"Este livro é um alerta de quem não suporta mais ficar calado ante tantos descasos e atrocidades. a hora é de reagir e somente através da mobilização da sociedade contra a corrupção e a imoralidade atual é que conseguiremos vislumbrar um brasil melhor para as gerações futuras..."
Original Title
Paulino Kunrath - Não cale, Não pare Não Desista lute por um brasil melhor
"Este livro é um alerta de quem não suporta mais ficar calado ante tantos descasos e atrocidades. a hora é de reagir e somente através da mobilização da sociedade contra a corrupção e a imoralidade atual é que conseguiremos vislumbrar um brasil melhor para as gerações futuras..."
"Este livro é um alerta de quem não suporta mais ficar calado ante tantos descasos e atrocidades. a hora é de reagir e somente através da mobilização da sociedade contra a corrupção e a imoralidade atual é que conseguiremos vislumbrar um brasil melhor para as gerações futuras..."
Permitida pela autor. páginas 21 à 42 da versão original
Para adquirir este livro ou para contatos pessoais
com o autor faça através do fone/fax: (51) 3332 4175 A criminalidade é um inevitável destino?
Não adianta tentarmos tapar o sol com a peneira. O
vínculo entre pobreza e criminalidade existe, é fato. A regra é que indivíduos em situação de pobreza estarão fadados ao inevitável destino da criminalidade.
Confesse. É assim que você pensa também, não é?
A infância e a juventude das classes populares neste
País precisam de especial atenção para que possam, desde muito cedo, criar valores morais mais rígidos que reprimam os "impulsos naturais" que fazem com que se inclinem para o mundo do crime. E para isso não há outro caminho senão retirar as crianças das ruas, uma vez que o espaço que hoje chamamos de "rua" é considerado como o grande facilitador e até mesmo o promotor da entrada desses indivíduos no mundo da delinqüência. A "rua", vista sob seu aspecto negativo, é sinônimo de "escola de crime". É onde estão as tentações e perigos da criminalidade. É onde as crianças e adolescentes, sem oportunidades, encontram as grandes ofertas para se converterem em criminosos.
Mas antes de pensarmos num caminho acertado para
que esse grupo possa fugir desse "destino" é preciso traçar um breve perfil de quem são e quais as origens dessas crianças e adolescentes.
Sabemos que centenas de milhares desse contigente jo-
vem integram famílias cujo rendimento mensal é menor que um salário mínimo. Suas moradias estão localizadas em comu- nidades extremamente carentes onde, como todos sabem, o mundo da contravenção se instala. No que se refere à situação escolar, quando estão matriculados, encontraremos esses jovens cursando séries defasadas em relação à sua idade, além de freqüentarem escolas públicas. A situação ocupacional de seus pais é extremamente precária, ou seja, desenvolvem ocupações para as quais não se exige qualificação ou ainda onde não existe estabilidade no emprego. Também é expressivo o percentual de mães que trabalham em casas de famílias nos afazeres domésticos devido à baixa qualificação profissional e educacional.
Abreve análise das questões raciais aponta para um
grupo formado quase que na sua totalidade por negros e pardos, pois é notório que o acesso deles, tanto à educação formal como às ocupações que requerem maior qualificação, ainda lhes é dificultado. Até hoje a condição racial desses indivíduos na sociedade brasileira determina, sobremaneira, sua situação socioeconômica,
Mas a criminalidade é um inevitável destino?
É claro que aspectos sociais tais como a pobreza, o
desemprego e a baixa escolaridade são facilitadores, mas também não podemos esquecer que apenas uma minoria entre os pobres pratica crimes, embora não sejam apenas os que têm menor poder aquisitivo os únicos praticantes de crimes. Ao contrário, nos dias de hoje os crimes contra o patrimônio são até estatisticamente mais freqüentes em ambientes afortunados, fato que já não deve surpreender, uma vez que diariamente assistimos e lemos dezenas de matérias na imprensa nesse sentido. Mas isso é outro assunto. Não quero me perder... Embora o tema nos indigne, enoje e revolte de fato.
Considero de suma importância termos claro que o crime
é um comportamento intencional e que resulta de uma escolha do indivíduo, de sua vontade, o que torna essa pessoa responsável por sua conduta. Na verdade, pobre ou rico, aquele que pratica atos criminosos deveria ser responsabilizado pelo seu comportamento em conformidade com a Lei.
