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Resumo: Desde o litoral do Paraná passando por São Paulo até o litoral sul Fluminense,
entre as serras úmidas e o mar ocorre há 500 anos a presença de uma população cuja
cultura está entranhada nesta natureza. Os caiçaras são representantes da história do
Brasil assim como outras comunidades tradicionais minoritárias em nossa sociedade.
Este último fator faz destas populações extremamente suscetíveis às ameaças urbanas.
Porém suas situações geográficas de isolamento serviram de fortaleza contra as
investidas do “crescimento nacional”. O caso da população da Ilha Grande é um exemplo
dos conflitos resultantes de políticas urbanas impostas sobre o meio rural. Este trabalho
permite uma visão espacial dos fatos através de Sensoriamento Remoto a partir de
imagens Landsat/TM.
Palavras-chave: Territorio, Conflito, Sensoriamento Remoto, Ilha Grande.
Abstract.: 500 years of history are represented in the landscape of Ilha Grande-RJ. The
decade of 1970 led to major changes in the history of this landscape. After centuries of
intensive use, different units of conservation of the nature(UC) overlap in order to protect
this shrine. Defined during the military dictatorship, the UCs did not consider the
centenarians inhabitants of these lands, the Caiçaras. The state define until recently, the
Caiçara’s condition as hiding in their own ancestral territory. The objective of this work is
through remote sensing draw the recent history of land use of the island in order to map
the practice of agriculture and its process of abandonment defined by law. We use in this
work Landsat/TM imagery and supervised classification.
Palavras-chave: Territory, conflict, Remote Sensing, Ilha Grande.
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XIX ENGA, São Paulo, 2009 WIEFELS, A.C.
1.Introdução
Ao longo dos séculos uma população sempre esteve presente vivendo da roça de
subsistência, do extrativismo vegetal, da caça e da pesca artesanal; os caiçaras com seu
característico modo de vida(caiçara). Esta população caiçara gerenciou a natureza por
séculos vendo o desmatamento de sua paisagem pelas fazendas e a regeneração das
matas que seguiu a falência destas. Um povo que conhece muito bem seu território
ancestral e a dinâmica da natureza e que nos ensina a viver em simbiose nela dando uma
lição de ecologia para toda a população urbana.
Desta forma o solo da Ilha Grande foi por séculos palco de muitas dinâmicas
territoriais e de uso dos recursos naturais. Em nosso moderno meio técnico científico
informacional, as tecnologias nos permitem estudar a história do manejo do solo para
planejar o futuro sustentável almejado.
Fazemos com este trabalho uma aproximação das novas tecnologias para/com as
populações tradicionais da Ilha Grande a fim de entender o histórico uso do solo
mapeando-o e gerando produtos cartográficos que auxiliem a tomada de decisões por
parte das instituições responsáveis pela conservação deste espaço. Em 2008 o plano de
manejo da principal UC da ilha, o Parque Estadual da Ilha Grande (PEIG) ainda esta em
construção e as informações construídas neste trabalho visam auxiliar na inclusão dos
interesses do caiçara no planejamento para a gestão inclusiva e participativa do parque.
A ocupação humana dos solos da ilha se deu preferencialmente da praia em
direção aos fundos dos vales elevando-se por toda vertente do relevo potencialmente
agricultável. Os assentamentos destas populações edificavam-se entre as roças e as
praias.
A partir da década de 1970 as diversas Unidades de Conservação existentes hoje
na ilha foram criadas expulsando as populações caiçaras desprovidas de títulos de
propriedades de sua terra(território). Após proibição da pratica da roça por parte da
legislação ambiental parte da população que não deixou a ilha em direção das favelas de
Angra dos Reis se agruparam nas praias onde desembocam os principais rios de seus
vales. Desta forma as comunidades são definidas hoje na Ilha pelo nome da praia onde
se encontram.
O objetivo deste trabalho científico é o de registrar através de mapeamento o uso
do solo da Ilha Grande no ano de 1985 para posteriores estudos comparativos a fim de
criar uma evolução do manejo ambiental local pós-criação das Unidades de Conservação.
