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NESTA EDIÇÃO

Ufa! Um ano
Nº 28 ! Dezembro de 2004
depois, fica pronto
o relatório final da Av. Brasil, 4.036/515, Manguinhos
Rio de Janeiro, RJ ! 21040-361
12ª Conferência
Nacional de Saúde w w w. e n s p . f i o c r u z . b r / r a d i s

PROPAGANDA DE REMÉDIOS | SAÚDE E AMBIENTE | DENGUE


Esta página é um espaço aberto à teoria
e à prática da Comunicação em Saúde

Mídia e mortalidade materna


nal envolvendo os seguintes itens: plicando que não são “apenas” de 2

A cobertura da mortalidade mater-


na tem sido pequena, superficial
e descontínua, e não está entre as
! a morte, que é sempre algo forte,
gera interesse e atrai atenção;
! a maternidade, que envolve as no-
mil a 3 mil mortes por ano, mas que são
mortes na maioria evitáveis;
! mostrar as vidas por trás dos núme-
principais preocupações da imprensa ções de dedicação e sacrifício; ros, revelando que, além das mulheres
brasileira na área de saúde. A conclu- ! os números, que dão a dimensão mortas, há também milhares de crian-
são é da jornalista Marisa Sanematsu, do problema; ças órfãs e famílias desestruturadas;
que coordenou diversos projetos de ! trata-se de mortes que poderiam ! denunciar a injustiça social e a desi-
monitoramento e análise do comporta- ser evitadas e que refletem a quali- gualdade racial e de gênero, mostran-
mento da mídia em temas como saúde dade da assistência à saúde; do sempre que as maiores vítimas des-
da mulher, Aids e racismo. Em junho, ela ! os personagens: a própria mulher e sas “mortes evitáveis” são mulheres
apresentou trabalho na Conferência de as pessoas que ela deixou (filhos, pobres, negras, separadas ou solteiras;
Morte Materna no Nordeste, em Salva- marido, pais etc.), para mostrar o ! mostrar as causas ocultas por trás
dor, no qual afirma que a mídia contribui lado humano por trás dos números; de cada morte, como um aborto clan-
para a “naturalização” da mortalidade ! o interesse do público conjugado destino realizado em péssimas condi-
materna. “Muita gente ainda acha que ao interesse público: “as mulheres ções ou um exame pré-natal ou um
morrer de parto é algo natural”, diz. são metade da população e mães da parto mal-feitos;
O tema na mídia é praticamente outra metade”, como lembra o movi- ! mostrar que o Estado brasileiro já
invisível. Para Marisa, isso ocorre por- mento feminista. assumiu o compromisso de reduzir a
que os números da mortalidade mater- mortalidade materna no país ao assi-
na se mantêm estáveis. Assim, o que nar diversos acordos internacionais,
deveria escandalizar a imprensa especi- até 2005, ainda que essa meta pare-
ILUSTRAÇÃO: INTERFERÊNCIA SOBRE QUADRO DE LEONARDO DA VINCI

alizada em saúde na verdade a deixa ça difícil de atingir;


acomodada: número estável não é notí- ! comover-se e indignar-se, sem ape-
cia. Além disso, há números conflitantes, lar para o sensacionalismo;
diz Marisa, que hoje trabalha na área ! provocar a mobilização pública,
de violência contra a mulher no Insti- abrindo discussão sobre o que pode
tuto Patrícia Galvão, em São Paulo. De- e deve ser feito;
sinteressados do assunto, os jornalistas ! divulgar também as “boas notícias”,
não se empenham em cobrar estatísti- mostrando o trabalho de hospitais-
cas ou mesmo organizar as informações. modelo, as chamadas “ilhas de bom
A morte materna, então, jamais atendimento à saúde” que apresen-
é notícia? Às vezes é, mas para que tam baixos índices de morte mater-
chame atenção da imprensa, observa na, e entrevistando profissionais com-
Marisa, é preciso ocorrer: petentes que realizam trabalho sério.
! uma alteração significativa na mor- Para tanto, a imprensa precisa de
talidade materna; informações, de fontes disponíveis e
! uma iniciativa em nível internacional, acessíveis, de novos enfoques e de
como o lançamento recente de um personagens que dêem depoimentos
manual sobre o problema pela OMS; e confiram um lado humano à notícia.
! em nível nacional, uma iniciativa do É preciso fazer o público se identifi-
Poder Executivo (por exemplo, quando Se a mídia souber trabalhar com car com o problema. “É preciso o com-
o Ministério da Saúde e outras institui- estes elementos será capaz de des- promisso de todos e todas para ali-
ções lançaram o Pacto Nacional pela Re- pertar o interesse do público, diz mentar a mídia”, conclama Marisa.
dução da Mortalidade Materna e Marisa. Afinal, lembra, a mídia infor-
Neonatal, em 8 de março de 2004), do mativa tem papel estratégico na for- Mais informações
Legislativo (como a CPI da Mortalidade mação da opinião e na pressão por Site Instituto Patrícia Galvão
Materna, em 2001) ou ações dos comi- políticas públicas. www.patriciagalvao.org.br/
tês de Mortalidade Materna, da área Marisa convida a mídia a contri- E-mail da autora Marisa Sanematsu
médica e da sociedade civil organizada; buir para a redução da mortalidade msanematsu@uol.com.br
! a divulgação de dados impactantes materna com as seguintes propostas:
de pesquisas produzidas por institui- ! informar sobre a real situação da Nesta página vale tudo: análises de
ções de renome, com recortes e morte materna no país, divulgando nú- campanhas de saúde nas mídias, co-
abordagens interessantes. meros atualizados e obtidos de fon- mentários sobre as mais recentes te-
tes confiáveis. Ter um olhar crítico ses acadêmicas, mosaico de experi-
ELEMENTOS DA NOTÍCIA sobre os números, comparando com ências exitosas (e também de
Para Marisa, a imprensa precisa as taxas de outros países, e enfatizar experiências “hesitosas”) da práti-
entender que, no que diz respeito à o problema da subnotificação, pre- ca dos serviços e dos usos da comu-
morte materna, tem em mãos um tema sente em muitas cidades e estados; nicação, fotos, textos, diagramas.
de grande impacto social e emocio- ! apontar a gravidade da situação, ex-
editorial
Nº 28 — Dezembro de 2004

Orçamento faz bem à saúde


T
Comunicação em Saúde
em gente que se opõe à amplia- rentes da União (10%) a ser destinado à
ção do orçamento da saúde, di- saúde, utilizando o mesmo critério ado- ! Mídia e mortalidade materna 2
zendo que o dinheiro é suficiente, mas tado para estados (12%) e municípios
é mal gasto. Não há dúvida de que nada (15%). Atualmente, a participação da
pode ser desperdiçado ou desviado, as União é imprecisa para o planejamento Editorial
prioridades têm que ser rigorosamen- orçamentário, porque se baseia na vari- ! Orçamento faz bem à saúde 3
te acompanhadas pelo controle social ação nominal do Produto Interno Bruto.
do Sistema Único de Saúde e qualquer Outra vantagem do PLP 1/03 é
irregularidade deve ser exemplarmen- que ele define claramente o que são Cartas 4
te punida. Mas, na verdade, o gasto ações e serviços públicos de saúde
público com saúde por pessoa no Bra- para efeito de financiamento do SUS,
sil é bem menor do que em muitos pa- evitando desvio de receitas para o Súmula 5
íses, como se verifica na matéria de Fundo de Combate à Pobreza, o paga-
capa desta edição, que aborda de ma- mento de serviços da dívida pública e
neira bastante didática o funcionamen- o pagamento de aposentados, como Toques da Redação 7
to do orçamento da saúde e da Lei de ocorreu no orçamento de 2004, o que
Diretrizes Orçamentárias. gerou protestos no Congresso e na
Mais do que aumentar os gastos comunidade da saúde pública, resul-
para se ter um Sistema Único de Saú- tando na correção desta distorção
de de qualidade e humanizado para já no orçamento de 2005.
todos, o que está em discussão neste O empenho do Ministério da Saú- Orçamento da saúde 2005
final de ano é justamente como defi- de, da Frente Parlamentar de Saúde e ! Pressão social por mais verba para
nir em lei a composição das receitas das principais entidades acadêmicas o SUS 8
desse orçamento, livrando as ações e e de representação política do setor
os serviços de saúde das oscilações (veja Radis 27, ou entre em nosso site)
de interesse dos diferentes governos. é para que o PLP 1/03 seja apreciado
Em tramitação no Congresso, o Pro- em regime de urgência e para que a
jeto de Lei Complementar 1/03 (PLP 1/ sociedade e suas organizações pressi-
03) regulamenta a Emenda Constitucio- onem os parlamentares no Congresso Vigilância Sanitária
nal 29, que desde 2000 estabelece para a sua aprovação ainda este ano.
vinculação orçamentária para a saúde Gastar bem os recursos dispo- ! Propaganda de remédio faz
nos orçamentos da União, de estados e níveis é muito importante, mas asse- mal à saúde 12
municípios. A novidade é que o projeto gurar fontes estáveis e crescentes de
defendido pelo Ministério da Saúde, receita é absolutamente indispensá-
aprovado nas comissões de Seguridade vel para um orçamento saudável. 3º Seminário Nacional em Saúde
e Família e de Finanças e Tributação, e Ambiente
em acordo com as deliberações da 12a ! Ética e eqüidade diante da incerteza 14
Conferência Nacional de Saúde, esta- Rogério Lannes Rocha
belece um percentual das receitas cor- Coordenador do Radis
Dengue
! Cuidado, o verão chegou! 15
car
rttu
umm

Relatório Final da 12ª CNS


! Demorou, mas saiu! 16

Serviço 18

Pós-Tudo
! Os limites da legalidade 19

Capa e ilustrações Aristides Dutra

Agradecimentos ao Programa de Ensino


Médio da Direh/Fiocruz
RADIS 28 ! DEZ/2004
[ 6 ]

C AR
RTTA S

Blumenau (Furb) o curso de Serviço E DIÇÕES ANTERIORES


P ROFESSORES E ALUNOS Social e estagio no ambulatório geral
da universidade.

