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NEUROCIRURGIA ARTIGO ORIGINAL Redagao de um relato de caso Sebastido Silva Gusmao Roberto Leal Silveira Sinopse Descrevem-se as orientagées bdsicas para redagao do artigo clenifico, tipo relato de caso, por meio da andlise das diferentes partes ow se¢des desse tipo de trabalho. Aborda-se, tanbém, 0 estilo da lingwagem cientifica Palavras-chave Anigo ciemifico, relato de caso, redagdo. Abstract Writing a case report This work presonts a basic orientation for the one who is writing a scientific paper (case report). An analysis of their component parts and of the style of scientific language are also discussed. Keywords Scientific paper case report, writing Os tipos mais frequentes de artigos cientificos dos periddicos médicos sao: relato de caso, revisio e original. O relato de caso tem por objetivo relatar uma observagio & comenté-la brevemente, Deve conter elementos originais ica diagnéstica sobre a fisiopatologia, o interesse de uma t6 ou tratamento de uma doenga O relato de caso & um dos tipos de publicagdes mais tradicionais e comuns da literatura médica. Hipécrates estabeleceu, no século V a.C., as bases da medicina cientifi- ca extraindo conclusdes do estudo de casos clinicos. Esse Faculdade de Medicina de Universe Feders de Minas Gera Serica de Neutocinugie do Norns Modre Teresa. Senica de Nevrocirrala So Hostel Lanemburgo tipo de estudo continuou sendo importante na evolugio da medicinae possibilitou a Morgagni (1682 — 1771), no sécu Jo XVIII, com oestudo de casos anatomoclinicos, introduzir oconceito de doenga localizada nos 6rgaos e fundar& anato: mia patoldgica. Apesar do grande prestigio dos artigos ori- ginais experimentais, 0 artigo tipo relato de caso continua sendo itil para a evolugdo do conhecimento médico. O relato de caso s6 se justifica quando apresenta algo de particular relevancia ou de novo, como exibir carater excepcional ou evolugao insdlita, introduzir sugestdes para O diagndstico ou para a terapéutica ou aventar um posstvel esclarecimento sobre a etiologia ou a fisiopatologia. Ou quan- do, referindo-se a doenga muito rara, contribuit para aumen: tar uma casuistica impossivel de ser estabelecida de outre forma. Trata-se, portanto, de publicagao muito iil do aspec- to epidemiol6gico, etiol6gico, terapéutico ede descrigao de sindromes raras. O estudo de um caso clinico de carter ex- cepeional ou de evolugao insétita pode trazer importantes con- tribuigdes para o diagndstico, indicar novas opgOes terapéuti- cas ou ajudara esclarecer a fisiopatologia de uma doenga, 0 caso elinico deve ser estudado com rigor, nao dei- xando diividas quanto as interpretagdes semioldgicas, aos exames complementares ¢ as bases em que s¢ firmaram o diagndstico e a evolugao. A redacao do relato de caso deve evitar duas tentagdes: fazer revisio da literatura a partir do €as0 isolado e redigir artigo didatico sob o pretexto de comentar uma observagio. A composigio completa do relato de caso é consttuida pelas seguintes partes: titulo, nome do(s) autor(es), creden- ciais do(s) autor(es), local de atividade do(s) autor(es), (GUSMAO SS, SILVEIRA RL — Ratagio de om rls de oo ‘Tiras Newrociurg 102} 6265, 1999 resumo, palavras-chave, introdugao, relato do caso, dis. cussdo € referencias bibliogréficas? Nosso objetivo ¢ expor as normas basicas de redago do trabalho cientifico tipo :elato de caso. Analisaremos a redagio das diferentes pares ou segdes desse tipo de trabalho. Seré também abordado o estilo da linguagem cientfica Titulo Onttulo € a verso mais simplificada e condensada do artigo. E 0 rétulo que indica o contetido do trabalho. Redigi- do de forma precisa, clara