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APLICABILIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS José Afonso da Silva Professor Titular da Faculdade de Direito da USP. RESUMO O presente trabalho trata da aplicabilidade das normas consti- tucionais da Constituigdo Brasileira, que é definida como constituigdo dirigente. ABSTRACT This article is about constitutional rules aplicability in Brazilian Constitution, which is defined as a directing constitution. 1, COLOCAGAO DO TEMA O tema seré tratado em fungdo da Constituigao de 1988, que se enquadra no conceito de constituigdo-dirigente, enquanto define fins e programas de agao futura no sentido de uma orientagao social democratica. Por isso, nao raro, foi minuciosa e, no seu compromisso com as conquistas liberais e com um plano de evolugao politica de contetido social, o enun- ciado de suas normas assumiu, muitas vezes, grande imprecisio com- prometendo sua eficécia e aplicabilidade imediata por requerer providéncias ulteriores para incidir concretamente. Isso the dé as caracteristicas daquilo que a doutrina chama de Consti- iO programatica, pelo que este estudo, embora se preocupe com a espago ao tema, em relagéo as normas ditas programaticas, onde sua relevancia é mais destacada. A Constituigdo se preocupa com sua eficdcia e aplicabilidade, tanto que preordenou alguns instrumentos para a sua reali- zagdo concreta, como a declaragdo do § 1° do seu art 5®, segundo o qual as normas definidoras dos direitos ¢ garantias fundamentais tém aplicabilidade imediata; a inconstitucionalidade por omisséo (art. 103, § 2°) e 0 mandado de injungdo (art. 5° LXX1). Entdo, esta exposigdo terd trés partes, uma sobre a teoria da eficdcia e aplicabilidade das normas constitucionais; outra sobre a eficdcia e aplicabilidade das normas programdticas, e outra sobre os mecanismos constitucionais de aplicabilidade das normas constitucionais. I- NORMAS CONSTITUCIONAIS E SUA APLICABILIDADE 2. NORMAS CONSTITUCIONAIS Nossa tese parte do principio de que todas as disposigdes inscritas numa Constituigao rigida, como a nossa, s40 normas constitucionais. Nao interessa, portanto, para os fins da eficdcia a distingdo entre normas constitucionais materiais e formais, porque todas elas, dentro de uma Constituigao rigida, assumem a caracteristica marcante do conceito de norma constitucional, que consiste na sua supremacia, por isso todas elas constituem fundamento de validade do ordenamento juridico estatal!, Recusamos, assim, a doutrina, hoje minoritéria e muito criticada "que via na constituicao uma simples formulagao de directivas politicas e no um verdadeiro complexo de normas juridicas directamente vinculante: 3. A DOUTRINA NORTE-AMERICANA E ITALIANA A questao da eficdcia e da aplicabilidade das normas constitucionais foi posta pela jurisprudéncia e doutrina norte- americanas de maneira muito peculiar, quando elaboraram a distingao das disposiges constitucionais em self-executing provisions e not self-executing provisions,” divulgada, entre 1 Nao obstante isso, o civilista, quando escreve sobre Direito Contitucional, insiste em dar efeitos diversos as normas constitucionais em fungao de sua natureza material ou formal. Eo que se Ié no Prof® Carlos Alberto Bittar ("A Constituigao de 1988 e sua Interpretagio", Revista dos Tribunais, 635/33, sctembro/1988), entendendo que as materiais "tem vigencia imediata, independentemente de declaragio formal do legislador consti , enquanto "as demais - em que se encartam as relagdes privadas - somente produzem efeito em sua plenitude com a adaptagio da legislagio correspondente”, assim, "as normas sobre Direito de Familia somente terao eficacia plena quando ajustado 0 Cédigo proprio". Nao existe relagdes privadas reguladas pela Constituigao. Se ela regulou, nos limites por cla postos, a matéria passa a ser de Direito Constitucional. Nela nio hd dircito civil nem comercial, mas normas constitucionais sobre matéria civil ou comercial, pondo princfpios regedores da sociedade civil. 2. CF. J. J.Gomes Canotilho, Direito Constitucional, p. 176. 3 C.f. Thomas M. Cooley, Treatise ou the Constitutional Limitations, 6? ed., Boston, Browonm 2iN® 2p. 7-22/Ago, 1993 nés, pela tradugo, respectivamente, de disposigdes (normas, clausulas) auto-aplicdveis ou auto-executdveis, ou aplicdveis por si mesmas ou ainda bastantes em si, € disposigées ndo auto-aplicdveis, OU ndo auto-ex- ecutdveis, ou ndo executdveis por si mesmas, Ou ndo bastantes em si. AS do primeiro grupo sao as desde logo aplicaveis, porque revestidas de plena eficdcia juridica, por regularem matérias, situagdes ou comportamentos de que cogitam, enquanto as do segundo grupo sao as de aplicabilidade dependente de leis. Essa é uma doutrina hoje superada. A regra fundamental sobre o assunto atualmente é a de que toda norma constitucional é sempre ex- ecutavel por si mesma até onde possa, até onde seja suscetivel de execucao, consoante ja escrevemos, anotando, entao, que 0 problema se situa, jus- tamente, na determinagao desse limite, na verificagao de quais os efeitos possiveis de cada norma.’ O principio é 0 de que nao ha norma consti- tucional alguma de todo ineficaz, "porque todas sao, de modo univoco, constitucionalmente cogentes em relagao a seus destinatarios", como assi- nala De Simone,” mas, também, como nota Crisafulli, nenhuma é, em si, completa. Por outro lado, a doutrina norte-americana nao destaca a importancia das normas programaticas que revelam o novo cardter das constituigdes contempordneas. Tendo em vista a insuficiéncia daquela doutrina € que os autores italianos comegaram a reelabord-la, a partir de problemas concretos de aplicagao de normas da Constituigaio de 1948, com muitas divergéncias, discordancias, exageros ¢ até algumas extravagancias, até chegarem a uma classificagao das normas constitucionais, quanto 4 eficdcia e a aplicabilidade, que assim se apresenta: a) normas diretivas, ou pro- gramdticas, ditigidas essencialmente ao legislador; b) normas precepti- vas obrigatérias, de aplicabilidade imediata; c) normas preceptivas obrigatérias, mas nao de aplicabilidade imediata, dependentes de legis lagao futura. 4, NOSSA CLASSIFICACAO Por entender ainda insatisfatéria a doutrina italiana é que nos propusemos a dar um passo adiante na caracterizagdo da eficdcia juridica and Company, 1890, pp. 98 a 101; Ruy Barbosa, Comentarios & Constituigao Federal do Brasileira, v. 2, So Paulo, Seraiva, 1933, pp. 475 ess. C.L, para pormenores nosso A plicabilidade das Normas Constitucionais, 2 ed., Sao Paulo, RT, 1982, p. 63. 4 Nossa ob. cit. supra, p. 66. Severio De Simone, Lincameati per una Teoria su Materia ¢ Norma Costituzionale ? Ordinamento Giuridico Italiano, Milo, Giuffie, 1953, p. 41 6 Verio Crisafulli, La Costituzio Disposizioni di Principio, Mildo, Giuffre, 1952, p. 106 das normas constitucionais, que constitui a base de sua aplicabilidade, eo fizemos partindo daquela premissa j4 enunciada, segundo a qual ndo hé norma constitucional alguma destitutda de eficdcia. "Todas elas irradiam efeitos jurfdicos, importando sempre numa inovagio da ordem juridica preexistente 4 entrada em vigor da Constituigao a que aderem, e na orde- nag&o da nova ordem instaurada. O que se pode admitir € que a eficdcia de certas normas constitucionais nao se manifesta na plenitude dos efeitos juridicos pretendidos pelo constituinte, enquanto n4o se emitir uma nor- se ageiea ordindéria ou complementar executéria, prevista ou re- querida "Se todas tém eficdcia - dissemos entao - sua distingao, sob esse aspecto, deve ressaltar essa caracteristica bdsica e ater-se & circunstancia de que se diferenciam tdo-s6 quanto ao grau de seus efeitos juridicos. E insuficiente, a nosso ver, separd-las em dois grupos, como insinuam certos autores: a) normas constitucionais de eficdcia plena, que seriam aquelas de imediata aplicagio; b) normas constitucionais de eficdcia limitada, distinguindo-se estas, ainda, em: 1) normas de legislagio, e 2) normas programéticas" Pareceu-nos necessdrio discriminar ainda mais, a fim de fazer-se uma separagdo de certas normas que prevéem uma legislacao futura, mas nao podem ser enquadradas entre as de eficdcia limitada. Esse reconhecimento nos levou a classificd-las, quanto 4 eficdcia e aplicabilidade, em trés grupos: I. normas de eficdcia plena e aplicabilidade direta, imediata e integral; II. normas de eficdcia contida (ou conttvel) e aplicabilidade direta, ime- diata, mas possivelmente nao integral; Ill. normas de eficdcia limitada: a) declaratérias de principios institutivos ou organizativos; b) declaratérias de princfpios programaticos’. Normas constitucionais de eficdcia plena sio aquelas que, desde a entrada em vigor da Constituigéo, produzem ou tém a possibilidade de produzir todos os efeitos essenciais, relativamente aos interesses, compor- 7 Nossa ob. cit,, pp. 71.75. 8 Idem, ibidem, p. 72. 9 Pinto Ferreira, "Eficécia (Direito Constitucional”, Enciclopédia Saraiva de Direito, 30/62, seguido por Maria Helena Diniz, Norma Constitucional e seus Efeitos, p. 97, introduzem a categoria das normas com eficdcia absoluta, aquelas intangfvels, contra as quais nem mesmo hd o poder de emendar, contendo uma forga paralisante total de toda a legislag ao que, explicita ou implicitamente, vier a contréria-las. Com a devida vénia, sob esse ponto de vista nao ha distingdo em relagio aS outras. Toda norma constitucional paralisa a legislagao que vier contrarid-la, se os mecanismos de verificagdo de constitucionalidade funcionarem. Quanto 3 eficdcia e aplicabilidade, também ndo hé distingdo entre essas ditas normas de eficécia absoluta e as de eficécia plena tamentos € situagdes, que o legislador constituinte, direta e normati- vamente, quis regular. Sao de aplicabilidade