S ou estudante de Enfermagem da
Universidade Estadual de Feira de
Santana, na Bahia, e gostaria de expli-
! Andréia Zanluca, Blumenau, SC

citar minha admiração pela revista


Radis. Parabenizo pela amplitude de
temas abordados em poucas páginas
S ou professor de Sociologia com
pós-graduação em Saúde Coletiva
e leciono Sociologia Aplicada para alu-
e que nos fazem repensar cada as- nos de Enfermagem, Farmácia e Fisio-
sunto. Utilizamos em sala muitos dos terapia na Universidade de Caxias do
artigos publicados, para discussões Sul (RS). Além disso, com um médico
em grupo e como referencial teóri- desta universidade, faço pesquisa para,
co em trabalhos científicos. A verda- a partir das condições socioeconômicas
de é que meu interesse por saúde
coletiva cresceu muito.
! Ivanlúcia Oliveira da Silva, Feira de
de mulheres residentes em bairros, ava-
liar o perfil da saúde dessa população,
com o objetivo de aperfeiçoar as ações
Q uero primeiramente parabenizar
a redação da revista pelas ótimas
reportagens da Radis. Sou estudan-
Santana, BA comunitárias que a UCS realiza progra- te de Enfermagem da PUC-Minas e
maticamente em bairros pobres de nos- tenho a honra de receber a revis-
sa cidade e da região. E a Radis ajuda ta. Achei espetacular a edição que

S ou professora universitária da área


de Gestão do Departamento de Saú-
de da Universidade Estadual de Feira
nessas atividades.
! Paulo Luiz Zugno, Caxias do Sul, RS
tinha a epidemiologia como tema
principal [Radis nº 24]. Fui benefi-
ciado, pois tenho a disciplina
de Santana, e tenho sempre utilizado R ADIS PARA JOVENS Epidemiologia e foi de suma impor-
matérias desta revista em discussões tância para o meu entendimento a
com os alunos, considerando a sua im-
portância como material didático.
! Marisa Leal Correia Melo, Feira de
S ou Josefa Martins de Carvalho, di-
retora da Escola Municipal Padre
Ibiapina, localizada no interior de
respeito da disciplina.
! Neimar de Ataide Silva, Belo Horizonte

Santana, BA Pernambuco, e os alunos necessitam ter R ADIS ESGOTADA


acesso a informações precisas e

E stive num fórum em que foi usado


o material de vocês, e gostei mui-
atualizadas sobre a saúde, assim como
vocês o fazem.
! Josefa Martins de Carvalho, Taqua-
S ou aluna do curso de doutorado
da Ensp/Fiocruz. Sempre leio a
revista Radis, porém não consegui
to. Faço na Universidade Regional de ritinga do Norte, PE ter acesso ao número 23 (julho de
2004). Fui informada de que a revis-
ta esgotou na Ensp. Gostaria de re-
ceber, a partir de agora, a revista
expediente em minha casa.
! Ana Cristina Borges de Oliveira, Belo
Subcoordenação Justa Helena Franco Horizonte
Edição Marinilda Carvalho
Reportagem Jesuan Xavier (subeditor), R ADIS EM SUSPENSO
Katia Machado e Wagner
Vasconcelos (Brasília/Direb)

RADIS é uma publicação impressa e online


Arte Aristides Dutra (subeditor) e
Hélio Nogueira
Documentação Jorge Ricardo Pereira
R ecebia minha revista Radis regu-
larmente. Há alguns meses dei-
xei de receber. Por isso venho mui
da Fundação Oswaldo Cruz, editada pelo e Laïs Tavares
Secretaria e Administração Onésimo respeitosamente solicitar que ve-
Programa RADIS (Reunião, Análise e
Difusão de Informação sobre Saúde), Gouvêa e Cícero Carneiro rifiquem o motivo da interrupção,
da Escola Nacional de Saúde Pública Informática Osvaldo José Filho e Ita pois, como gestor e professor, é
Sergio Arouca (Ensp). Goes (estágio supervisionado) de fundamental importância para
Endereço que possa me manter atualizado,
Periodicidade mensal
Av. Brasil, 4.036, sala 515 — Manguinhos
Tiragem 43 mil exemplares
Rio de Janeiro / RJ — CEP 21040-361 devido à excelente qualidade do
Assinatura grátis material.
(sujeita à ampliação do cadastro)
Tel. (21) 3882-9118
Fax (21) 3882-9119 ! Dirceu Krainski Pinto, Curitiba
Presidente da Fiocruz Paulo Buss E-Mail radis@ensp.fiocruz.br
Diretor da Ensp Antônio Ivo de Carvalho
Site www.ensp.fiocruz.br/radis
PROGRAMA RADIS
N
Impressão
ão gostaria de ficar sem rece-
Coordenação Rogério Lannes Rocha Ediouro Gráfica e Editora SA
ber um só mês essa revista de
USO DA INFORMAÇÃO — O conteúdo da revista Radis sáveis pelas matérias reproduzidas. Solicitamos aos
que tanto gosto e que é muito útil
pode ser livremente utilizado e reproduzido em qual- veículos que reproduzirem ou citarem conteúdo de nos meus estudos. Parabéns pela re-
quer meio de comunicação impresso, radiofônico, nossas publicações que enviem para o Radis um exem-
televisivo e eletrônico, desde que acompanhado dos plar da publicação em que a menção ocorre, as refe- vista, ela é ótima.
créditos gerais e da assinatura dos jornalistas respon- rências da reprodução ou a URL da Web. ! Marli Paixão Soares, Rio de Janeiro
RADIS 28 ! DEZ/2004
[ 7 ]

H á uns dois meses não recebo a


revista Radis, e está me fazen-
do muita falta. Gostaria de receber
SÚMULA

novamente, por favor. Sou acadêmi-


ca de Medicina na UFPB, do quarto implantação de pontes e mesmo os
ano, sendo que minha cidade natal é R EMÉDIOS APENAS NAS FARMÁCIAS transplantes cardíacos.
Triunfo, no interior de Pernambuco. Apresentado oficialmente em agos-
! Mauriciana Ferreira, João Pessoa

Prezados amigos, estamos verifi-


D ecisão unânime do Superior Tri-
bunal de Justiça (STJ) proibiu
supermercados de venderem qual-
to no Congresso Europeu de Cardio-
logia, na Alemanha, o estudo teve iní-
cio no fim de 2001, para testar a
cando o problema. Foram retirados do quer tipo de medicamento — mesmo capacidade das células-tronco de
cadastro de assinantes apenas os en- aqueles isentos de prescrição. A de- medula óssea de regenerar artérias
dereços com devolução da revista. cisão foi tomada quando o tribunal do coração. Participaram do estudo
analisou recurso do supermercado 14 pacientes em estado muito grave,
R ADIS NO TRABALHO G.Barbosa & Cia. Ltda., de Nossa Se- sem alternativa de tratamento que não
nhora do Socorro, no interior de o transplante, e com expectativa

A doro o trabalho de vocês, a lin-


guagem que usam e a forma como
abordam os assuntos. Como estou fa-
Sergipe.
A empresa recorreu à Justiça
com mandado de segurança após re-
máxima de vida de seis meses.
A primeira parte do estudo foi
concluída em 2002 com uma cons-
zendo especialização em Saúde Cole- ceber comunicado da Divisão de Vigi- tatação inédita: a terapia celular era
tiva, este material me ajuda a traba- lância Sanitária da Secretaria de Saú- mesmo capaz de regenerar as artéri-
lhar os temas com a comunidade na de do estado, dando prazo de 30 dias as, promovendo maior vascularização
qual atuo, no Centro de Saúde. para que retirasse todos os remédios do coração dos pacientes. O aposen-
! Lieze Fiorese, Curitiba das prateleiras. Segundo noticiou o tado Carlos Oscar Gomes Pareto, de
jornal O Dia, em 14/10, o supermer- 78 anos, que já havia sofrido quatro
cado alegou que o ato protegia o infartos, melhorou muito. “Agora levo

A doro receber esta valiosa publi-


cação da Ensp/Fiocruz. Sou
servidora da Secretaria da Saúde de
monopólio de farmácias e laboratóri-
os, ferindo os princípios constitucio-
nais da livre concorrência.
uma vida tranqüila. Não sinto mais falta
de ar constante, nem cansaço”.
Os médicos suspeitaram que,
Minas Gerais (auditora do SUS), pro- O juiz de primeira instância acei- além de regenerar artérias, as célu-
fessora universitária há 10 anos e tou a alegação, mas a Câmara Civil do las-tronco estariam recriando o pró-
aprecio demais a Radis. Tribunal cassou a decisão, originan- prio músculo cardíaco. Mas faltava a
! Maria de Lourdes Chaves, Divinó- do recurso ao STJ. A decisão da Pri- comprovação definitiva, que veio com
polis, MG meira Turma do Superior Tribunal de a morte de um dos pacientes, vítima
Justiça cria jurisprudência para to- de derrame.
R ADIS 20 ANOS dos os casos semelhantes. — A análise morfológica do cora-
ção do paciente mostrou que, além

Q uero parabenizar toda a equipe da


Radis pela conceituada revista e
pelo sucesso dessa trajetória de in-
R IO USA CÉLULAS - TRONCO PARA
REGENERAR CORAÇÃO
da vascularização, a terapia havia pro-
piciado a criação de novas fibras de
músculo cardíaco — contou Radovan
formação na área de saúde ao longo Borojevic, chefe do Departamento de
de todo esse período, em matérias Embriologia e Histologia da UFRJ, que
brilhantes e estimulantes para a his- também participou do estudo. — Ana-
tória do nosso pais. Gostaria de re- lisando as proteínas expressadas por
ceber se possível a Coletânea Radis essas células constatamos que são
20 anos em minha casa. típicas de músculo cardíaco.
! Eliton Marcio Chagas, Belo Horizonte A OMS lançou em Genebra, na
Suíça, um Atlas global sobre derrame
Prezado Eliton, o CD-ROM está sen- e doenças do coração, que matam
do enviado a bibiotecas e instituições anualmente 17 milhões de pessoas no
de saúde. Você pode acessar a cole- mundo. A organização iniciou campa-
tânea pela internet, no site do Radis nha de esclarecimento com foco na
(www.ensp.fiocruz.br/radis), inclu- população infantil: 18 milhões de cri-
sive com busca no acervo (instru-
ções: www.ensp.fiocruz.br/radis/
pesq_exemplo.html).
E specialistas brasileiros consegui-
ram comprovar pela primeira vez
que é possível regenerar músculos do
anças com menos de 5 anos são obe-
sas no mundo. Hoje, 75% das vítimas
de doenças do coração são de paí-
coração a partir do uso de terapia ses em desenvolvimento. Índia e Chi-
de células-tronco — as células mais na, os mais populosos do mundo, es-
NORMAS PARA CORRESPONDÊNCIA primitivas do organismo, capazes de tão entre os mais afetados.
A Radis solicita que a correspondên- originar tecidos e órgãos. O estudo, — É essencial para a saúde das
cia dos leitores para publicação (car- inédito no mundo, segundo O Globo gerações futuras que o governo de
ta, e-mail ou fax) contenha identifi- de 24/9, foi apresentado por especi- cada país trate a prevenção das do-
cação completa do remetente: nome, alistas do Hospital Pró-Cardíaco e da enças cardiovasculares como assun-
endereço e telefone. Por questões de Universidade Federal do Rio de Janei- to prioritário — disse Jane Voute, di-
espaço, o texto pode ser resumido. ro (UFRJ). A médio prazo, a terapia retora do Federação Mundial do
poderá substituir as cirurgias para Coração.
RADIS 28 ! DEZ/2004
[ 8 ]

de 53,3% — margem de erro de 2 pon- cional de Saúde (Funasa) na Praia Bra-


Í NDICE DNA B RASIL tos percentuais. No Sudeste, esse va, em Angra dos Reis (RJ), atende
percentual chega a 57%, com 3 pontos hoje cerca de 700 índios guaranis das
percentuais de margem de erro. Quan- aldeias Sapucai, Araponga, Parati-Mi-
to ao estado nutricional, 29,4% dos rim e Rio Pequeno.
nordestinos estão acima do peso (mar- Segundo o jornal O Globo, em 1º/9,
gem de erro de 1,6 ponto percentual), o laboratório permite diagnosticar
enquanto no Sudeste esse índice che- com segurança e rapidez doenças
ga a 37,7% e, na média nacional, a 35,3%. provocadas pela água. Há muito, mé-
Das 5 mil famílias entrevistadas em todo dicos que trabalham com essas co-
o Brasil, 1.480 estavam na região. munidades reclamam da contamina-
ção das fontes consumidas pelas
tribos. Inicialmente, a unidade vai tra-
DIVULGAÇÃO
I MPORTAÇÃO M A I S FÁCIL balhar junto ao programa municipal
PARA PESQUISA Médico da Família, voltado especial-
mente para a comunidade indígena

O Senado Federal aprovou no dia


16 de setembro o Projeto de Lei
do Sul Fluminense.