e concisa, ele indica, de maneira inequivoca e com 0 menor mtimero possivel de palavras, 0 contetido, a esséncia do trabalho. Como no artigo e no resu- mo, ele deve refletir 0 que foi realizado no estudo de modo que, mesmo quando publicado separadamente (nas biblio- grafias), permita identificar a natureza e 0 conteiido do tra~ balho. ‘Umbom titulo é aquele que desereve de forma adequa 44a 0 contetido do trabalho, como menor numero possivel de palavras. E aconselhavel elaboré-lo a partir das palavras. chave, ou seja, 0s termos determinantes para se caracterizar o trabalho. Das palavras, no titulo, exige-se quase a mesma preciso dos simbolos em uma equagao matemética Resumo Resumo 6 apresentagdio sintética dos pontos elevantes do texto. & sua versio reduzida, mais minuciosa que 0 titulo fe menos que o todo. Ea ponte entre 0 titulo ¢ 0 contetido completo do artigo, apresentando o essencial deste. Deve permitirrépida informagao e avaliagao do texto completo e refletir,fiel mente, os dados fundamentais do trabatho. AA finalidade do resumo é difundir pesquisa o mais amplamente possivel. Ea parte passfvel de ser rapidamente difundida por meio dos sistemas eletrdnicos de indexacao. Para tal, deve formar um todo, podendo, assim, ser publica~ doindependentemente. O resumo deve apresentar 0 seguinte contetid! + Introdugo: faz-se breve justficativa da conveniéncia de relatar 0 caso. + Relato do caso: 0 caso € relatado de forma objetiva e concisa, enfocando os aspectos essenciais que caracterizam a doenga, + Discusséo: descreve-se as conseqiiéncias dos achados para a prtica clinica, Quanto & apresentagio, o resumo tera niimero limitado de palavras e seré redigido em linguagem simples, clara, 63 concisa e precisa, com frases curtas e completas. Os verbos so colocados no passado quando se referem ao trabalho apresentado, recomendando-se 0 uso da terceira pessoa do singular. O texto deve ser composto por uma seqiiéncia cor- rente de frases concisas e no por enumeracao de tépicos. Introdugao A introdugo tem por objetivo apresentar 0 caso que seré relatado, com a justficativa e os objetives que deram origem a decisio de se tratar do assunto, bem como suas relagdes com outros trabalhos, Deve incluir breve revisio da literatura Quanto ao estilo, deve-se usar © tempo verbal no passado para falar sobre o trabalho apresentado e 0 tempo verbal no presente para citar os resultados ja publicados. Na redagdo do objetivo, usa-se a forma infinitiva dos verbos. Relato de caso No relato de caso, a doenga é descrita de forma quali tativa, fenomenoldgica: observagdo e descrigao dirigidas para © fendmeno. Pode descrever um paciente, uma familia ou uma pequena amostra de pacientes. Quando se trata de vari- 105 casos, eles so sucessivamente relatados: caso 1, caso 2, etc, Nao € necessério especificar as iniciais do nome do pa ciente nem o niimero do prontudrio ou do registro no arquivo do hospital onde foi atendido. As informagoes sdo distribuidas em pardgrafos em se- qliéncia ldgica. Inicia-se com a identificagao, a queixa prin: cipal e 0 motivo do atendimento. A seguir, expdem-se, em pardgrafos sucessivos, ahistéria, o exame fisico, 0s exames complementares, a evolugo, 0s resultados ¢, se houver, 0 exame necroscépico. Orelato deve ser objetivo, conciso, preciso ¢ em forma de narrativa suave, assinalando a sucesso cronolégica dos acontecimentos. Na descri¢a0 do caso, 0 verbo é usado no passado. Os dados negativos da histéria e do exame fisico so incluidos apenas quando importantes para a compreensio do caso. Assim, em um caso de lombociatalgia da primeira raiz sacra, a informagao de que o exame neurol6gico ndo revelou alteragao do reflexo