A VERDADE Newsletter de informação

Nº 8 Mar/2007

Editorial: A ver a banda passar

Os antigos lá da minha aldeia natal
Números anteriores na Beira Baixa, quando viam um ocioso
sentado à entrada da taberna, diziam que
1. Portugal, que futuro? estava a ver a banda passar.
2. Vox populi
3. Crise? Qual crise? A expressão era óbviamente
4. O que pensa Constâncio jocosa e pretendia significar que a pessoa
5. Poupança, ou nem por isso? em questão era um calão que não gostava
6. Porque não sobe a taxa de desemprego de trabalhar.
7. No reino do faz de conta
8. A ver a banda passar Claro que a prática na altura era
que quem não trabalhava também não
ganhava.
Pedidos de envio
Mas isso eram outros tempos. Os
Caro leitor, conceitos hoje são diferentes e casos há
em que até já não é preciso fazer nada de
Se pretender receber directamente a útil para ganhar dinheiro.
newsletter ou se tiver em falta qualquer dos
números anteriores d’A VERDADE e É o caso dos observadores.
pretender recebê-lo basta solicitar o seu
envio para o e-mail Não intervém, não melhoram,
também não prejudicam, limitam-se
mrc008@gmail.com simplesmente a observar e a vir dizer
umas banalidades de tempos a tempos

E é uma profissão com futuro. Porque a prática corrente na governação deste país
que tantas situações problemáticas tem, é a de não as resolver e em vez disso criar um
“Observatório” e nomear “observadores” que no fim de meses ou anos de observação
apurada, para justificarem os ordenados que lhe estão a ser pagos, vêm dizer aquilo que
já toda a gente sabe: ali existe um problema!
Vamos então conhecer os mais recentes postos de observadores a
A ver a banda passar!
O artigo do semanário SOL

O semanário SOL na sua edição nº 79 de 15 de Março de 2008 inclui nas suas

páginas 24/25 e última, uma excelente reportagem com o título “NOVA VAGA DE
EMIGRAÇÃO” (http://sol.sapo.pt/PaginaInicial/Sociedade/Interior.aspx?content_id=85208)
da autoria do jornalista Emanuel Costa, que confirma basicamente tudo o que foi dito
n’A VERDADE 006 dedicada à emigração para Espanha.
Mas acrescenta também alguns factos novos que iremos aqui resumir. (Para uma
análise mais profunda recomendamos a leitura da reportagem completa no jornal.
Acreditem que vale mesmo a pena, porque a reportagem está muito bem feita).

Os números “Emigrantes estão a aliviar desemprego ...

1. Por cada 15 imigrantes (africanos,
asiáticos, brasileiros, ucranianos, etc.)
que entram, saem 100 portugueses para
o estrangeiro.
2. Desde 2003 que o INE não produz
estatísticas sobre os movimentos
migratórios.
3. Portugal é o 2º país do mundo com
maior percentagem de população
emigrada, com 13,75% da sua
população no estrangeiro.
uma realidade incómoda ... mas que alivia as
estatísticas do desemprego...”
Pedro Rodrigues (padre numa paróquia de
Londres) sobre o elevado número - meio
milhão - de emigrantes portugueses no Reino
Unido:
“Não há, nem interessa ao Estado português
haver uma contabilidade actualizada, porque
isso também seria negativo para a análise das
políticas do Governo.”

4. Estima-se em 500 000 o número de Francisco Sales Diniz (Director da Obra

portugueses emigrantes no Reino Católica Portuguesa de Migrações) sobre o
Unido. motivo das emigrações:

5. Os emigrantes estão a enviar 7,3
milhões de euros /dia ou 2600
milhões de euros / ano para Portugal.
(Sem estas remessas imagine o leitor
como estaria a Balança de Transacções
Correntes)
As opiniões
Mafalda Durão Ferreira (ex-Sub-Directora
Geral dos Assuntos Consulares, casada com o
deputado Manuel Alegre do PS), sobre o
motivo por detrás da ocultação dos dados
oficiais relativos à emigração:
“Em termos de números ... não deixa de ser
revelador que as expectativas de vida das
pessoas no mercado de emprego estão a
baixar muito.”
De realçar aqui o número de emigrantes
portugueses no Reino Unido que é deveras
elevado: 500 000.
Para muitos leitores pouco
familiarizados com o fenómeno da emigração,
e habituados a associá-la aos destinos
tradicionais, muito por via do elevado número
de viaturas de matrículas francesas, alemãs,
belgas e suíças que circulam nas estradas
portuguesas durante as férias de Verão, este
número deve mesmo constituir uma surpresa.