F oi muito comentado na imprensa


o encontro “DNA Brasil”, que reu-
niu durante três dias, em Campos do
de Conversão 43/04, antiga Medida Pro-
visória 191/04, que regulamenta o Im-
porta Fácil Ciência. A proposição isenta
T ERMINA A CPI
DE Ó RGÃOS
DO T RÁFICO

Jordão (SP), 50 especialistas brasileiros “cientistas e pesquisadores, devidamen-


de diversas áreas — as “melhores cabe-
ças do país”, como foram chamados —,
para pensar nos desafios do país nos pró-
te cadastrados, de impostos de impor-
tação de máquinas, equipamentos, apa-
relhos, instrumentos e insumos para
A pós seis meses de investigação so-
bre a atuação de organizações cri-
minosas, a CPI do Tráfico de Órgãos
ximos 50 anos. No encerramento, foi di- pesquisas científicas e tecnológicas”. No concluiu em 19 de outubro seu rela-
vulgado o Índice DNA Brasil, que mede dia 6 de outubro, a Câmara aprovou as tório — assinado pelo deputado Pas-
fatores como renda per capita, mortali- emendas do Senado, e a matéria seguiu tor Pedro Ribeiro (PMDB-CE). O relator
dade infantil, tratamento de esgoto e para sanção presidencial. destaca que, no primeiro bimestre de
lixo e taxa de ocupação formal. O país Os pesquisadores só precisam 2004, o número de transplantes no
ficou com um índice de 46,8%. Ou seja, ser credenciados pelo CNPq para con- país aumentou 44% em relação ao ano
precisa melhorar 53,2%, percentual que seguir a isenção do Imposto de Im- passado. No Brasil, há quase 60 mil
separa “o Brasil que somos do Brasil que portação, do Imposto sobre Produ- pessoas à espera de órgãos — pro-
gostaríamos de ser”. tos Industrializados (IPI) e do Adicional porcionalmente, é a maior lista de
No cenário ideal (100%), o Brasil para a Renovação da Frota da Mari- espera do mundo: um paciente para
deve ter o triplo da renda per capita nha Mercante (ARFMM), em proces- cada 3.600 habitantes.
atual, reduzir para padrões escandi- sos de até US$ 10 mil. Antes da medi- O relatório sugere 17 alterações
navos a mortalidade infantil, avançar no da, somente o CNPq e as entidades na Lei dos Transplantes (9.434/97),
tratamento de lixo e esgoto e ousar de pesquisa sem fins lucrativos eram faz recomendações ao Executivo,
no gasto per capita em saúde. O índi- isentas das taxas de importação. solicita ao Ministério Público o
ce será medido anualmente. indiciamento de oito médicos (por
negligência, captação e transplan-
Í NDIO QUER ÁGUA DE QUALIDADE te ilegais de órgãos), apóia quatro
SUS ATENDE 88% DOS NORDESTINOS projetos de lei sobre o assunto que
tramitam na Câmara e pede à Polí-

U m total de 88% dos 49 milhões


de habitantes do Nordeste são
atendidos exclusivamente pelo SUS.
cia Federal o aprofundamento das
investigações sobre os casos apura-
dos pela CPI.
Este é um dos dados regionais divulga- Foram incluídos no texto os
dos em setembro pelos coordenado- sete principais casos investigados
res da Pesquisa Mundial de Saúde pela CPI, informa o boletim da Agên-
(PMS) no Brasil, realizada em 2003 pelo cia Câmara:
Departamento de Informações em Saú- ! Caso Paulinho Pavesi: em 2000, Pau-
de do Centro de Informação Científi- lo Veronesi Pavesi acidentou-se em
ca e Tecnológica (DIS-Cict) da Fiocruz. casa e foi levado em estado grave ao
Os primeiros resultados do trabalho Hospital Pedro Sanches, em Poços de
saíram em junho (Radis nº 23). A média Caldas (MG), onde foi operado. O pai
nacional é de 74%, e a do Sudeste, de da criança acusou o primeiro médico
67% — ver reportagem completa, in- que atendeu Paulinho de acionar a
cluindo percentuais de margem de Central de Transplantes antes da con-
erro, na página CCS-Imprensa da firmação da morte cerebral do garo-
Fiocruz (www.fiocruz.br/ccs/novida- to. Transferido para o Hospital Santa
des/set04/pesquisa_plo.htm).
Além disso, 47,2% fazem auto-ava-
liação da saúde como boa ou muito boa
O primeiro laboratório de contro-
le de qualidade da água em área
indígena do país já está em funciona-
Casa de Misericórdia, lá sofreu reti-
rada múltipla de órgãos, com decla-
ração falsa de morte encefálica, de-
(margem de erro de 3 pontos percen- mento desde setembro de 2004. A uni- nunciou o pai.
tuais), abaixo da média nacional, que é dade, inaugurada pela Fundação Na- ! Caso Athaíde Patreze: o radialista de
RADIS 28 ! DEZ/2004
[ 9 ]

São Paulo contou em programa da TV


Bandeirantes que o médico Elias David
Neto, do Hospital Sírio-Libanês (São
Paulo), fez-lhe proposta de compra de
um rim por R$ 150 mil. “Não seja bobo,
no Brasil só pobre fica na fila, rico,
não”, teria dito o médico.
! Quadrilha do Recife: o ex-major
do Exército israelense Gedalya DIREITOS DO PACIENTE — Os pacien-
Tauber encabeçava uma associação tes de paralisia, câncer, hanseníase,
clandestina que comprava rins de mo- Aids e várias outras doenças total
radores da periferia do Recife por ou parcialmente incapacitantes têm
até 10 mil dólares. Os candidatos TATUAGEM DE HENNA, UM RISCO — muitos direitos, entre eles, isenção
eram submetidos a exames pré-ope- Engana-se quem pensa que a tatua- de impostos e taxas, descontos, pas-
ratórios no Recife e depois levados gem de henna é inofensiva. A henna se-livre no transporte coletivo, re-
a Durban, na África do Sul, para a é uma tinta de origem indiana, de cor médios gratuitos. Esse paciente
cirurgia. De volta ao Brasil, passavam marrom ou ferrugem, antes usada nos pode requerer: direito a remédios
a captar novos doadores, e recebi- cabelos e agora adotada em tatua- gratuitos e atendimento médico
am 1.000 dólares por voluntário cap- gens provisórias. A tatuagem, feita domiciliar; aposentadoria integral;
tado. Em dois anos, a quadrilha pro- com um cone semelhante à bisnaga isenção de IR, CPMF e contribui-
moveu 38 transplantes. de confeiteiro, dura de uma a duas ção previdenciária; isenção de IPI,
Mais quatro casos são citados no semanas, e por isso tem atraído prin- ICMS, IOF e IPVA (esta, vitalícia) na
relatório: o de um menino de Brasília, cipalmente as crianças. Pois esse compra de carro especial; direito
o dos quatro médicos de Taubaté (SP) material está causando irritação, in- a saque integral de FGTS, PIS/Pasep;
acusados de eutanásia e transplan- flamação e até infecção. Recente- direito à quitação do financiamen-
tes ilegais — denunciados por homi- mente, a Radis conferiu, nas costas to da casa própria. A advogada
cídio pelo Ministério Público —, o da de uma criança de 11 anos, uma feri- pernambucana Antonieta Barbosa
venda ilegal de cadáveres em Franco da séria, infeccionada, no local do consolidou todos esses direitos no
da Rocha (SP) e o da importação de desenho de uma aranha feito com a livro Câncer: direito e cidadania
córneas. A CPI adverte o Ministério tinta. Se o processo da tatuagem foi (Editora ARX).
da Saúde de que a importação de simples e rápido, o mesmo não acon-
córneas é crime e solicita ao MP o teceu com o tratamento: nosso pe- CT&I ONLINE — A Fundação de Ampa-
indiciamento de funcionários envol- queno tatuado teve que tomar ro à Pesquisa do Estado de São Paulo
vidos em tal esquema comercial. antiinflamatório por 10 dias, além de (Fapesp) lançou em outubro um ser-
aplicar pomada no local e ficar sem viço de grande utilidade para pesqui-
tomar sol enquanto houver vestígios sadores, gestores e profissionais da
P RECONCEITO E HANSENÍASE do ferimento. Esse é um alerta para área de ciência, tecnologia e inova-
as muitas mães que desconhecem o ção (CT&I). Trata-se do Fapesp.Indica

A hanseníase e o preconceito ca-


minham juntos. No centro da cri-
se política que resultou na troca do
perigo de uma tatuagem de henna,
porque o episódio não é isolado. A
médica que tratou nosso paciente
( w w w. f a p e s p . b r / i n d i c a d o r e s /
index2.php), que consolida os muitos
sistemas de informação existentes. O
ministro da Defesa, em 4 de novem- afirmou já ter visto outros casos. serviço é dividido em três partes:
bro de 2004, a mágo do cabo refor- ! INDICA.ORG, para pesquisa de fon-
mado José Alves Firmino. Nos anos A PORTA DO INFERNO — Leitura tes primárias de informação sobre in-
1990, servia como informante do imperdível: a repórter Conceição Lemes, dicadores de CT&I — um banco de
Exército, espionando os encontros do site nomínimo (http://nominimo. dados sobre instituições e mecanis-
de partidos de esquerda. Mas con- ibest.com.br/), passou os meses de mos de ação, públicos ou privados,
traiu hanseníase, e sua carreira de- abril, maio e junho testando o duplo nacional ou internacional, que pro-
sandou. Tentou se aposentar, mas atendimento (para pacientes do SUS duzem, processam e/ou difundem es-
teve o pedido negado, sendo trans- e pacientes de planos de saúde) no tatísticas, documentos técnicos ou
ferido de Brasília para Goiânia. Sen- Hospital das Clínicas da Faculdade de indicadores de CT&I.
tindo-se discriminado e perseguido, Medicina da USP e no Hospital São Pau- ! INDICA.BIB, para pesquisa de fon-
resolveu guardar arquivos secretos lo, da Unifesp/Escola Paulista de Me- tes documentais — um banco de da-
sobre prisões e tortura na ditadura, dicina — reconhecidos centros de ex- dos bibliográfico com referências
revelados recentemente pelo Cor- celência em ensino, pesquisa e das principais publicações, docu-
reio Braziliense. A reportagem pro- assistência. Pela porta 1 entram os mentos técnicos e bases de dados
vocou nota oficial do Exército escri- usuários do SUS, conta ela. “Outra online relativos a indicadores de
ta em termos incompatíveis com a entrada menos vi- CT&I de entidades nacionais e in-
democracia, gerando a crise no go- sível, sem filas e em ternacionais.
verno e a demissão do ministro José preocupante pro- ! INDICA.TAB, para pesquisa de in-
Viegas, da Defesa. cesso de expansão: dicadores de CT&I — um banco de
a porta 2, restrita dados que contém séries de dados
aos convênios e pa- consolidados e pré-formatados re-
SÚMULA é produzida a partir do acom- cientes particula- lativos aos principais indicadores de
panhamento crítico do que é divulgado res.” A Radis nº 19, CT&I do estado de São Paulo, do Bra-
na mídia impressa e eletrônica. de março de 2004, sil e internacionais, indexados por
tratou do assunto. variáveis diversas.
RADIS 28 ! DEZ/2004
[ 10 ]

ORÇAMENTO DA SAÚDE 2005

s
PreSsao sOciAl
por mAIS vErba
pAra O sUS
Aprovado, o PLC 1/03, que esta-
Wagner Vasconcelos belece para a saúde 10% das receitas

