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No Brasil séo ainda reduzidas as Pesquisas sobre suas formacdes superficiais. Na tentativa de atenuar esta caréncia, 0 Boletim Geografico transcreve artigo do Prof. Dr. C. Trool, publicado originalmente em Beih. Geol. Jb, — 80, s. 225-257 — Hannover/Oktober 1969, que traz contribuigaéo das mais valiosas para estes estudos. Trata-se de anélise referente a métodos de trabalho em geomorfologia, levando em consideragao os avangos da caréncia, em estudos realizados na Africa e América do Sul, principalmente no que diz respeito 4 geomorfologia climatica. 102| Teor, problemas e métodos de pesquisa geomorfoldégica (Considerando particularmente © questiondrio sobre o clima) JA os antigos pesquisadores da natu- Yeza pensaram e escreveram a respeito de formas do solo em costas, vulcdes, e embocaduras de rios. Entre os pes- quisadores da Terra do século XVIII, ja houve acaloradas discusses sobre a génese de certas formas geograficas, so- bremodo quanto & formacio de vales (J. J. Scheuchzer, J. A. de Luc, Giraud. Soulavie, J. Hutton, J. Playfair e ou- tros). No entanto, como ciéncia, a morfologia da superficie terrestre nao se originou sen%o da considerac%o comparativa das formas do mundo no periodo da filosofia idealistica. A Morfologia das plantas de Goethe — cle pronunciou o termo “morfologia”, pela primeira vez, em 1790, em seu tra- tado sobre a “metamorfose das plan- CARL TROLL tas” — sucedeu-se a Fisiondmica dos ve- getais, de A. vy. Humboldt, em 1807. O seu contemporaneo C. G. Carus es- creve em suas Cartas sobre apresenta- gio de paisagem (publicadas de 1815 a 1824), sobre a “Fisionomia das Mon- tanhas” (1841) e, mais tarde, em suas Doze cartas sobre a vida terrestre (1841) fala em sua “Morfologia da Su- perficie Terrestre” No mesmo ano, Louis Agassiz apresen- tou a doutrina do periodo glacial da Terra, com que, pela primeira ve7, se conjeturou quanto ao conhecimento de formas de superficie, sobre climas no passado geoldgico. Trés decénios mais tarde (1869), O. Peschel escreveu Novos problemas da Geografia com- parativa como tentativa de uma morfo- logia da superficie terrestre. Ai apare- ce pela primeira vex nao apenas a pa- lavra “problema” em conexio com a geomorfologia, mas também 0 método comparativo é aplicado conscientemen- te € leva, p. eX, a explicacgio das cos tas de fiordes pela glaciagio, no peri- odo glacial, de montanhas costeiras de latitudes mais altas, Apés as extensas pesquisas de campo por F. von Richt- hofen, na Asia Oriental e por J. W. Powell ¢ Grove K. Gilbert nas monta- nhas do Extremo Leste, von Richtho- fen péde escrever em 1886 0 primeiro livro de ensino e Albrecht Penck, em 1894, 0 primeito manual de morfo- loi A morfologia explica o mundo de for- mas, da crosta terrestre sélida_pelas alternativas da dinamica endégena € exgena, como forma de estrutura, res- pectivamente de escultura, Processos enddgenos sfo tectonica sismica ¢ vul- canismo; processos exdgenos sio a ati- vidade de formas originadas de fora, que residem na atmosfera e hidrosfera: de Agua corrente, de gelo do glaciar, do vento e da ressaca do mar, da 4gua subterranea que dissolve ¢ do gelo con- tido no solo. A morfogénese, 0 estudo do desenvolvimento das formas, que leva a processos anteriores da geologia, poe a morfologia em contato intimo com a geologia que, inversamente, tem que se valer da dindmica morfoldgica atual sob as mais diversas condicées climdticas para a reconstrugio de pro- cessos geolégicos. Para se compreender a riqueza de formas da Terra, as dife- rencas regionais de clima e econom: de ‘gua, também do revestimento flo- ristico sio de importincia igual a litos- fera e dindmica tectonica. E por isso que a morfologia é um assunto central da geografia fisica, que ainda se dedi- ca ao estudo das alterndncias funcio- nais entre litosfera, atmosfera, hidros- fera ¢ biosfera. As formas de superficie sio um indicio basico de toda a uni- dade de paisagem e, em espaco reduzi- do, também decisivas para a articula- | cho do espaco natural. $io dominadas pela rocha, pelo clima e pela circulagio da agua, por sua vez, no entanto, tam- bém slio a base para solo, revestimen- to vegetal topoclima etc. Assim como © geologo esté, desde G. K. Gilbert (1877), acostumado a ver as formas terrestres como efeitos da estrutura in- terna (structure), da escultura externa (process), € do estagio (stage) do desen- volvimento conseguido, para o ge grafo as formas terrestres (do solo) também so componentes da textura de efeito ecoldgico da pa ecossistema Variagdo de importéncia nas formas de relevo Ao falar-se hoje tanto em “geomorfo- logia climatica” pode isso levar facil- mente a um mal entendido, como se houvesse uma morfologia tecnica ou dimatica especial. & natural que se compreende as formas apenas a partir da dinamica geral. Nao obstante o questiondrio climatico levou, nos tl- timos 30 anos, a conhecimentos sobre- modo importantes. A importincia da variagio petrogrifica (a diferenciacto tectonica morfoldgica pelo carater da rocha primordial), variacio_climética, movimentos de conjunto dos contin- nentes a estrutura tectonica fundamen- tal, por J. Budel (1963), nao corres. ponde com exatidéo terminoldgica, no entanto, na visio total da tripartigio classica de G. K. Gilbert Dois exemplos tirados da pesquisa geo- morfoldgica moderna talvez elucidem a formulacdo de perguntas quanto 4 im- portincia do carater da rocha ¢ clima. Os estudos sobre o carso tropical que, desde 1955, sob a orientacio espiritual de H. Lehmann, sao levados a efeito sistematica ¢ mundialmente, t€m por meta procurar compreender 0 tipo de paisagem morfoldgica de uma deter- minada rocha, rocha calcdria facilmen- Bol. Geogr. Rio de Janeiro, 32(234): 1-164, maio/jun., 1973 104 te soltivel, como efeito do clima tro- pical especificamente tmido (H. Leh- mann, 1954, 1956, 1960). Inversamen- te, H. Wilhelmy (1958) submeteu as diversas formas de decomposicao de ro- chas cristalinas em grandes massas a um exame comparativo sob as varia condigées climaticas € nisso colheu co- nhecimentos essenciais. Geomorfologia e microclima Na geomorfologia, também as diversas dimensdes do clima, que depois dos trabalhos basicos de R. Geiger (1927) se aprendeu a diferenciar (macrocli- mas, meso, topoclima ou do terreno e | microclima ou clima de area restrita ou minima), desempenham um_pa- pel importante certos fendmenos que, outrora, se julgava ter que explicar por outros climas do passado, que en. contram explicagio menos forgada por diferenciagdes microclimaticas na eco- nomia da natureza, Citaremos trés exemplos para isso. Por “decomposigio em alvéolos” (de- composigio por buracos, grades de pe dra, honey-combed rocks, roches alvéo- Ides), entendese uma microforma de decomposigio de pareddes de arenito, que pode ser observada por toda parte wa Alemanha; tratase de arenito va- siegado (Buntsandstein), arenito cre- ticeo (Kreidesandstein), arenito Keu- per ou arenito lidsico. No entanto, é observada também em muitas outras regides climéticas da Terra prancha 3, fig. 1). Visto que, por volta do inicio deste século, foram descritas regides desérticas, sobremodo belas, do Egito (J. Walther, 1900). Asia Central (K. Futterer, 1902) ¢ Africa Su- doeste (I, Schlve-Jena, 1907), surgiu em seguida a suposi¢Zo de que na Eu- ropa Central timida se tratasse de for- magées de um paleoclima arido (E. Obst, 1909. P. Kessler, 1918: E. Kraus, 1923). Todavia, posterior mente, essa opinifio foi cnergicamente refutada, A. Hettner, em 1910 € 1911, defendeu a “teoria ‘de percolagio”, isto é uma decomposigio das paredes a partir de dentro. D. Haberle (desde 1911) propugnou uma “teoria de in- filuagto” e C. Weiss (1916), a sua teoria de “estratificagio”. A alteragio diagenética dos arenitos como pres- suposigzo cde “decomposigéo em favos”” pode ser hoje considerada como se- gura. Para 0 préprio processo de decompo- sicfo, no entanto, a observacao deci- siva € que em nossos climas pluviais a formacio em “favos” depende da defesa da chuva em paredes pensas por cima ou por cornijas salientes nas pa- redes. Reina ali um microclima desér- tico sem vegetacao, com decomposigio mecinica da rocha ¢ por sais. A ocor- réncia de sais, a saber, alume e gipsita, nos buracos causados por decomposi- cio, ja em 1911. O. Beyer descreveu-a em um excelente estudo. Desde que tornamos a expor uma tal parede A acio do microclima, pela demolicao da cornija que a defende da chuva, os “favos” revestem-se de vegetacio: li- quens, musgos, fetos, etc. so viti mados pela destruigio. A explicacio por um clima de outrora deveria ter- ado com isso desde © prin- cipio, pois as formagdes de “favos” se encontram desenvolvides do mesmo modo, em muralhas de cidades e por- tes de castelos construidos na Idade Média, Outro exemplo de morfologia micro- dimatica sido as chamadas’ “wiisten- tenrinden” (‘‘verniz do deserto”), em campo fronteiro as geleiras dos Alpes. :m 1919, G. von Zahn havia relatado sobre “‘crostas desérticas na margem das geleiras”; em 1940, F, Klute e L. M. Krassler “sobre formagdes de verniz desértico na alta montanha”, Encon- tramse elas sobretudo nos campos em frente as geleiras, que somente em épocas recentes (1856, 1890 € 1920) fi- caram livres de gelo, portanto sto re- centes com certeza. Com proximidade de geleira no tém que fazer seno par- cial ou indiretamente, Trata-se disto: pedras que jazem sobre o solo ainda nao coberto de vegetagio, desnudo mas umido, revestidas em sua superficie ¢ somente nesta, de genuinas crostas pro- tetoras consistentes em hidréxido de ferro com dcido silicico, Acido fosfé- rico € um pouco de cdlcio (G. Linck, 1930). A radiagio forte sobre 0 solo rochoso isento de vegetacio, 0 secar ripido apés umedecimento, 0 supri- mento de agua do subsolo na evapora- cao, bem como as condi¢ées locais mi- croclimaticas especificas, criam a pre suposiczo para esas “crostas desér- ticas”. ‘Também a rocha desempenha um papel, como nos ensina a obse vagio. Rochas granuladas e ferriferas mostram o fenémeno muito nitidamen- te. Evidenci idao do ma- croclima nfo é de modo algum deci- siva, também pelo fato que mesmo no clima tropical da mata pluvial em ro- chedos desprovidos de vegetacio, que sobressaem das cataratas que sfio fre- qiientemente molhadas pela chuva ou adas © tornam a secar, se encon- tram semelhantes “carsos desérticos de britho negro” (A. Heim, 1947), que jd J. Walther, no deserto do Egito, designou como “erostas de cataratas.” O terceiro exemplo sao os vales assimé- tricos, como podem ser encontrados na Europa Central, nas redes ramificadas de vales de regides colinosas, sobretudo aquelas com. revestimento de_ loess. Ainda até 1920 e tanto, defendeu-se a opinio que a assimetria de tais vale- zinhos tinha conexio com a lei de Bar e a forca Coriolus, contrariamente a observacao que em. valezinhos ori- entados alternadamente para sul e nor- te, o lado ingreme nem sempre é 0 lado direito, mas o orientado para o este (0 que foi bem estudado na “Vorland” alpina da Baviera, por J Biidel, 1944, e H. Poser e Th. Miiller 1954, Neste caso, tratam-se de formas geoldgicas anteriores, a saber, do tl timo periodo glacial pleistocénico, sob condigoes de clima glacial e congela- mento permanente do solo (perma- frost), além disso, porém, de efeitos de diferenciacio de clima_ topograficos. Gomo Biidel mostrou, foram os ventos ocidentais que tiveram como conse qiiéncia uma deposi¢io mais vuliosa de loess e bem assim de neve hibernal nas encostas vazias orientadas para les- te. Nos solos saturados de umidade pelo degelo estival, os flancos ociden- tais