aquileu é desejével, porque ela pode existir. A informaco, entretanto, no relato desse mes- ‘mo caso, de que nao existem alterages dos nervos cranianos éirrelevante. Os resultados dos exames complementares ¢ a des- crigdo da operacao no devem ser c6pias dos registros do prontudtio do paciente. As informagées fundamentais so selecionadas e descritas em linguagem narrativa. Os resulta- ‘GUSMRO SS, SILVEIRA RL = Radagh Geum ato deca “Tiras Nearocirarg 1012) 6265, 1999 64 dos podem ser apresentados em tabela. Ff usada para apre sentag30 de resultados numéricos e valores comparativos. prineipalmente quando em grande quantidade. A tabela deve ser auto-explicativa, sem necessidade de se referir ao texto para ser compreendida’ Quando 0 trabaline ¢ ilustrado com Fotografias do pa- lente, deve-se evitar a identificagdo: ndo incluir 0 rosto ou cobrit os olhos. Quanto as datas, os eventos sio referidos no inicio da doenga ou no momento da internago ou da intetven- {¢20 cintirgica. Ao longo da narragao, as demais ocorrén- cias so referidas em relagdo ao evento escolhido como referéncia. Discuss Na discussdo, com base no caso relatado e nos traba- Ihos da literatura, os dados encontcados so interpretados, ‘comparados, analisados e comentados, buscando sua expli: cago e seu significado, Seu contetido € organizado na seguinte seqiténcia de objetivos + Dimensionar a qualidade ¢ a originalidade do caso relatado, como contribuigso ao debate cientifico + Comparar a interpretagao e os achados com aque! da literatura, chamando a atengao para as concor- dancias e discordancias. + Indicar qualquer exces: evidenciar os aspectos duvidosos, delimitando claramente 0s aspectos nao resolvidos. + Discutir as implicagdes teéticas dos achados, assim como as possiveis aplicagées préticas. ‘A argumentagio desenvolvida na discussdo deve ser sélida e seguir uma sequéncia l6gica. Fstabelece, inicial- mente, 2 correlagio entre os dados e, a seguir, compara os achados com aqueles da literatura. Como o relato de caso 6 uma pesquisa fenomenolégica, de ordem qualitativa, ndo chega a conclusdes ou a genecalizagdes. Entretanto, um pa- ragrafo conclusivo pode ser tedigido no final da discussio para sugerir as possibilidades de estudos faturos ou as impli- cagées pata a pratica clinica ow falta de coeréncia e Referéncias bibliograficas Referéncia bibliogrdfica é a listagem das referéncias citadas no texto de forma que permita a identficagio dos documents impressos.E feita em dois passos: nserglo da citagdo no texto e constituigho da lista das referéncias bibliogetias. Insergao das citagdes no texto Existem trés sistemas alternativos para indicar as cita Ges no texto: 0 autor-data ou sobrenome-ano (Sistem de Harvard), o numérico-alfabético e o numérico oul em sequién- cia, ou de ordem de citagdo (Sistema de Vancouver)**. Cada publicagdo periédica traz, entre as instrugdes aos colabora~ dores, as regras a seguir para a citagdo das referéncias bibliograficas. Asrefeténcias bibliogréficas no artigo tipo relato de caso geralmente se restringem a alguns trabalhos mais importan tes. Excepcionalmente é feita revisdo exaustiva da literatura, ‘que torna o texto misto entre revisio ¢ relato de caso. A literatura é descrita no passado (pretérito perfeito) Todos os trabalhos citados devem constar das referéncias bibliogréficas, bem como todes os trabalhos af listados de- vem ter sido citados no texto, Listagem das referéncias bibliogréficas A sesao referéncias bibliograficas, ltima parte do texto, compreende a ordenagao sistemética dos trabalhos referidos. Essa citagio deve seguir as normas tecomendadas pelo peri- ico a que se destina o artige. Dependendo do sistema adotado, as