U
correntes brutas da União, vai derra-
m capítulo histórico para mar sua influência sobre os orçamen-
a saúde brasileira começou tos futuros. E haverá mudança pro-
a ser escrito no Congresso funda não só no destino dos recursos,
Nacional neste finzinho de mas sobretudo nas relações entre
2004. Depois da aprovação da Lei de população e governo e entre o go-
Diretrizes Orçamentárias (LDO) para verno federal e as outras duas esfe-
o próximo ano, os parlamentares se ras de poder.
debruçaram sobre a Lei Orçamentá- Na contagem regressiva à espera
ria Anual (LOA), que prevê para 2005 da votação da LOA e do PLP 1/03 (si-
um montante de quase R$ 40 bilhões glas, siglas...), Brasília se transformou
para a saúde. O toque diferente em numa espécie de antena de rádio que
relação a outras votações de verbas capta as mais variadas ondas eletro-
para o setor cabe à tramitação para- magnéticas vindas de todos os pontos
lela do Projeto de Lei Complementar do Brasil. A freqüência e a amplitude
1/03, regulamentando a Emenda Cons- dessas ondas têm um nome comum:
titucional 29 (EC 29), tão cara aos que pressão social. Os agentes que lutam
lutaram pela reforma sanitária brasi- pela melhoria do Sistema Único de
leira. Sua aprovação, garantem os es- Saúde, hoje como em outros momen-
pecialistas em orçamento, pode ser tos históricos, quando surfam nessas
comparada à criação revolucionária ondas ganham o poder mágico de de-
do SUS, há quase 15 anos: a área da cidir o tratamento que o Brasil dará à
saúde terá dinheiro como nunca em saúde do povo nas próximas décadas.
nossa história. Palavra dos especialistas.
RADIS 28 ! DEZ/2004
[ 11 ]

É sempre assim: quando viramos orçamento — o planejamento dos O DINHEIRO QUE


a folhinha do calendário para o mês gastos de acordo com as receitas. NOS INTERESSA
de dezembro fazemos promessas — “A lei orçamentária traz dentro
quase sempre as mesmas: começar dela o orçamento”, já vai explicando
um regime, pintar a casa, fazer Elias Antônio Jorge. As pessoas costu-
exercício, conhecer a mam tratar o orçamento
Bahia... enfim, promessas como um produto, mas ele
geralmente associadas à considera o orçamento um
esperança em dias melho- processo, porque o que
res. Também fazemos con- aconteceu neste ano deter-
tas, que parecem nunca mina o que vai ocorrer no Embora com a previsão de R$ 39,2
fechar. Equilibrar o que ano seguinte. “O que não é bilhões para o orçamento total da saú-
gastamos e o que ganha- diferente das finanças pes- de, isso não queria dizer que todo esse
mos é um complicado soais”, afirma. “O que você dinheiro seria investido em ações e
exercício. Com o governo, arrecadou e gastou no mês serviços de saúde. Desse montante, ain-
a natureza das contas é di- anterior tem repercussões da seriam descontados o pagamento
ferente, mas a essência do dilema é neste mês atual, que por sua vez terá dos aposentados, o serviço da dívida e
parecida (pelo menos o governo já repercussões sobre o mês seguinte”. as parcelas do Fundo de Erradicação
conhece a Bahia!). Mas como é construído o orça- da Pobreza. Para os aposentados iriam,
O Projeto de Lei Orçamentária mento? Pois o primeiro passo é a ela- em 2005, R$ 3,1 bilhões. O serviço da
Anual (Ploa para os íntimos) prevê que boração, por parte do Executivo, de dívida, isto é, o pagamento dos juros
o Ministério da Saúde tenha à dispo- um Projeto de Lei de Diretrizes Or- pelos empréstimos que a área de saú-
sição R$ 39,2 bilhões em 2005. O exer- çamentárias — que, ao ser aprova- de tomou, deveria chegar a R$ 600 mi-
cício de 2004, ainda não encerrado, do, passará a se chamar Lei de Dire- lhões. O Fundo de Erradicação da Po-
deve fechar em R$ 36,5 (a explicação trizes Orçamentárias, a tal da LDO breza levaria mais R$ 323 milhões.
disso vem abaixo). O aumento de qua- citada no início desta matéria. Esse Seria preciso descontar, portan-
se R$ 3 bilhões em relação a este ano projeto é enviado à avaliação no Con- to, R$ 4,23 bilhões, a soma des-
ainda decorre da variação nominal do gresso até o dia 15 de abril, e preci- ses três gastos. Às ações e aos
Produto Interno Bruto (PIB) — crité- sa estar aprovado antes do recesso serviços de saúde restariam en-
rio que, caso seja aprovado o PLP 1/03, parlamentar do meio do ano. Nem tão cerca de R$ 35,2 bilhões. No
deixará de existir. sempre ocorre assim: quem acompa- linguajar técnico, esses descon-
O orçamento da saúde sempre nha essa questão sabe que enquan- tos eram justificados assim: “Para
instiga embates. Por isso a Radis deci- to o Congresso não aprova o Orça- fins de cumprimento da emenda”. A
diu fazer uma radiografia desse nor- mento os parlamentares ficam de emenda, claro, é a nossa célebre e que-
malmente árido assunto e, para isso, castigo (ainda que remunerado...), rida EC 29, que estabelece o que é e o
conversou com Nelson Rodrigues dos sem poder entrar em férias. Neste que deixa de ser ação e serviço de saú-
Santos, o Nelsão, diretor de Programa 2004, a aprovação da LDO ocorreu de. A pressão social evitou esses desvi-
da Secretaria de Gestão Participativa em 13 de julho, e o presidente san- os, como veremos adiante.
do Ministério da Saúde, e Elias Antô- cionou a lei em 15 de agosto. Para o ano de 2004, o orçamen-
nio Jorge, diretor de Economia da Um detalhe importante: projeto to total previsto é de R$ 36,5 bilhões.
Saúde do ministério. de lei orçamentária tem tramitação di- Para “fins de cumprimento da emen-
-
ferente dos demais projetos. A LDO não da”, ou seja, descontados os gastos
QUE BICHO E ESSE? é votada em dois turnos separados na extra-SUS, o montante final fica em
Câmara dos Deputados e no Senado torno de R$ 33,2 bilhões. “Na verda-
Federal. É tudo ao mesmo tempo. Com- de, quando se comparam esses dois
plicado? De forma alguma. É matéria tí- elementos (2004 e 2005) a gente tem
pica de avaliação mista, ou seja, de de- um crescimento aquém da expectati-
putados e senadores em conjunto, va da variação nominal do PIB. Isso
num total de 594 parlamentares (513 deve, necessariamente, gerar um pro-
deputados e 81 senadores). Depois de cesso de discussão no governo, no Con-
ser discutido e de receber emendas, gresso e na sociedade”, prevê Elias.
Antes de mais nada é preciso o projeto é votado em turno único. De acordo com ele, os valores pre-
entender o que é orçamento. Esque- Aprovada, a nossa LDO estabele- vistos para o próximo ano, em compa-
ça, por enquanto, números gigantes- ce não os valores, mas a forma pela ração a 2004, representam um cresci-
cos e cálculos complicados. Concen- qual o governo vai gastar o dinheiro no mento inferior a 10%, e a variação
tre-se em sua rotina doméstica. Seu exercício seguinte, ou seja, no ano que nominal do PIB de 2003 para 2004, ao
salário, ganho com o suor de seu tra- vem. A importância da LDO é que ela que tudo indica, deve ser superior a
balho, é usado para manter as des- serve de base para a elaboração da Lei 10%. Explicando: a variação nominal do
pesas da casa e garantir comida, lazer, Orçamentária Anual, aquela simpática PIB quer dizer o crescimento real do
saúde, escola, condução, roupas etc. LOA, lembram? Essa, sim, fala de dinheiro PIB mais a inflação. Como o crescimen-
O governo também tem seu “salário”, propriamente dito. E ficou aguardan- to real está previsto para um valor
que ele chama de “receita”. A recei- do exame no Congresso, porque os dois entre 4% e 5%, e a inflação deve supe-
ta é decorrente de todos os impos- turnos das eleições municipais manti- rar um pouco os 6% ou 7%, está
tos que nós, os brasileiros inseridos veram os parlamentares em suas cida- explicada a preocupação.
na economia formal, pagamos. Assim des. A LOA, por lei encaminhada pelo “Mas isso não é inconstitucio-
como planejamos o uso do salário Executivo ao Congresso até 31 de agos- nal?”, perguntamos todos. “Não neces-
segundo nossos compromissos, o go- to, precisa ser votada até 15 de de- sariamente”, responde Elias. E explica:
verno também faz sua programação. zembro — senão os parlamentares fi- — Depende do que acontecer no
Pronto. Agora você já sabe o que é cam de novo de castigo. dia 31 de dezembro. Esses R$ 33,2 bilhões
RADIS 28 ! DEZ/2004
[ 12 ]

são a previsão do que será executado para 2004. O parágrafo 2º do Artigo e da supremacia do Executivo em
até o último dia de 2004. Caso os R$ 33,2 59 da LDO 2004, obedecendo à EC- relação ao Legislativo.
bilhões sejam realmente executados, aí 29, dizia que os recursos para o Fun- — No dia em que se tornar al-
os R$ 35,3 serão insuficientes para atin- do de Erradicação da Pobreza, para guma parte do orçamento obrigató-
gir o cumprimento da emenda. o pagamento das dívidas da saúde e rio, em vez de autorizativo, será
Lembrem-se de que precisamos dos inativos — ou seja, os gastos ex- mudada a correlação de forças na
somar aqueles três gastos já mencio- tra-SUS — não poderiam ser consi- questão orçamentária entre esses
nados. Para facilitar: supondo que para derados como ações e serviços de dois poderes. Diminuirá a importân-
2005 seja aprovado um total de R$ 35,2 saúde. Ou seja, não poderiam ser cia do Executivo e aumentará a do
bilhões, e que em 2004 sejam executa- retirados daquilo que é destinado Legislativo. Isso, numa determinada
dos os R$ 33,2 bilhões, o que aconte- exclusivamente ao SUS. Mas o pre- medida, pode ser bastante saudá-
ce? “Para não se cair numa ilegalidade sidente vetou esse parágrafo. A po- vel para a vida política nacional que
vai ter de ser usado o recurso da lêmica foi grande e as reclamações, trata da coisa pública.
suplementação orçamentária ao longo devido à perda de recursos, foram
do exercício seguinte”, esclarece Elias. generalizadas. Diante de toda a con- OS PASSOS DO DINHEIRO
A LOA então deve ser votada antes trovérsia, o governo voltou atrás e
do prazo para aplicação dos recursos garantiu os recursos que antes do
de 2004. Elias explica que, exatamente veto estavam previstos para ações
por isso, no debate da regulamentação e serviços de saúde. Segundo os es-
da EC 29 foram discutidas algumas hipó- pecialistas, caso o veto tivesse vi-
teses sobre a vinculação dos recursos gorado, o SUS teria perdido, em
federais distinta da variação nominal do 2004, cerca de R$ 3,5 bilhões. De
PIB, porque a própria variação nominal acordo com projeções deles, ao fim
do PIB de 2004 sobre 2003 só será co- dos quatro anos de governo, as Empenho, execução, liquidação
nhecida ao longo do exercício de 2005 ações e os serviços de saúde teri- e outros termos herméticos assim
(o PIB varia, e o que se previu ontem am perdido uma média entre R$ 20 sempre estiveram ligados às notícias
não se realiza hoje: esse fantas- bilhões e R$ 22 bilhões. sobre orçamento a que tivemos aces-
ma tem assombrado o ministro da Elias atenta para alguns detalhes so. Mas agora chegou o momento de
Saúde ao longo do ano). em relação à noção de orçamento e entendê-los. Para isso, nada melhor
A lei obriga que estados à atenção dada a alguns aspectos do do que mais um exemplo da nossa vida
e municípios vinculem os in- assunto. De acordo com ele, as pes- prática, dado pelo próprio Elias, que
vestimentos em saúde às re- soas prestam muita atenção no pro- é, lembre-se, diretor de Economia da
ceitas. Estados, 12% do total dos im- duto, e mais ainda ao menos impor- Saúde do Ministério da Saúde.
postos estaduais; municípios, 15% da tante: a discussão do projeto no Suponha que você entre numa
receita. A 12ª Conferência Nacional Legislativo. Para ele, o que é funda- loja e, bem-atendido por um sorri-
de Saúde aprovou, e o PLP 1/03 de- mental e relevante é o processo de dente vendedor, escolhe um produ-
fende exatamente isso, que a União, execução dos recursos. “Não adian- to: uma geladeira. Se escreve no ca-
em vez da traiçoeira variação nomi- ta nada constar na lei se não for nhoto do talão de cheque o valor
nal do PIB, aplique na saúde 10% das executado”, alerta. “Nesse aspecto, do produto, você ainda não entre-
receitas correntes brutas. “Aí terí- é evidente que o Executivo tem muito gou o cheque ao vendedor, mas já
amos um grau de precisão maior importância do que o está abatendo o preço da geladeira
maior, porque o Congres- Legislativo, porque compete de seu saldo bancário. “Orçamenta-
so estaria votando uma a ele formular a proposta ori- riamente” falando, você “empenhou”
previsão de receitas e, por- ginal e depois executá-la”. sua palavra com o vendedor de que
tanto, uma previsão de re- A Lei Orçamentária, é vai fazer aquela compra.
cursos para a saúde da importante esclarecer, tem O vendedor, então, faz alguns
mesma forma que se exige caráter autorizativo. Isso acertos com você e manda entregar
de estados e municípios”, quer dizer que, caso haja o produto em sua casa. Quando você
diz Elias. a receita, o Poder Execu- assina a nota fiscal dizendo que re-
— Isso daria um espec- tivo fica autorizado a fazer cebeu a geladeira, parabéns, você
tro mais isonômico. A Ploa a despesa. Mas aí surge acabou de fazer uma “liquidação”.
que está no Congresso não levou em uma polêmica. Estar “autorizado” Ou seja, reconheceu sua dívida. Es-
conta isso. Levou em conta a estima- não significa estar “obrigado”. E já tando ela reconhecida, o cheque
tiva atual de variação nominal do PIB. existem discussões avançadas em re- entregue ao vendedor, você não só
lação a isso. De acordo com Elias, reconheceu a dívida como deu a ele
AVANCOS
, E PODERES há uma proposta em discussão no um instrumento para que possa re-
Congresso — capitaneada pelo se- ceber o dinheiro referente ao pro-
nador Antônio Carlos Magalhães duto. Mas o fato de entregar o che-
(PFL-BA) — de criar a figura da que significa que o processo ainda
“obrigatoriedade”. está na fase de liquidação. Enquan-
“Em 1990, foram introduzidas to o vendedor não levar esse che-
emendas no orçamento para que, que no banco e o dinheiro não for
em alguns tópicos, em vez do uso transferido para a conta dele, o pa-
do termo fica autorizado a fosse gamento não foi feito.
O avanço em relação à LDO para usada a expressão fica obrigado a”, Outro detalhe importante: se
2005 é que ela não veio acompanha- lembra. A iniciativa, no entanto, não você não gastar o dinheiro com a com-
da do que Nelsão e Elias classificam prosperou, embora o relator a te- pra fica com seu saldo intacto. Pois
de “problema original”, verificado nha acatado. O que ela traria como bem, é assim que funciona com o go-
quando da discussão da proposta conseqüência? A quebra do poder verno. Ele analisa onde vai aplicar os
RADIS 28 ! DEZ/2004
[ 13 ]

