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PARA COMPREENDER A SALA DE AULA:

OUVINDO HISTÓRIAS PARA CONTAR HISTÓRIAS1

Andréa Machado de Almeida MATTOS


Universidade Federal de Minas Gerais

Resumo: Este trabalho ressalta a importância de se conhecer as histórias da sala de aula


de inglês como língua estrangeira para uma melhor compreensão do contexto em que
ela se insere. Através das narrativas de uma professora de inglês sobre sua sala de aula e
sua percepção dos eventos ali ocorridos, foi possível apreender a relevância de tais
eventos para os participantes do contexto. A metodologia da pesquisa baseou-se nas
histórias da professora informante – como sugerido por Freeman (1996) – para ter
acesso a possíveis questões ocultas no contexto da sala de aula. Os resultados revelaram
um conjunto fatores relevantes para a informante, mas que seriam imperceptíveis para o
observador externo.

Palavras Chaves: Pesquisa em Sala de Aula; Narrativas; Visão Interpretativista.

Introdução

Recentemente, a pesquisa em várias áreas assumiu uma perspectiva mais


qualitativa. Por essa razão, há um crescente interesse pelo chamado “modo narrativo de
pensamento e expressão” (Bruner, 1986). A chamada “Virada Narrativa” tem
influenciado as ciências humanas e sociais, e a pesquisa nessa linha metodológica cobre
uma variedade de tópicos, desde a ficção a modos narrativos para compreensão da
experiência humana. De acordo com Fivush (2006), este crescente interesse originou-se
a partir do trabalho de importantes teóricos: o psicólogo e filósofo americano William
James (1842-1910) falava de dois modos de pensamento, o “paradigmático” e o modo
narrativo. Mais recentemente, o psicólogo cognitivista Jerome Bruner (1986) referiu-se
a “modos narrativos de conhecimento” e descreveu narrativas como histórias, dramas, e
relatos históricos que enfatizam a intenção e a ação humanas. Para o autor, o homem
tem a “capacidade de organizar e comunicar sua experiência de forma narrativa”
(2002:16). De acordo com Bruner, é na construção de histórias e mitos, e ao ouvir as
histórias de outrem, que lidamos com nossa experiência e fazemos sentido de nossa
realidade. Narrativas e histórias são, assim, de acordo com Bruner (1990), uma forma de
pensamento, uma forma de organizar a experiência humana.
A psicóloga e pesquisadora Robyn Fivush (2006a) acredita que “narrativas são a
maneira através da qual compreendemos e fazemos sentido de nossas experiências
diárias, e esse processo ocorre nas interações sociais”. A autora também afirma que “à
medida que falamos sobre nossas experiências, nós reinterpretamos, reavaliamos e
reconstruimos nossas experiências” (ibid). Ela também acrescenta que

“Narrativas vão além da simples descrição de eventos experienciados para fornecer


modelos explicativos e avaliação emocional sobre o que esses eventos significam
para o indivíduo. Mais especificamente, narrativas permitem-nos criar uma realidade
compartilhada. Ao contar as histórias da nossa vida, estamos contando quem somos e
estamos compartilhando nossa visão de mundo. Nós não apenas contamos o que
aconteceu; nós explicamos como e por quê esses eventos aconteceram, como nós nos
sentimos e como reagimos a eles e o que eles significam para nós” (Fivush, 2006b).

A área de ensino/aprendizagem de língua também tem usado narrativas como


metodologia de pesquisa. Um dos grandes desafios do campo de aprendizagem de
língua estrangeira é compreender e explicar como acontece a aprendizagem de língua. A
metodologia narrativa tem sido usada recentemente como uma maneira de ter acesso a
informações cruciais que, de outra forma, seriam inacessíveis ao pesquisador. Pavlenko
(2001: 213), por exemplo, acredita que memórias de aprendizes têm grande potencial
para iluminar as pesquisas sobre aprendizagem de segunda língua. Para ela, narrativas
são “uma fonte única de informação sobre motivações, experiências, lutas, perdas e
ganhos” (ibid). Já para o campo do ensino de línguas, os trabalhos de Carter (1993) e
Clandinin & Connelly (2000), que enfocam o desenvolvimento do professor de língua
estrangeira, são referências mundiais.
Este trabalho relata os resultados de uma pesquisa que objetivou o
desenvolvimento profissional de uma professora de inglês em formação. O foco
principal da pesquisa foram as percepções da informante sobre os eventos ocorridos em
sua sala de aula, tendo como objetivo principal uma melhor compreensão das
experiências da informante a partir de seu próprio ponto de vista. Para ter acesso às
percepções e interpretações da professora informante, a pesquisa analisou suas
narrativas, coletadas na forma de entrevistas de retrospecção, sobre os eventos de sua
sala de aula. Antes, porém, de ingressar na descrição e discussão desta pesquisa, faz-se
necessário conhecer melhor as “histórias” contadas pela pesquisa sobre ensino de língua
em geral. Depois disso, a questão do professor não-nativo de língua estrangeira (LE)
será brevemente discutida, já que esta foi uma preocupação crucial para o presente
trabalho. Finalmente, o desenho desta pesquisa e seus resultados serão apresentados e
discutidos.