imediata e direta, porque dotadas de todos os meios e elementos necessérios 4 sua executoriedade, nao requerendo normatividade alguma ulterior para sua aplicagio. Normas constitucionais de eficdcia contivel tém natureza de normas imperativas, positivas ou negativas, limitadoras do Poder Puiblico, valendo dizer, consagradoras, em regra, de direitos subjetivos dos individuos ou de entidades publicas ou privadas. E as regras de contengio de sua eficdcia constituem limitagdes a esses direitos e autonomias. Sdo, portanto, aquelas em que o constituinte regulou suficientemente os interesses relativos a determinada matéria, mas deixou margem @ atuagdo restritiva da com- peténcia discriciondrio do Poder Piiblico, nos termos que a lei estabelecer ‘ou nos termos de conceitos gerais nelas enunciados, como os de bons costumes, de ordem publica, etc. Sao de aplicabilidade imediata e direta. Sua eficdcia independe da interferéncia do legislador, nem sua aplicabili- dade fica condicionada a uma normagao ulterior, mas fica dependente dos limites (daf: eficdcia contivel) que ulteriormente se Ihe estabelegam medi- ante lei, ou de que as circunstancias restritivas, constitucionalmente admi- tidas, ocorram (atuagdio do Poder Ptiblico, para manter a ordem, a seguranca ptiblica, os bons costumes, etc.), Normas constitucionais de eficdcia limitada sio todas as que depen- dem de uma providéncia ulterior (lei integrativa, processo especial, etc.) que lhe compete a eficdcia e disponha sobre sua aplicagdo. Sao de dois tipos, como vimos acima: a) as de princ{pio institutivo ou organizativo; b) as de principio programdtico. As primeiras so aquelas através das quais olegistador constituinte traga esquemas gerais de estruturagao e atribuigoes de drgaos, entidades ou instituigdes, para que o legislador ordindrio os estruture em definitive, mediante lei ordinéria ou complementar. Sio reconheciveis, espacialmente pela mengo a uma lei integradora, com dicgdes como "a lei complementar estabelecerd...", "a lei disciplinaré...", "a lei regulard...", "a lei fixard...", "a lei especificard...", "na forma da lei. ..", "nos termos da lei...", "conforme ou como dispuser a lei. . .. do modo que dispuser a lei... .", ou expressdes semelhantes. As normas consti- tucionais programdticas sao aquelas, através das quais 0 constituinte, em vez. de regular, direta e imediatamente, determinados interesses, limitou-se a tracar-lhes os prinefpios para screm cumpridos pelos 6rgdos estatais (legisla- tivo, executivo, jurisdicionais ¢ administrativos), como programas das re- spectivas atividedes, visando & realizacao dos fins sociais do Estado. W1- EFICACIA JURIDICA DAS NORMAS PROGRAMATICAS 5. LOCALIZACAO DAS DISPOSICOES PROG RAMATIC. relevancia hodie da eficéci sulinahilidads 4 normas constitucionais se manifesta mais acentuadamente na sua consid- eragdo em relagéo as chamadas normas programaticas. Trés razdes, pelo menos, destacam essa relevancia. Uma é que ainda se ouve em relagdo A Constituigao de 1988 que ela esta repleta de normas de intengao, como se juridicas e imperativas nao fossem. Outra € que tais normas traduzem os elementos sécio-ideoldgicos da Constituigdo, onde se acham os direitos sociais, tomada aqui a expressao direitos sociais num sentido abrangente também dos econémicos e culturais. Uma terceira razao, talvez de maior importancia, é que indicam os fins e objetivos do Estado, o que importa em definir o sentido geral da ordem juridica. Elas se localizam, como vimos, entre as de eficdcia limitada. Em livro anterior, firmamos a tese da eficdcia juridica das normas programaticas; observamos que elas impéem certos limites 4 autonomia de determinados sujeitos, privados ou piiblicos, e ditam comportamentos ptiblicos em razao dos interesses a serem regulados, e, assim, sustentamos, contra a doutrina corrente, 0 seu caréter imperativo e seu cardter vinculativo. Sobretudo, procuramos ea seu importante papel na ordem juridica e no regime politico do pais Essa doutrina, que aqui reafirm amos, foi certamente um passo avangado na compreens&o das disposigSes constitucionais programaticas. Contudo, talvez ela ainda se ressinta de certa dubiedade no que tange a aplicabilidade dessas disposigGes. Pois, a afirm agao, mesmo peremptéria, do caraterjuridico e positivo dessas normas, nao basta para que surtam os efeitos que seu contetido geralmente requer. Restou, na nossa afirmativa de sua eficdcia limitada e de sua aplicabilidade dependente de emissao de uma normatividade futura, a idéia de que ndo sejam auténtico direito atual, de imediata aplica- bilidade, concepgao que as entende "como linhas programéticas dirigidas 20 legislador, e nao como auténticas nomas juridicas imediatamente pevepiines e directamente aplicdveis pelos tribunais ou quaisquer outras autoridades" i Essa € a linha que as constituigdes e a doutrina (alema, especialmente, com