impõe as
sanções previamente estabelecidas e, se reiterada a falha, cabe a sua
expulsão.
Para a articulação de serviços, a qualidade é insuficiente – o
procedimento das normas ISO e a metodologia EFQM se centram na
qualidade no interior de cada serviço. As marcas de qualidade podem
exigir de cada operador tais normas, mas elas garantem a qualidade
de cada serviço e, também, a sua coordenação.
Em uma oferta de serviços de bem-estar social, cada vez mais ampla e
fragmentada, é preciso uma ação dos governos locais apoiados pelos
demais níveis de poder para promover e dirigir uma marca de
qualidade em um território.
Uma marca de qualidade em serviços de bem-estar social deverá, no
mínimo, dispor dos seguintes elementos:
Um serviço de recepção de novos sócios que solicitem
ingressar na marca de qualidade.
Exigências mínimas de funcionamento interno para cada um
dos serviços distintos incluídos na marca.
120
Uma identificação dos compromissos de coordenação entre
cada tipo de serviço.
Um serviço de queixas e reclamações próprio da marca de
qualidade para usuários, familiares e vizinhos.
Uma normativa de bonificações e sanções, inclusive
expulsão, para os serviços que não cumpram as regras.
Uma política de comunicação e divulgação da marca de
qualidade para a cidadania e entidades sociais.
As marcas de qualidade são, sem dúvida, um claro instrumento de
gestão relacional, de governança. Através deste instrumento, o
governo local assume um papel de maior relevância social como fiador
da qualidade e da atenção integral do que desempenhava como
simples prestador ou gestor de determinados serviços.
Na governança, a responsabilidade pública não somente consiste em
responder pela qualidade dos serviços financiados com recursos
públicos, mas, e fundamentalmente, em responsabilizar-se pela
resposta coletiva aos desafios e necessidades sociais da população, e
garantir a qualidade da atenção integral dos usuários dos serviços.
As marcas de qualidade começam a ter uma clara expansão quando
são aplicadas no âmbito turístico, assistência sanitária, nas instalações
esportivas, no transporte coletivo intermodal de passageiros etc., e, em
breve, seguramente, serão aplicadas nos serviços de bem-estar social
na Província de Barcelona.
É preciso que se vá preparando para o futuro das marcas de qualidade
na área do bem-estar social, assim como também para organizar a
oferta de serviços com critérios de governança, isto é, para que
tenham um impacto positivo na capacidade de organização e resposta
comunitária. Deve-se iniciar de modo imediato a revisão dos critérios
de adjudicação nas licitações públicas para a contratação externa dos
serviços de bem-estar social.
121
Um critério essencial para a terceirização, que já podia ter
sido estabelecido no modo gerencial, é o de definição dos
objetivos de impacto na população usuária. A identificação
destes objetivos permite a medição posterior de resultados
nos serviços sociais, e levam a não pressupor que um
incremento de produtividade seja suficiente para aferir a
eficácia no cumprimento de objetivos de fortalecimento da
autonomia pessoal ou de inserção social. É muito importante
recordar que se eficiência é um cociente em que o
numerador é a eficácia e o denominador é o custo, no caso
em que a eficácia tenda a zero, por mais produtivos e de
baixo custo que sejam os serviços, a eficiência será zero.
Este resultado é com bastante frequência esquecido por
aqueles que se consideram entusiastas da produtividade em
serviços sociais, uma vez que, se não há resultados, de nada
serve a produtividade ou o baixo custo das atividades ou
serviços ineficientes.
Parece óbvio que, na contratação externa de serviços sociais,
o fundamental seja a existência de cláusulas perfeitamente
mensuráveis através de indicadores, tanto para identificar as
características das entidades a serem contratadas e garantir
sua responsabilidade social como para regular e controlar a
qualidade da atenção na atividade dos serviços e medir os
resultados. Ao contrário do que é hoje prática habitual, a
variável custo na contratação de serviços na área de
assistência social só deveria pontuar na adjudicação no caso
de um hipotético empate na pontuação dos critérios de
qualidade na atenção e nos resultados sociais propostos a
serem alcançados.
