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Entrevista Soninha Francine Subprefeita da Lapa

Quando o
mato já está
alto
Foto: Aline Scátola

2 nome da revista - 07 de maio


A subprefeitu-
ra da Lapa,
na zona
Oeste, representa
uma das melhores
Cida: Na última eleição você se
candidatou à prefeitura, ou seja,
o [Andrea] Matarazzo [secretá-
rio das subprefeituras] nisso
regiões de São Pau- pensava em políticas integrais tudo? É surpreendentemente bom.
lo. Seus moradores para a Cidade. Qual é a diferença Ele é muito... de verdade, muito sen-
têm renda mais de de se pensar políticas públicas lo- sível ao nosso drama cotidiano, que é
duas vezes maior cais na subprefeitura? receber todas as reclamações da po-
que a média do mu- Soninha: A dificuldade é a impo- pulação e ter muitos limites. Por um
nicípio e boa parte tência. É muito bom você ter estu- lado.... ele é nosso porta-voz dentro do
da oferta de empre- dado a Cidade toda e ter uma noção governo para acionar todas as secre-
go (8,77%) está ali. melhor, aperfeiçoada da inter-relação tarias. Ele tem essa noção do nosso...
A oferta de equi- entre as coisas. Por exemplo, uma das martírio diário. E ele é muito firme,
pamentos culturais discussões mais fortes dessa eleição foi muito exigente com a qualidade do
públicos represen- o trânsito e o transporte. E muita gen- serviço que a gente presta. Muito rigo-
ta 6,43% de toda te acha que para melhorar o trânsito roso com eficiência, honestidade, agi-
Cidade, segundo o em São Paulo precisa alargar as Mar- lidade. Procura melhorar os processos
movimento Nossa ginais, tapar o rio, aquela proposta do pra que as coisas funcionem melhor.
São Paulo. [Paulo] Maluf [candidato na última Ele tem uma preocupação obsessiva,
Isso não exclui os eleição pelo PP]. Mas não é lá o pro- do tipo “por que não anda? onde é
problemas. Pro- blema. O problema é o que traz tanta que está errado? É um problema de
porcionalmente, há gente para cá. Então, se você melhorar pessoal? De recurso financeiro? Re-
mais crimes vio- uma ligação entre a Freguesia do Ó e solvam. Muda o que precisar mudar”.
lentos não fatais e Santana, talvez melhore a Marginal. Isso é muito legal. Ele é muito bom
grande desigualda- Ter essa noção ajuda. Porque se o Ter- chefe de cima para baixo, nas relações
de de renda entre minal da Lapa está sobrecarregado, com as pessoas que trabalham com
negros e não ne- provavelmente o problema não está ele. Talvez ele não consiga ser tão fir-
gros. aqui, está na demanda que faz muita me e tão exigente com seus pares,
Em entrevista ex- gente ter que passar por aqui. Mas o com os outros secretários. Essa ação
clusiva, a subprefeita que adianta eu saber de tudo isso? política dele, eu acho que podia –
Soninha Franci- devia ser mais forte.
ne fala sobre o pa- Pois é, o que adianta saber de tudo
pel do órgão, políti- isso? Aí que entra um ponto superim- As subprefeituras foram criadas
ca e administração. portante: o gestor público não é só para descentralizar os serviços
um gerente, um cara que tem que da prefeitura. Isso acontece hoje?
ter um superconhecimento técni- Apesar de o órgão estar mais per-
co para lidar com os recursos. Ele é to, ele tem dificuldades de comu-
um político. É um gestor que toma nicação com a comunidade, não?
decisões, que escolhe prioridades e Olha... está ruim com as subprefeitu-
que procura influenciar pessoas. O ras, mas sem elas estaria muito pior.
subprefeito é esse cara que vai buscar Quer dizer, se daqui eu já estou longe
recursos, vai tentar conseguir ações da Vila Jaguara, imagina se não tivesse
da SPTrans, da CPTM [Companhia a subprefeitura. Mas esse órgão teria
Paulista de Trens Metropolitanos], do que ter postos avançados, ter outra
Metrô, da Sabesp. Se você for só ad- perna em cada um dos distritos. Aí
ministrar as entradas e saídas, como você tem que afinar as divisões terri-
se tudo se resolvesse numa planilha, toriais da Cidade e as duas administra-
“tá” ferrado. A capacidade gerencial é ções – municipal e estadual – deviam
superimportante. Mas é mais do que caminhar para ajustar essas divisões.
isso. E também precisa criar outras instân-
Aline Scátola cias de representação da população na
Gisele Brito
alinescatola@gmail.com E como é o relacionamento com subprefeitura, porque a Câmara Muni-
brito.gisele@gmail.com
07 de maio -Cida
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Entrevista Soninha Francine Subprefeita da Lapa

cipal não dá conta. Mas a gente con- dividida em seis distritos bem
tinua com um problema para ter ca- desiguais. Ao mesmo tempo em
pilaridade, para ter comunicação, para que tem o Jaguaré, onde 43,40%
ter presença mesmo na Cidade toda. das famílias vivem em favelas,
Muitas coisas continuam sendo cen- tem Perdizes, um bairro de clas-
tralizadas, não só na prefeitura. O que se média. As pessoas de Perdizes
existe de mídia local é a mídia impressa são muito mais organizadas, co-
e a qualidade dos jornais locais é muito bram muito mais, sabem quem faz
desigual. Em muitos casos os jornais o que na subprefeitura. Elas tem
locais têm uma ligação muito forte mais acesso aos jornais, então se fa-
com um determinado cacique político zem ouvir muito mais. Emplacam
local. Já televisão não é local e as rádios matérias nos grandes veículos. Já
locais seriam as comunitárias, mas elas a turma do Jaguara só se faz ouvir
continuam tendo toda dificuldade do nos jornais do bairro. É um barulho
mundo para se viabilizar. Então o que forte, mas não tem o mesmo efeito
a gente faz é usar a web. do que uma foto em um grande jor-
nal ou revista. Então tem uma deci-
Em um dos seus blogs você são política espinhosa, que eu não
comentou que a limpeza dos me incomodo de tomar. É preciso
lugares públicos atualmente deixar esse pessoal de Perdizes chiar
é feita sob demanda e que um um pouco mesmo. Eu sei que aqui
dos seus objetivos é sistematizar está ruim, mas lá está bem pior. Daí
o serviço. Nesse cenário, como sai a foto no Estadão e eles falam:
é que se definem as priorida- “se aqui no Sumaré está ruim, ima-
des e como está sendo monta- gina na periferia?” Pois é, lá tem co-
da essa sistematização? Como bra, não é só feio, não. Tem cobra! links em
já está pegando fogo, o jeito é apagar gabinetesoninha.
o incêndio. Não dá para parar tudo Apesar de ser uma região com blogspot.com
para se criar isso. O mato já está alto. bons índices socioeconômicos,
Tem os critérios que vem da própria você tem que lidar com as dife-
prefeitura e os de cada subprefeitura. renças... Olha é difícil para a prefei-
Um dos critérios de toda sub é sobre tura como um todo. Lidar com isso
as áreas onde tem mais movimento. da baixa renda. A própria prefeitura,
Onde passa mais gente você tem que que gera receita, tem muita dificul-
dar atenção urgente. Além disso a im- dade em lidar com a miséria e com
pressão de descuido faz mal para todo a desigualdade. Porque obviamente
mundo. Quando a Cidade parece que o município é muito influenciado
está descuidada a chance das pessoas pela política econômica e cambial
jogarem lixo fora do lugar, pararem que é definida em Brasília. Então
carro na calçada, deixarem suas facha- na subprefeitura você tem uma di-
das descuidadas é muito maior. Áreas ficuldade imensa em lidar com o
em torno de equipamentos públicos comércio irregular, por exemplo, e
e áreas que ofereçam riscos também isso tem muito a ver com política
tem prioridade. cambial, fiscal e controle de fron-
teira. Porque está muito mais fácil
No fim das contas, cada sub tem vender qualquer bugiganga “made
sua própria periferia, não é? É. É in China” do que montar um negó-
isso mesmo. cio para fabricar aqui.

A sub da Lapa, por exemplo, é Vocês lidam mais com os pro-

Cida - 07 de maio
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blemas do que com as políti- E aí você chega em um ponto que é
cas... Não conseguimos chegar muito nosso, que são as calçadas. Se
nas políticas capazes de realmente o sujeito tem que andar pelo meio da
transformar. Isso é uma tortura rua, ele está mais exposto, se árvore
para mim, para um subprefeito. cobre o semáforo, ele corre mais ris-
Porque você consegue remediar co. Se a Cidade está uma desordem
mais ou menos, mas o que é estru- de modo geral, o trânsito fica mais
tural, estruturante está super fora um salve-se quem puder. Então tem
do seu alcance. Mas azar, a gente muitas medidas de urbanização mes-
tem que fazer o que puder. Inclu- mo, de requalificação urbana que a
sive tentar com seus instrumentos gente consegue, além da manutenção.
promover desenvolvimento. Daí E tem uma coisa que me incomoda
que entra você identificar o que é a muito, que também é macro, que é
vocação dos lugares. Aqui na Lapa o excesso de viagens, excesso de de-
e em quase São Paulo toda a gente manda. Se as pessoas não precisassem
explora super pouco o turismo, que se deslocar tanto, se as coisas fossem
é um tipo de atividade econômica mais próximas umas das outras, você
que envolve muito pouco maquiná- não teria tanto trânsito, tanto estresse,
rio, insumos, produção industrial, e tanto ponto de ônibus transbordando
a partir da qual você consegue gerar de gente. Então pensamos como in-
renda, independentemente da polí- duzir as coisas de modo que as pesso-
tica cambial. Não tem como com- as tenham mais lazer e mais comércio
petir, o que é atração turística aqui, perto de casa.
é só daqui mesmo.
Que tipo de ação se pode fazer
E você acha que essa é uma voca- para isso? É... por exemplo, olhando
ção da Lapa? É. Outro dia eu vi uma com mais carinho para nossas áreas
foto aérea do Farol do Jaguaré, que na públicas. A gente tem ali o viaduto
verdade é um relógio. Poxa, é superle- da Lapa, debaixo tem o sacolão. Está
gal. funcionando bem? Está faltando
alguma coisa? Como é que a gente
Alguns índices da região são bem pode melhorar a oferta do sacolão.
ruins, como problemas circula- Do lado tem uma quadra desativa.
tórios, gravidez precoce e, espe- Pô, as pessoas tem a maior necessida-
cificamente na Barra Funda, as de de lazer, de ter o que fazer. Então
mortes no trânsito. Como a sub- de repente, em vez de a pessoa pegar
prefeitura se relaciona com isso? a moto e sair zoando, ele vai jogar
Tem algumas intervenções que estão bola? É oferecer alternativas de lazer,
ao nosso alcance que podem fazer a de convivência. E isso tudo nos leva à
diferença. As medidas de engenharia história das doenças circulatórias, que
de tráfego, propriamente – faixa de tem a ver com estresse, com sedenta-
pedestre, mão, contra mão – com- rismo. Então quanto mais você ofere-
petem à CET [Companhia de Enge- cer alternativas para as pessoas saírem
nharia de Tráfego]. Mas aí cabe nossa a pé, conviverem umas com as outras,
ação política de ficar pressionando, tudo isso faz bem. Dinamizar os es-
exigindo. Não pode ir muito além dis- paços públicos para dar melhores
Barra Funda, so. Alguma solução viária a subprefei- condições de vida para as pessoas.
tura pode fazer, mas a maioria delas Pode não parecer na hora, mas em
Jaguara, Jaguaré, é da CET mesmo. Mas por exemplo, algum momento vai fazer efeito
Lapa, Perdizes, Vila nós temos muitas mortes de pedestre. sobre a vida das pessoas.
Leopoldina
07 de maio -Cida
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