A VERDADE 008 Mar/2008 | 2

A política governamental para os emigrantes
Fig. 1 - Moradias geminadas típicas de Stockwell, subúrbio londrino onde vivem 80 000
portugueses. Vivem mais portugueses neste bairro de Londres do que nalgumas capitais de
distrito em Portugal.
O responsável pelos emigrantes
A pessoa no Governo a quem está
confiada a pasta dos emigrantes é o Dr.
António Fernandes da Silva Braga,
Secretário de Estado das Comunidades.
Segundo o seu Curriculum oficial no
Portal do Governo, o Dr. António Braga é
natural de Gualtar, Braga, é casado e pai de
dois filhos e reside na cidade de Braga.
Licenciou-se em Filosofia (não diz
onde nem com que média) e foi Inspector
Superior da Inspecção Geral da Educação.
Autarca no Município de Braga (não
indica em que datas, com que funções e qual a
assiduidade).
É deputado à Assembleia da República,
eleito pelo Círculo Eleitoral de Braga.
É também Dirigente Nacional do
Partido Socialista e membro da Comissão
Política Nacional.
Foi Presidente da Comissão
Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura,
no triénio 1999/2002.
Presidente da Fundação Cultural
Bracara Augusta de 1997 a 1999.
Vice Presidente do Grupo Parlamentar
do PS de 1995 a 1998 e 2001/2002.
No triénio de 2002/2005 foi
simultaneamente:
(1) Vice-Presidente da Comissão Parlamentar
de Educação, Ciência e Cultura;
(2) Membro da Delegação Parlamentar
Portuguesa à Assembleia Parlamentar do
Conselho da Europa, onde integrou a Comissão
de Cultura, Educação e Ciência;
(3) Membro da Comissão Executiva do Centro
Norte Sul, com estatuto de observador, em
representação da Assembleia Parlamentar do
Conselho da Europa;
A VERDADE 008 Mar/2008 | 3