dos vales estavam dessarte sujeitos a um desenvolvimento mais avultado de terra carreada pela agua, 0 que des- Jocava a calha da descarga para leste. Segundo Poser ¢ Miiller (como ja em 1930, segundo uma interpretacio mais antiga por H. Lésche), a exposicao ao vento actesceu a exposi¢io aos raios (do sol), a saber, 0 degelo mais pro- fundo e com isso a solifluxio mais forte nas encostas expostas ao sol. Em todo caso, a explicagio do fendmeno que ressalta em todo mapa topogra- fico, reside na diferenciagio mesocli- matica do clima periglacial de periodo frio, na combinacao de exposicio ao vento € aos raios do sol 3. Métodos indutivos e dedutivos. A. geomorfologia como “a descricio plicativa das formas terrestres” (W. M. Davis, 1912), tem a partir da con- templacio, portanto indutiva da obser- | vacdo comparativa na natureza. Mo- | delos de pensar dedutivos servem & acio de aprofundar logicamente, entre- tanto tém de ser controlados a tempo, novamente pela observacio ou pela experimentacio, portanto pelo modo indutivo. Aplicada unilateralmente, a dedugio pode levar a conclusdes er- radas, tal como o demostraram a cha- mada doutrina de ciclos por W. M. Davis ou a “andlise morfolégica” por W. Penck. Davis deu & sua doutrina | a base que uma particula de crosta Bol. Geogr. Rio de Janeiro, 32(234): 1-161, maiojjun., 1973 | 105 106 | esta sujeita, antes de wdo, apenas a | dinamica enddgena, a saber, a0 soer- guimento tectonico e apenas secun- dariamente ao arrasamento exégeno. Desde 0 estigio da juventude ao da madureza ¢ senilidade da desnudacio supunha-se quietude tectonica. Leva isso finalmente & peneplanicie ou pe- neplano. W. Penck, que assumira a ta- refa de explicar as superficies de ar- rasamento ou degraus — truncados, como podem ser observadas em grande niimero nas nossas montanhas antigas, quetendo evitar a hipétese de Davis, deduziu 0 processo de arrasamento como simultinea elevacio ou abaixa- mento da costa, 0 que denominou de- senvolvimento ascendente ou descen- dente, Nisso, porém, como gedlogo, cometeu o erro de negligenciar de todo a diferenciagio climatica. A contra. -reacio é, desde ento, 0 cuidado espe- cial deste questionario climatico. Para os seus ciclos de arrasamento, Davis diferenciara apenas tres tipos climéticos: 0 ciclo de erosio normal, (que outros definiram como tipos flu- vidtil ou timido); 0 ciclo drido € 0 c clo glacial. A. Hettner (1921) nao tar- dow a ctiticar que a multiplicidade das influéncias climaticas estava preju- dicada segundo Davis, que, p. ex., den- wo do ciclo fluvidtil, 0 arrasamento decorre de modo totalmente diferente na zona polar, na temperada, no cli- ma dos etésios, nos trépicos de umi- dade alternada, etc. Contrariamente a isso, J. Biidel, em 1946, em “Sistema de Morfologia climatica” ja distinguiu 15 tipos climéticos de morfodinamica. Estes, apenas em parte, haviam sido derivados indutivamente da observa- Go morfoldgica, em parte deduzidos de pontos de vista da classificagio de climas. Mais importante que o ntimero de tipos é 0 conhecimento de que em cada Ambito climético, os diversos ajus- tes morfoldgicos: 4gua corrente, ven- tos, gua do subsolo, gelo de solo, cor- rentes maritimas ¢ ressacas maritimas, tém, de um modo complexo, uma acio do conjunto de mancira complicada e também conforme o decurso sazonal respectivamente diurno da_tempera- tura dos hidrometeoros, totalmente di- versa. Uma geologia geral e de orien- tacio mundial tem que ter, portanto, uma classificagio de clima acomodada A economia da natureza (G. Troll, 1955 € 1964. No clima polar, p, ex., sio de efeito decisive 0 gelo do solo, a duragio e a profundidade de seu de- gelo estival, e ainda as aguas de degelo cstival com a sua forte carga de entu- Iho, muito forte também o vento sobre © solo frouxo, pobre de vegetacio, res- sequido, que pelo congelamento do solo é rico em tamanhos