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1. Introdução
Esse apego ao papel é fruto de uma construção histórica que começa no século XV com
Gutemberg e vem sendo reforçado nos últimos 5 séculos. Atinge seu apogeu com a implantação
do modelo burocrático weberiano nas estruturas organizacionais.
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mudança nas organizações com a implantação do correio eletrônico.
Durante séculos, a comunicação escrita foi feita por manuscritos ou processos artesanais
de entalhe, gravação e impressão de caracteres em pergaminhos preparados a partir do couro de
animais. No século VII, Carlos Magno, rei dos francos, introduz o cristianismo nas regiões
conquistadas, estabelecendo relações comerciais através de seu Império e também com o Oriente.
Essa expansão do comércio promovida por Carlos Magno vai exigir uma organização
administrativa dos negócios, ensejando, por sua vez, um incremento na correspondência
comercial, limitada porém a eventuais trocas de registros com quantidades e valores.
Embora o papel tenha chegado na Europa no século XII e impulsionado a propagação dos
meios de comunicação impressos, a “era do papel” inicia com o Renascimento2 no final do século
15, e tem como marco histórico o desenvolvimento da prensa mecânica por Gutemberg.
Gutemberg em 1448 tem pronto os tipos móveis de metal que permitiam a composição
manual dos caracteres até formarem linhas. A reutilização dos caracteres e a rapidez na montagem
dos textos revolucionaram os processos de composição, possibilitando a impressão mecânica de
textos e sua reprodutibilidade.
1 Durante a Idade Média, “o livro é indústria eminentemente monástica. Mais do que um simples trabalho de ordem
material, a cópia de manuscritos assumia foros de exercício espiritual, capaz de aprimorar as virtudes e realçar os
merecimentos sobrenaturais dos monges”(MARTINS-1996:98).
2 “Juntamente com a pólvora (essa outra invenção chinesa!), o papel é o grande aríete do mundo renascentista que se
anunciava, contra o mundo medieval que sucumbia. A transformação seria feita, em grande parte, através do livro e
da palavra escrita: o papel é que se ia revelar, na verdade, a grande arma, a arma mais perigosa, mais potente e de
maior alcance já inventada pelo homem”(MARTINS-1996:114).
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Os primeiros livros impressos por Gutemberg - entre 1452 e 1455 - foram cerca de 100
exemplares da Bíblia. No bojo do impulso renascentista de redescoberta dos autores da
antigüidade clássica, seguiram-se a edição de textos clássicos da literatura. O livro deixa de ser o
local onde se escondia o conhecimento e passa a ser o meio de divulgá-lo. O leitor é uma
invenção do Renascimento.
A Bíblia até o século XVI era escrita apenas em hebreu ou aramaico. Conhecida portanto
por poucos ilustrados da igreja, que traduziam os textos para os fiéis ignorantes. A mediação com
o divino era feita através da Igreja e dos padres, únicos capazes de interpretar a Bíblia.
Inicia-se, com isso, uma relação de sacralização com o papel, como um meio de acesso ao
transcendente. As escrituras sagradas fixadas no papel libertavam o crente da dependência da
Igreja e dos padres. A posse da bíblia e sua leitura3 era a garantia da salvação. A ligação com o
divino podia ser estabelecida diretamente pelo homem através da bíblia traduzida para a sua
língua.
A bíblia deixa de ser um volume que esconde as palavras para ser um veículo da
revelação.
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Descartes publica “O Discurso sobre o Método” em 1637. A filosofia do cogito representa
a afirmação do homem como sujeito. O desenvolvimento da razão e do espírito crítico é a
condição para a individualidade, e o livro é o grande parceiro do homem nessa construção da
subjetividade.
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A Retórica, como arte de convencer através do discurso oral, perde o prestígio a partir do
final do século XVIII. O termo retórica passa a indicar o discurso vazio que tenta substituir com
expediente medíocres a falta de idéias.
A Revolução Francesa (1789) pode ser incluída naquele pequeno grupo de acontecimentos
históricos que, em virtude das transformações socioculturais que puseram em marcha, afetaram,
direta ou indiretamente, a vida de boa parte das nações do mundo. Muitos dos elementos
constitutivos das chamadas sociedades modernas conheceram a sua formulação primeira durante a
Revolução. As mudanças propostas pela Revolução Francesa estão ainda carregadas de
contemporaneidade.
1814 - a prensa a vapor é capaz de rodar 1.100 páginas por hora. O jornal londrino The
Times é o primeiro a utilizar o novo invento.
1846 - a rotativa roda 5 mil página por hora.
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industrial começa a surgir a necessidade de organização do trabalho, o que passa a ser feito
através de registros e orientações escritas.
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- as relações são impessoais;
- a promoção se dá por tempo de serviço e merecimento;
- o funcionamento da organização é completamente previsível.
A onipotência do papel está em xeque, após 5 séculos de hegemonia. Estamos neste final
de século vivenciando uma nova revolução - os bits substituem os átomos. O ano de 1976 vem
marcar o início da era dos bits com o surgimento da Internet.
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O correio eletrônico agiliza processos e mostra como se torna obsoleta a estrutura
hierarquizada das empresas, pois salta os patamares hierárquicos e permite o fluxo livre da
informação. Por que manter instâncias repassadoras da informação se é possível a comunicação
diretamente com o destinatário?
4. Conclusão
4 Ver ROMAN, Artur Roberto “A carnavalização da linguagem na comunicação administrativa do Banco do Brasil -
um ritual de inversão dos bancobrasilianos”. INTERCOM/1997.
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desemprego tecnológico.
Embora o papel seja ainda o suporte hegemônico nos processos rituais de poder nas
organizações, graças à informatização da comunicação, uma tradição organizacional
profundamente marcada pela escrita vai perdendo espaço para processos comunicacionais cada
vez mais tributários às estruturas discursivas da oralidade.
Um dos mais importantes papéis do papel e da palavra escrita na idade moderna foi
ampliar nossa capacidade de memorização. Na era dos bits, os discos rígidos dos computadores o
fazem com muito mais eficiência. Trazem ainda a possibilidade de acumular em pequenos
espaços imagens e sons juntos com o texto escrito. Assim com o livro tornou a memória obsoleta,
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o correio eletrônico torna obsoleto um estoque de objetos com os quais nos acostumamos a
conviver nas empresas: arquivos, carimbos, gavetas, grampeadores. Livres desses ícones da era do
papel e do que representam, quem sabe tenhamos mais tempo para nos olharmos e reconhecermos
quão medíocre é a vida em um escritório...
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Referências Bibliográficas
LINS, Ivan.. A idade média, a cavalaria e as cruzadas. Civilização Brasileira. Rio. 1970.
MARTINS, Wilson. A palavra escrita - História do livro, da imprensa e da biblioteca. Ática.
S.Paulo. 1996.
MOTTA, Fernando C. Prestes. Teoria geral da administração: uma introdução. Livraria Pioneira
Editora. S.Paulo. 1992.
ROMAN, Artur Roberto. A linguagem da comunicação administrativa escrita do Banco do Brasil
- uma interpretação sociolingüística. Dissertação de Mestrado. UFPR. 1993.
Resumo
O apego ao papel nas empresas é fruto de uma construção histórica que começa no século XV e
atinge seu apogeu com a implantação do modelo burocrático weberiano nas estruturas
organizacionais. Esse modelo, racionalizador no passado, criou uma excessiva exigência de
normas e instruções escritas, emperrando o funcionamento das organizações. Este trabalho discute
esse trajeto histórico e as mudanças na comunicação administrativa das empresas com a
implantação do correio eletrônico.
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