1. Breve História da Pesquisa em Ensino de Língua

Há mais de vinte anos, num artigo seminal sobre pesquisa em sala de aula,
Michael Long (1980) discutiu as questões metodológicas envolvidas nesse tipo de
pesquisa e chamou a sala de aula de LE de “caixa preta”, numa metáfora óbvia para o
pouco conhecimento que se tinha, à época, sobre os processos de ensino/aprendizagem
em sala de aula. Hoje em dia, a situação certamente não é mais a mesma, principalmente
devido ao crescente número de pesquisas realizadas em sala de aula. Contudo, a grande
maioria das pesquisas que buscam compreender a sala de aula enquanto contexto social
(Holliday, 1994) o fazem a partir do ponto de vista dos aprendizes, sendo que o ponto
de vista do professor, enquanto participante deste contexto, ainda é pouco estudado.
Nos últimos anos, porém, o interesse pelo professor de LE tem crescido em todo
o mundo, principalmente a partir dos trabalhos de Freeman (1989) e Richards & Nunan
(1990). A pesquisa sobre formação e desenvolvimento do professor de LE, assim,
rapidamente cresceu e abarcou diferentes perspectivas. Mas a eterna separação entre
teoria e prática, pesquisa e ensino, permaneceu. Freeman (1996), por exemplo, discute a
relação entre pesquisa e ensino e chama atenção para sua natureza hierárquica e
unidirecional. O autor argumenta que é necessário “saber a história para poder contar a
história”1 (p. 90). Para ele, aqueles que conhecem a sala de aula a fundo (professores e
alunos) raramente falam desse conhecimento, enquanto que aqueles que normalmente
falam sobre a sala de aula (pesquisadores) “freqüentemente desconhecem as histórias ali
presentes” (ibid). O autor sugere, então, que para compreender completamente a
atividade de ensinar, é preciso colocar a pessoa do professor no centro das pesquisas
sobre ensino.
De acordo com Freeman (ibid), as pesquisas sobre o professor de LE podem ser
agrupadas em três diferentes tendências, dependendo do ponto de vista assumido pelo
pesquisador e da importância dada às contribuições do professor participante: a visão
comportamental, a visão cognitiva e a visão interpretativista.2 A visão comportamental,
como sugere o nome, focaliza o comportamento do professor em sala de aula. Neste tipo
de pesquisa, o pesquisador é um observador dos eventos de sala de aula e as ações do
professor são freqüentemente relacionadas ao resultado da aprendizagem dos alunos.
Para Freeman, os resultados destas pesquisas se afastam “tanto do mundo em que [o
ensino] acontece quanto da pessoa que o realiza” (ibid, p. 91) e acrescenta que, em
termos das “histórias” que são contadas, esses resultados levam a uma visão
compartimentada do ensino, ou seja, uma visão comportamental, impessoal e divorciada
dos contextos em que ocorre.
A visão cognitiva focaliza os processos mentais do professor, suas percepções e
intenções, suas crenças, conhecimento e atitudes, assim como as dimensões afetivas
(como sentimentos de ansiedade e medo) que sem dúvida habitam o dia-a-dia do
professor, moldando seus pensamentos e ações. Este tipo de pesquisa tenta compreender
não apenas o que os professores fazem em sala de aula, em termos de comportamentos e
ações, mas também o que eles pensam ao realizarem estes comportamentos e ações.
Freeman (ibid, p. 95) argumenta que “para contar este lado da história, precisamos
colocar as percepções dos professores – seu raciocínio, suas crenças e suas intenções –
no centro de qualquer relato de pesquisa”. Para o autor, os resultados desta nova
tendência revelam não apenas visões do ensino, mas também suas limitações.
A visão interpretativista é sugerida por Freeman como tendência alternativa,
objetivando compreender como os professores interpretam sua própria prática em
relação aos contextos específicos em que trabalham. A pesquisa, sob esta nova
perspectiva, tenta focalizar não apenas as conclusões do pesquisador, mas também as
vozes dos professores participantes. O autor conclui que “este tipo de pesquisa fornece
um espelho que reflete centralmente o professor em seus relatos” (ibid, p. 96).
A conclusão do autor, após apresentar estas tendências da pesquisa na formação
do professor, é que o conhecimento profissional do professor é caracterizado por
histórias. Assim, para ele a pesquisa sobre ensino deve “saber como contar a história”
(ibid) para melhor poder interpretar o ensino e seus resultados.

2. O Professor Não-Nativo

Uma das constantes preocupações de pesquisadores no campo da formação do


professor de língua é a questão do professor não-nativo. A dicotomia entre falantes
nativos e não-nativos de uma determinada língua vem das origens dos estudos
modernos em Lingüística, quando Chomsky, ao final dos anos 50, introduziu a noção de
“competência do falante nativo” (Stern, 1983). Inicialmente, a necessidade de imitar o
1
Grifo meu.
2
Tradução minha.
falante nativo dominou os objetivos de professores e alunos de LE. Atualmente, isso já
não é tão importante, embora a questão não tenha sido ainda totalmente esquecida. Mais
de trinta anos depois de Chomsky, Medgyes (1994) reabre a discussão sobre esse
controverso aspecto do ensino de línguas. O autor discute as principais diferenças nas
atitudes dos professores nativos e não-nativos de inglês como LE e as vantagens e
desvantagens de ser um professor não-nativo. Ele dá atenção especial aos principais
problemas enfrentados pelo professor não-nativo, tais como o déficit lingüístico e um
possível complexo de inferioridade em relação a falantes nativos. Como conseqüência
disso, Medgyes ressalta que o professor pode entrar num ciclo de estresse que pode
levar a um baixo desempenho e à baixa auto-estima. O acúmulo de trabalho, um
problema comum da profissão, também pode contribuir para o aumento do estresse do
professor, causando tensão e sentimentos de culpa, o que pode levar o professor ao
isolamento ou mesmo causar problemas de saúde.

Medgyes (ibid, p. 41) nos lembra que

“Estudos sobre o aprendiz de língua são abundantes, enquanto aqueles sobre o


professor de língua são bem menos comuns. Isto também se aplica às pesquisas
sobre estresse em ensino de LE: enquanto livros e artigos sobre ansiedade na
aprendizagem de língua existem em abundância, quase não existe nada escrito sobre
‘a doença de ensina’ língua estrangeira. Este é um fato lamentável, considerando que
professores estressados tendem a também elevar o nível de estresse dos alunos.”

O autor, assim, nos adverte sobre os perigos de os professores se tornarem


estressados e ansiosos. Por isso é necessário compreender a natureza dos problemas
encontrados por professores para, então, identificar claramente as fontes de estresse e
ansiedade. Medgyes sugere que, dessa forma, será possível melhor preparar os
professores para enfrentar esses problemas e evitar a ansiedade e o estresse.

3. Para Compreender a Sala de Aula

A pesquisa aqui relatada procurou tratar das questões discutidas nas seções
acima. Baseada nas sugestões de Freeman (1996) sobre tendências interpretativistas da
pesquisa na formação do professor, este trabalho adotou uma metodologia que buscou
focalizar as percepções da informante sobre os eventos ocorridos em sua sala de aula a
partir de seu próprio ponto de vista. Tendo como objetivo inicial uma compreensão
global das percepções da informante, os resultados encontrados nas narrativas ou
“histórias” da professora também revelaram um conjunto de elementos que podem
influenciar a prática diária do professor de LE.
A informante da pesquisa foi uma professora em formação e o contexto de
coleta dos dados foi o centro de extensão para ensino de línguas em uma universidade
brasileira. Carolina, como a participante preferiu ser chamada, era uma professora
ingressante na profissão: ela não tinha nenhuma experiência anterior de ensino. Os
dados foram coletados em uma turma de alunos adultos pré-intermediários para os quais
Carolina lecionava.
Os dados da pesquisa foram coletados através de uma série de entrevistas de
retrospecção entre a pesquisadora e a professora participante, que refletia sobre os
eventos de sua sala de aula com a ajuda de gravações em vídeo de suas aulas. Durante
as entrevistas, a participante forneceu histórias e interpretações dos eventos ocorridos
em sua sala de aula.
A análise das histórias contadas pela professora participante permite perceber
que as experiências por ela vividas em sua sala de aula incluem não apenas suas crenças
sobre ensino e aprendizagem de línguas, mas também outras percepções e interpretações
sobre vários assuntos e eventos. Contudo, uma análise detalhada dessas histórias seria
exaustivamente longa e estaria além do escopo deste trabalho3. Para os objetivos do
presente texto, portanto, foram analisados apenas os trechos das histórias da participante
que falavam sobre eventos ou fatores que influenciavam seu desempenho em sala de
aula. Como foi visto, Medgyes (1994) discutiu os principais problemas enfrentados por
professores não-nativos. As histórias da professora participante aqui apresentadas
parecem corroborar as idéias de Medgyes sobre esse assunto.
As histórias narradas por Carolina, coletadas durante as entrevistas de
retrospecção, revelam que seu desempenho em sala de aula é influenciado por vários
fatores. Estas influências podem ser positivas ou negativas, e podem se originar dentro
ou fora da sala de aula. O quadro abaixo descreve os vários fatores que influenciam a
sala de aula de LE, de acordo com as interpretações e percepções da professora
participante:

Fatores que Influenciam a Sala de Aula de Língua Estrangeira

• A relação entre ensino e contexto


- Influências positivas
- Influências negativas
• As pressões à sala de aula
- Pressões internas: a) pressões pedagógicas
b) pressões da interação
- Pressões externas: a) pressões pessoais
b) pressões contextuais

Os resultados acima representam um panorama dos fatores que influenciam a


sala de aula da participante. Como ressaltou Medgyes (1994), o trabalho diário do
professor não-nativo é cheio de influências e pressões que nem sempre se originam
dentro da sala de aula, ou seja, o contexto em que atua. Estas influências e pressões
estão claramente reveladas nas histórias da participante. Durante as entrevistas de
retrospecção, Carolina falava não apenas de suas interpretações dos eventos ocorridos
em sua sala de aula, mas também sobre as razões que ela atribuía a cada um deles. Estas
razões incluem, por exemplo, suas dificuldades pessoais enquanto aprendiz da língua
que ensina, as influências positivas e negativas das experiências anteriores de seus
alunos, sua dificuldade em controlar o tempo das atividades pedagógicas, suas
cobranças pessoais, sua vontade de manter uma boa imagem frente às alunas, suas
dificuldades e ansiedades frente às suas outras atividades e suas obrigações curriculares,
como fazer avaliações, apresentar notas e cumprir o programa do curso. Estas
percepções serão detalhadamente discutidas a seguir.

3
Para conhecer outros resultados desta pesquisa, ver Mattos (2000 e 2002a e b).
A Relação entre Ensino e Contexto: Influências Positivas e Negativas
Carolina apontou, por exemplo, como influência positiva do contexto sobre a
sua sala de aula a questão da relação entre alunos e professor. Segundo ela, a visão que
os alunos do CENEX têm do professor é diferente da visão de outros alunos. Para ela,
no CENEX, os alunos são mais tolerantes aos erros do professor porque conhecem o
sistema da escola, que tem por objetivo oferecer oportunidade de prática aos professores
em formação. Os alunos que freqüentam os cursos do CENEX conhecem o objetivo da
escola e isso favorece a relação do professor com esses alunos.
Quanto às influências negativas do contexto sobre sua sala de aula, Carolina
apontou a questão da pouca participação das alunas durante a aula. Ela comentou que
suas alunas participavam pouco das atividades orais de sala de aula porque nos níveis
anteriores isso não era exigido pelo professor.

As Pressões à Sala de Aula: Pressões Internas


Durante as entrevistas, várias vezes, Carolina abordou a questão das pressões à
sala de aula, sejam elas internas ou externas. Dentre as pressões internas, seus
comentários foram divididos em pressões pedagógicas e pressões da interação. Sobre as
pressões pedagógicas, Carolina abordou dois pontos principais: a questão do controle do
tempo e os problemas não previstos. Sobre o controle do tempo, Carolina dizia ter
dificuldades para controlar o tempo de cada atividade pedagógica, e intencionava buscar
maneiras de melhorar sua atuação quanto a este ponto.
Quanto aos problemas não previstos, Carolina contava que muitas vezes se
deparava com situações imprevistas e que, nestas ocasiões geralmente não sabia como
agir. Numa dessas ocasiões, Carolina fala das dificuldades que os alunos geralmente
têm para compreender pontos gramaticais que são diferentes na língua materna e na LE,
como, por exemplo, o conceito de substantivos incontáveis. Para ela, o professor deve
prever essas dificuldades ou problemas e preparar-se para esclarecer as dúvidas dos
alunos. Porém, quando isso não acontece, o professor se depara com uma situação
inesperada, como ocorreu com ela quando um aluno lhe perguntou se havia adjetivos
incontáveis.
Sobre as pressões internas à sala de aula, relacionadas à interação, Carolina
demonstrou ser uma professora preocupada com sua imagem frente a seus alunos. Ela
comentou que o professor deve mostrar segurança aos alunos e sua vontade de
corresponder a essa expectativa a preocupava.
Estas foram as histórias de Carolina em relação às pressões internas à sua sala de
aula. As pressões externas serão discutidas nas sessões seguintes.