de grios finis- simos. Nisso, entre climas totalmente diferen- tes, também podem ser verificadas con- vergéncias morfoldgicas. Ainda em 1925, estabeleci como uma das teses de habilitacko a seguinte: “Clima nival e drido, em muitos casos, podem produ- zir formas © depésitos semelhantes”, pensara eu na formacgio mecanica de blocos por geada, respectivamente in- solagio, nos gigantescos montes de en- tulho em costas desérticas, a auséncia de vegetacdo, Ha poucos anos (1963), W. Meckelein reexaminou mais minu- cosamente essas convergéncias & base de experiéncias no Saara e em Spitz bergen. Em conexio com a erosio regressiva € a formagao dos vales de ruptura em montanhas de dobramento jovens, ma- nifestowse outrora freqiientemente a opiniio de que a crosio fluvidtil é mais forte em regides de abundante precipi- tagao pluvial que em regides de seca. A. observacio indutiva n&o confirma isso, E que o arrasamento da encosta depende muito da existéncia ou ausén- cia de um manto de vegetagio protetor. Por exemplo, fiz a experiéncia que no Himalaia oriental, de precipitacao co- piosissima, coberto de um denso reves- timento florestal, nas encostas de mon- tanha totalmente ingremes, cujo solo & revestido de coxins de musgo, mesmo no auge da moncio estival, escorre agua clara ao vale. No cintur’o de desertos e estepes do vale do Indo, na parte norte-ocidental do Himallaia, toda pan- cada forte de chuva carreia enormes quantidades de sedimentos para den. tro dos ios. No periodo clissico da _gemorfologia, grandes pesquisadores como F. von Richthofen, M. Davis, A. Penck, ¢ imimeros outros puderam, no método indutivo, limitar-se & observacio visual ¢ a conexio das formas e estruturas geoldgicas, A geomorfologia que tem a servirse muito mais da andlise de la- boratorio para obter valores numéricos exatos. E 0 mérito de gedgrafos fran- ceses ¢ holandeses (A. Cailieux, J. Tri- cart, J. P. Bakker) terem sido pionei- ros na introdugao da andlise de mine- rais pesados, andlise do teor de argila, Naturalmente, estes _trabalhos no servem 2 pesquisa basica na pe- dologia ou mineralogica; sio apenas para o fim do conhecimento morfogené tico. Nada, porém, pode elucidar me- Ihor a nacessidade de uma frutificagao mtitua de trabalho de estudo da natu- reza que a colaboracio interdisciplinar que a estreita troca de conhecimentos novos, que nos dias de hoje existe (ou deveria existir) Aos necessiirios processos analiticos de geomorfologia pertence também a pa- Icontologia, no ambito continental a palinologia ou andlise de pélens, prin- cipalmente porque a sua aplicabilidade se alarga cada vez mais dos depésitos puramente organigenos (turfa, linhito, horizontes de humo para deposiciio minerdgena (p. ex. loess), ¢ solos. E dbvio que também analises geocronolé- gicas, crolonogia de isétopos tefrocro- nologia das cinzas etc.), deve ser apli- cada onde quer que se ofereca uma possibilidade. Além de observagées de terreno e da andlise em laboratério também o ex- perimento morfoldgico tem sua impor- tancia. A comecar de pequenos e ins- trutivos experimentos no terreno, como se pode procedé-lo sem dispéndio por- ventura para pesquisas da erosio € se- dimentaco (colmatagem) em um de- posito de argila ou depésito de areia durante uma chuva, aos grandes la- boratérios experimentais, como. exis- tem nos E. U. A. Waterways Experi- mental Station em Vixburgo no Mis- sissipi, para questoes de erosio flu- vial e formacéo de meandros ou no Sipre Institute em Wilmette, Tlinois (o atual U.S. Army Cold Regions Research And Engineering Laboratory em Hanover (N. H.), para experimen- tos relatives & morfologia periglacial ou também no Instituto Geografico da Universidade de Uppsala ha diver- sas possibilidades. Até aqui ainda 1 se cumpriu a esperanga de resolver completamente processes: morfoldgicos fisico-mateméticos (p. ex. mean- dros, dunas, drumlin). Em