reflexo em Portugal) vém tentando superar, e esta exposigaio nos dé a opor- tunidade de expenderalgumas reflexGes, que esclarecem outros aspectos dessa nova vistio que se vai tendo das chamadas normas constitucionais program @ti- cas, 6. NORMAS PROGRAMATICAS E DIREITOS SOCIAIS Nos nossos estudos sobre as normas programéticas sempre as enten- demos vinculadas & disciplina das relagdes econdmico- sociais. E que ha 10 Cf. nosso A plicabilidade das Normas Constitucionais, pp. 37 ¢ 135 a 146, 11 Cf. J. J. Gomes Canotilho, ob. cit,, p. 177. muito esta superada a chamada "regulamentagio da liberdade" que preten- dia que cada direito individual fosse organizado, isto é, que as condigdes e os limites de sua aplicabilidade fossem determinados por uma lei or- ganica. Pois, as normas constitucionais que enunciam os direitos indi- viduais so de aplicabilidade imediata e direta. Sua eficdcia néo depende da intermediagiio do legislador, desde que, no "curso do séc. XIX - como denota Biscaretti di Ruffia -, a enunciagao desses direitos sofreu dupla transformagao: passou para 0 texto das Constituigdes, imprimindo as suas férmulas, até ent&o abstratas, o carter concreto de normas jurfdicas posi- tivas, validas para os individuos dos respectivos Estados (dita subjeti- vagdo), e, nao raro, integrou-se também de outras normas destinadas a atuar uma completa e pormenorizada regulamentagao juridico-constitucional de seus pontos mais delicados, de modo a nao requerer ulteriormente, a tal propdsito, a intervengio do legislador ordinério (ou seja, sua positi- vagao)'*. Esse fendmeno de subjetivagdoe de positivagdo comega a concreti- zar-se também em relagdo aos direitos econdmicos, sociais e culturais, pois aordem econémica e social adquire dimensao jurfdica a partir do momento em que as Constituigdes passaram a disciplind-las sistematicamente, como elementos sécio-ideolégicos que revelam o caréter de compromisso das Constituigdes contempordneas entre o Estado liberal individualista, o Estado social intervencionista e, mais recentemente, como € 0 nosso caso, o Estado Democratico de Direito. A propdsito observamos de outra feita: "Esse embate entre o liberalismo e 0 intervencionismo ou 0 socialisno repercute nos textos das constituigdes contemporaneas, com seus principios de direitos econdmicos e sociais, comportando um conjunto de disposigdes concernentes tanto aos direitos dos trabalhadores como & estrutura da economia € ao estatuto dos cidadaos. O conjunto desses principios forma o chamado contetido social das constituigdes. Mas é justo reconhecer que, nessa luta, as reivindicagSes sociais mal conseguem introduzir-se nas cartas cons- titucionais. Poucas tém conseguido firmar-se como nomas plenamente efi- cazes. Muitas sao traduzidas nos textos supremos em principios, como esquemas genéricos, simples programas a serem desenvolvidos ulteriomente pela atividade dos legisladores ordindrios. Sao estas que constituem as normas constitucionais de princfpios programdtico" O problema que se coloca agudamente, na doutrina recente, consiste em buscar mecanismos constitucionais e fundamentos teéricos para superar 0 caréter abstrato e incompleto das normas definidoras de direitos sociais, ainda 12 Ci. Diritto Costitazionale, 7 ed., Népoles, Jovene, 1965, pp. 695 © 696, 13 Nossa ob. cit, p. 128. concebidas como programdticas, a fim de possibilitar sua concretizagio pritica, Cogita-se de responder & seguinte questo, posta por Canotilho: "em que medida pode uma lei fundamental transformar-se em programa normativo do Estado e da Sociedade, Mais concretamente: como pode (se € que pode) uma constituigao servir de fundamento nomativo para o alargamento das tarefas estaduais ¢ para a incorporagio de fins econdmico-sociais, positi- vamente vinculantes das instdncias de regulagiio juridica?!" 7. NORMAS PROGRAMATICAS E FINS DA ORDEM ECONOMICA E SOCIAL As normas programiticas so de grande importncia, como dissemos, porque procuram dizer para onde € como se vai, buscando atribuir fins a0 Estado, esvaziado pelo liberalismo econ6mico. Essa caracteristica teleolégica Ihes confere relevancia e fungao de principios gerais de toda a ordem juridica, como bem assinala Natoli,'> tendente a instaurar um regime de democracia substancial, ao determinarem a realizagao de fins sociais, através da atuagao de programas de intervengéo na ordem econémica, com vistas a assegurar a todos existéncia digna, conforme ditames da justiga social. Esta é 0 fim que os arts, 170 ¢ 193 da Constituigao de 1988 prescrevem para as ordens econdmica e social. Nao é fécil realizar a justiga social num sistema em que predomina a concentragao da riqueza, E que ela 86 se concretizaré mediante equitativa distribuigao da riqueza nacional, pois um regime de justiga social sera aquele em que cada um deve poder dispor dos meios materiais de viver confortavelmente segundo as exigéncias de sua natureza fis spiritual e politica.'