Fig. 2 - O Dr. António Braga, Secretário de
Estado das Comunidades.
(4) Membro da Delegação Parlamentar
Portuguesa na União da Europa Ocidental,
onde integrou a Comissão Técnica
Aeroespacial e foi Vice-Presidente.
(5) Vice-Presidente do Grupo Parlamentar de
Amizade Portugal-Rússia.
(6) Membro do Grupo Parlamentar de
Amizade Portugal-Canadá.
(7) e ainda arranjou tempo para ser
Vice-Presidente do Grupo Socialista Europeu
na Assembleia Parlamentar do Conselho da
Europa (2002/2003)
(Ufa!!! E eu a pensar que apenas Deus gozava
do dom da ubiquidade! Santa ingenuidade a
minha. Perante esta acumulação de cargos -
sete!!!- pelo Dr. António Braga em simultâneo
e em locais tão distintos, acho que vou ter que
rever os meus conceitos a partir de hoje.)
Conforme o leitor pode constatar pela
leitura da biografia, toda a carreira profissional
do Dr. António Braga foi feita no sector
público e o seu salário pago a partir dos mais
de 50% de rendimento que é descontado
coercivamente aos cidadãos deste país sob a
forma de impostos.
Ora o Dr. António Braga ou nunca
tentou trabalhar no sector privado, ou então
nunca conseguiu. O que não deixa de ser
singular para uma pessoa cujas competências
profissionais abrangem um espectro tão vasto
na área da Educação, Ciência e Cultura, que vai
desde a Filosofia até à Técnica Aeroespacial.
Se calhar os nossos empresários e caçadores de
talentos devem andar desatentos.
Pois é este senhor que exerce
actualmente as funções de Secretário de Estado
das Comunidades.
Porque está ele habilitado para as
funções de Secretário de Estado
Segundo as suas próprias palavras na
referida reportagem do Sol, o Dr. António
Braga que entrou para o Governo em 14 de
Março de 2005 exercendo ininterruptamente
desde essa data as funções de Secretário de
Estado das Comunidades, ao fim de
exactamente três anos de exercício das suas
funções afirma:
1. Desconhecer qual o número de
portugueses que vive fora de Portugal;
2. Desconhecer o motivo que os levou
um dia a partir de Portugal;
3. Desconhecer o grau de ligação que
mantêm com o país de origem;
4. Desconhecer o motivo pelo qual o INE
não produz estatísticas sobre a
emigração;
5. Desconhecer que a emigração está a
crescer.
6. Desconhecer o que se passa nas
comunidades.
Conforme o leitor pode verificar, pelo
conhecimento que ao fim de três anos tem da
sua pasta governativa , este senhor é mesmo a
pessoa indicada para o cargo.
A VERDADE 008 Mar/2008 | 4
O que pensa então fazer o Dr.
António Braga
Mas quais são então os projectos que o
Dr. António Braga pretende implementar com
vista à melhoria das condições de vida dos
nossos emigrantes e da sua relação com o país
de origem?
Ainda segundo a pequena entrevista
inserida na já referida reportagem do Sol, o
nosso Secretário de Estado das Comunidades
tem duas ideias importantes para meter em
marcha em prol dos emigrantes.
A primeira delas passa pela criação de
um Museu da Emigração onde, segundo as
suas próprias palavras se vai poder:
“... ler a história deste fenómeno e fazer as
pazes com a nossa emigração.”
Aparentemente, o Dr. António Braga
acredita que há pessoas que andam zangadas
com os emigrantes e o museu irá permitir fazer
as pazes entre as partes. Ora o apaziguamento
é sempre de apadrinhar.
A outra medida importante do
consulado do Dr. António Braga é a criação de
um Observatório da Emigração, onde
segundo também as suas próprias palavras se
vai:
“... fazer o enquadramento dos portugueses
que saem, recorrendo aos ficheiros dos
serviços consulares, e com uma metodologia
científica através de um protocolo com o
ISCTE.”
E aqui reside o busílis da questão, ou
seja, o tema editorial desta newsletter: os
observadores.
O dinheiro poupado com o
encerramento de dezenas de postos
consulares, obrigando agora muitos
emigrantes a percorrer centenas de
quilómetros sempre que precisam de tratar de
qualquer assunto oficial, vai permitir criar um
“Observatório” onde se vai pagar
(possivelmente sob a forma de bolsas de estudo
ou subsídios à investigação, que sempre ficam
isentos de IRS) a alguns “observadores” para
estudarem o fenómeno da emigração.
Após a leitura das centenas de
reportagens publicadas na imprensa sobre a
emigração e algumas viagens ao estrangeiro
para “contactar as comunidades emigrantes”
(pagas pelos contribuintes, claro!), estes
observadores irão resumir e condensar as
referidas reportagens elaborando um
“Relatório sobre o fenómeno da emigração”
onde com “metodologia científica” o Dr.
António Braga será elucidado sobre os factos e
dados que são do domínio público, aparecem
em reportagens na imprensa, mas que ele ainda