referéncias bibli- ogedficas so numeradas por ordem consecutiva de sua ci- ago no texto (sistema numérico) ou por ordem alfabética (sistemas sobrenome-ano e numérico-alfabético). Estilo As qualidades essenciais de qualquer texto e, parti cularmente, do texto cientifico sao: clareza, concisfo e corresio® Clareza Ea mais importante das trés qualidades fundamentais, do texto, & qual, de certo modo, reduzem-se todas as de~ ‘mais. Clareza consiste na expressao limpida do pensamen- to, na transparéncia ou nitidez que torna o texto facilmente compreensivel. Tudo pode ser dito com palavras simples ¢ exatas ¢ “o simples traz o enigma do que permanece” (Heidegger) Para atingir a linguagem simples: 1. use frases curtas e na ordem direta; 2. escotha palavras acessfveis ao maior nlimero possivel de leitores; 3. opte pela palavra mais simples que defina a coisa ou a situagao referida; ‘GOSMAO SS, SILVEIRA RL — Reda;ao de um vento de caso ‘Tibras Newrocirarg 10(2} 62.65, 1999 4. evite 0s termos técnicos desnecessérios e, quando absolutamente indispensavel, nfo deixe de explicé-los; 5, nfo use frases perndsticas e pomposas. Concisio Concisto & 0 emprego do menor niimero possivel de pa- lavras para exprimixo pensamento. A concisao confere a es- tilo particular vigor. As palavras dispensdveis poluem texto, Preceitos para a concisdo: 1. excluir pormenores insignificantes caracteristicas irrelevantes: 2. eliminar palavras e adjetivos initeis; 3. suprimir repetigdes das mesmas idéias. Correcao Correcao ou pureza consiste em observar a gramética. Devem ser evitados ertos de concordancia, impropriedade (troca ou mau emprego de palavras), ambigiiidade (frase com dois sentidos), obscuridade (Falta de clareza), cacografia (erro de grafia ou de acentuagao grifica), solecismo (erro sintati- co que pode ser de regéncia, de concordancia ou de coloca- 540), cacdfato ou cacofonia (encontro de duas palavras, for ‘mando uma terceira, de som desagradsivel ou de sentido incon- veniente),barbarismo (emprego abusivo ou desnecessériode palavras ou expressdes de outras tinguas), neologismo vicioso (uso de palavras supérfluas ou mal formadas), eco (repeti- 65 do de fonemas iguais), colisdo (repeticao de palavras com fonemas consonsintas iguais ou semelhantes) gitia ou jarg0 Cinguagem especial de uma classe ou profissto) Para conseguir clareza, coné rio rever 0 texto varias vezes, para corrigi-lo e cortar o supér- fluo, Deve-se procurar a formulagao mais simples, com eco- nomia de palavras. Tanto o editor como o leitor querem a me- thor informago, no espago minimo e como menor esforgo. Referéncias bibliograficas 1. ASSOCIACAO BRASILEIRA DE NORMAS TECNICAS: Normas ABNT sobre documentagio, Rio de Janeizo, ABNT, 1989. 2, CONSELHO NACIONAL DE ESTATISTICA; Normas de apresentagio tabular, Rev Bras Estatistica, 24 42-8, 1965, 3. DAY RA: Bow to write and publish a scientific paper. 5. ed, Phoenix, Oryx Press, 1998 4. INTERNATIONAL COMMITTEE OF MEDICAL JOURNAL EDITORS: Uniform requirersents for manuscripts submitted to biomedical journals. N Engl J Med, 336: 309-15, 1997, 5. NATIONAL LIBRARY OF MEDICINE RECOMMENDED FORMATS FOR BIBLIOGRAPHIC CITATION. Bethesda, National Library of Medicine, 1991 6. RAMON Y, CAJAL S: Reglas y consejos sobre investigacién ciemtifiea. In: Obras Literarias Compleras. Madrid, Aguila, 1961. 7. WHITE EB, STRUNK W: The elements of style. New York MacMillan, 1972. Endereco para correspondéacia: Sebastido Gusmao Rua Oroni, 909/410 CEP 30150-270 - Belo Horizonte, MG E-mail: gusmao@medicina.uimg br ‘GUSWAO SS, SILVEIRA Ri - Retagio Geum ralode cana Tras Neurodirarg 10(2) 6265, 1999

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