® Um regime de- mocrdtico de justiga social nao aceita as profundas desigualdades, a po- breza e a miséria. Ora, o reconhecimento dos direitos sociais, como instrumentos de tutela dos menos favorecidos, nfo tem tido a cficacia necesséria para reequilibrar a posigao de inferioridade que Ihes impede o efetivo exercicio das liberdades garantidas. Assim, no sistema anterior, a promessa constitucional de realizagao da justica social nao se efetivara na pritica. A Constituigio de 1988 & mais incisiva no conceber a ordem econdmica sujeita aos ditames da justica social para o fim de assegurar a todos existéncia digna, Dé a justiga social um contetido preciso, Preordena alguns principios da ordem econdmica - a defesa do consumidor, a defesa do meio ambiente, a redugdo das desigualdades regionais ¢ pessoais ¢ a busca do pleno emprego - que possibilitam a compreensio de que 0 14 CL. Constituigto Dirigente ¢ Vineulagio do Legislador: contributo para 4 compreensio das normas constitucionais programsticas, Coimbra 15 CL. Ugo Natol 5 Giutfre, 1955, p.29. 16 Cf Pierre Duclos, yore, Mildo, "Evolution des Rupports Politiques depuis 1750, Pacis, PUE, p. 149. 1 Revista Pensar/Portaleza/V. 2IN® DIP. 7-22IAg0, 1993 capitalismo concebido hé de humanizar-se (se € que isso seja possivel). Traz, por outro lado, mecanismos na ordem social voltados A sua efeti- vagiio. Tudo depende da aplicagao das normas constituciongis que contém essas determinantes, esses princfpios ¢ esses mecanismos.' Nilo & que seja destituida de valor juridico e de eficécia a determinante constitucional de que as ordens econdmica e social objetivem realizar a justiga social. Esta é uma determinante essencial que impde e obriga que todas as demais regras da constituigao econdmica sejam entendidas ¢ operadas em fungao dela. E mais releva essa importancia quando se lembra que parte da doutrina reconhece que a justica social se erige em fator de legitimagio constitucional.'" A questo, atualmente, consiste mais em compreender a natureza desse valor-fim das ordens econémica e social, a fim de que seja tido em conta na aplicagéo das normas definidoras dos direitos sociais do homem 8. DISPOSICOES PROGRAMATICAS E PRINC{PIOS CONSTI- TUCIONAIS Nao se confundem disposi¢des programdticas ¢ principios consti- tucio-nais, Nao necessitamos entrar aqui nas graves perquirigdes sobre os principios. Bastam algumas consideragdes para situar o nosso problema, a comegar pela distingao entre normas e principios. As normas so preceitos que tutelam situages subjetivas de vantagem ou de vinculo, ou seja, reconhecem, por um lado, a pessoas ou entidades a faculdade de realizar certos interesses por ato proprio ou exigindo aco ou abstengao de outrem, e, por outro lado, vinculam pessoas ou entidades & obrigagdo de submeter-se As exigéncias de realizar uma prestagio, ago ou abstengio em favor de outrem. Os principios sio ordenagdes que se irradiam e imantam os sistemas de normas, "so - como observam Cano- tilho e Vital Moreira - “niclegs de condensages" nos quais confluem valores ¢ bens constitucionais"!?, © tema mereceu consideragdes esclarecedoras de Canotilho. Refere- seele adois tipos de prinetpios: a) os prinetpios jurtdicos fundgmentais, & b) os principios politicos constitucinalmente conformadores.”” Recusa a idéia de que os principios juridicos fundamentais se reduzam a simples princtpios gerais de direito ou regras juridicas gerais ou se inscrevam numa ordem juridica suprapositiva (iusnaturalismo). Entende-se como direito positivo ¢ fonte de direito. Mas, quando fala em prinefpios juridicos 17 Ch. nosso Curso de Direito Constitucionl Positiv, 7c, Sto Paulo, RT, 1991, p. 661 18 CL nosso Curso de Diteto Consiituctonal Positivo, 7 ed. Sho Paulo, RT, 1991, p. 66, 19 CL. Constituigto dx Repablica Portuguesa Anotada, 2 ed. I* Colmbra Editors, 1984, pp. Al ef 20 Gh beet ‘Constitucional. pp. 189 ¢ 190. Age. 1 15 fundamentais como fonte de direito constitucional, refere-se "a principios fundamentais historicamente objetivados e progressivamente introduzidos na consciéncia jurtdica geral e que encontram uma recepgdo expressa ou implicita no texto constitucional. Pertencem & ordem juridica positiva e constituem um importante fundgmento para a interpretagaio, conhecimento e aplicagiio do direito positivo"”!. Por outro lado, os principios politicos constitucionalmente confor- madores so os que explicitam as valoragées politicas fundamentais do legislador constituinte, nos quais se condensam as opgdes Pgliticas funda- mentais € se reflete a ideologia inspiradora da constituigao*~. Entre elas, ele inclui as disposigdes caracterizadoras da organizag&o econémica e social. Finaliza, observando que, tal "como acontece em relago aos princfpios jurfdicos fundamentais, os principios politicos constitucional. mente conformadores sao normas