Resumindo quero alertar que a influência exercida pelos
fatores sociais é um fato, mas não podemos perder de vista que características individuais são determinantes diante da escolha entre o comportamento criminoso e aquele que é consagrado como convencional. Aquele mesmo menino que nasce na po- breza e na miséria pode se resignar e cair na marginalidade ou não aceitá-la, vislumbrando na escola e no trabalho honesto um caminho para obter uma situação favorável para si mesmo e, conseqüentemente, ganhar mais dignidade e dinheiro por mei- os lícitos.
Durante o período em que escrevo e reflito sobre esses te-
mas um crime ganhou grande notoriedade no Brasil e no mundo pela barbárie. Após um assalto, na Zona Norte do Rio de Ja- neiro, o menino João Hélio ficou preso no cinto de segurança do carro que era conduzido pela mãe e foi arrastado, durante a fuga dos criminosos, por cerca de sete quilômetros pelas ruas da re- gião. O crime chocou a sociedade brasileira e provocou o ambi- ente para a discussão de medidas enérgicas contra o crime. E mais que isso, acirrou a discussão sobre a maioridade penal, já que um dos assassinos de João Hélio tem apenas 16 anos.
E é sobre a nossa Legislação, absurda em vários
aspectos, que ouso passar a escrever, pois foram diversas as autoridades dentre as quais o Presidente da República e a Presidente do Supremo Tribunal Federal - que afirmaram que em momentos como esse, de grande comoção social, não se devem discutir medidas penais, sob pena do "calor do momento" conduzir os legisladores ao agravamento de penas.
Sinceramente, é duro ter que "engolir" essas manifestações.
Considero discutir a criminalidade dos jovens um dever de nos- sas autoridades e parece que a sociedade está saindo do seu estado de sonolência e resignação, demonstrando sua revolta contra o nosso sistema penal.
Deixarmos passar mais essa selvageria, esquecer mais
essa morte e esperarmos por uma próxima, sem que nada tenha se modificado é o que me parece um verdadeiro absurdo!
0 ECA é uma "eca"?
Apesar da idade convivo muito com meus jovens netos e ECA, além de ser a sigla do Estatuto da Criança e do Adolescente, é uma gíria muito utilizada pelos adolescentes, que remete a sen- sação de nojo, para quem desconhece a expressão.
Desde sua criação, em 1990, o ECA - Lei Federal n.° 8.069 -
obedece ao artigo 227 da Constituição Federal e adota a chamada Doutrinada Proteção Integral, cujo pressuposto básico afirma que crianças e adolescentes devem ser vistos como pessoas em desenvolvimento, sujeitos de direitos e destinatários de proteção integral.
Historicamente, a necessidade de repensar a forma de com-
preender a fase da adolescência e suas manifestações teve como marco a Convenção Internacional dos Direitos da Criança das Organizações das Nações Unidas, em 1989, influenciando sobremaneira a transformação das políticas públicas voltadas à essa população.
No Brasil, diversas foram as pesquisas e reflexões
teóricas para que juristas, políticos e educadores substituíssem o Código de Menores - que vigorava desde 1979 - e optassem pela criação do ECA.
O Estatuto conta com mais de 2ó0 artigos e garante os direitos e
deveres de cidadania a crianças e adolescentes, determinando ainda a responsabilidade dessa garantia aos setores que compõem a sociedade, tais como a família, o Estado ou a comunidade. Ao longo de seus capítulos e artigos, o ECA discorre sobre as políticas referentes à saúde, educação, adoção, tutela e questões relacionadas a crianças e adolescentes autores de atos infracionais.
A publicação do ECA e a repercussão causada pelos capítulos
referentes ao Trabalho Infantil geraram na sociedade como um todo debates acerca das conseqüências e possíveis soluções para superar algumas diretrizes contidas no Estatuto.
No que se refere à idade mínima para o trabalho, a
Constituição de 1988 já a definia em 16 anos. Proíbe em seu artigo 7o, inciso XXX, a diferença de salário, de exercício de funções e de critérios de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil. Estabelece no inciso XXXIII, do mesmo artigo, a proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre aos menores de dezoito anos e de qualquer trabalho a menor de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz. E na prática o ECA estabeleceu a obrigatoriedade de carteira de trabalho e o pagamento dos benefícios sociais a todos os trabalhadores a partir de 14 anos, estando ou não na condição de aprendiz.
