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AFONSO HENRIQUES
Pai da pátria portuguesa: 1109 - 1185
Mais do que bom e preocupado papai, Afonso VI tenta ampliar seu poder e
garantir domínio sobre maior extensão de terras. Tiro pela culatra. Tão logo o
rei de Leão e Castela mete o bedelho no Condado Portucalense, a nobreza
local inicia forte movimento separatista.
Enfim, com tal filho nas mãos, dona Teresa, além de se aliar aos galegos,
aparece com outro conde debaixo de braço, contando uma história trôpega de
“apoio político”. Arma-se o circo. Com 21 anos, Afonso Henriques cerca
Guimarães e declara uma briga de gafieira: quem está fora, não entra; quem
está dentro, não sai. Nem mamãe, suposta rainha do condado.
É bom que se diga: igual ao avô, o infante não dá ponto sem nó. Fareja que,
com poucas chances na linha sucessória de Leão e Castela, precisa descobrir o
próprio espaço. Quer o poder, seu lugar é no condado materno.
Tudo aponta para o fato de que o infante apenas capitaliza o desagrado da
nobreza portucalense. Desagrado que se acentua quando Teresa enfia os
galegos no caldeirão. O esperto Afonso Henriques já andava observando que,
além do anseio de se libertar de Castela, as cidades de Portucale identificam-
se cultural e ideologicamente. Para ele, não parece tarefa difícil transformá-las
em uma só força política. Teresa apenas fornece a justificativa para o infante
virar a mesa.
Contando assim, parece fácil. Não é, senão qualquer pessoa faria. Afonso
Henriques tem enorme sensibilidade. Age na hora certa, com as pessoas
certas, da maneira certa. Não falseia. Comporta-se como perfeito animal
político do início ao fim de sua história. Faz a História, coloca o mundo nas
mãos. Tolos são os que o cercam, incapazes de observar a genialidade do
príncipe enquanto ele arma o bote.
Para alcançar tal prestígio, Afonso Henriques sua. Passa a vida combatendo e
costurando acordos políticos. O primeiro, com a Igreja Católica, pedra angular
do qualquer poder durante a baixa Idade Média. Quem não recebe a benção
episcopal que trate de procurar novo emprego. Logo após a vitória de São
Mamede, Afonso Henriques estabelece suas relações com a Igreja: cede em
tudo. Sabe onde pisa, os clérigos têm força demais para serem contrariados.
Tudo sobre Ourique são conjeturas. Mas a história é tão importante que
marca o imaginário português, permanece no brasão do país - cinco escudos,
cinco quinas, cada qual com cinco bolas representando os cinco reis mouros
degolados na batalha – e, finalmente, transforma Afonso Henriques em rei de
fato e de direito. Até hoje, historiadores portugueses discutem o episódio.
O moral da soldadesca alcança as nuvens quando eles sabem quem lhes fizera
uma visitinha. Além do mais, 25 de julho é dedicado a Santiago, o mata-
mouros, santo que jamais abandona cristãos em perigo. Especialista em
degolas, Santiago trabalha com eficiência invejável – aparentemente, é o
primeiro ser do planeta a conhecer o lugar exato das carótidas, não perde uma.
Hoje, parece, aposentou-se. Como se vê, tudo colabora para o sucesso do
infante.
Sorrateiro, costuma agir por baixo dos panos, pré-estréia do jeito luso-
brasileiro de ser. O bandoleiro Geraldo Sem Pavor, que saracoteia desenvolto
em terras de Castela, provavelmente trabalha para Afonso Henriques. Se o
infante não pode invadir propriedade alheia, um preposto oficioso pode. Não
há como provar. Mas os cavaleiros de Geraldo Sem Pavor pertencem ao
Conselho de Coimbra, é difícil imaginar tais cidadãos combatendo sem
aprovação real.
O infante que pretende ser rei, vira um mito. É impossível separar verdade e
lenda na biografia de Afonso Henriques. Ele antecede seu tempo, revela-se um
gênio de extraordinária visão política e indiscutível coragem moral. Dele,
restam poucos registros escritos pelos monges de Santa Cruz - até porque,
além dos monges, ninguém mais sabe escrever, nem Afonso Henriques.
Casado com a discreta Mafalda de Sabóia - com quem tem sete filhos, entre
eles, o herdeiro Sancho –, Afonso Henriques abençoa quatro bastardos. Um
documento de 1184, descortina o inesperado pai carinhoso. Quando uma de
suas filhas legítimas casa com o conde de Flandres, Afonso Henriques não
titubeia. Para alegrar a noiva, enche vários navios com o que existe de mais
fino. As naus saem do porto de Lisboa abarrotadas de vestidos bordado a ouro,
jóias preciosas, sedas, mais ouro, mais jóias, tudo que pudesse alegrar a
menina alegre, filha de pai poderoso.