Como resultado esperado, está a observação do declínio gradual do uso do solo
observado por satélite caracterizando um processo paulatino de desterritorialização da
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XIX ENGA, São Paulo, 2009 WIEFELS, A.C.
população caiçara do seu território ancestral. Para isso foi necessário trabalhar com
sensoriamento remoto de imagens de satélite a fim de produzir dados de uso do solo.
Posteriormente foi produzido um material estatístico-descritivo e cartográfico referente ás
bacias hidrográficas da Ilha Grande. Através de álgebra de mapas foram cruzados os
dados a fim de definir o grau de preservação ambiental por bacia hidrográfica através de
um índice criado para este trabalho.
constitui um choque social, cultural e, sobretudo vital para esta população privada de sua
rotina de subsistência.
Territorialidade física
Território metafísico.
Mas não é possível negligenciar as mudanças radicais que ocorrem nas práticas
cotidianas dos moradores da vila do aventureiro na hora de fazer esta análise. A cultura
está mudando junto com os meios de subsistência e as novas relações de trabalho
afetando a identidade caiçara.
Tal identidade sendo representativa de um modo de vida, e este modo de vida
estando passando por uma metamorfose radical, podemos falar de uma
desterritorialização caiçara na Vila do Aventureiro e contradizer os ditos de que esta seria
a comunidade caiçara mais tradicional do estado.
Outras localidades na Ilha Grande, como o sertão do Sitio Forte e da Tapera
mantêm exemplos mais tradicionais desta cultura.
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2.Materiais e Métodos
uso respectivo dos comprimentos de onda do “infra-vermelho médio”( 0,63 - 0,69 m),
“infra-vermelho próximo”( 0,76 - 0,90 m) e “vermelho”( 1,55 - 1,75 m).
Tal composição é conhecida por permitir a identificação de diferentes tonalidades
da falsa-cor vermelho que representa a vegetação. O olho humano distingue maior
diversidade de tonalidades da cor vermelha que qualquer outra cor. Desta forma é
possível classificar diferentes tipos de vegetação. O alvo em destaque neste trabalho não
é propriamente a vegetação, mas a falta desta. As clareiras são os indicativos da
presença de roças caiçaras em funcionamento ou em estágio de abandono. Desta forma
foram destacadas da imagem através da classificação automática “Mahalanobis Distance”
as seguintes classes: 1) água; 2) sombra; 3) areia; 4) floresta; 5) clareira (tabela-1). As
amostras de treinamento foram destacadas visualmente sobre diferentes representantes
destas classes. A classe “floresta” precisou ser generalizada apesar das diferentes
respostas espectrais possíveis para tal análise devido ao desinteresse desta pesquisa
específica em esmiuçar tal classe.
Correções:
-Divisão dos polígonos que ocupavam duas bacias:
“Analisis tools” – overlay – intersect (camadas: “BH” e “Clareiras”)
-Fusão de polygonos:
Editor - Merge
Finalmente foi feito um “join espacial” da camada referentes ao “uso do solo” sobre
a das bacias hidrográficas(BH) para gerar a tabela que possibilitou calcular a “taxa de
impacto ambiental” por BH. Tal taxa é porcentagem de área desflorestada representada
pela formula (a/A*100) onde “a” é a área sem cobertura florestal de uma BH e “A” é a área
total da mesma BH.
3.Resultados
Em diversas idas a campo, foi possível fazer uma leitura de paisagem e conhecer
as pessoas que interagem cotidianamente com esta paisagem. Neste momento
identificamos os detalhes do sub-clima conflituoso que existe. Quer dizer; existe um
conflito latente referente a história desta população, mas também existe a inércia e o
silêncio da impotência frente aos órgãos do poder que geraram esta injustiça. Existem
também outros conflitos que dizem respeito a uma situação mais moderna. O
desenvolvimento da Ilha Grande junto com todo o da região da Costa Verde no litoral Sul-
Fluminense está fundamentado no discurso do turismo ecológico, mas que na verdade
trata a ecologia como objeto de consumo. Pousadeiros e veranistas correm geram uma
verdadeira “corrida do ouro” a fim de se apossar de parcelas deste solo sagradamente
verde e “preservado”, que se revela um objeto de consumo cobiçado nacional e
principalmente internacionalmente para o turismo.