não conhece.
A VERDADE ainda não sabe como irá
funcionar esse observatório, mas a fazer fé nos
exemplos do passado, promete.
A VERDADE 008 Mar/2008 | 5
A VERDADE antecipa as conclusões do Observatório da Emigração
Ainda antes do Observatório da Emigração começar a funcionar, A VERDADE está
já em condições de antecipar as conclusões que os observadores só conseguirão transmitir
ao senhor Secretário de Estado das Comunidades daqui por dois ou três anos de
observações com “metodologia científica”.
É verdade caro leitor. Em tempos de
contenção orçamental e redução de custos,
sugerimos ao Dr. António Braga que dispense
os observadores, porque irá ficar alguns meses
ou mesmo anos à espera para ouvir as mesmas
conclusões que nós graciosamente antecipamos
aqui, hoje mesmo:
1. Qual o número de portugueses no
estrangeiro?
Cada vez mais. A segunda maior
cidade portuguesa em população já não é o
Porto mas sim Paris. O número de portugueses
aí residente ultrapassa o milhão.
2. Porque emigram os portugueses?
Existem vários motivos. A maioria
emigra porque aufere de maiores rendimentos
e tem melhor qualidade de vida nos países de
acolhimento do que no seu país natal.
3. Qual o grau de ligação com o país de
origem?
A primeira geração mantém as
propriedades que herdou dos pais e
normalmente passa as férias de Verão em
Portugal. A segunda geração já não acha tanta
graça ao país.
Com o encerramento de consulados e
as dificuldades crescentes em tratar de
assuntos legais irão perder cada vez mais a
ligação.
Até que um dia ela desaparecerá
completamente. Portugal irá ser apenas um
país longínquo de onde em tempos idos
emigrou um antepassado remoto.
4. Pensam regressar?
A primeira geração emigrou com
intenção de regressar a Portugal quando se
reformasse. Só que no momento da reforma já
os filhos e os netos se encontram também no
país de acolhimento. Como os pais já
faleceram, a única família que têm não reside
em Portugal mas no país de acolhimento. Irão
dividir o seu tempo entre as xácaras na aldeia
e a família no estrangeiro.
A segunda geração cresceu e muitas
vezes nasceu mesmo no país de acolhimento.
Têm lá a sua actividade profissional e o
círculo de amigos. Portugal é apenas um país
exótico onde iam passar as férias com os pais.
Mal se recordam dos avós, falam mal a língua,
não conhecem as pessoas, e não compreendem
porque é que as instituições estatais dificultam
a vida aos residentes. Logo que os pais deixem
de vir, também eles deixarão de vir.
5. O que pensam do Portugal moderno?
Um país sub-desenvolvido onde a
maioria dos cidadãos recorre à banca e está
endividado para os próximos 30 ou 40 anos,
mas quando lhe são concedidos empréstimos e
o dinheiro é depositado na conta pensa que
está a viver bem porque vai poder comprar o
que não necessita com dinheiro que não é dele.
Pelo menos o sol e o clima ainda se vão
aproveitando.
Vale uma aposta que serão estas as
conclusões do Observatório da Emigração?
A VERDADE 008 Mar/2008 | 6
A fábrica de emigrantes!
A VERDADE andou pelo país a ouvir os portugueses para tentar descobrir porque
motivo emigraram, pensam emigrar, ou têm pena de não emigrar. Trazemos aqui ao
conhecimento do leitor algumas das histórias mais invulgares que nos contaram.
É um retrato genuíno mas não necessariamente completo da fábrica de emigrantes
em que Portugal se transformou.
A mão amiga!
Há vinte e muitos anos atrás um grupo
de jovens empreendedores sonharam em ser
donos de um restaurante. Pediram o dinheiro,
construiram o edifício à beira da EN1, abriram
as portas, e, ao fim de poucos anos
conseguiram ser dos maiores restaurantes da
região.
O sucesso foi de tal maneira estrondoso
que o restaurante começou a ser cobiçado por
um magnata local, que tentou comprá-lo. Sem
êxito, porque os proprietários recusaram a
venda.
Passado pouco tempo, com a alegação
da falta de segurança, a delegação regional da
extinta Junta Autónoma de Estradas colocou
um traço contínuo em frente do restaurante,
para impedir um dos sentidos do trânsito de
virar para lá, e simultaneamente a Brigada de
Trânsito começou a vigiar esse troço da EN1
para garantir que ninguém estacionava também
na berma.
O movimento do restaurante caiu para
menos de metade e os jovens empreendedores
foram forçados a vendê-lo por um preço muito
abaixo do valor real.
Imagina o leitor o que aconteceu depois
de o magnata ter comprado o restaurante? A
mesma JAE que com os anteriores
proprietários tinha colocado o traço contínuo,
depois do magnata ter efectuado a aquisição
colocou um separador no meio da estrada para
facilitar a vida a quem queria virar para o