recursos de que dispõe e empenha o


dinheiro para tal investimento. De- GASTOS EM SAÚDE NO MUNDO
pois, ao analisar que o investimento *Em dólares, por habitante/ano
é mesmo necessário ou promissor, faz
a liquidação. “No caso do orçamento
público, se não for feito o empenho
aquilo não é mais considerado, pode
até virar recursos para o ano seguin-

REPRODUÇÃO DA RADIS 18
te, mas para aquele exercício ele está
incinerado”, explica Elias.
Agora que você já é praticamen-
te um especialista em orçamento
público, e deve estar se perguntan-
do sobre os dados referentes ao que Fonte: Gilson Carvalho
foi gasto ao longo deste ano, vamos a
eles. Bem, como o ano ainda não ter-
minou, os dados não estão fechados. restos a pagar”, ensina Nelsão. “É representavam os usuários, os paci-
Uma simples consulta à página do dotação orçamentária deste ano, entes e até do empresariado, como
Conselho Nacional de Saúde (http:// mas que será executada financeira- a Federação Nacional de Agricultu-
conselho.saude.gov.br/) pode ser mente no ano seguinte”. ra, a CNI. A partir daí, parlamenta-
bastante útil. Lá se sabe, por exem- res eram abordados nos fins de se-
plo, que até junho deste ano foram OS 54 TELEFONEMAS mana em suas casas, em suas
liquidados R$ 15,5 bilhões, o que cidades e nos corredores do Con-
corresponde a 42,44% do orçamento gresso. “E isso foi feito de monte:
do Ministério da Saúde. Até o fecha- tínhamos plenárias de saúde com 800
mento desta reportagem da Radis, conselheiros, a CNBB mantinha seis
uma reunião do CNS, na qual dados bispos rodando pelos corre-
mais atualizados seriam discutidos, dores do Congresso, ao lado
ainda não havia sido realizada. da CUT, da CGT, da Força Sin-
No boletim Em Questão de 8 de dical, da Contag”, continua
outubro, entretanto, a Secretaria de É no grau de mobilização e orga- Nelsão. “A emenda 29 foi a so-
Comunicação da Presidência da Re- nização da sociedade civil que Nelsão ciedade civil mobilizada”.
pública informa que até 30 de setem- ampara sua esperança na aprovação Na opinião dele, depois do proces-
bro haviam sido comprometidos 78,4% do PLP 1/03. Essa mobilização resulta so eleitoral já é necessário dar muito
dos recursos reservados aos ministé- em pressões populares e de entida- subsídio para essa mobilização. “E não
rios para custeio e investimento em des representativas, que favorece- só para aprovar o projeto, mas para
2004, “a melhor execução orçamen- ram, por exemplo, a aprovação dos aprová-lo em caráter de urgência” —
tária desde 1998”. No Ministério da princípios da Reforma Sanitária na seguindo diretamente para o Plenário
Saúde, para empenho até dezembro Constituição Federal de 1988 e a cri- da Câmara. O pedido de urgência, da
havia R$ 29.009.955; empenhados, ação do SUS em 1990. “Isso voltou a Frente Parlamentar de Saúde, não en-
23.638.810, e liquidados, R$ 20.152.556. acontecer em vários momentos de controu eco até 10 de novembro, quan-
Por sinal, é grande a diferença entre crise nos anos 90, mas com muita cla- do foi aprovado pela Comissão de Finan-
os recursos da saúde e os das demais reza no ano 2000, com a aprovação ças e Tributação. Diz Nelsão:
áreas do governo: a Educação tem da emenda 29”, lembra Nelsão. O grau — Pela primeira vez um projeto
verba empenhada cinco vezes menor de mobilização e organização pela EC separa e identifica com clareza o que
(R$ 6 bilhões); o Desenvolvimento So- 29 foi muito menor do que lá trás, são ações e serviços públicos de saú-
cial e Combate à Fome tem R$ 5,8 bi- quando da criação do SUS, “mas foi de e o que eles representam para
lhões empenhados, e a Defesa, R$ 4,6 suficiente para descolar a aprovação efeito de financiamento do SUS. Isso
bilhões. Ainda assim, o investimento dela, que sofria resistências do rolo quebra um grande sofisma, porque
do Brasil na saúde é baixo, se compa- compressor do governo da época — tudo interessa à saúde: educação, ali-
rado a outros países (ver quadro). Ministério da Fazenda, Casa Civil e Pa- mentação, transporte, trabalho e
Nelsão prevê que, assim como lácio do Planalto”. merenda se refletem na saúde, mas
novembro, dezembro será um mês Sobre isso, Nelsão conta um são de outros setores do Estado e de
de grande execução orçamentária. caso, que ficou conhecido como “os governo. Não é porque determinam
Deve ficar como restos a pagar um 54 telefonemas”. O Ministério da Fa- condições de saúde que devem en-
volume significativo de recursos. Se zenda fez 27 telefonemas para 27 se- trar no orçamento do SUS.
esses recursos não forem utilizados cretários estaduais de Fazenda e, em Empolgado com os 15 anos que
nem entrarem como restos a pagar, seguida, 27 telefonemas para os 27 o SUS completa no ano que vem,
corre-se o risco de “incineração” governadores. A idéia era fazê-los Elias Antônio Jorge diz que, como o
desse dinheiro. Restos a pagar, es- pressionar suas bancadas a não apro- sistema vai debutar em 2005, seria
clarecendo, é o que não foi pago varem a emenda, do contrário, o go- uma excelente valsa a aprovação do
durante um exercício, mas que foi verno não rolaria a dívida dos esta- projeto que não trata apenas da
executado do orçamento presente. dos. “Do outro lado, a sociedade se quantidade de recursos, mas sim de
“Por exemplo, você tem R$ 30 bi- organizou e se mobilizou, os conse- “uma reflexão sobre essa fantásti-
lhões e empenha R$ 25 bilhões: os lheiros conseguiram sair do seu isola- ca experiência que é a tentativa de
cinco que você não empenhou de- mento e conseguiram se empolgar, implantação e construção do Siste-
saparecem; mas, se empenha R$ 25 mobilizar as diretorias de suas enti- ma Único de Saúde”. Nelsão con-
bilhões e paga R$ 20 bilhões, esses dades”, lembra. Não só os trabalha- corda: “A aprovação do projeto é o
cinco que não foram pagos viram dores da saúde, mas as entidades que renascimento do SUS”.
RADIS 28 ! DEZ/2004
[ 14 ]

V IIG
GIL Â NC I A SA N I T
TÁÁRIA

Propaganda
de remédio faz
mal à saúde

ganda, compra, sim, medicamentos de remédio deve ser utilizado apenas por
Jesuan Xavier qualidade e efeito duvidosos”. um público específico, que realmen-

