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SOBRE A LINGUAGEM (textos de apoio)

"(...) a linguagem é simultaneamente o único modo de ser do pensamento, a sua realidade


e a sua realização. Mesmo o discurso mudo (o "pensamento mudo"), no seu labirinto, se serve da
rede da linguagem e não a pode dispensar; parece impossível afirmar a existência de um
pensamento extralinguístico.
Evitamos afirmar que a linguagem é o instrumento do pensamento. Tal concepção podia
fazer crer que a linguagem exprime, como um utensílio, qualquer coisa  uma ideia?  de
exterior a ela. Mas o que é esta ideia? Existirá sem ser em forma de linguagem?"
Júlia Kristeva

"Seguramente, a linguagem na medida em que é falada, é empregue para expressar "o


que queremos dizer". Mas isso que assim designamos, "o que queremos dizer" ou "o que temos
no espírito" ou como quer que o designemos, é um conteúdo de pensamento muito difícil de
definir em si mesmo. Só ao ser enunciado, e apenas por ser enunciado, esse conteúdo adquire
uma forma. Adquire forma na língua e pela língua, que é como o molde de toda a expressão
possível; o pensamento não pode ser dissociado da ou transcender a língua. De outro modo, o
pensamento reduzir-se-ia, se não a nada, pelo menos a algo tão vago e indiferenciado que,
independente da forma que a língua lhe confere, não poderia ser apreendido como "conteúdo". A
forma linguística é, não apenas a condição de transmissibilidade, como também a condição de
efectivação do pensamento. Só apreendemos o pensamento quando está já estruturado pelos
quadros da língua."
E. Benveniste

"O pensamento não é nada de interior; não existe fora do mundo, nem fora da palavra. O
que nos engana, o que nos faz crer num pensamento que existiria por si anterior à sua expressão,
são os pensamentos já constituídos e já expressos que nós podemos evocar silenciosamente e
pelos quais damos a ilusão de uma vida interior. Mas na realidade esse pretenso silêncio está
ocupado pelo barulho das palavras; essa vida interior é uma linguagem interior. (...) O
pensamento e a linguagem constituem-se, pois, simultaneamente." 1
M. Merleau-Ponty

"O que o animal diz é muito específico: fornece uma informação aos outros animais. Os
animais não se reúnem para discutir, analisar ou reflectir sobre o que lhes foi dito. Um grupo e
macacos põe-se em fuga quando ouve o grito de alarme da sua sentinela. Quando a colmeia
observa a dança da abelha que regressa, segue as suas instruções sem discutir (...)
Os seres humanos também têm uma linguagem de instruções e informações.
Mas os seres humanos também utilizam a linguagem para um fim muito diferente: para a
reflexão e elaboração pessoais. Quando acabarem de ler este texto, pensarão nele e fá-lo-ão
utilizando a vossa linguagem pessoal, em privado. (...) Reflectirão, estabelecerão analogias e
tirarão conclusões, ... É esta capacidade que nos torna humanos: a utilização de palavras ou
símbolos, não para comunicarmos com os outros, mas para forjarmos as nossas próprias ideias
nos nossos espíritos.
A capacidade de conceber coisas que se não apresentam aos sentidos é crucial para o
desenvolvimento do homem. E esta capacidade implica a existência de um símbolo (ou de um
signo), algures dentro do espírito, para qualquer coisa que não se encontra lá. (...) A função das
palavras no pensamento humano é representar coisas que se não apresentam aos sentidos, para
que o espírito as formule  coisas, conceitos, ideias, tudo o que não tem realidade física para
nós no momento.
1
Por vezes, pode parecer-nos "não ter palavras" para exprimir o que pensamos, que sabemos bem o que queremos
dizer, mas não sabemos como. Porém, esta independência do pensamento relativamente à linguagem é ilusória. O
que efectivamente acontece é que um vago sentimento ainda não se estruturou como pensamento.
1
A capacidade de reterem na mente coisas que estão ausentes dá aos seres humanos uma
liberdade dentro do seu ambiente que mais nenhum animal possui. (...) A linguagem de seres
humanos permite que nos coloquemos em milhares de situações que nos não são apresentadas e
podem nunca vir a sê-lo. A previsão é um atributo tipicamente humano. Só os seres humanos são
capazes de se projectar em situações imaginárias e de pensar com uma semana de avanço (...)."
J. Bronowski

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