restaurante!
Perguntará o leitor porque motivo tinha
esse magnata tanto empenho em comprar o
restaurante. Pois vou-lhe satisfazer a
curiosidade. O restaurante em questão
facturava ao tempo 120 000 contos / mês.
O magnata mencionado era
comendador condecorado pelo presidente da
República, e integrava o grupo das pessoas
mais ricas do país. Faleceu há 5 ou 6 anos, e
não conseguiu levar com ele a imensa fortuna
que acumulou.
Quanto aos proprietários originais do
restaurante estão arrependidos de não ter
emigrado para um país onde a JAE local
não ajude os magnatas a concretizar
negócios.
Esta outra situação ocorreu há menos
de um ano. Um conhecido empresário
proprietário de uma empresa industrial de
carnes com matadouro e salsicharia, era
fornecedor das grandes superfícies. Cansado do
esmagamento de margens e dos prazos de
pagamento de 120 dias tomou a decisão de
deixar de fornecer essas mesmas grandes
superfícies e abriu uma rede de vários
estabelecimentos de venda ao público
incluindo talho e peixaria e com preços
verdadeiramente fabulosos.
Só para o leitor ter uma ideia, cheguei
a comprar lá peixe congelado (pescada, red-
fish, solha, etc.) a preços que variavam entre
1,00 € e 1,25 € / kg (Compare o leitor com os
preços que paga pelo mesmo artigo nas grandes
superfícies). Os preços das carnes eram
também inferiores entre 10% a 30% aos
praticados nas cadeias de lojas da grande
distribuição.
É claro que as vendas dos seus antigos
clientes ressentiram-se imediatamente. Uma
das grandes superfícies ainda tentou reagir e
passou a anunciar que às quintas feiras tinham
"Carnes da nossa Quinta", mas parece que não
foi suficiente para recuperar as vendas.
Pois sabe o leitor o que aconteceu aos
talhos? Passaram a ter visitas regulares da
fiscalização que lhe dificultavam a vida em
tudo que podiam.
Acabou por ser forçado a fechar.
A VERDADE 008 Mar/2008 | 7
Transferiu todo o equipamento da fábrica e
emigrou para Espanha onde actualmente
trabalha sem sofrer qualquer
perseguição. Escusado será dizer que após o
encerramento dos talhos as vendas das grandes
superfícies voltaram aos valores anteriores.
O Sr. Adam Smith na sua obra clássica
do séc. XVIII A Riqueza das Nações falava na
mão invisível que conduzia a economia. Estes
empresários aprenderam o equivalente nacional
à mão invisível. Em Portugal há uma mão
amiga que está a conduzir alguns ao estrelato
económico. E que até não é invisível. Só não se
apercebe quem estiver desatento ou for
ingénuo.
A avença
Um empresário cujo ramo de actividade
é o aluguer de máquinas de construção civil
(camiões, buldozers, retro-escavadoras, etc.)
refere dois elementos da Brigada de Trânsito
que todos os meses passam pela empresa a
levantar 200,00 € em numerário (100,00 € para
cada um). É o preço que tem de pagar para
poder circular com as máquinas sem ser
incomodado. Está a pensar emigrar para um
país onde os agentes de autoridade não
cobrem avenças.
As casas
Outro empresário proprietário de uma
pedreira refere também agentes da Brigada de
Trânsito que vão abastecer-se de brita à sua
pedreira para moradias que andam a construir.
Até aqui nada de especial. A pedreira existe é
para isso mesmo. O problema reside no facto
de o proprietário ser pressionado a oferecer
gratuitamente a brita sob a insinuação velada
de que os seus camiões podem ser sujeitos a
uma fiscalização mais rigorosa quando forem
mandados parar nalguma operação stop.
Também está a pensar emigrar para um
país onde os agentes da BT tenham por
hábito pagar os materiais de construção que
utilizam nas suas moradias.
O Pai Natal
Outro empresário refere o comandante
do posto da GNR do concelho onde exerce a
actividade como tendo telefonado pelo Natal a
empresas desse concelho a perguntar quanto é
que poderia carregar de bebidas “para a
rapaziada” numa garrafeira regional do
concelho. Neste caso as bebidas não vão
apenas para o comandante. São igualmente
distribuídas por todos os agentes do posto.
Também ele está a pensar emigrar para um
país onde não tenha de abastecer as
garrafeiras dos comandantes e agentes das
forças policiais.
Os entraves pseudo-técnicos
Um promotor imobiliário tem a
construção duma urbanização parada porque
um engenheiro da Câmara Municipal local
exige-lhe a alteração do tipo de canalizações a
aplicar. Acontece que apenas um fabricante
fornece esse tipo de tubagem cujo preço é
exorbitante (e tem exactamente as mesmas
características técnicas da tubagem que estava
previsto usar inicialmente) indo a sua
utilização encarecer a obra em 200 000,00€.
Vários fornecedores de materiais de
construção para obras públicas referem a