A seguir estão ilustradas três situações de clareiras que foram agrupadas na
classificação como um tipo de área denominada para este trabalho de área desmatada
em contraposição à floresta.
O caso do solo exposto ilustrado pela Figura 7 é característico principalmente do
vale do Provetá no sudoeste da ilha onde o uso intensivo por séculos deteriorou o solo e
onde a vegetação secundária tem dificuldade para se regenerar apesar da presença de
florestas mais densas circunvizinhas.
As Clareiras cobertas por gramíneas ou espécies da família das samambaias
(diferença provavelmente devida a diferença de Ph do solo)(Figura 8) estão espalhadas
pela floresta e na maioria das vezes são roças abandonadas em regeneração.
As Roças de subsistência caiçaras (Figura 9) ainda existem em 2008 em diversas
localidades da ilha apesar da ilegalidade.
Foi construída uma carta temática que representa a taxa de área desmatada na
Ilha Grande. A coloração varia em um gradiente de verde (para ambiente mais
preservado) a vermelho (para ambiente mais desmatado). Esta carta está associada a
seu banco de dados com os nomes das bacias hidrográficas, as áreas e perímetros
destas bacias assim como das áreas desmatadas. A “tabela 5”, é um resumo deste
banco de dados produzida para comparar as áreas e calcular a “taxa de impacto”, dando
as informações por bacia hidrográfica. Em seguida está a carta final do trabalho (carta 1)
que nos fornece uma visualização do cenário da ilha grande no ano de 1985.
4.Conclusão
caiçara viu a mata voltar a crescer e retomar o seu espaço de forma exuberante
demonstrando o potencial da Mata Atlântica em se auto-regenerar. Da mesma forma, as
roças de subsistências, proibidas a partir da década de 1970 por decisão legislativa
tiveram seu abandono gradual representando hoje diversos estágios de recuperação da
mata.
No ano de 1985, podemos perceber que muitas famílias ainda resistiam ao
despejo e ainda estavam na terra mantendo o seu “modo de vida caiçara”, indo contra a
decisão do Estado que lhes proporcionou uma situação de ilegalidade quanto à sua
presença em solos “preservados”.
Este trabalho fornece bases metodológicas para construir a progressão do uso e
manejo dos solos da Ilha Grande ao longo do tempo. Imagens da série de satélites
Landsat nos fornece dados desde o inicio da década de 1970 até hoje.
O estudo comparativo com as décadas precedentes e posteriores á 1985 nos
informará a velocidade com que as famílias promoveram este “êxodo rural forçado” para o
continente (maior parte para as favelas de Angra dos Reis) e a velocidade com que a
vegetação se regenerou.
O resultado da pesquisa permite observações a respeito de quais são as áreas
mais ocupadas, degradadas e recuperadas da Ilha Grande. As bacias hidrográficas mais
preservadas são: as bacias do “Capivari-Corrego do Sul’, ‘Rio Pereque”, pequenas bacias
costeiras do sul e “Barra Pequena” em Dois Rios.
Em contraposição, as bacias mais impactadas são as do “Saco do Céu”, “Tapera”,
“Araçatiba”, “Praia Vermelha”, “Proveta”, ‘Aventureiro” e “Abrão”, condizendo com as
maiores aglomerações humanas.
Podemos observar desta forma o processo de desterritorialização do povo caiçara
em relação ao seu território ancestral, o qual representa a ilha toda. A reterritorialização
precária nas favelas de Angra dos Reis, ou nas praias da ilha na condição de mão de
obra barata para pousadeiros e outras infra-estruturas turísticas é conseqüência de uma
política por parte das “autoridades ambientais” que não reconhecem os direitos dos
caiçara em relação ao seu território ancestral.
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XIX ENGA, São Paulo, 2009 WIEFELS, A.C.
5 Bibliografia: