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– Jesus dá-nos a sua Mãe como Mãe nossa. Os frutos da Cruz. O bom ladrão.
Toda a vida de Jesus está orientada para este momento supremo. Muito a
custo, consegue chegar ofegante e exausto ao cimo daquela pequena colina
chamada “lugar da caveira”. A seguir, estendem-no no chão e começam a
pregá-lo no madeiro. Introduzem primeiro os ferros nas mãos, desfibrando-lhe
nervos e carne. Depois, é içado até ficar erguido sobre a trave vertical fixada no
chão. Por fim, pregam-lhe os pés. Maria, sua Mãe, contempla a cena.
Oferecem-lhe vinho com mirra. Dai licor àquele que desfalece e vinho
àquele que traz amargura no seu coração: que bebam e esquecerão a sua
miséria e não voltarão a lembrar-se das suas mágoas3. Era costume ter esses
gestos de humanidade com os condenados. A bebida – um vinho forte com um
pouco de mirra – adormecia e aliviava o sofrimento. O Senhor provou-a por
gratidão para com aquele que lha oferecia, mas não quis tomá-la, para esgotar
o cálice da dor.
“Não era necessário tanto tormento. Ele podia ter evitado aquelas
amarguras, aquelas humilhações, aqueles maus tratos, aquele juízo iníquo, e a
vergonha do patíbulo, e os pregos, e a lança... Mas quis sofrer tudo isso por ti e
por mim. E nós não havemos de saber corresponder?
“Jesus Cristo quis submeter-se por amor, com plena consciência, inteira
liberdade e coração sensível [...]. Ninguém morreu como Jesus Cristo, porque
Ele era a própria Vida. Ninguém expiou o pecado como Ele, porque Ele era a
própria Pureza”9. Nós recebemos agora copiosamente os frutos daquele amor
de Jesus na Cruz. Só o nosso “não querer” pode tornar vã a Paixão de Cristo.
Muito perto de Jesus está sua Mãe, com outras santas mulheres. Também
ali está João, o mais jovem dos Apóstolos. Quando Jesus viu sua Mãe e, perto
dela, o discípulo que amava, disse à sua mãe: Mulher, eis aí o teu filho. Depois
disse ao discípulo: Eis aí a tua mãe. E dessa hora em diante o discípulo a
levou para sua casa10. Jesus, depois de dar-se a si próprio na Última Ceia, dá-
nos agora o que mais ama na terra, o que lhe resta de mais precioso.
Despojaram-no de tudo. E Ele nos dá Maria como nossa Mãe.
Este gesto tem um duplo sentido. Por um lado, o Senhor preocupa-se com a
Virgem, cumprindo com toda a fidelidade o quarto mandamento do Decálogo.
Por outro, declara que Ela é nossa Mãe. “A Santíssima Virgem avançou
também na peregrinação da fé e manteve fielmente a sua união com o Filho
até a Cruz, junto da qual, não sem um desígnio divino, permaneceu de pé (Jo
19, 25), sofrendo profundamente com o seu Unigénito e associando-se com
entranhas de mãe ao seu sacrifício, consentindo amorosamente na imolação
da Vítima que Ela mesma tinha gerado; e, finalmente, foi dada como mãe ao
discípulo pelo próprio Cristo Jesus, agonizante na Cruz”11.
“Eli, Eli, lamma sabachtani?! Isto é: Meu Deus, meu Deus, por que me
abandonaste? (Mt 27, 46).
“Depois, sabendo que todas as coisas estão prestes a ser consumadas, para
que se cumpra a Escritura diz:
“E expira.
“Ama o sacrifício, que é fonte de vida interior. Ama a Cruz, que é altar do
sacrifício. Ama a dor, até beberes, como Cristo, o cálice até às fezes”12.
Com Maria, nossa Mãe, ser-nos-á mais fácil consegui-lo, e por isso
cantamos-lhe com o hino litúrgico: “Ó doce fonte de amor! Faz-me sentir a tua
dor para que chore contigo. Faz-me chorar contigo e doer-me deveras das tuas
penas enquanto vivo; porque desejo acompanhar o teu coração compassivo na
cruz em que o vejo. Faz com que a cruz me enamore e que nela viva e
habite...”13
(1) Hino Crux fidelis, Adoração da Cruz, Ofício da Sexta-feira da Semana Santa; (2) L. de la
Palma, La Pasión del Señor, pág. 168-169; (3) Prov 31, 6-7; (4) Santo Agostinho, Coment.
sobre o Salmo 21, 11, 8; (5) cfr. 1 Cor 1, 23; (6) São Josemaría Escrivá, Via Sacra, XIª est., n.
1; (7) Lc 23, 43; (8) Gal 2, 20; (9) R. Guardini, O Senhor; (10) Jo 19, 26-27; (11) Conc. Vat. II,
Const. Lumen gentium, 58; (12) São Josemaría Escrivá, Via Sacra, XIIª est.; (13) hino Stabat
Mater.