As Pressões à Sala de Aula: Pressões Externas


Quanto às pressões externas à sala de aula, a análise dos dados revelou que
existiam pressões pessoais, ou seja, aquelas relacionadas à vida pessoal da professora
participante, e pressões contextuais, ou seja, aquelas relacionadas ao contexto da escola.
Sobre as pressões pessoais, Carolina comentou várias vezes sobre a existência de
problemas relacionados a suas outras atividades, que a deixavam dispersa dentro da sala
de aula.
Sobre as pressões contextuais, ou seja, aquelas relacionadas ao contexto da
escola, Carolina teceu comentários sobre sua preocupação em cumprir o programa
previsto para o curso, uma dificuldade que todo professor parece ter, mas que a
preocupava enormemente. Uma outra questão que Carolina mencionou sobre as
pressões contextuais a sua sala de aula está relacionada à avaliação. Para ela, a avaliação
somativa parece ser um mal necessário, algo que ela gostaria de evitar, mas que não
pode por ser uma exigência da escola.
Esses foram, então, alguns dos comentários da professora participante sobre as
influências presentes no seu dia-a-dia e sobre as pressões à sua sala de aula. A discussão
das histórias de Carolina, apresentada acima, procura representar esse vasto universo de
influências e pressões à sala de aula, discutido por Medgyes (1994) e descrito pela
participante. A figura 1, apresentada a seguir, tenta representar esquematicamente esses
vários fatores que influenciam a sala de aula de LE.

Contexto
Influências Influências
Positivas Negativas

Sala de Aula
Pressões da Pressões
Interação Pedagógicas

Pressões Pressões
Contextuais Pessoais
Contexto

Figura 1: Fatores que influenciam a sala de aula de LE

Na figura acima, a grande área externa em forma de estrela representa o contexto


em que está inserida a sala de aula. Por ser fluido e, por natureza, não delimitado, o
contexto está representado por uma linha tracejada. As várias pontas da estrela tentam
representar as diferenças contextuais encontradas nas várias situações de ensino de LE
(Holliday, 1994). O círculo interno representa a sala de aula de LE que, por se tratar de
uma cultura fechada e inacessível ao observador não-participante (Holliday, ibid) ou
uma “caixa preta” na concepção de Long (1984), está representada por uma linha
contínua escura. A partir do contexto, surgem as influências positivas e negativas à sala
de aula e também as pressões externas, ou seja, as pressões contextuais e as pressões
pessoais. Dentro da própria sala de aula, por fim, surgem as pressões internas, ou seja,
as pressões pedagógicas e as pressões da interação. Os resultados apresentados parecem
ratificar as idéias de Medgyes (1994) sobre os problemas dos professores não-nativos.

Conclusão:

Como discutido acima, através de suas histórias, a professora informante revelou


que seu desempenho em sala de aula é influenciado por um conjunto de diferentes
elementos, que podem ser caracterizados como influências positivas ou negativas ou
podem assumir a forma de pressões originadas dentro ou fora do contexto da sala de
aula.
Fica claro, portanto, que professores de LE enfrentam problemas de toda sorte e
também se deparam com outras fontes de ansiedade em sua rotina diária. Esses
elementos certamente influenciam o desempenho do professor em sala de aula. Assim, é
necessário compreender melhor esses elementos e esclarecer como eles interferem no
desempenho do professor, para se obter um maior conhecimento sobre a sala de aula de
LE e compreende-la como um contexto social em toda sua complexidade. Como
afirmou Freeman (1996), é preciso “saber a história para poder contá-la”. Conforme
discutido acima, narrativas e histórias são uma importante ferramenta nesta direção.

Referências

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1
Publicado nos Anais do I Congresso Latino-Americano sobre Formação de Professores de Línguas,
Florianópolis: UFSC, 2007. 1 CD-Rom.

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