Eu considero - e creio que muitos concordam comigo -
que a determinação legal da idade mínima em 16 anos para ad- missão do trabalhador menor de idade e a exigência da regula- mentação desse trabalho são práticas inviáveis em face da realidade do nosso País. A obrigatoriedade da garantia dos direitos previdenciários e trabalhistas só fez com que os próprios adolescentes fossem prejudicados devido às demissões e diminuição da oferta de empregos no mercado formal, restringindo cada vez mais as oportunidades de ocupação dessa população em atividades voltadas para o mundo profissional e para o que chamo de "produtividade sadia". E toda vez que diminuem essas possibilidades, conseqüente e assustadoramente, temos o aumento de jovens desocupados e passíveis de ingressar no mundo do crime. Na prática pode-se dizer, sem sombra de dúvidas, que saiu pela culatra uma das "boas intenções" do Estatuto da Criança e do Adolescente. O Artigo 65, que visava proteger menores de idade contra a exploração no trabalho, está perigosamente desempregando em massa adolescentes entre 14 e 18 anos.
Criar formas de ocupação dessa população, de
preferência através da inserção no mercado de trabalho, é prioridade gritante na atualidade. Ações precisam ser realizadas, quer pela iniciativa pública ou pela privada, na busca de uma formação profissional para a população infanto-juvenil, concretizando realmente o espírito de "proteção integral" do ECA.
Voltando ao tema da criminalidade do menor, o Estatuto
da Criança e do Adolescente prescreve no artigo 121: Artigo 121. A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito a condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.
Parágrafo Io Será permitida a realização de atividades externas, a
critério da equipe técnica da entidade, salvo expressa determinação judicial em contrário.
Parágrafo 2o A medida não comporta prazo determinado, devendo
sua manutenção ser reavaliada, mediante decisão fundamentada, no máximo a cada seis meses.
Parágrafo 3o Em nenhuma hipótese o período máximo de internação
excederá a três anos.
Parágrafo 4o Atingido o limite estabelecido no parágrafo anterior, o
adolescente deverá ser liberado, colocado em regime de semi- liberdade ou de liberdade assistida.
Parágrafo 5o A liberação será compulsória aos vinte e um anos de
idade.
Parágrafo 6° Em qualquer hipótese a desinternação será precedida
de autorização judicial, ouvido o Ministério Público. Destaco, em especial, o parágrafo 3o do artigo 121 do ECA. E lembro, novamente, do menino João Hélio, que teve sua vida interrompida aos seis anos de idade. Percebem que o assassino do menino, de 16 anos, sairá da "internação" no máximo aos 19 anos? Enquanto que o outro participante do crime, por ter 18 anos de idade, pegará uma pena de 20 a 30 anos por latrocínio, sujeita a progressão da pena mesmo sendo um crime hediondo ante a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.
Então, por força do ECA, colocaremos velozmente na rua
um assassino de 19 anos que voltará a praticar novos e revoltantes crimes.
Há solução? É claro que há e esta me parece simples. Re-
duzir a maioridade penal para 16 anos exigiria a alteração do artigo 228 da Constituição Federal e demandaria meses, talvez anos. Mas ajustar o absurdo artigo 121, parágrafo 3o do ECA é prioridade para que não seja banalizada ainda mais a criminalidade existente.
A sociedade brasileira não agüenta mais desfechos
como o do menino João Hélio, dentre vários outros, em que os criminosos são soltos em pouquíssimo tempo.
Não podemos permitir que a falta de condições sociais ex-
plique os crimes contra a vida e, em especial, aqueles cometi- dos com requintes de crueldade.
Defender o contrário é manter o Brasil nesse estado
diário de atrocidades, na qual se culpa e se espera pacientemente a melhoria das condições sociais. É através da convergência entre diferentes forças políticas e sociais e da reformulação da nossa legislação que diminuirá, mesmo que em parte, a criminalidade da população infanto-juvenil. Ao mesmo tempo acredito que através da inserção desses jovens em diversos tipos de experiências de formação para o trabalho, tais como cursos profissionalizantes e oficinas de produção é que daremos a "assistência" que eles precisam.
Falando curto e grosso, como dizem os gaúchos, a
criminalidade só terá fim no Brasil quando todas as crianças de 12 a 16 anos estiverem na escola ou trabalhando e quando os jovens infratores acima de 16 anos sejam tratados como quais- quer criminosos.
Que me desculpem o Presidente da República e a
Presidente do Supremo Tribunal Federal, mas é preciso mudar a legislação e o momento propício para isso é agora!
0 trabalho também é uma "escola"
Nunca me faltaram audácia e opiniões. Até hoje, já octogenário, sou assim. E sendo assim sempre busco nas expe- riências vivenciadas e no aprendizado "autônomo" subsídios para defender minhas opiniões. É por isto que peço licença aos leitores para ser opinativo.