todo caso, 0 experimento permite, com isso, conse- guir conhecimentos importantes, alte- randose em um complexo de fatos e, em seguida, também por calculo. F provayel, pois, que ainda tenha maior futuro na geomorfologia. ‘A pesquisa do periodo glacial e a mor- fologia glacial dos ultimos 40 a 45 anos mostraram, por sua vez, que métodos quantitativos, por mais exatos que pa- recam, nao podem substituir a vista adestrada (experimentada) do geo- morfélogo de campo. O dom magistral de observagio de A. Penck na conexio de formas de superficies € deposigdes de geleiras ¢ de suas aguas de degelo, aplicadas aos Alpes e as regides do sopé dos Alpes, levou ao conheci- mento do decurso pleistoceno em qua- tro perfodes glaciais e trés_perfodos glaciais entremeados. Desde 1924 essa concepcao classica foi submetida a uma prova dura, em conseqiiéncia de uma valorizagio exagerada de dedugio as- trondmica ¢ extrapolaco. Poucos anos mais tarde ja se falava em onze periodos Bol. Geogr. Rio de Janeiro, 32(234}: 1-164, maio}jun., 1973 107 | 108 | glaciais; esses, trés em lugar do pe- Viodo glacial melhor compreensivel ou de Wiirm (W. Soergel, 1925, 1939, B. Eherl, 1980). Muitos doutos acre- ditavam ter superado muito 0 conhe- cimento classico com essa “articulagio plena do periodo glacial”. Aconteceu com a fixacio de datas com o radio-car- bonio 14 a possibilidade de indicar, para camadas com vegetacio, mimeros exatos de anos ou ao menos de século. Com a aplicagio no critica de tais fixagdes de datas que nao adquirem 0 seu valor real sengo na conex4o com a observagio em campo, surgiram cur- vas cada vez mais novas do decurso do clima do pleistoceno recente. Ocorreu mesmo uma opiniao de que 0 método geomorfoldgico tinha falhado. Aconte- Ce justamente o contrério. O resumo panorimico critico das observagées em forma ¢ interligagdes de_ terracos, coberturas sobrejacentes de loess, seu contetido em féssies, seu teor de pélem, horizontes de solo, £6s- seis no loess, demais a compa- racio de extensio mundial dos ni- veis de mar pleistocénicos € 0 encaixe das datas geocronoldgicaslevam-nos hoje ao conhecimento de que a arti- culagio necesita sem diivida um re- finamento e uma ampliagio que, no entanto, a articulagio obtida pela observagio no terreno se confirmou no seu todo de maneira admiravel Hoje, possivelmente, nfo haveré mais pesquisadores que persistam em man- ter a chamada plena articulagio do periodo glacial 4, Mapas geomorfoldégicos Tal como o gedlogo, 0 peddlogo, 0 bo- tanico, também 0 geomorfdlogo tem a tarefa de depositar as suas observa- c6es de maneira sindtica, cartografica- mente, € com isso também desenvolver determinados tipos de mapas, Os ma- pas geoldgicos usuais apresentam as lormacées segundo sua idade estrati- grifica, eventualmente também segun- do a sua facies, mas nio mostram for- mas de superficie, como degraus de camadas, “inselberge” (mortos. resi duais), formas cirsticas etc. Seria de desejar que na Alemanha, seguindo 0 exemplo britanico, se editassem mapas geolégicos em separado, conforme os da base sélida de rocha ("solid maps”) © os das formagies de superficie frouxa (“drift maps”). Foi isso tentado em parte pelos chamados mapas geo- morlolégicos periglaciais (H. Poser, 1953 e 1960). Mapas litolégicos, que sio oferecidos com relativa raridade, mostram as espécies de rochas, mapas tectOnicos, os efeitos da dinamica en- dégena. Mapas geomorfoldgicos devem, por conseguinte, procurar reproduzir as formas de superficie, a saber, como tipos genéticos pela acio conjunta de dinimica exdgena e endégena. Isso deve ser, antes de tudo, a meta de mo- dernos mapas de resumo, portanto também de mapas murais, que visuali- zam a0 consulente os atos litolégico- tecténico-geomorfoldgicos, que dete minam as maiores unidades da paisa- gem. E 0 que mapas puramente geol6- gicos nfo fazem. Desde ha muitos anos