Só pela pequena capacidade de inovação pode-se entender
que na gestão dos serviços públicos, ainda hoje, persistam
critérios econômicos próprios do industrialismo, que, entre
outros, considera em sua contabilidade as pessoas como
gasto e os equipamentos e máquinas como ativo.
À parte deste critério de racionalidade própria de qualquer
tipo de gestão dos recursos públicos, a gestão relacional – ou
de interdependências própria da governança – exige uma
série de outros critérios para que a prestação dos serviços
repercuta positivamente na geração de tecido social, ou no
seu fortalecimento, e na adaptação à diversidade social
própria do território. Só desse modo conseguirá os resultados
essenciais e a articulação necessária com as políticas de
desenvolvimento comunitário e as políticas públicas do
território.
A coordenação com os serviços sociais e pessoais do
território para estabelecer uma cobertura na rede que
permita uma resposta integral aos desafios sociais através da
complementaridade dos serviços.
A dimensão comunitária da gestão do serviço, de tal modo
que facilite a máxima inserção dos usuários e familiares em
associações e movimentos de interesse social. São muito
destacados na Província de Barcelona os serviços geridos por
associações dedicadas à assistência a pessoas com
122
dependência física e psíquica, assim como os dedicados à
prevenção e assistência aos dependentes químicos, em que
se canaliza a participação de pessoas usuárias e familiares
para as tarefas de voluntariado para a prevenção de riscos e
à ajuda mútua.
A contribuição ao desenvolvimento da cultura cívica no
território e, deste modo, contribuir para a geração de capital
social.
Dado que “o traje não faz o monge”, não se pode concluir que as
entidades sem fins lucrativos sejam as depositárias da contratação
externa dos serviços em um governo relacional. Porém, parece
razoável que não sejam empresas ou entidades sem finalidades nem
práticas sociais, nem muito menos as que procedem de setores como
construção civil, construção de estradas, canais e portos ou com
especialidade na coleta e tratamento de resíduos sólidos, para citar
alguns exemplos reais, as que consigam maior pontuação nos
processos licitatórios de serviços sociais públicos. Esta é, no mínimo,
uma prova da confusão de critérios a que se pode chegar na gestão
pública. E, sem dúvida, constitui uma prova da permanência do modo
gerencial baseado na denominada escola da “Nova Gestão Pública”,
que optou pela imitação das empresas privadas, em vez de inovar na
gestão pública, que é do que realmente se trata.
123
A gestão de redes e a participação cidadã
125
A participação da cidadania tem um impacto básico na capacidade de
organização e ação que a gestão relacional persegue – a articulação de
uma ampla rede social e o fortalecimento do capital social.
Por capital social se entende o conjunto de redes que as pessoas
podem formar para resolver problemas comuns. São redes de
compromisso cívico como entidades esportivas, associações de
moradores e culturais etc. Quanto mais densas são estas redes,
maiores as possibilidades de que os cidadãos cooperem para gerar
oportunidades comuns de bem-estar.85 Construir capital social requer
conhecimento do “outro”, a geração e preservação da confiança e
compromisso de atuar conjunta e coordenadamente.
A participação cidadã é entendida como um conjunto de processos que
têm por finalidade o envolvimento da cidadania no desenvolvimento da
cidade, isto é, que cidadãos se sintam parte da cidade. Participação
não é, na governança, um simples processo para canalizar demandas,
sugestões ou recomendações à administração municipal. Trata-se de
que as pessoas reconheçam sua importância no passado, presente e
futuro da cidade e se responsabilizem pelo andamento da mesma.
Participação é compromisso e colaboração cidadã.
No modo gerencial de governar, também encontramos processos de
participação, mas neste caso se dirigem à administração como clientes
e usuários, para que esta melhore a prestação e gestão de recursos e
serviços. Assim, encontramos processos participativos para fazer
recomendações e sugestões em:
Análise das situações sociais.
Programas para a gestão pública.
Serviços que se adaptem às necessidades dos usuários.
Realização de serviços públicos.
Avaliação de resultados.
Na governança, estes processos são uma dimensão subordinada. O
importante é criar espaços, como fizeram muitos planos estratégicos,
em que o cidadão descortina o conjunto do território e não apenas a
oferta municipal ou pública, e se coloca em uma situação de
corresponsabilidade.
Para finalizar esta seção, é importante observar que muito
frequentemente ocorrem erros na concepção dos processos
participativos, que levam à inoperância dos mesmos e debilitam a
importante contribuição da participação cidadã à democracia local e
como dimensão que não só completa mas qualifica a democracia, que
é fundamentalmente representação. Entre os principais erros,
encontramos:
Confunde-se participação com elaboração de estratégias ou
de projetos. A elaboração de estratégias e projetos é uma
tarefa complexa e precisa, de rigor técnico e conceitual, pelo
que não se pode deixar esta tarefa aos processos
participativos. Tal como já observado, os processos
participativos devem identificar desafios e interesses, e estes
são o principal insumo para a elaboração de estratégias. O
85
Ver D. Putnam, Making Democracy Work: Civic traditions in modern Italy. Princeton: Princeton
University Press, 1993. p. 125.
126
contrário significaria obter estratégias e projetos sem
legitimação nem apoio social, e o processo de elaboração
não teria impacto na melhoria da capacidade de organização.
Atribui-se erroneamente à participação cidadã a aprovação
das estratégias e projetos. De fato, a participação irá
referendar e dar consentimento majoritário à estratégia e,
sobretudo, aos projetos. Mas a aprovação dos mesmos
depende dos atores que têm capacidade para levá-los a
termo. A aprovação participativa de projetos sem o
compromisso prévio dos atores relevantes para a sua
execução não traz a garantia de que estes serão
concretizados, com o que se produz uma importante
frustração de expectativas nas pessoas e uma desconfiança
nos processos participativos. Desconfiança que surge de
serem propostas aos participantes deliberações que não lhes
dizem respeito. Dos processos participativos podem, sim, sair
critérios de atuação que orientem a ação política e a gestão
de redes.
Juntamente com o ponto anterior, verificamos que os
processos participativos se colocam como o lugar adequado
para a tomada de decisões que correspondem à atuação dos
eleitos e, de fato, reivindicam substituir os órgãos de
representação política. Este é um erro de graves
consequências democráticas, uma vez que qualquer
processo participativo é setorial-corporativo. A convocação
para os processos participativos se subordina a temas
predefinidos e os participantes, quando muito, representam
suas organizações, e não são escolhidos pelo conjunto da
cidadania. Considerar estes processos como substitutos das
instituições surgidas de votações gerais é, sem dúvida, uma
atitude antidemocrática e só explicável em situações em que
os processos eleitorais tenham sido corrompidos.
Não se distingue com clareza duas dimensões da
participação. A participação cidadã na elaboração de políticas
municipais financiadas com recursos públicos da participação
cidadã no “fazer cidade”, em fazer parte de organizações
sociais, desportivas, culturais, de moradores etc., de adotar
comportamentos cívicos e, naturalmente, da participação
eleitoral. Ambas são importantes e se condicionam
mutuamente, mas os métodos para o seu desenvolvimento
são distintos e, sem dúvida, a segunda dimensão é
determinante.
A participação cidadã na elaboração e monitoramentos das políticas,
em condições de normalidade democrática, qualifica a democracia. Por
isto, sua finalidade deve ser concebida de tal modo que favoreça a
participação eleitoral e o interesse pelo monitoramento da política. Um
dos principais indicadores dos processos de participação cidadã
(embora não dependa apenas da participação) deveria ser o aumento
da participação eleitoral, o interesse pela política e o prestígio da figura
do representante político.