Como já disse anteriormente, o estudo "formal" praticado
no ensino regular do Brasil, por diversos motivos, não se adapta à realidade da maioria de nossos jovens. Muitos deles gostariam de aprender uma profissão e ter, o quanto antes, sua independência financeira.
Durante minha juventude era muito comum as crianças
concluírem o que se chama atualmente de ensino fundamental, ingressarem no mercado de trabalho e atuarem em pequenas empresas familiares. Quando as famílias não tinham seu próprio negócio, os pais procuravam colocações para seus filhos nas empresas onde trabalhavam ou ainda com amigos e parentes que possuíam vagas para aprendizes. Naquela época também era corriqueiro - especialmente no interior - que as filhas mulheres de origem menos privilegiada fossem trabalhar em casas de famílias na Capital ou em residências onde a situação cultural e econômica eram mais privilegiadas. Com isso essas meninas aprendiam afazeres domésticos como cozinhar, arrumar com esmero uma casa, costurar, bordar e etc, além de vivenciar instruções de educação, tanto formal como comportamentais.
Em ambos os casos, meninos e meninas tinham desde
cedo expectativas para um futuro melhore, em muitos desses casos, esses jovens além de aprender um ofício, acabavam por concluir os estudos e ingressar na faculdade. Também poderia citar dezenas de empresas que foram fundadas por esses jovens, que desde muito cedo ingressaram no mercado de trabalho, aprendendo e convivendo com valores como responsabilidade, comprometimento e disciplina.
Afinal, o trabalho também é uma "escola". E eu diria mais:
o trabalho é uma bela escola. E este mundo não precisa apenas de "doutores". O mercado de trabalho precisa tanto de um bom pedreiro ou marceneiro como de um mestre em engenharia ou arquitetura, por exemplo.
E mesmo aqueles jovens que sofrem de fracasso escolar
-caracterizado como um baixo ou nulo rendimento - assim como aqueles que sofrem dificuldades de aprendizagem - originadas por problemas como deficiência da percepção, da atenção e da memória - podem ser estimulados a desenvolver tarefas mais primárias e necessárias, ainda hoje, no mercado de trabalho. Posso citar várias atividades como as braçais de pouca complexidade, auxiliares de limpeza e de serviços gerais, ascensorista, ajudantes de obras e tantas outras.
Convenhamos que para essas e diversas outras
atividades não há necessidade que o indivíduo seja muito letrado. E que fique bem claro que não estou aqui a defender o analfabetismo. Se neste País um analfabeto pode votar, por que esse mesmo indivíduo não pode trabalhar? Soaria simpático, mas demagógico, negar a existência de milhares de jovens nessa situação e negar-lhes sequer a oportunidade de trabalhar com dignidade, embora muitos prefiram tapar o sol com a peneira...
Eu defendo há muitos anos a idéia de cursos profissiona-
lizantes para menores carentes e é sobre esse assunto que passo a tratar a partir de agora, analisando a questão historicamente e tecendo comentários sobre como esses cursos são pouco explorados em nosso País.
O ensino profissionalizante no Brasil
Foi no século XIX que teve início a preocupação com o ensino profissionalizante no Brasil. Inicialmente esse tipo de formação ficava restrito a estabelecimentos militares e tinha como objetivo a formação de aprendizes, geralmente órfãos e des-validos.
Pelo que pesquisei, a primeira mudança marcante no con-
ceito de formação profissional surgiu com a República, quando a crise econômica mundial de 1929 repercutiu diretamente sobre as forças produtoras rurais que perderam do Governo os subsídios que garantiam a produção. A Revolução de 30 foi o marco referencial para a entrada do Brasil no mundo capitalista de produção e a acumulação de capital, permitindo com que o País pudesse investir no mercado interno e na produção industrial.
Foi essa nova realidade brasileira que passou a exigir
uma mão-de-obra especializada e, para tal, era preciso investir na educação. Em 1930 foi criado o Ministério da Educação e Saúde Pública, que impulsionou o ensino profissionalizante.
Apenas a título de curiosidade, é no processo de
industrialização que no Estado de São Paulo já encontramos instituições de ensino profissionalizantes voltadas as atividades industriais.
Com a Constituição de 1937, o Governo posicionou-se di-
ante do problema da formação profissional, estabelecendo no art. 129: "É dever das indústrias e dos sindicatos econômicos cri- ar, na esfera de sua especialidade, escolas de aprendizes, destinadas aos filhos de seus operários ou de seus associados".