existência de responsáveis técnicos de Câmaras
Municipais que colocam obstáculos à
utilização de determinados tipos de materiais
até receberem subornos dos respectivos
fornecedores. Logo que entra o dinheiro as
reticências técnicas são removidas e o material
já pode ser aplicado.
Vários destes fornecedores estão a
pensar emigrar para um país onde não
tenham de pagar luvas para o material que
fornecem ser considerado tecnicamente apto
à utilização em obras públicas.
Produzir para deitar fora
Um casal de agricultores meu
conhecido vive numa região montanhosa de
terrenos calcários, pobre para a horticultura,
mas de clima excelente para a vinha, azeite e
pastorícia.
Até há poucos anos atrás viviam
A VERDADE 008 Mar/2008 | 8
desafogadamente vendendo as suas produções
caseiras de vinho, queijo e azeite. Todos os
produtos eram de boa qualidade e nunca
ninguém adoeceu por os consumir.
Agora foram impedidos de vender o
que produzem. Alguns clientes antigos
mantiveram-se fiéis e continuam a abastecer-se
clandestinamente em casa desse casal. Sempre
a medo. Mas não são suficientes para escoar a
totalidade da produção. Todos os anos são
obrigados a deitar fora uma parte da produção
de vinho do ano anterior para libertarem
vazilhame para o novo.
Este casal a quem foram retirados os
meios de subsistência só lamenta estarem
demasiado velhos para emigrar.
O espoliado
Um investidor vendeu um lote de
terreno para construção no concelho de Cascais
na década de 1980. Há já 20 anos que lá foi
construído um bloco de apartamentos cujas
fracções pagam contribuição autárquica /
imposto municipal de imóveis. No ano de 2005
foi notificado para pagar IMI do referido
terreno.
Dirigiu-se à Repartição de Finanças do
concelho para reclamar da liquidação de IMI
sobre um terreno de que já tinha deixado de ser
proprietário há 20 anos.
Em vez de lhe anular automaticamente
a liquidação, o funcionário que o atendeu
disse-lhe para fazer uma exposição ao Chefe da
Repartição a pedir a anulação da liquidação de
IMI com o fundamento de já não ser
proprietário do referido terreno.
Pois apesar de ter efectuado a
exposição, dado não ter efectuado o pagamento
no prazo legal, foi-lhe penhorada a conta
bancária sem aviso prévio. Chamam os
funcionários das finanças a esta conduta
grotesca uma “penhora provisória” até se
apurar se o contribuinte deve ou não o
dinheiro. Se da análise da reclamação
concluirem que a dívida afinal até nem existia,
garantem que o dinheiro irá ser devolvido. O
caso está no Tribunal Administrativo e Fiscal
e da última vez que falei com ele ainda não
tinha conseguido que lhe fosse devolvido o
dinheiro.
Também ele está a pensar emigrar
para um país onde as contas bancárias não
sejam penhoradas impunemente por um
qualquer Chefe de Finanças desejoso de
mostrar trabalho, em nome de uma dívida
inexistente.
O infantário
Uma leitora que trabalha numa
creche/infantário localizada numa freguesia
rural refere-nos também um caso muito
interessante.
O referido infantário tinha por norma
comprar os vegetais que utilizava na confecção
das refeições das crianças aos produtores
locais. Os alimentos eram colhidos de manhã e
entregues imediatamente na cozinha para
serem confeccionados. Mais fresco do que isto
era impossível. Todos os vegetais eram de
qualidade e alguns dos fornecedores eram
mesmo até pais de crianças que frequentavam
o infantário.
O ano passado apareceu lá um inspector
para fiscalizar o funcionamento do infantário.
Quando soube que os vegetais eram comprados
a produtores locais proibiu logo a sua
confecção e obrigou a cozinha do infantário a
abastecer-se em “fornecedores certificados”.
O fornecedor de vegetais para o
infantário é agora um armazenista “certificado”
(nem sequer é produtor) que importa os
vegetais de Almeria em Espanha. São tudo
menos frescos. Segundo a funcionária, as
alfaces vêm dispostas por camadas em caixas
onde apenas a camada que vem ao cimo é
verde e fresca enquanto as camadas que vêm
escondidas por baixo da primeira, amarelas e
engelhadas, deixam muito a desejar. Os custos
com a alimentação dos petizes subiram
bastante devido à quantidade de vegetais
retrasados que é fornecida já em condições de
conservação deficientes e que tem de ser
deitada fora.
Outro problema resultante da troca de
fornecedor de vegetais são as reclamações dos
garotos que não gostando do sabor das
hortaliças de Almeria faziam birra para não as
comer. Numa segunda visita do inspector à
creche, quando confrontado pela responsável
com este facto, limitou-se a responder:
“Não ligue. Com o tempo eles habituam-se.”
A VERDADE 008 Mar/2008 | 9