A
Entre os remédios que conside- te tenha problema fisiológico, e por
indústria farmacêutica inves- ra “pouco confiáveis”, destacou, es- indicação médica”.
te mais hoje em propaganda tão principalmente os que prometem Outro artifício recorrente da
e marketing do que em pes- emagrecimento rápido e de combate indústria farmacêutica, na tentativa
quisa. A constatação é da à disfunção erétil. “São os chamados de ludibriar o consumidor, é o símbo-
advogada Ana Paula Dutra Massera, remédios milagreiros”. De acordo com lo ISO 9000, que a indústria banalizou
da Agência Nacional de Vigilância Sa- dados da Anvisa, o Brasil está entre como suposta prova de excelência.
nitária (Anvisa). Ao lado de outros os países que mais consomem medi- “Isso nem deveria constar das emba-
especialistas no assunto, ela parti- camentos no mundo. O país ocupa lagens de medicamentos. Não faz par-
cipou em outubro do seminário Pro- atualmente o 10º lugar no ranking te dos requisitos exigidos pela
paganda de Medicamentos no Brasil, mundial do mercado farmacêutico, Anvisa”, explicou.
na Escola Nacional de Saúde Públi- com média de 1,6 bilhão de caixas ven- Ana Paula ressaltou que a Anvisa,
ca Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz), no didas anualmente. dentro de suas possibilidades, tenta
Rio de Janeiro. Pior do que isso, dos remédios coibir esse tipo de propaganda. “Sa-
Segundo Ana, que chefia a Uni- de venda livre, amplamente propa- bemos que ainda é pouco, mas já te-
dade de Monitoramento e Fiscaliza- gandeados em revista, rádio, TV e jor- mos observado algum progresso: atu-
ção de Propaganda, Publicidade, Pro- nal, 20,5% não apresentavam sequer almente, aqueles folhetos de preços
moção e Informação de Produtos informações sobre contra-indicação — que são distribuídos nas farmácias não
Sujeitos à Vigilância Sanitária da item obrigatório pela legislação brasi- podem ter qualquer artifício de
Anvisa, dos cinco remédios mais con- leira —, segundo levantamento feito marketing”, contou. “Esse já foi um
sumidos no Brasil, três dispensam re- pela Anvisa no ano passado. “Essa in- grande passo no combate ao abuso”.
ceita médica — Novalgina, Neosaldina fração, seguida de perto pelos produ- Para corroborar sua afirmação,
e Cataflan (versão spray e pomada). tos que nem têm registro no Ministé- ela exibiu dados do Ministério da Saú-
Ou seja, o consumidor, influenciado rio da Saúde, é a mais freqüente”. de, pelos quais se pode constatar a
pelo marketing, acaba comprando Ana citou outros abusos na pro- evolução nos autos de infração. “Se
medicamentos às vezes sem nem pre- paganda de remédios. “A do Viagra, pegarmos o ano corrente até setem-
cisar. “Não estou dizendo que é o por exemplo, dava conotação de uso bro, verificamos que houve 254 noti-
caso específico desses remédios, mas recreativo do produto”, lembrou. ficações de infrações; em 2000, esse
o consumidor, por causa da propa- “Isso era um absurdo. Esse tipo de número foi de apenas 36”.
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MULTAS IRRISÓRIAS
Ao seu lado na mesa de deba-
tes, o jornalista Álvaro Nascimento, No vácuo do Vioxx, o oportunismo
da Ensp/Fiocruz, defendeu uma am-
pla reformulação na lei que regula-
menta a propaganda de medicamen-
tos no Brasil, porque a atual é
A suspensão da venda do antiinfla-
matório Vioxx (laboratório Merck)
em 80 países, por gerar risco de
verdade, já que se houver abuso ou
mau uso pode causar úlcera ou he-
patite”, disse Ana. A Roche terá pra-
insuficiente. “Já ficou demonstra- enfarte e derrame, mostrou como zo de defesa e, se mantida a deci-
do que multas irrisórias e posterio- a indústria farmacêutica pode ser são da Anvisa, deverá ser multada
res à veiculação do produto na mídia oportunista. Na ânsia de conquis- em até R$ 1,5 milhão.
não resolvem. O modelo regulatório tar o público que ficou órfão de O Vioxx foi retirado das farmá-
é errado, pune depois, quando o um dos remédios mais consumidos cias em 30 de setembro, após divul-
mal já está feito”. no mundo, algumas empresas ten- gação de estudos recentes da FDA
Segundo ele, a indústria farma- taram se aproveitar desse vácuo e (a Anvisa americana). O medicamen-
cêutica investe em publicidade no erraram a mão. to pode ter provocado 27 mil ata-
país cerca de R$ 3 bilhões anualmen- No Brasil, foi o caso do labora- ques cardíacos e derrames nos Es-
te — 20% do faturamento do setor. tório Roche, cujo anúncio do napro- tados Unidos — alguns resultando
“Se pegarmos dados da própria Anvisa, xeno sódico 275 mg (Flanax) foi em mortes.
as multas aplicadas entre 2001 e 2004 suspenso logo que passou a ser vei- A agência americana liberou o
chegaram a R$ 9 milhões”, informou. culado na mídia. “A Anvisa abriu pro- remédio antes do término desses es-
“Ou seja, não representaram nada cesso contra a Roche por conside- tudos. Por que a Anvisa também libe-
para essas empresas que gastam tan- rar que a propaganda poderia rou o Vioxx?, perguntou a Radis. “A
to em propaganda” confundir o consumidor”, informou liberação de um remédio como esse
Em sua dissertação de mestrado, Ana Paula Massera. se dá com base em estudos científi-
Álvaro analisou 100 anúncios, entre O anúncio “Existe uma alter- cos”, disse Ana. “E todos os estudos
outubro de 2002 e julho de 2003. “Ne- nativa confiável contra as inflama- feitos com o Vioxx, na ocasião do lan-
nhum deles cumpria todas as reco- ções” foi publicado em revistas e çamento, indicavam que o medica-
mendações da Anvisa”. Segundo sua jornais, e sugeria que o naproxeno mento era confiável. Tanto que era
pesquisa, a maior parte dos anúncios não traz risco algum. “O que não é vendido em dezenas de países.”
não mencionava contra-indicação.
“Quando tinha, limitava-se apenas a
‘esse medicamento pode causar tomas, o médico deverá ser con- bem-elaborados e de visual atraen-
hipersensibilidade aos elementos da sultado”, presente nas embalagens te”, denunciou.
fórmula’. O que diz isso ao consumi- dos remédios por exigência da lei: De 87 medicamentos em propa-
dor? Simplesmente nada”. Na TV, re- “A indústria farmacêutica não con- gandas captadas por ela em consul-
clamou, a contra-indicação, quando seguiria melhor se tivesse pedido tórios médicos de Juiz de Fora, para
existe, aparece em letras minúscu- tal frase a seus publicitários: é uma sua dissertação de mestrado na Uerj,
las, ultra-rápido, impossível de se ler”. grande peça publicitária, pois aca- nem 10 tinham sequer registro do Mi-
Álvaro constatou a correlação ba estimulando o consumo do pro- nistério da Saúde. “O que torna o ab-
entre a falta de uma boa informa- duto”. surdo ainda maior, visto que as propa-
ção ao consumidor e os casos de gandas estavam sendo distribuídas em
intoxicação por medicamento: em O ASSÉDIO AOS MÉDICOS consultórios, lugares tidos como de
um ano, segundo dados do Ministé- A pesquisadora Rita de Cássia ‘credibilidade’.”
rio da Saúde de 2001, 12 mil pessoas Alves Vieira, da Universidade Fede- Atualmente, o nível de intoxica-
foram intoxicadas por remédios. ral de Juiz de Fora, foi além. Para ção por medicamento no Brasil supe-
“Isso quer dizer que, a cada 40 mi- ela, os profissionais de saúde estão ra os casos de acidentes com animais
nutos, uma pessoa dá entrada no sendo assediados vergonhosamente peçonhentos, produtos químicos e
SUS por causa disso”. pela indústria farmacêutica. “Agen- pesticidas. “A contra-indicação,
O jornalista condenou a tradi- tes de propaganda bombardeiam os quando presente na bula, sempre
cional frase “A persistirem os sin- consultórios com folhetos muito minimiza os riscos”.

Infrações mais frequentes


1 Não menciona a contra-indicação
principal
2 O produto não é registrado

3 Apresenta mensagens como “aprovado”,


“recomendado”
4 Sugere ausência de efeitos colaterais

5 Realiza comparações sem embasamento


científico
6 Sugere menor risco

1 2 3 4 5 6 Dados de Dezembro de 2003 Fonte: ANVISA


RADIS 28 ! DEZ/2004
[ 16 ]

3º SEMINÁRIO NACIONAL EM SAÚDE E AMBIENTE

Ética e eqüidade
diante da incerteza
do conceito de ambiente, ou seja, técnico-científicas, não consegue
de sobrevivência das espécies. Mas o analisar e responder adequadamen-
conceito avançou com a geografia, “ga- te aos problemas envolvendo riscos
nhando um enfoque jurídico-político, complexos e incertos”, alertou Firpo.
ou seja, ligando a idéia de Estado e Para ele, as tecnologias são cons-
território, e um enfoque etológico, truções sociais, que expressam inten-
que explica a territorialidade huma- ções, visões de mundo, conhecimen-
na”, disse (a etologia estuda os hábi- tos e ignorâncias. “Como citam os
tos dos animais e sua acomodação às autores Turner e Pidgeon, as organi-
condições do ambiente). No caso, os zações e os projetos tecnológicos
hábitos do homem. E conhecê-los é estão relacionados a certas inten-
essencial para que as autoridades de ções, e sua execução e os muitos ris-
saúde distribuam cada serviço ou uni- cos e desastres são produtos dessas
dade, disse Mauricio Monken. Colo- intenções”, disse o pesquisador.
car em prática tal idéia, prosseguiu, Assim, o maior entrave nesse
exige que o SUS incorpore recursos debate, na opinião do pesquisador,
metodológicos de reconhecimento de é: quem decide o que é o melhor, e
divisões espaciais, e que pesquisado- sob quais critérios? Quem ganha e
res e profissionais, que estudam as quem perde com a entrada de novas
condições ambientais e de saúde ou tecnologias e quem gerencia os ris-
atuam na área, aperfeiçoem seu tra- cos por ela gerados? Marcelo Firpo
balho de campo. acredita que as respostas a tantos
questionamentos podem estar num
NOVAS TECNOLOGIAS reencontro da prática científica com

O
No que diz respeito ao impacto os movimentos sociais, “agregando
território em que vivemos das novas tecnologias na saúde das po- valores éticos, saberes populares e
e o impacto das novas pulações, Marcelo Firpo, pesquisador ancestrais dos povos oprimidos”. Para
tecnologias em nossa vida do Centro de Estudos da Saúde do Tra- ele, avaliar tais riscos cabe a uma ci-
estiveram no centro dos de- balhador e Ecologia Humana, da Escola ência aberta ao diálogo e que pro-
bates do 3º Seminário Nacional em Saú- Nacional de Saúde Pública Sérgio mova o direito à vida, à saúde e à li-
de e Ambiente, realizado em setembro Arouca, também da Fiocruz, chamou a berdade como elementos essenciais
pela Vice-Presidência de Serviços de Re- atenção para os riscos complexos e in- na produção do conhecimento.
ferência e Ambiente, da Fiocruz. Afinal, certos que podem ser gerados na saú-
conhecer o processo de saúde-doen- de da população. São eles: “Os riscos OS PILARES DO DEBATE
ça de uma população é também conhe- extensivos em geral”, como os ecoló- Renaud de Plaen, especialista em
cer o ambiente em que ela vive. Esta é gicos globais decorrentes da poluição saúde ambiental do IDRC (International
uma relação cada vez mais estreita para química; “os sistemas agrícolas intensi- Development Research Centre) do
os estudos na área da saúde. vos”, que se restringem a 15 espécies Canadá, em sua palestra questionou
Especificamente, para a saúde, o vegetais e a oito animais, totalizando além: “Quem da comunidade tem aces-
território é a base para a organização 90% da produção mundial de alimen- so ou é impactado pelas novas
do SUS, pois ajuda a explicar como se tos; e “a biotecnologia e a soja tecnologias?”. Seja qual for a respos-
dá a produção dos problemas e das transgênica”. Algumas perguntas que ta, Plaen acredita que a questão-cha-
necessidades de saúde de certos gru- o palestrante sugere que a socieda- ve é a “busca da eqüidade”. Para ele
pos e de suas potencialidades. Mauri- de indague: tais produtos concentram a tecnologia em si não é suficiente.
cio Monken, pesquisador do Núcleo de renda? Ajudam a alimentar pobres do “O importante é saber como ela pode
Vigilância em Saúde e Meio Ambiente Brasil ou animais dos países ricos? contribuir para o desenvolvimento de
da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Se muitos são os riscos, e mui- uma sociedade mais saudável”, ressal-
Venâncio/Fiocruz (EPSJ), destacou a tos deles desconhecidos, Marcelo vou. Nesse sentido, três são os pilares
importância do território como refe- Firpo acredita na necessidade de uma do debate: a transdisciplinaridade; a
rência para análises em saúde e ambi- ciência que promova a saúde e a jus- participação das várias partes interes-
ente, mostrando como o território vem tiça ambiental, que dê conta da sadas; e a equidade social.
sendo compreendido na saúde. sustentabilidade do ambiente e dos O desafio é amplo, as perguntas são
Segundo ele, no século 18, o ter- grupos vulneráveis. “O modelo atual muitas, o que só reforça a necessidade
ritório estava ligado à noção original de ciência, bem como as instituições de que o debate continue. (K. M.)
RADIS 28 ! DEZ/2004
[ 17 ]

DENGUE

Cuidado, o verão chegou!


