Manoel Hygino dos Santos

Família e arranjos

Venho atribuindo parte dos problemas sociais no Brasil à degradação dos laços
familiares, considerando que vínculos entre os que formam esse grupo se deterioraram
com o correr do tempo, com mudanças de comportamento da sociedade, influências
nocivas introduzidas na célula mater por pessoas ou grupos exógenos.
A família já não é mais como antigamente. Os filhos não têm respeito aos pais, embora
haja pais que tampouco se importem com o que acontece com os filhos, o que estão
fazendo nas ruas, com que se encontram, o tipo de divertimento que têm, a hora em que
retornam das andanças noturnas, se fumam, se bebem, se ingerem drogas.
Antes, a formação dos indivíduos saudáveis e cidadãos normais exigiam controle das
boas normas familiares, morais e higiênicas colocadas sob responsabilidade da dona de
casa e do pai, provedor e responsável. Tudo bem. Mas não existe, de fato, a família na
conceituação de antes, considerada antiga ou antiquada. Citado por Mary Cristina
Thomaz Gomes, psicanalista, François de Singly, diretor do Centro de Pesquisa sobre os
laços de Família, na Universidade Paris V, diz que, nos anos 70... "havia indicativos de
que a instituição família havia chegado ao fim. Os jovens começaram a viver juntos sem
se casar; os adultos divorciam-se cada vez mais; os homens foram obrigados a partilhar
com as mulheres o trabalho assalariado e a autoridade na família. Assim, a família
considerada 'tradicional', que exigia o respeito à instituição e à divisão do trabalho entre
sexos, se desestabilizou ou se transformou".
Aliás, parece-me oportuno o surgimento de uma expressão no artigo de Mary Cristina,
em 2006. Ficou bem dizer "arranjo familiar", ao invés de família, salvo melhor juízo.
Aliás, em Belo Horizonte, foram identificadas algumas modalidade de "arranjos
familiares". E são muitos: Nuclear simples: com pai e mãe presentes e filhos de casal;
monoparental feminina simples: mãe e filhos; monoparental masculina: pai e filhos;
nuclear extensa: pai e mãe com filhos e outras crianças e/ou adolescentes sob sua
responsabilidade.
Nesses arranjos, podemos encontrar ainda adultos e/ou idosos dependentes;
monoparental feminina extensa, em que apenas a mãe é responsável pelos filhos, outros
crianças e adultos, com relação de parentesco ou não; família convivente: família(s) que
moram juntas no mesmo domicílio; família nuclear reconstituída: pai e mãe em nova
união, legal ou consensualmente, podendo também ser encontrados filhos de uniões
anteriores por parte de mãe ou do pai com outros(as) companheiros.
Há mais. Família nuclear com crianças agregadas: pai e mãe presentes com filhos e
outras crianças sem a presença de outros adultos no domicílio; família homossexual
feminina simples: casal composto por duas mulheres; família homossexual feminina
composta, com a presença de duas mulheres e filhos de uma delas e/ou de ambas de
uniões heterossexuais; família homossexual composta extensa: com a presença de duas
mulheres e com crianças e/ou adolescentes sob sua responsabilidade; família
homossexual masculina simples: casal composto por dois homens; família homossexual
masculina composta: casal composto por dois homens e filhos de um deles e/ou de
ambos, de uniões anteriores heterossexuais; família homossexual masculina composta
extensa com a presença de dois homens, e presença de crianças e/ou adolescentes sob
sua responsabilidade.
Diante dos tipos de "famílias", vemos como éramos ou somos conservadores. É como
observa a doutora: "Nos últimos 20 anos, várias mudanças ocorridas no plano sócio-
político-econômico relacionadas ao processo de globalização da economia capitalista
vêm interferindo na dinâmica e estrutura familiar e possibilitando mudanças em seu
padrão tradicional de organização". Tudo se transformou: "Da desestabilização surgiram
novas formas de se estar em família, novos arranjos, a autoridade paterna foi abalada e
nos deparamos com o rompimento eminente da cultura familiar que herdamos do século
XIX: nuclear, monogâmica, patriarcal, falocêntrica.

Postado em 17 de Abril, 2010