Fig. 4 - Fotografia de satélite da região de Almeria e dos seus 25 000 ha de estufas de plástico.
Terá havido acréscimo de qualidade na
alimentação dos meninos e meninas da creche
quando se trocou os produtores locais por
armazenistas importadores “certificados”?
Avalie o leitor por si próprio.
A região de Almeria fica situada no Sul
de Espanha. Nesta região espanhola tudo
parecia ser desfavorável à agricultura. O clima
semi-árido, o solo seco, pedregoso e
improdutivo fizeram da cidade e sua micro-
região, nos anos 40, um dos lugares mais
pobres da Andaluzia. H a v i a a p e n a s u m a
pequena produção de uva de mesa. O "milagre
almeriense", como se referem os espanhóis,
começou na década de 60. Alguns institutos de
pesquisa, com o respaldo dos produtores,
passaram a desenvolver o cultivo de hortaliças
em estufas.
Quatro décadas depois, há 15 mil
Fig. 3 - As estufas cercam a
cidade de Almería,
que era uma das
áreas mais pobres da
Espanha e hoje é
centro exportador de
frutas e hortaliças
agricultores a trabalhar nas estufas, e utilizando
diferentes técnicas para os cultivos como a
fertirrigação, com doses precisas de adubos
e nutrientes químicos dissolvidos na água da
irrigação.
À boleia do desenvolvimento agrícola,
surgiram 160 indústrias que actuam nas áreas
de fabricação de plásticos, agroquímicos
(fertilizantes e pesticidas), sementes,
embalagens, etc., que em conjunto facturam
260 milhões de euros por ano e geram mais de
3 mil empregos.
Vista do alto, a cidade parece que foi
envolvida numa extensa camada de plástico. A
área coberta de estufas chega a 25 mil hectares.
A produção de 2,5 milhões de toneladas
de hortaliças, tomate e pimentos em especial,
das quais cerca de 62% são encaminhadas para
os países da União Europeia, levaram a que a
A VERDADE 008 Mar/2008 | 10
Fig. 5 - Os solos da região de Almeria são impróprios para agricultura
região de Almeria fosse classificada como a
horta da Europa.
Recordando uma frase famosa atribuída
ao produtor e comerciante de vinhos Abel
Pereira da Fonseca,
“Até de uvas se faz vinho”
a região de Almeria é o exemplo acabado de
como até sem solo se faz agricultura.
Ainda recentemente o Governo
Regional da Andaluzia ordenou o
encerramento de cinco estufas da localidade de
Almeria, devido ao uso de um pesticida ilegal
no cultivo de pimentões doces (ver
desenvolvimento completo da notícia em
http://rtp1.rtp.pt/index.php?article=265506&
visual=16).
Pois é esta a comida “certificada” que
o tal inspector entende que as crianças devem
comer.
A funcionária que nos contou o caso
ainda não tem filhos. Mas quando pensar em os
ter está a considerar a hipótese de emigrar
para um país onde os seus filhos em vez de
serem obrigados a comer alimentos
certificados possam ter a possibilidade de
comer alimentos saudáveis.
O desgaste do chão
Um casal que apareceu num dos canais
de televisão durante uma reportagem no mês de
Fevereiro era proprietário duma casa de
petiscos no Alentejo e mudou o negócio para
uma aldeia de Espanha perto da fronteira.
Apresentaram duas razões para a mudança.
Uma tinha que ver com a dificuldade
em arranjar produtos tradicionais para servir os
clientes. Parece que aquilo que os clientes
procuravam na casa, a morcela caseira, o arroz
de cabidela, o queijo de pastor, o vinho caseiro,
etc., tinha sido proibido cá, alegadamente por
restrições legislativas comunitárias (isto é
outra falácia que A VERDADE irá
desmascarar em número futuro). Para poderem
continuar a servir estas iguarias aos clientes
viram-se forçados a transferir o
estabelecimento para Espanha onde ao que
consta o governo espanhol estará mesmo a
apadrinhar os mercados e produtos tradicionais
como forma de apoiar a economia local. Os
seus clientes portugueses mantiveram-se fieis
e continuam a frequentar o estabelecimento. Só
que agora deslocam-se a Espanha.
O outro motivo citado foram as normas
pseudo-higiénicas da ASAE. Segundo as suas
próprias palavras:
“Em Portugal a ASAE obrigava-nos a
limpar os quartos de banho quatro vezes ao