J
necessidades e avanços dessa políti- de casos: Bahia, 7.393; Alagoas, 5.429;
oana está com febre e dores no ca. Em 2004 foram liberados R$ 55 mi- Pernambuco, 5.308; Ceará, 2.396; Rio
corpo; chega ao posto de saúde lhões para ações de prevenção. “Ha- Grande do Norte, 2.218; Maranhão,
e o diagnóstico é batata: den- via cidades sem pessoal suficiente para 2.209; e Paraíba, 1.594 casos. Desse
gue. Transmitida pelo mosquito visitar as casas de dois em dois meses, total, 17 casos foram notificados como
Aedes aegypti, a dengue é um proble- como recomenda o ministério”, infor- FHD: 7 no Ceará, 7 em Pernambuco, 2
mas de saúde pública no mundo. A OMS ma Fabiano Pimenta Júnior, diretor em Alagoas e 1 caso na Bahia.
diz que 80 milhões de pessoas são técnico de Gestão da SVS. Na Região Centro-Oeste, foram no-
infectadas por ano, umas 550 mil vão Além disso, a sociedade civil or- tificados até o momento 12.896 casos,
parar no hospital e pelo menos 20 mil ganizada vem criando comitês de com 19 casos de FHD — redução de 57,8%
morrem da doença, presente em mais mobilização contra a dengue, e os em relação a 2003. Goiás apresentou o
de 100 países — todos nas regiões tro- especialistas formam comitês técni- maior número de casos (7.841), sendo 18
pical e subtropical do planeta, justa- cos de assessoramento, para avaliar FHD, seguido de Mato Grosso (2.804).
mente onde o clima convida o mosqui- as medidas de combate à doença. Se Na Região Norte houve 13.813
to a se instalar. A Europa tem sorte: o cada um fizer a sua parte o Aedes vai casos — a maioria, 12.928, no primei-
Aedes não gosta de frio. bater asas em outra freguesia. ro semestre. A redução — a menor
No Brasil, onde a temperatura é do país —, comparada ao ano passa-
ideal para a proliferação do Aedes e há UM BALANÇO NACIONAL do, foi de 50,6%. Destacaram-se o
muita chuva no verão, a dengue já fez Na Região Sudeste, até setembro Pará, com 4.786, Amapá, com 2.492,
história. Em 2002, ano de maior inci- tivemos 29.350 casos da doença (29.084 Tocantins, com 2.029, e Rondônia,
dência da doença, o país registrou só nos seis primeiros meses do ano), e com 1.956 casos.
794.219 casos, dos quais 2.714 de fe- 12 de FHD. Em relação a 2003, a região O recorde positivo é da Região
bre dengue hemorrágica (FDH). Em conseguiu diminuir em 64,9% o núme- Sul, com 322 casos de dengue: Rio
2003, quando o governo e o povo se ro de casos. Os estados de maior in- Grande do Sul e Santa Catarina — se
mobilizaram nas ações de prevenção e cidência foram: Minas Gerais, com não se tratar de subnotificação, que
controle, o número de casos caiu em 18.644 casos, 5 de FDH; Espírito San- maravilha! — não tiveram um registro
57,2%. Ou seja, 339.630 casos to, com 6.381, sem registro de den- autóctone sequer (isto é, dengue
registrados de dengue, incluindo 709 gue hemorrágica; São Paulo, com 2.996; contraída na própria região). Santa
de dengue hemorrágica. Até setembro e Rio de Janeiro, com 1.329 e 7 casos Catarina registrou 138 casos importa-
de 2004, a redução no número de ca- de FDH confirmados — queda de 85,3% dos de outros estados (o paciente
sos é de 73,3%. A Secretaria de Vigilân- comparada ao ano passado. trouxe a doença de fora) e o Rio Gran-
cia Sanitária, do Ministério da Saúde Na Região Nordeste foram notifi- de do Sul, 98. A redução foi, respec-
(SVS/MS), responsável pelo controle da cados 28.154 casos, 25.110 só no pri- tivamente, de 79,3% e 78,8%. No
dengue, registrou 84.535 casos de den- meiro semestre de 2004 – redução de Paraná, 86 pessoas tiveram dengue (o
gue (48 de dengue hemorrágica) e uma 83,4%. Os estados com maior número último registro é de julho). (K. M.)
morte, em Minas Gerais.
Pois o calor está de volta, é hora
de cuidar dos vasinhos de plantas, do
lixo e dos objetos no quintal, do terre- O que fazer para evitar
no abandonado. Para a SVS, a queda do
número de casos é conseqüência dire-
ta de ações concretas de controle e
prevenção. Não há outra saída: somen-
N a guerra contra o Aedes, não
adianta recorrer a inseticida,
repelente, vela de andiroba e
! Conscientize vizinhos e comerci-
antes de sua rua sobre a necessi-
dade das ações preventivas;
te o trabalho conjunto dos governos citronela, tela na janela ou reza for- ! Mobilize as escolas e os clubes
federal, estadual e municipal, de seto- te: espantar o inseto adulto é pali- de seu bairro para que se integrem
res públicos como a limpeza urbana, e a ativo. Portanto, veja o que você às ações;
mobilização da sociedade pode manter pode fazer em casa para cortar o ! Avise à Secretaria de Saúde so-
a doença sob controle. Afinal, todos mal pela raiz, ou seja, eliminar os bre casas e terrenos abandonados
sabem que o mosquito deposita seus criadouros do vetor: em seu bairro;
ovos (e suas larvas se desenvolvem) nas ! Mantenha os pratinhos de suas ! Cobre das autoridades a visita
águas limpas acumuladas em locais aber- plantas com areia; domiciliar periódica para combate
tos, como caixas d’água. Mas, aparen- ! Vire as garrafas de boca para ao vetor.
temente, muitos esquecem disso ao lon- baixo, cubra sempre os pneus; Mais informações sobre a dengue na
go do ano, e o mosquito reaparece. ! Ponha tampa nas caixas d’água, Súmula nº 87, de março de 2002
O MS vem promovendo reuniões nos tanques e em outros recipien- (www.ensp.fiocruz.br/radis/web/
periódicas com gestores municipais e tes de água; sumula-87.pdf)
estaduais, para identificar problemas,
RADIS 28 ! DEZ/2004
[ 18 ]

REL AT ÓRI
ÓRIOO FIN AL D
FINAL DAA 12ª CN
CNSS

Demorou,
mas saiu!

U
mentam que foi mais lento do que o de. “Na Doze tivemos uma ampla par-
m ano depois da realiza- imaginado o processo de votação dos ticipação da sociedade, uma incrível
ção da 12ª Conferência milhares de destaques e emendas demonstração de democracia”, argu-
Nacional de Saúde, final- (cerca de 4 mil) que não puderam ser menta. Agora, não importa se o rela-
mente governo e socieda- apreciados naqueles cinco dias — e tório final demorou: o trabalho foi
de têm em mãos o relatório final do noites! — de dezembro do ano passa- feito. “Tirar isso do papel dependerá
evento (ver link no fim da matéria). Con- do, em Brasília. Um dos relatores res- de nós mesmos, pois a sociedade deve
forme compromisso dos organizadores, ponsáveis, Paulo Gadelha, vice-presi- e precisa cobrar que o governo siga
todos os 3 mil delegados receberam dente da Fiocruz, admite: “O as diretrizes ali formalizadas”. Gadelha
em casa, pelo correio, as propostas, fechamento do texto final foi muito está esperançoso. “Foi o próprio Mi-
item por item, pendentes de apreci- complicado”. nistério da Saúde que resolveu ante-
ação. O relatório final estava prome- Mas ele ressalta a importância cipar a realização da Doze, com a in-
tido para março de 2004... e como deste documento, referendado por tenção de ter um norte para a
demorou! Os coordenadores argu- diversos segmentos da área da saú- política de saúde do novo governo”.
RADIS 28 ! DEZ/2004
[ 19 ]

Uma certeza se impõe: o modelo


das conferências precisa ser modifica-
do. Foram mais de 10 mil redações em
todas as etapas da Doze: o volume de
Doze na Radis
itens, a serem discutidos e votados, era
enorme. “Agrupar tudo isso não foi
nada fácil”. Além do excesso de “con-
tribuições”, Gadelha aponta um pro-
D urante todo o ano de 2003, a re-
vista acompanhou o desenlaçar da
12ª Conferência Nacional de Saúde.
blema ainda maior. “Do jeito como são Mesmo antes da abertura oficial do en-
hoje, as conferências votam propos- contro mais importante da área da saú-
tas, não discutem a viabilidade delas.” de, a Radis procurou destrinchar as
O coordenador da Doze, Eduardo propostas que seriam apresentadas no
Jorge, que em entrevista publicada à evento. Com a série Ecos da 12, em
Radis nº 18 já clamava por uma ampla 2004, a revista assumiu o compromis-
reformulação no modelo adotado nas so de acompanhar as decisões toma-
conferências, desta vez preferiu não das naqueles dias. E, mesmo agora, de-
falar do conteúdo do relatório, somen- pois da divulgação do balanço final, a
te de seu encaminhamento futuro: “As Radis ainda não se dá por satisfeita.
decisões da conferência, divulgadas ao Daqui por diante, vai cobrar das auto-
público no site do Ministério da Saúde, ridades: as diretrizes da Doze preci-
vão ao Congresso, e esperamos que os sam sair do papel. É hora de fazer!
parlamentares as sigam como cartilha”. Todas essas edições (núme-
Eduardo lembrou que o ministro ros 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17,
da Saúde, Humberto Costa, na aber- 18, 19, 20, 21, 22 e 26) estão em
tura da Doze, e o presidente Luiz www.ensp.fiocruz.br/radis
Inácio Lula da Silva, no encerramen-
to, garantiram que o governo adota-
ria na prática as decisões tomadas
pelos delegados. “Seria algo inédito”,
disse a sanitarista Sarah Escorel, em
tom de ironia, no seminário História
e perspectivas do SUS no Brasil, reali-
zado em outubro na Escola Nacional
de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/ “Acho que o momento é de discutir- Ele citou como exemplo práti-
Fiocruz), no Rio de Janeiro. mos o modelo, torná-lo mais prático e co as alterações à Emenda Constitu-
As deliberações das conferên- objetivo. Mas sou a favor das confe- cional 29. “A expectativa é que seri-
cias não têm sido levadas adiante, rências, elas são uma festa cívica de am aprovadas, mas, por causa da
afirmou. “Com certeza não é lá (nas cidadania que precisa ser preservada”. mobilização que começou na Doze,
conferências) que estão tomando as Paulo Gadelha, que também par- acabou rejeitada pelos parlamenta-
decisões: a política continua saindo ticipou do evento na Ensp, concor- res. Isso já é uma demonstração de
dos gabinetes do Executivo, que só dou em que as conferências estão força da sociedade”. (J. X.)
implementam aquilo que interessa”. muito aquém do que poderiam produ-
Na Doze, a sanitarista foi a mais zir, mas ressaltou a importância na Integra do relatório final da
aclamada na cerimônia de abertura. política sanitária do país. “As decisões 12ª Conferência Nacional de Saúde
Num só coro, os 4 mil presentes exi- tomadas numa conferência servem, no www.ensp.fiocruz.br/publi/radis/
giram que ela permanecesse à mesa, mínimo, como legitimação discursiva”. 28-web-01.html
até então formada apenas por ho-
mens. “O que percebo é que, a cada
conferência, recomeça tudo outra O RADIS ADVERTE
vez”, disse Sarah no seminário. “O que
foi aprovado na anterior fica para trás?
Ninguém nem discute se realmente Cumprir as
foi implantado ou não, e qual o moti- decisões das
vo por não ter sido?”. conferências
Sarah, que assina o relatório fi- faz bem à
nal da Doze como relatora-adjunta, saúde pública.
ressaltou na palestra que, da forma
como são conduzidas, as conferênci-
as favorecem quem tem facilidade de
se expressar. “Muitos assuntos, de ex-
trema relevância, não são devidamen-
te aprofundados, simplesmente por
falta de tempo; vemos também que
quem tem oratória acaba levando o
voto da maioria”.
Apesar das críticas, Sarah defen-
deu a existência das conferências.
RADIS 28 ! DEZ/2004
[ 20 ]