Já em 1939, a partir da XXV* Sessão da Conferência
Internacional do Trabalho, o conceito de formação profissional torna-se mais abrangente, designando "todos os modos de formação que permitam adquirir ou desenvolver conhecimentos técnicos e profissionais, quer se proporcione esta formação na escola ou no local de trabalho".
Em janeiro de 1942, pelo decreto-lei 4.048 do então
presidente Getúlio Vargas, surge o SENAJ para atendera uma necessidade premente: a formação de mão-de-obra para a incipiente indústria de base. Em 1946, foi criado o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial- SENAC, instituição de educação profíssional aberta a toda a sociedade, que oferece cursos e programação que vão desde a formação inicial até a educação superior, íbsteriormente vieram outras instituições, com grande autonomia, visando o ensino profissional do jovem, assumindo o empresariado os encargos que julgo ser obrigação do Estado.
Volto a insistir que a educação no Brasil ainda não é
tratada como deveria muito embora esse assunto seja amplamente debatido pela sua importância para o desenvolvimento do país e sucessivos governos vêm negligenciando a necessidade de se investir na qualidade do ensino. Não vejo avanços nessa área. Aliás, estudos recentes demonstram que o ensino cada vez mais decaiu, em termos de qualidade. É fácil perceber que estamos muito longe do ideal. Enquanto alguns países vizinhos têm entre 35 e 40% da população nas universidades, o Brasil tem apenas 18% e isso decorre da falta de investimentos em escolas públicas de qualidade além de universidades demasiado caras para os padrões brasileiros, o que por si só inviabiliza o acesso ao ensino superior de uma parcela significativa da população. E perceba que aqui não falo apenas das classes menos favorecidas. Hoje em dia é muito comum para dezenas - ou quem dirá centenas - de milhares de jovens da classe média não ter acesso ao ensino superior, caso não consigam ingressarem universidades públicas. Imaginem, então, os números nas classes menos favorecidas!
Entendo que para o efetivo combate dessa deficiência o
Governo deva investir maciçamente em escolas públicas profissionalizantes de ensino médio, pois só assim os menos fa- vorecidos teriam a oportunidade de, após concluírem o .antigo primeiro grau, fazer um curso profissionalizante que lhes garan- ta uma profissão. Dessa maneira esses mesmos jovens teriam mais chances de conseguir um emprego para arcar com os altos custos de uma faculdade.
Centenas de milhares de jovens precisam se preparar
para enfrentar o mercado de trabalho. E o que acontece, de fato? A grande maioria deles não possui condições de concorrer, já que não têm formação profissional. E por esse motivo que precisamos unir esforços para termos no Brasil escolas públicas profissionalizantes e de qualidade, que oportunizem aos menos favorecidos uma chance de disputar uma vaga no concorrido mercado de trabalho, alterando a "lógica" e o "destino" da vida de milhares de jovens.
A articulação entre o saber prático e o saber teórico é fun-
damental. Prova disso é que na Europa e no Japão o ensino mé- dio é um curso profissionalizante, formando o aluno para o mer- cado de trabalho. Para citar apenas um exemplo, na Alemanha - país que tive a oportunidade de visitar algumas vezes - um jovem só se torna um pedreiro profissional após dois anos de estudo.
Não é por acaso que países europeus e o Japão estejam
à nossa frente. O ensino profissionalizante é tão importante para o cidadão como para as nações. Pensar seriamente nisso, criando cursos e oficinas em diversas áreas, é garantia de gerar segurança aos jovens e potencial para que no futuro esses mesmos indivíduos venham a ser os novos empreendedores deste País. Só pensando e agindo nesse sentido estaremos construindo uma nova realidade para eles e, como conseqüência, para o Brasil.
Somos adultos: e agora?
A redução da maioridade civil de 21 para 18 anos é um dos pontos que causa divergências entre advogados em relação ao novo Código Civil, que entrou em vigor no mês de janeiro de 2003, substituindo a legislação em vigência desde 1916. Pela nova legislação, pessoas com 18 anos podem praticar todos os atos da vida civil, entre os quais podemos citar que não necessitam mais da autorização dos pais para celebrar nenhum tipo de contrato, podem abrir contas em bancos, casar sem consentimento, além de possuírem responsabilidade sob seus patrimônios.
Por um lado, eu acredito que o novo Código "coloca em
risco" os jovens, que podem não ter a percepção necessária para avaliar suas decisões. No Brasil, nas classes mais privilegiadas, um jovem de 18 anos, ainda está em plena fase de formação, mora com os pais, só estuda e não tem maturidade suficiente para quase nada. Mas, de outra parte, me pergunto sobre alguns reflexos do novo Código Civil no âmbito penal - pois vejo este novo parâmetro etário para fins civis (18 anos - Art. 5o) fundamental para que sejam repensados diversos institutos e dispositivos legais no âmbito criminal.
Por que me questiono? Porque há dispositivos penais
que beneficiam o menor de 21 anos e, segundo nossos legisladores, a fundamentação desses dispositivos reside na imaturidade que esse mesmo menor poderia suportar, em igualdade de condições com o delinqüente adulto, os rigores de uma condenação penal. Ou seja, em nosso País a diminuição da pena em favor do réu menor de 21 anos faz parte do processo de individualização da pena, exigido pela Constituição Federal (Art. 5o, inc. XLVI), que concebe que eles devem ficar separados dos demais condenados, receber pena menor, que a influência desse jovem frente aos adultos é mais intensa, que seu prazo prescricional deve ser menor, entre outras fundamentações.
Observamos que nem entre as leis que vigoram por aqui
há um consenso. Há, isso sim, grandes divergências, assim como é claro que existem diferenças gritantes entre os jovens de 18 anos no nosso País. Falando de forma simplória, eu diria que temos jovens nessa faixa etária que são verdadeiros "filhinhos-de-papais" e outros que já comandam quadrilhas há muitos anos.
Afinal, quando somos adultos? Em que momento isso
acontece? Aos 18 anos, na maioridade civil? Quando acabam os estudos? Quando tentos independência financeira? Quando se forma uma família?
As possibilidades são muitas e eu poderia escrever muito
sobre este tema. Mas considero que adulto é aquele ser respon- sável pelas escolhas que faz e encara as conseqüências dessas escolhas, sejam elas boas ou ruins. E essa "passagem" para nós é, também, muito dolorosa, lenta e gradual. Está na hora de encarar a vida. E a vida nos dias de hoje não está nada fácil, como veremos a seguir. 0 mercado de trabalho É preciso falar um pouco sobre conceitos eles são a base para podermos nos aprofundarem determinados assuntos. E nos dias de hoje muito se fala sobre mercado de trabalho, mas o que é mercado de trabalho? Por que é tão importante manter-se informado sobre ele? O que ele tem a ver com a escolha profissional?
Mercado de trabalho é a relação entre a oferta de
trabalho e a procura de trabalhadores e o conjunto de pessoas e/ou empresas que em épocas e lugares determinados provocam o surgimento e as condições dessa relação. Ou seja: ficar atento ao mercado de trabalho é fundamental para quem está pretendendo investir em uma profissão, em uma carreira. Entender o que se busca em um profissional atualmente, as novas regras de trabalho, as relações de competição, as exigências da globalização, entre outras coisas, fazem parte da compreensão da expressão "mercado de trabalho".
Foi-se o tempo em que os jovens apenas seguiam uma
vocação. Também se foi o tempo em que os jovens aprendiam um ofício com seus pais. Como muito já falamos, vivemos numa época cada vez mais restrita em oportunidades. E não falo ape- nas para aqueles que são menos privilegiados. As oportunidades estão escassas até para aqueles que se preparam para o futuro.
Vejamos como exemplo um caso que acompanhei de
perto. Tenho uma neta que ingressou com 16 anos numa faculdade particular de hotelaria. Forma-se neste ano e o salário das colegas que já concluíram o curso está na faixa de R$ 600,00, uma vez que nesse ramo sempre se inicia em cargos de menor expressão. Há muitas categorias e serviços prestados por pessoas sem praticamente nenhuma formação que ganham isso, ou muito mais, até. O fato é que se investe muito dinheiro e muitas vezes são infindáveis os sacrifícios - para realizar o sonho de ter um filho "doutor". Entendam "doutor" como um filho formado, com canudo. Em suma, o investimento é alto e longo e o retorno não é mais "garantido" e demora, quando chega.
Sobre esse tema li, faz poucos anos, que o ensino
superior brasileiro teve em dois anos crescimento recorde no número de instituições privadas. No período de outubro de 2001 até julho de 2003 a média foi de quase um estabelecimento particular novo criado a cada dia. Convenhamos, é realmente uma indústria. Falando francamente, na maioria desses estabelecimentos de ensino basta ter dinheiro para fazer a matrícula que se está lá dentro, porque existe oferta em níveis superiores à demanda dos que podem pagar. E pagar, apenas, não significa que teremos profissionais empregados no mercado, assim como pessoas competentes naquilo que fazem.
O número indiscriminado de faculdades, formando pro-
fissionais que muitas vezes não têm base acadêmica suficiente- mente sólida para enfrentar o duro mercado de trabalho é uma realidade nos dias de hoje. E mesmo aqueles que a tenham, ain- da assim podem ficar fora de um mercado que não absorve mais toda a mão-de-obra disponível.
E é tão simples entender isso...
0 mundo não precisa só de doutores
Eu sou um bom exemplo de que o mundo não precisa só de doutores. Para quem não sabe, aos 19 anos iniciei a realização de um sonho, trabalhando como ajudante de oficina, na cidade de Feliz/RS. Depois de seis anos de trabalho, estudos técnicos e aprimoramento profissional, concluí o curso de mecânica e fui me estabelecer por conta própria. Ao todo, foram 30 anos de trabalho e dedicação, coroados com sucesso pessoal, profissional e, porque não dizer, financeiro. Cinco filhos criados e formados, através da minha atividade de mecânico.
Mas quem sonha com um filho mecânico nos dias de
hoje? Muito poucos pais, eu garanto. A mera qualificação profissional - nos moldes em que está ocorrendo atualmente - não altera, necessariamente, as curvas estatísticas do desemprego. Observa-se que além dos milhares de "profissionais desempregados", formados por instituições como o SENAI, o SENAC e diversos cursos que o mercado disponibiliza, há também o desemprego que atinge a classe média, maciçamente e os trabalhadores com "canudos" - pois há um excedente estrutural de mão-de-obra no mundo, sobretudo em países em desenvolvimento. E esse excedente vai expulsando de campo quem tem menos conhecimento, sem dó nem piedade, mesmo sendo esta mão-de-obra dotada de maior escolaridade.
Algumas vezes, enquanto escrevo, eu mesmo
desanimo. A força da educação como promotora de inserção do trabalhador no mercado é incontestável. Seja para se formar um mecânico, assim como para dar diploma a um engenheiro mecânico. O problema também reside no mercado restritivo, se outros fatores não forem levados em conta.
Durante décadas observo que as indústrias que vão se
instalando no País não conseguem absorver o contingente de migrantes do campo, que buscam nas grandes metrópoles oportunidades de emprego. O impacto de vários fatores, por sua vez, pode ser percebido com o aumento do nível de desemprego e o crescimento da informalização nas relações trabalhistas. Também o deslocamento setorial do emprego e a transformação nos requisitos funcionais - com a exigência cada vez maior de novas habilidades e competências por parte dos empregadores - são fatores relevantes. Nada indica que o processo de transformações deste novo milênio vá resolver no curto prazo problemas como o desemprego e a exclusão social. A chegada dos novos padrões tecnológicos, as mudanças nas empresas na era da globalização competitiva elevam, substancialmente, a produtividade e, portanto, amortecem o efeito do crescimento econômico sob a geração de emprego.
I Instituições políticas e civis precisam buscar soluções
para minimizar esses efeitos. Os homens precisam, de forma racional, encontrar respostas para os problemas que eles próprios criaram. Afinal, deve haver sempre um momento em que uma porta se abre e deixa entrar a esperança para um futuro melhor.
O desemprego é uma realidade para milhões de
pessoas, tanto nos países ricos quanto nos países pobres.
Quem está iniciando a carreira profissional hoje em dia
sofre muito mais exigências do que há 50 anos. As empresas procuram profissionais qualificados, mesmo no caso de cargos mais elementares, preferindo os indivíduos que estão, no mínimo, freqüentando um curso superior.
Proponho a seguinte reflexão a todos: se o futuro nos reserva
um mundo onde nem todos terão trabalho, cumpre desde já desenvolvermos alternativas para que possamos aliviar as ten- sões sociais, com mudanças profundas na educação dos jovens, propondo novos valores - ou até mesmo recuperando os antigos para um novo tempo com mais esperança para todos aqueles que necessitam e merecem um lugar ao sol. Independente de ser essa pessoa um "doutor" ou não.
E de quem é esta responsabilidade? É o tema que me proponho
a abordar a seguir. E preciso repensar muitas coisas Um país da dimensão do Brasil precisa ser pensado globalmente e para que esse "globalmente" exista, de verdade, nós temos que pensá-lo a nível regional. E o papel do Governo Federal é criar condições para que todas as regiões do País tenham a mesma oportunidade de receber investimentos, a mesma oportunidade de se desenvolver e, portanto, a mesma possibilidade de crescer, gerar empregos e distribuir renda. Não é tarefa fácil, pois o Brasil possui oito milhões e meio de quilômetros quadrados, diferenças econômicas, diferenças políticas e diferenças culturais. Vou me deter em comentar o básico, sob pena de me perder nas críticas às políticas de redução da miséria.