gerais que a propria constituigado ou o legislador desdobram em normas mais precisas e individualizadoras. No entanto, como eles exprimem as concepgoes politicas fundamentais do poder constituinte, todos os érgaios do poder devem considerd-los como principios rectores e operantes quer no momento da criagao do direito quer no momento de sua aplicagao">, E de extrema importancia ter em mente essas consideragées, a fim de distinguir as disposigdes programaticas e os principios politicos consti. tucio-nais conformadores das ordens econémica e social. Esses principios sdo programaticos, mas apenas no sentido de que definem as bases dos fins ¢ tarefas estatais, e enquanto poem os objetivos e determinagdes do pro- grama a ser cumprido pelo Estado. Constituem direito imediatamente vigente, € so diretamente aplicdveis”*. Assim, a determinagao consti- tucional, segundo a qual as ordens econémica e social tem por fim realizar a justica social, constitui uma norma-fim, que permeia todos os direitos econ6micos € sociais, mas ndo s6 ales como também a todaa ordenagao constitucional, porque nela se traduz um principio politico constitucional- mente conformador, que se impde ao aplicador da Constituigdo, Os demais principios informadores da ordem econ6mica - propriedade privada, fungao social da propriedade, livre concorréncia, defesa do consumidor, defesa do meio ambiente, redugdo das desigualdades regionais e sociais, busca do pleno emprego - s4o da mesma natureza. Apenas esses principios preordenam-se e ho que harmonizar-se em vista do principio-fim que a realizagao da justiga social, a fim de assegurar a todos existéncia digna. Nesse sentido, hio de reputar-se plenamente eficazes e diretamente 21 Idem, ibidem, p. 191. 22 Idem, ibidem, pp. 192 ¢ 193. 23 Idem, Ibidem, p. 193. 24 Cf. mais uma vez Canotilho, Constituigio Dirigente, p. 194, aplicdveis, embora nem a doutrina nem a jurisprudéncia tenham percebido © seu alcance, nem thes tém dado aplicagiio adequada, como principios- condigdo da justiga social. Informadas por esses princfpios, existem as normas definidoras de direitos econdmicos .e social especificos. Delas umas mencionam uma legislacao futura, outras nao indicam. As primeiras dependem da atividade do legislador, e estao vinculadas ao principio da legalidade; as outras ora sao referidas aos poderes ptiblicos ou aos agentes da ordem econdmica e social em geral. Sua eficdcia e aplicabilidade dependem muito de seu enunciado e de sua conex4o com outras normas. Mais adiante examinare- mos a repercussdo que tem $ 12 do art. 5° da Constituigao sobre a aplica- bilidade dos direitos sociais considerados dircitos fundamentais. Por ora, basta dizer que quase todas aquelas normas pressupdem ou até exigem a emanagao de outros atos, sobretudo legislativos, consoante nota Canotilho, gue também lembra que dai nao se pode concluir pela nao preceptividade de tais normas*”. "A sua disciplina - acrescenta - é obrigatéria e as directivas por elas definidas, longe de serem meros convites para legislar, assumem 0 carater de verdadeiras imposi¢des constitucionais de actividade legiferante". Significa isso repelir a tese dos direitos econdmicos, sociais e culturais como simples direitos legais, tese que assenta fundamentada- mente na concepgao de que tais diretivas "nao alicergam qualquer preten: sfo subjectiva, judicialmente accionavel", pois s6 "quando o legislador concretiza essas diretivas, fundamentando poderes juridicos subjectivos, é que se pode falar de direitos subjectiyos", logo, "os direitos subjectivos s6 existem no Ambito da lei ordinaria"°, nao no ambito da prépria norma constitucional programatica. A lig&o do citado autor é rica de consequéncias no aspecto consid- erado, quando, refutando a tese, sustenta que a "forca dirigente dos direitos fundamentais justifica que se ultrapasse a degradacao dos direitos sociais, econémicos € culturais (na parte em que se implicam direitos a prestagdes estaduais) em "simples direitos legais", pois que sao direitos originarios a prestagdes fundados na constituigdo e nao direitos a prestagdes derivados da lei; "os direitos subjectivos a prestagGes - prossegue - mesmo quando nao concretizados, existem para além da lei por virtude da constituigdo, podendo ser invocados (embora nao judicialmente, diz ele) contra as omissoes inconstitucionais do legislador. A forga imediatamente vincu- lante que hoje se atribui a uma parte dos direitos fundamentais (os direitos,s liberdades e garantias e os direitos de natureza andloga) pode e deve ser interpretada, no que respeita aos direitos a prestagdes, no onal, p. 178 Revi W sentido de fundamentar originariamente esses direitos, mesmo que yao haja imposi¢ao constitucional dirigida expressamente ao legislador"=’. Por isso, 0 autor péde dizer com tranquilidade que a "forga dirigente e determinante dos direitos a prestagdes (econémicos, sociais e culturais) inverte, desde logo, 0 objecto classico da pretensio jurfdica fundada num direito subjectivo: de uma pretensdo de omissao dos poderes ptblicos (direito a exigir que o Estado se abstenha de interferir nos direitos, liber- dades e garantias) transita-se para uma proibigdo de omissdo (direito a exigir que o Estado intervenha activamente no sentido de assegurar pre- stagGes aos cidadios)". $6 temos que observar que, ao contrdrio do que afirma Canotilho, ssa Constituigaéo fundamenta até mesmo a invocacao judicial contra as omiss6es inconstitucionais do legislador, pelo texto do § 1° do art. 5°e pelo mandado de injungio. 