SE R
RVVIÇO

EVENTOS ência, saber e tecnologia; Trabalho, tes cientistas que o país já teve. Filho
profissões e formação profissional; Sub- de pais suíços que emigraram para o
4° C ONGRESSO M UNDIAL jetividade, corpo e pessoa; e Práticas Brasil em 1850, no auge da epidemia
DEC ENTROS DE C IÊNCIA corporais, atenção e cuidado à saúde. de febre amarela que devastou a en-
Data 9 a 13 de julho de 2005 tão capital do império brasileiro,

O anfitrião do evento é o Museu


da Vida, da Fundação Oswaldo Cruz
(Fiocruz). Esta quarta edição do encon-
Local Florianópolis, SC
Mais informações
Tel./fax: (48) 248-5838
Adolpho Lutz (1855-1940) foi o precur-
sor das modernas campanhas sanitári-
as e dos estudos epidemiológicos en-
tro abordará temas relativos ao campo Site www.acorianaeventos.com.br volvendo, sobretudo, o cólera, a febre
de atuação de centros e museus de ci- E-mail tifóide, a peste bubônica e a febre
ência, com ênfase especial no papel que abrasco2005@acorianeventos.com.br amarela. A obra traz quatro livros, cujos
essas instituições desempenham no fo- títulos são: “Primeiros trabalhos: Ale-
mento da inclusão social e da eqüida- PUBLICAÇÕES manha, Suíça e Brasil (1878-1885)”;
de. O congresso será composto por três “Hanseníase”; “Dermatologia &
conferências e quatro plenárias, que L ANÇAMENTO — E DUSP Micologia”; e ainda um suplemento
servirão de orientação para as ações de com glossário, índices e resumos. Ne-
museus e centros de ciência em todo o Enciclopédia da Língua les, os organizadores recuperaram o
mundo, além de sessões paralelas, nas de Sinais Brasileira, que arquivo pessoal do cientista e de sua
quais os participantes apresentarão suas recebeu como subtítu- filha, a bióloga Bertha Lutz — mais co-
contribuições. As inscrições terminam lo “O mundo do surdo nhecida por sua militância como femi-
no dia 10 de abril de 2005. em libras”, é uma cole- nista — até sua morte, em 1976.
Data 10 a 14 de abril de 2005 ção de 19 volumes que Mais informações
Local Fiocruz e Riocentro, Rio de Janeiro servirão de instrumento Editora Fiocruz, Av. Brasil, 4.365, sala
Mais informações de ensino para os sur- 112, Manguinhos, Rio de Janeiro, RJ
Site www.museudavida.fiocruz.br/ dos brasileiros, estejam eles no ensino CEP 21040-361
4scwc/ fundamental ou no médio. Estão dispo- Tel.: (21) 2560-3537 / 3882-9039
E-mail pamela@coc.fiocruz.br; níveis os dois primeiros volumes, publi- E-mail editora@fiocruz.br
4scwc@gauche-eventos.com.br cados pela Editora da Universidade de Site www.fiocruz.br/editora
São Paulo (Edusp) em parceria com a
Imprensa Oficial. A publicação recebeu
3º C ONGRESSO B RASILEIRO DE também apoio da Fundação Vitae, da História, ciências,
C IÊNCIAS S OCIAIS E H UMANAS Capes, do CNPq e da Fapesp. O con- saúde: Manguinhos
EM S AÚDE teúdo do primeiro volume da enciclo- (volume 11, nº 2),
pédia foi testado num grupo de 1.500 publicada pela Casa
surdos, de 6 a 45 anos de idade. de Oswaldo Cruz
Mais informações (COC/Fiocruz), apre-
Edusp, Av. Prof. Luciano Gualberto, senta um dossiê so-
374, Trav. J/6º andar, Prédio da Antiga bre Miguel Ozorio
Reitoria, Cidade Universitária, São de Almeida, um dos
Paulo, SP maiores divulgadores científicos brasi-
CEP 05508-900 leiros da primeira metade do século 20.
Tel (11) 3091-4008/4150 A revista traz ainda artigos sobre diver-
E-mail edusp-venda@edu.usp.br sos temas científicos, que vão da pe-
Site www.usp.br/edusp dagogia à entomologia. Destacam-se
trabalhos sobre antecedentes da re-
forma psiquiátrica no Brasil, o discurso
L ANÇAMENTO - E DITORA F IOCRUZ da Ação da Cidadania contra a Fome, a
Miséria e pela Vida, a violência sob uma
Obra completa perspectiva paleoepidemiológica, uma

O evento, promovido pela Associa-


ção Brasileira de Pós-Graduação
em Saúde Coletiva (Abrasco), tem como
de Adolpho Lutz,
organizada pelo
historiador Jaime
abordagem pedagógica de promoção
da vida, a ciência como rede de ato-
res e a relação ciência e arte. Com-
objetivo promover uma reflexão arti- Larry Benchimol pletam o livro resenhas de oito livros
culada no campo das Ciências Sociais e pela bióloga e e resumos de teses de doutorado e
e Humanas sobre a saúde e a qualida- historiadora da de dissertações de mestrado. Versão
de de vida das populações. Com o tema ciência Magali online da revista no endereço
“Desafios da fragilidade da vida na soci- Romero Sá, am- www.coc.fiocruz.br/hscience.
edade contemporânea”, serão debati- bos da Fundação Mais informações
dos os seguintes tópicos: Estado, insti- Oswaldo Cruz Tel.: (21) 2209-4111/2260-7946
tuições e políticas públicas; Sociedade (Fiocruz), é uma E-mails hscience@coc.fiocruz.br e
civil, movimentos sociais e cultura; Ci- homenagem a um dos mais importan- cardosoc@coc.fiocruz.br
RADIS 28 ! DEZ/2004
[ 2191 ]

PÓS-TUDO

Os limites da legalidade
talvez, 20 minutos, mas isso não se
Samantha Buglione *
caracteriza como vida, conforme a Lei
9.434/97, que regula o transplante de

O Supremo Tribunal Federal (STF)


decidiu em 20/10 cassar a liminar
do ministro Marco Aurélio de Mello [que
órgãos no país. A proteção à vida que
está presente na Constituição Fede-
ral e no Código Civil não pode ser con-
autorizava a antecipação do parto na fundida com a proteção a uma con-
gestação de feto anencefálico sem au- cepção sobre vida. Vida é a ausência
torização judicial — ver Radis nº 24], da morte. E, nestes casos, tanto a
porém, ainda não votou o cabimento morte cerebral quanto a morte da
da Argüição de Descumprimento de anencefalia é o único dado irrefutável.
Preceito Fundamental (ADPF), ou seja, Por ser o direito originalmente
nada está acabado. O pedido da ADPF político deveria garantir um espaço
é simples: apenas solicita que os ar- de mediação para questões que di-
tigos 124 e 125, caput, e 128 pará- zem respeito a todos. O desafio é que
grafo I e II do Código Penal, que tra- hoje, em sociedades plurais, não se
tam do aborto, não seja aplicado no sabe muito bem o que é de interesse
caso de fetos anencefálicos, simples- comum. Por isso que o ponto central
mente pelo fato de que não se trata deste caso deveria ser a tolerância,
de aborto. e não o fundamentalismo perverso
É importante ter em mente que legitimado pelo Estado. Entende-se
o STF não estará fazendo papel de le- por fundamentalismo a supremacia de
gislar positivo, mas de guardião dos uma determinada concepção de mun- posicionar é que questões dessa na-
preceitos constitucionais. Não se pede do sobre todas as outras, ou seja, o tureza não deveriam ocupar a esfera
uma nova norma, no caso um novo total desrespeito à diversidade moral pública, uma vez que são de ordem
permissivo para a lei penal, mas, sim- e à privacidade. Isso explica a espé- privada e dizem respeito, estritamen-
plesmente a aplicação do texto cons- cie de “privatização da esfera públi- te, às pessoas envolvidas. Essa liber-
titucional, seja de forma direta e ime- ca” que se vive hoje, na qual o que dade de decisão é que deveria ser
diata, seja através da reinterpretação se tem, em verdade, não é a conju- resguardada, garantindo-se, assim, o
das normas infraconstitucionais, no gação de interesses comuns, mas uma respeito à dignidade humana.
caso o Código Penal. arena de interesses privados. Destaca-se que, no caso da
O preocupante, neste caso, é A questão da anencefalia é anencefalia, não se busca, apenas,
que não se trata, apenas, de funda- emblemática quanto a isto. A sorte para resguardar a dignidade, a saúde e a
mentos jurídicos, mas subjetivos. muitos é que estratégias processuais liberdade, mas evidenciar que se está
Ocorre que o direito pode ser usado são capazes de neutralizar o medo, a diante de uma situação fática que não
como um instrumento para legitimar intolerância e o fundamentalismo. O gera conflito de direitos, uma vez a
“inclinações”. Nenhuma técnica é STF terá nas mãos a possibilidade de morte do feto. Mesmo que se con-
neutra. Tampouco o seu uso é ingê- se comprometer não com subjetivi- sidere o feto como pessoa e como su-
nuo, afinal, foi através da técnica que dades, mas com a legalidade, pelo res- jeito de direitos (numa tentativa de
se promoveram estragos como os peito à Constituição Federal, mais es- promover o diálogo, já que estas são
ocorridos em Hiroxima e Nagasaqui. pecificamente às normas que guardam categorias com vários significados e
Porém, o mais importante, neste caso, a liberdade, a saúde e a dignidade diferentes compreensões), mesmo as-
é que se está diante de um dado in- humana. Obrigar mulheres e casais a sim não se criaria nenhum limitador à
contestável: o fator morte. Não se levar a cabo a gravidez de um filho antecipação terapêutica do parto,
trata de negar o direito à vida, mas morto é uma ação de tortura promo- porque o feto é pessoa morta; e a ele
em observar que não se pode garan- vida pelo Estado. A ADPF objetiva ga- incidem todos os direitos desta con-
tir este direito a quem já está morto. rantir que as mulheres e casais pos- dição. O que não se pode permitir é
Um feto anencéfalo, face sua sam decidir — resguardando, inclusive, que a saúde e a dignidade de mulhe-
condição, que se equipara à de uma o direito de escolha daqueles que res e casais sejam preteridas em nome
pessoa com morte cerebral, não pos- quiserem levar a gestação até o fim. do fundamentalismo ou do totalitaris-
sui vida. A morte cerebral não é um O que se preza é o respeito à diversi- mo de moralidades individuais.
estado que pode ser alterado, o mes- dade, não a manutenção de uma fé.
mo ocorre com a anencefalia. Ao se Caso o STF opte pelo silêncio Mestre em Direito Público pela PUC-RS,
desligarem os aparelhos de alguém com o não-reconhecimento do cabi- doutoranda em Ciências Humanas na
com morte cerebral será possível mento da ADPF, o que talvez possa ser UFSC, professora de Introdução ao Di-
observar um coração batendo por, apreendido nesta dificuldade em se reito, Bioética e Direitos Fundamentais.
RADIS 28 ! DEZ/2004
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