Segundo dados atuais, nem o principal programa de
transferência de renda mantido pelo Governo Federal, o Bolsa Família, tem conseguido fazer frente ao problema da fome no Brasil. Fome que atinge com maior prevalência as regiões Norte e Nordeste.
Está mais do que na hora do presidente Lula apresentar
um novo projeto de desenvolvimento, com a definição de metas de crescimento econômico e de superação das desigualdades sociais. Além disso, essas iniciativas emergenciais são importantes, mas não podem serás únicas, pois é incontestável que ainda carecemos de políticas de geração de emprego e renda mais efetivas, que possam dar sustentação às necessárias alterações nas políticas públicas, no modelo econômico e na legislação tributária e trabalhista vigente.
De acordo com análise feita pelo IBPT - Instituto
Brasileiro de Planejamento Tributário, o Brasil apresenta a terceira maior carga tributária do mundo entre as maiores economias mundiais, ficando atrás somente da França e da Itália. E não podemos nos iludir: somente com um efetivo controle das despesas públicas será possível diminuir a carga tributária no Brasil.
A sociedade como um todo não pode se conformar com a
alta carga tributária, assim como não deve aceitar a livre vontade do legislador nem do Governo, que vêm incessantemente aumentando os tributos sem que haja proporcionalidade nas contraprestações. Entendam essa afirmação relativa aos serviços que o Estado deveria prestar à população. Nesse caso também vale lembrar que é importante a consciência política na hora da escolha de nossos governantes, além da fiscalização de suas ações. Cobrar atitudes e programas políticos sérios, que contenham os gastos públicos e direcionem os investimentos nos setores que realmente precisam, tais como políticas educacionais que instruam a população, gastos com a saúde e infra-estrutura.
Resumindo, é preciso redistribuir a renda nacional em
benefício do País e do povo, pois se o Estado tributar pesadamente, mas prestar à população todos os serviços públicos de que necessita, não reclamaremos tanto da alta carga tributária, que segundo estudos apresentados pelo próprio Governo, em agosto de 2006 atingiu níveis absurdos de 37,37% do PIB (Produto Interno Bruto), no ano de 2005.
Como se sabe, não é só a reforma tributária que vai trazer
um maior crescimento e aumento de contratações formais no Brasil. A questão dos encargos sociais sobre a folha de pagamento - representados em custos diretos como o salário e rendimentos, férias, 13o salário, contribuição previdenciária e FGTS - também acaba refletindo em cortes de pessoal.
Pesquisas recentes realizadas por renomadas
universidades no exterior constataram ser a legislação brasileira, em nível mundial, a que mais protege o trabalhador. Segundo essas pesquisas, a falta de flexibilidade da legislação trabalhista faz com que apenas 40% dos trabalhadores estejam abrigados pela legislação trabalhista, posicionando os demais 60% na informalidade.
Entretanto, é comum confundir os elevados encargos de-
correntes da contratação de um funcionário com as regras que regem os contratos de trabalho. É fato que no Brasil os encargos sociais extrapolam os limites do razoável, mas não podemos es- quecer que eles se prestam a cobrir o déficit decorrente da má gestão dos recursos da previdência social, aposentadorias precoces, entre outros fatores.
Para grande parte dos especialistas, o principal
problema é a própria legislação trabalhista do Brasil - uma das mais rígidas, volumosas e detalhistas do mundo. Mas a velha máxima ainda é consenso: "o salário é muito para quem paga e pouco para quem recebe".
O que ocorre na maioria dos países avançados é vermos
o trabalhador no mercado formal porque a legislação trabalhista é flexível. Já no Brasil a grande maioria cai no mercado informal porque legislação é inflexível. Na prática, a única maneira de se contratar trabalho no Brasil é através do emprego e pagando mais de 100% de encargos sociais sobre o salário. É daí que surge a maior parte do rombo da Previdência Social. Como o Estado pode atender 100% da população se apenas 40% dos trabalhadores contribuem? Essa conta não fecha e não fechará jamais.
Nada indica que as mudanças nessas áreas venham em
um curto prazo. Reformas profundas, tanto tributárias' como previdenciárias, de modo a desonerar a folha de pagamento, di- minuir os encargos, aumentar a geração de empregos e o investimento em produção parecem não fazer parte das pautas de nossos governantes. Pelo menos não existe nenhum sério e consistente projeto de reforma. O que se viu ao longo dos últimos anos são propostas casuísticas e ideologicamente comprometidas. Infelizmente.