127
O apoio social às estratégias e políticas
Trata-se de uma metodologia criada pela equipe da “Estrategias de Calidad Urbana”; ver
86
www.equ.es
128
O sonho realista em relação ao futuro, se as ações individuais
são inseridas na tarefa coletiva; trata-se de valorizar a
contribuição cidadã no trabalho coletivo.
A união entre tradição e modernidade na cidade, para
articular todos os setores da cidadania em uma mesma
perspectiva de futuro, que será aquela que olhe o passado
com os olhos de futuro.
A gestão de rede de atores, combinada com um amplo processo de
participação cidadã e de apoio social, inseridos todos os três em um
marco estratégico, articula a coesão social prévia e necessária para
que se produza o desenvolvimento humano na cidade.
129
Em geral, os departamentos e áreas são definidos por
prestações de serviços: esportes, ensino, serviços sanitários e
serviços sociais. O que ocorre é que alguns não se definem pelo
tipo de benefícios e serviços que prestam, mas por objetivos de
impacto na população, e se denominam, por exemplo, saúde em
vez de serviço sanitário, educação em vez de ensino, ou
inclusão social em vez de serviços sociais etc., que são objetivos
compartilhados por outros sistemas de serviços e benefícios.
A gestão relacional vai além da transversalidade. A
transversalidade das políticas, como por exemplo a promoção
da igualdade de gênero, tem como finalidade que os
departamentos, áreas etc., isto é, as estruturas verticais,
compartilhem a consecução de um objetivo comum sem que
seja objetivo de nenhuma delas em particular. A
transversalidade exclui a gestão operacional, os órgãos
transversais não participam de projetos operacionais, apenas
monitoram o impacto produzido na sua finalidade. Todavia os
objetivos sociais de impacto, como “dar cobertura às
necessidades básicas” ou “reduzir as desigualdades em capital
educacional ou cultural”, exigem a articulação de diferentes
sistemas de benefícios: serviços sociais, serviços sanitários,
ensino, moradia etc., mas neste caso se necessita de uma
gestão de tipo operativo interdepartamental e interinstitucional;
por esta razão, fala-se de gestão das interdependências.
Estas tendências irão se configurando de maneira progressiva na
maioria dos governos locais e nos departamentos de bem-estar social
ou serviços sociais, em especial, dada a falência do modo gerencial
como consequência da mudança das condições econômicas e sociais
que o fizeram surgir.
130
Referências
selecionadas
131
Abaixo são indicadas as referências bibliográficas e páginas eletrônicas mais
diretamente relacionadas à temática do livro e possivelmente úteis ao leitor
que queira se aprofundar na mesma.
1. Bibliografia
132
europeas actuales”. Instituto de Gobierno y Políticas Públicas. UAB,
2003.
VIDAL BELTRAN, J.M. y PRATS, J. Governanza. Diálogo Iberoamericano.
Madri: INAP, 2005.
VVAA. Las democracias urbanas en Europa. Madri: INAP, 2006.
ZAFRA, M. El ayuntamiento como gobierno facilitador de consensos.
Barcelona: Fundación Pi i Sunyer, 2007.
2. Links eletrônicos
133
Josep Maria Pascual Esteve
Jose Maria Pascual Esteve
134
• Estrategia Regional y Gobernanza Territorial: La gestión de redes de
ciudades. Junta de Andalucía, Sevilla, 2004 y América-Europa de
Regiones y Ciudades.
• La gestión estratégica de las ciudades. Un instrumento para gobernar
las ciudades en la era info-global. Junta de Andalucía. Sevilla, 2002.
• La Estrategia de las ciudades. Los planes estratégicos como
instrumento: métodos, técnicas y buenas prácticas. Diputación de
Barcelona y Centro Iberoamericano de Desarrollo Estratégico.
Barcelona, 1999.
135