tentei, no ensino de geografia, desenvol- ver para algumas partes da Alemanha um tal tipo de mapas que denominei “mapa topografico escultural-estrutu- ral". Meu discipulo D. Gohl apresen- tou, hé poucos anos, apds esforcos du- rante longos anos, um tal mapa na es- cala de 1:500.000 para o territério da Republica Federal ¢ de DDR (Rept- blica Demoerdtica Alem’). O mapa pode ser utilizado como mapa mural a uma distancia de 8 a 10 metros, visto que as paisagens de formas maiores sio bem reconheciveis pelo colorido. Envretanto, também em escala mais reduzida, digamos 1:1.000.000, pode servir como mapa manual, visto que cle reproduz formas singulares, como terraco de vale, “‘Schwemmkegel, Um- lautberge, Morinenriicken” !, morros testemunhos, etc. Brevemente sera edi- tado em duas execucdes, como mapa manual e mapa mural. Outra é a tarefa dos mapas geomorlo- Iégicos especiais. Em conexao com a meta de um levantamento geomorfo- légico da pais que hoje em dia é meta especial na Poldnia, na Tchecoslo’ quia e na Franca, escreveu-se muito sobre o método de tais mapas (com- pare antes de tudo: A. Spirodonov, 1956; M. Klimaszewski, 1963, Progress in Geomorphological Mapping, 1967) saiu vitoriosa a exigéncia de H. Kugler que mapas morfoldgicos especiais, por- ventura na escala de 1:50.00 ou 1:25.000, devem, além da caracteriza- cao da dinamica recente, conter indi- cacées morfogrificas, morfogeneticas ¢ morfocronolégicas. Os mais novos ma- pas especiais deste tipo sio para a Ale- manha Central: Mapa de Kugler, fo- Tha Weissensee (Turingia), 1:25.000 (1965), para a Reptiblica Federal o mapa morfoldgico de H. Leser, folha Alzey (colinas de Hessen Renana) . 1:50.000 (1967). A riqueza das legen- das @ ilustracées (elucidagées) indica a diversidade do teor e 0 cuidado na elaboragio desses mapas, que podem servir de exemplo para um futuro le- vantamento geomorfoldgico do pais. 5. Formas dos tempos passados e dos presentes Desde ha muito verificouse que o mundo de formas de hoje € 0 resul- tado de um desenvolvimento geoldgico muito longo, em cujo decurso os cli- mas estiveram sujeitos muitas vezes a oscilagdes maximas, sobretudo em la- titudes mais elevadas. Os wacos prin- cipais na face do aspecto de formas curopeu sio formas fésseis de super- ficie. Eis porque & paleoclimatologia Bol. Geog, Rio de Janeiro, 32934): 1-164, cabe um papel importante na geomor- fologia. J. Biidel (1963) criou o con- ceito da’ “geragio de relevo”, de onde se desenvolveu a multidio de formas nos diss de hoje. Nisso a geomorfo- logia tem contato intimo com a pedo- logia. ‘Também os perfis de solo sio freqiientemente a expressio de diver- sas fases climaticas da formagio do solo. Geracio de relevo e fases de for- magio do solo tém que ser, portanto, harmonizadas. Nos altiplanos de ambos os lados do vale do Reno, entre Bonn e Linz s/o Reno encontram-se, p. ex., depdsitos de caulim de muita profundidade, que nao provém de uma sedimentagio, mas de uma antiguissima formagio eluvial de solo, de 20 metros de possanga. Pode-se verificar isso sem dificuldade pelos veios de quartzo completamente conservados na decomposicio da ro- cha devoniana primordial. A. forma- cio dos caulins ocorreu no eoceno ¢ teve lugar sob condigdes -trdpico- Yimidas, simultaneamente com a for- magio de superficies truncadas do pa- leo-tercidrio, Sobreposto a esse solo pileo-tercidtio encontra-se um solo do pleistoceno recente, com estrutura ni- tidamente crioturvada, portanto do tiltimo periodo frie do. pleistoceno, com as suas condicées de clima értico. Na alternincia desses periodos de frio € intervalos quentes com refloresta. mento € que formou o vale de ruptura do Reno com seus terragos em uma seqiiéncia de periodos de erosio pro- funda ¢ atulhamento com cascalho. Apenas a mais alta camada de solo, 0 solo pardo de mato ¢ um efeito dos atuais processos holocénicos de forma- cio de solo. Problemas geomorfoldgi- cos, paleoclimaticos ¢ paleopedolégicos tém uma finalidade comum dacio das condigées ecolégic sagem no passado geoldgico. a eluci- s da pai- Cone de sedimentagio. morros de contorno. lombada de morainas. maio|jun., 1973 , loo 110 6. Questédes da morfologia periglacial pleistocénica Vamos ainda visualizar os pontos de vista expostos & mao de dois grandes sar exemplos de geomorfologia compara- tiva: um da zona temperada fresca do hemisfério norte e outro da zona tro- pical. Nos tiltimos trinta a tinta e cinco anos, 0 peso da pesquisa do perfodo glacial deslocou-se das regides da Ter- ra glaciados no periodo glacial para as regides livres de gelo das latitudes mais elevadas, onde se aprendeu a ler (interpretar) com grande acribia_os eleitos dos periodos remotissimos frios, nas formas do solo, dos sedimentos ¢ sua estratificacgao, nos perfis do solo nos f6sseis indicadores do clima. Mor. fologicamente, trata-se nisso dos efci- tos mediatos ou imediatos do estado gelado do solo. W. von Lozinsili criou para isso em 1910 0 conceito dos fené- menos “periglaciais”, sob o que — como revela 0 nome — pensou em prin- cipio, apenas nas regides na periferia do inlandsis nérdico. Esse termo tor- nou-se, nesse interim, demasiadamente restrito, pois se trata de um complexo de processos que tém lugar em todos os climas fries da Terra, aproximada- mente entre os limites das drvores e da neve (eterna) em latitudes elevadas € nas altas montanhas de todas as zo- nas até o Equador, a saber na atuali- dade e — correspondentemente ao des- locamento do limite da neve — nos periodos de frio, pleistocénicos. Por isso. propus para esses Ambitos um termo climatico que enfzixe o todo, 0 “dos ambitos de clima subnival” (1968). Tampouco € feliz 0 termo “permafrost” que surgin nos Estados Unidos durante a segunda guerra mun- dial (em lugar dos termos anterior- mente usados “perenne Tjale”, da lin- gua sueca ou “merslota” do russo, que se aplicou como designacio para o pes- quisador do periglacial como “perma- frost geologist” pois em latitudes bai- as 0S processos morfoldgicos corres- pondentes tém lugar na alternancia do estado gelado diurno do solo (C. Troll, 1944). Em 1947 tentei fixar esse 4mbito sub- nival para o Velho Mundo, através do limite do solo de “estrutura” ou limite do estado gelado do solo, morfologica- mente cficaz. O limite mostra, tal como 0 limite da neve, com 0 qual de- corre no mesmo sentido, mas nfo pa- ralelamente, um comportamento que se pode esclarecer segundo 0 principio da alternancia_ planetirio ocidental- oriental e periférico-central. Do nivel de mar na Lapénia a 3.300 mtros de altitude no Alto Atlas ¢ de 2.900 m no Libano até mais de 5.000 m no Ti- bete. Nos trdpicos, ele situa-se acima de 4.000 m e nao 1.000 m mais baixo, como J. Héfermann (1954), preten- deu comprovar em interpretacio nao critica de ocorréncias tipicamente extra- zonais de solos estruturais e aduzindo formas de vale, certamente pseudogla- ciais. A minha propria apresentacto cartografica de 1947 contém, sem du- vida, um outro erro, que eu mesmo gostaria de corrigir, desde que nao houve, até aqui, quem o fizesse. To- mando por base uma interpretacdo er- rada de um trabalho de N. B. Shos- tacovitch (1927), supus que o conhe- cido limite do eterno estado gelado na Sibéria Oriental que se estende ao sul do lago Baical e para dentro da re- gifo do rio Amur, representasse tam. bem o nivel de zero m do solo estrutu- 1. Esse, porém, situase nessas regides, ainda alto nas montanhas e, somente na Tundra, na peninsula de Taimur e no delta do rio Lena baixa ao nivel do mar. Assim como, por um lado, ha belos solos estruturais sem estado ge- Iado permanente (nas montanhas de latitudes baixas, ha também regides de estado de gelo permanente na Sibéria Oriental).

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