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dia mesmo que não estivessem sujos. Em
Espanha as autoridades sanitárias obrigam-
nos a limpar o quarto de banho quando está
sujo. Quando está limpo, não somos
obrigados a ir limpá-lo novamente.”
Parece que com tanta esfregação o chão
do quarto de banho até já estava a começar a
ficar gasto.
As dádivas
Fig. 6 - Igreja na Póvoa da Atalaia
Póvoa da Atalaia é uma freguesia do
concelho do Fundão onde funciona um centro
de dia sem fins lucrativos, que acolhe 40
idosos a quem serve almoços e jantares
diariamente.
Num gesto de grande generosidade a
população local oferecia graciosamente
alimentos para confeccionar as refeições dos
velhinhos.
A 14 de Janeiro deste ano, o centro de
dia foi alvo de uma inspecção da ASAE que
mandou deitar fora os alimentos oferecidos e
proibiu o centro de dia de aceitar mais ofertas
de alimentos da população para os velhinhos.
Segundo enumera o padre Paulo Figueiró que
dirige o centro de dia:
"Frangos, pastéis de bacalhau e taças
de marmelada oferecidas pela população",
O padre Paulo Figueiró questiona o
facto de serem eliminados alimentos oferecidos
pela população e que não estavam estragados:
"Os alimentos não estavam estragados, mas
como não obedeciam a algumas normas,
tiveram que ir fora. Acho que não há bom
senso em deitar alimentos no lixo sem os
analisar",
Lamenta também ter de passar a recusar
algumas ofertas da população:
"Estou na paróquia desde
Outubro e já percebi que a população é
muito generosa. No entanto, pelo menos
as coisas que a ASAE indicar, vamos ter
de deixar de aceitar.
Quase que parece que já não se
pode ser bom, generoso. Acho que basta
haver um pouco de bom senso: estamos
a falar de coisas que as pessoas sempre
comeram e nunca fizeram mal."
As ofertas da população vão
deixar de ser aceites. A partir de agora só
alimentos "certificados", de preferência
provenientes de Almeria, cultivados em
estufas hidropónicas com adubos
químicos artificiais e hormonas de
crescimento e ainda carregados de pesticidas
que é para matar a lombriga quando passarem
pelo intestino dos velhinhos. E óbviamente
pagos, com acréscimos de custos para o centro
de dia.
Ouçamos novamente o padre Paulo
Figueiró:
"Uma coisa é indicar o que está errado para
nós corrigirmos e aí a ASAE é sempre bem-
vinda. Outra coisa é dificultar uma
associação sem fins lucrativos que cuida de
idosos, um papel social que compete ao
Estado.
É preciso analisar com cuidado se não
estão a ser exigidos gastos que podem pôr em
risco de sobrevivência instituições como esta,
porque, se fechar, a vida dos 40 idosos que
acolhemos não melhora de certeza."
Fica aqui o conselho d’A VERDADE
para o senhor padre Paulo Figueiró: emigre
com os seus idosos para um país onde eles
sejam respeitados, porque um país onde
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agentes da ASAE têm uma conduta ignóbil, E-mails
com a conivência dos seus superiores e o
beneplácito dos governantes é simplesmente 1. Queremos aqui agradecer
um local mal frequentado. publicamente a amabilidade e
gentileza das muitas e muitas
pessoas que nos têm contactado
via e-mail.

2. Lamentavelmente para nós

Nota da redacção
Todos os casos descritos
anteriormente (excepto os dois últimos
que foram visados na comunicação social)
foram-nos relatados em primeira mão
pelos próprios intervenientes.
Pelas situações criadas geraram
emigrantes reais ou potenciais.
Por uma questão de privacidade,
não estamos autorizados a revelar os
nomes dos envolvidos.
Mas fazem parte do tal Portugal que
come e cala. Porque se fala ainda come
mais.
devido ao grande volume de
correspondência recebida não
conseguimos responder com a
rapidez que desejáveis e
mereceis. Daí algum atraso nas
respostas. Mas fica prometido
que iremos tentar responder a
todos!
3. Desde já o nosso MUITO
OBRIGADO. Bem-hajam pelo
interesse e continuem a enviar
os vossos comentários!

Lisboa, 20/Mar/2008

Manuel Rodrigues Cunha

mrc008@gmail.com

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