9. NATUREZA DOS DIREITOS SOCIAIS Certa corrente concebe os direitos sociais, nao como verdadeiros direitos, mas como garantias institucionais, negando-Ihes a caracteristica de direitos fundamentais. A doutrina mais consequente, contudo, vem refutando essa tese, e reconhece neles a natureza de direitos fundamentais, ao lado dos direitos individuais, politicos e do direito A nacionalidade. SAo direitos fundamentais do homem-social, ¢ até "se estima que, mais que uma categoria de direitos fundamentais, constituem um meio positivo para dar um contetido gal euma possibilidade de exercicio eficaz a todos os direitos ¢ liberdades"””. A Constituigao seguiu essa doutrina, incluindo-os entre os direitos fundamentais no seu Titulo II. Nao Ihes tira essa natureza o fato de sua realizagao poder depender de providéncias positivas do Poder Puiblico. Por isso, caracterizam-se como prestagdes positivas impostas As autoridades ptiblicas pela Constituigao (imposigdes constitucionais). E certo que, para tanto, a efetivacao de muitos desses direitos depende do estabelecimento de instituigdes. E Canotilho que mais uma vez nos fornece a ligdo correta, mediante exemplo expressivo: "Quando se afirma que o direito 4 habitagao incumbe ao Estado programar e executar uma politica de habitagao inserida em plano de reordenamento geral do territério e apoiada em planos de urbanizagao . . . estamos a salientar a dimensao institucional de um 27 Idem, ibidem, pp. 370 ¢ 371 28 Idem, ibidem, p. 365. 29 Cf. Pérez, Lufio. "Delimitacién conceptual de los derechos humanos Derechos Humanos, Sevilha, Universidade, 1979, p. 217. Nosso Curso de D Positivo, p. 165. no volume de que é editor: to Constitucional direito"®, A partir dai, o autor chega mesmo a afirmar que esses direitos so regras juridicas dirctamente aplicaveis, vinculativas de todos os érgios do Estado” Em obra posterior, Canotilho exprime-se ainda com maior precisao, fazendo distingdes que conduzem a um entendimento mais adequado das normas constitucionais com dimensao programatica. Eis 0 seu texto: 'O reconhecimento, por exemplo, do direito a satide, € diferente da imposigéio constitucional que exige a criagdo do Servigo Nacional de Satide, destinado a fornecer prestagGes existenciais imanentes aquele dire- ito. Como as prestagdes tém, igualmente, uma dimensao subjectiva e uma dimensao objectiva, considera-se que, em geral, esta prestagao é 0 objecto da pretensao dos particulares e do dever concretamente imposto ao legis- lador através das imposigGes constitucionais. Todavia, como a pretensio nao pode ser judicialmente exigida, nao se enquadrando, pois, no modelo classico de direito subjectivo, a doutrina tende a salientar apenas o dever objectivo da prestagao pelos entes piiblicos e a minimizar o seu contetido subjectivo. Ainda aqui a caracterizagao material de um direito fundamental nao tolera esta inversao de planos: os direitos 4 educagao, satide e assistén- cia nao deixam de ser direitos subjectivos pelo facto de nao serem criadas as condigdes materiais € institucionais necessdrias & fruigdo desses direi- tos” 10. VINCULATIVIDADE DAS NORMAS PROGRAMATICAS Afirma-se, hoje, em geral na doutrina, o cardter vinculativo das normas programaticas. Significa que o fato de dependerem de providéncias institucionais para sua realizagao nao quer dizer que nao tenham eficdcia Ao.contrario, sua imperatividade direta é reconhecida, como imposigdo constitucional aos 6rgdos publicos. Sao, por isso, também aplicaveis nos limites dessa eficdcia, consoante resumiremos em seguida Ressalte-se, por primeiro, sua fungao de princfpios gerais de toda a ordem juridica, que projetam a sua relevancia para além dos limites da matéria especifica, para as quais foram ditadas, relevancia que nao pode ser excluida ou suspensa pela falta de regulamentago prevista, porque deriva do fato mesmo de serem normas constitucionais. Revelam também as caracterfsticas do regime politico, e tendem a instaurar uma democracia de contetido social, ao determinarem a realizagio de fins sociais, através de programas de intervengao na ordem econémica com vista a realizar a justiga social 30 Direito Constitucional, p. 183. 31 Idem, ibidem, p. 184. A caracterizagao das normas programaticas como prinefpios gerais informadores do regime politico e de sua ordem juridica dé-Ihes importin- cia fundamental, como orientago axiolégica para a compreensio do sistema juridico nacional. O significado disso consubstancia-se no recon- hecimento de que tém elas uma eficdcia interpretativa que ultrapassa, nesse ponto, a outras do sistema constitucional ou legal, porquanto apon- tam os fins sociais e as exigéncias do bem comum, visto como, sendo indicativas dos fins do Estado, revelam os “critérios hierdrquicos de valor, sobre os quais esté fundada ¢ pelos quais se inspira a ordem juridica positiva, de,que deve servir-se o juiz para resolver 0 caso submetido & suia jurisdigao"**, Com isso, pode-se afirmar que as normas programticas vinculam a atividade jurisdicional, desde que o juiz, na aplicagdo da lei, hd de atender aos fins sociais a que eia se dirige e as exigéncias do bem comum, segundo determinacdo do art. 5° da Lei de Introdugio ao Cédigo Civil. Outro efeito notavel das normas programaticas consiste em prescre- ver A legislago ordinaria ou complementar uma via a seguir; se nao conseguem constranger diretamente o legislador a seguir; via indicada, compelem-no, quando nada, a nao seguir outra diversa, pois sera inconsti- tucional lei que dispuser de modo contrario a quanto a constituigio comanda™, Af se descortina a eficdcia e aplicabilidade direta das dis- posigdes programaticas em relagao a legislacao futura, condicionando a atividade do legislador ordinario, mas também a administracao e a juris- digo, cujos atos hao de respeitar os principios nelas consagrados. As normas programaticas, assim, vinculam o poder legislativo, quer porque the assinalem somente certo fim a atingir, quer porque estabelecam, desde logo, restrigées, limites, observancia de certas diretrizes, critérios ou esquemas gerais, para aleangar 0 escopo proposto””. Por conseguinte, todas as normas que reconhecem os direitos sociais, ainda quando sejam programaticas, vinculam os érgaos estatais, de tal sorte que 0 "poder legislativo nao pode emanar leis contra estes direitos e, por outro lado, esté vinculado & adogio das medidas necessdrias & sua concreti- zagao; ao poder judicidrio est4 vedado, seja através de elementos proces: suais, seja nas proprias decisoes judiciais, prejudicar a consisténcia de tais direitos; ao poder executivo impoe-se, tal como ao legislador, actuar de formy a proteger © impulsionar a realizagao conereta dos mesmos direi- tos"””. 33 CE. Recasen Siches. Nueva Filosofia de la Interpretacién del Derecho, México, Fondo de Cultura Econémica, 1936, p. 227. 34 CE Daladore Pallicr, Dieitto Costitesionale, Milio, Giutfrs, 1955, p. 322. AS CL Crisaflli, ob. eit, pp. 62 € 63. 36 J. 4. Gomes Canotitho, Direito Const ional, p. 184, 20 [Revista Pensar/Fortaleza/V. 278° 21P. 7-20/Ag0. 1993 para consideré-lo mero meio de obtengao de declaragao da inconstitucion- alidade por omissao. 13, INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSAO A inconstitucionalidade por omisséo verifica-se nos casos em que n&o sejam praticados atos legislativos ou executivos requeridos para tornar plenamente aplicdveis normas constitucionais que postulam lei ou providéncia administrativa ulterior para que os direitos ou situacées nelas previstos se efetivem na pratica. A Constituigio de 1988 foi abeberar o instituto no art. 283 da Consti- tuigao portuguesa. Prevé autoridades, pessoas e entidades que podem propor a acao direta visando a declaragao da omissao. Foi timida, no entanto, nas consequéncias do seu reconhecimento. Apenas dispds, no § 2° do art. 103, que, declarada a inconstitucionalidade por omissao de medida para tornar efetiva norma constitucional, serd dada ciéncia ao Poder competente para a adogdo das providéncias necessdrias e, em se tratando de 6rgdo administrativo, para fazé-lo em trinta dias. A mera ciéncia ao poder legislativo pode ser ineficaz, j4 que ele nao pode ser obrigado a legislar, embora um dever moral de legislar possa impulsionar o legislativo a tender 0 julgado, J4.INICIATIVA POPULAR O exercicio da inicativa popular também pode contribuir para a elaboragao de leis ordindrias ou complementares integradoras da eficdcia de norma constitucionais. Ela é prevista no art. 61, § 2° nos termos seguintes: "A iniciativa popular pode ser exercida pela apresentagao 4 Camara dos Deputados de projeto de lei subscrito por, nominimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuido pelo menos por cinco Estados, com nao menos de trés décimos por cento dos eleitores de cada um deles". A omisséo do poder legislativo nao pode ser totalmente suprida pela participacdo popular, mas a falta de iniciativa das leis 0 pode, ¢ por certo que a iniciativa, subscrita por milhares de eleitores, traz um peso especifico, que estimulard a atividade dos legisladores.

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