You are on page 1of 18
. © 2003 Casa do Paid proibid 9 repradagao total ow Sem sions wo Livratia © Editora Lada etal desta publicagdo, para qualquer finalidade, D por escrito dos editor 1 edigso. 008 Euitoros Ingo Bern Gurues ¢ Sia Dephino Produgio Grafica Renata Vieira Nimes utdo Nake Wien Revise New Alves Edltoragao Eletroni dutta Koss ix de Catalogagio nia Publicsgao (CIP) (Camara Brasileira do Livro, SP. Brasil) Poscologia escolar: teorlas erfticas / Marisa Eugéaia Melillo Meira ¢ Musuko Aparecida Makino Antunes, organizadoras, — Sto Paulo: Casa do Psicslogo’®, 2003, Varios aucores liogratia 85-7396.285.6 1. Psicologia educacional 1. Antunes, Mitsuko Aparecida 030728 epb370.15 Indices para catilogo sistemétice: Psicologia ecucacional 370.15 Tampresso no trail Printed in Breil Reservas todos os direitos de publicagdo em Lingwa Portuguesa & 2 Casa do Psicélogo® Livrarta ¢ Kaitvra Lida, EB uo owrsto Coctho, 1.059 ~ Vila Madslens ~ OS417-011 ~ Sio Paulw/SP — Beast Tel: (11) 30343600 ~ E-mail: casadopstcologo® casndopsicologe.somror Sle: Suvweasadopsicalogo-comir wh BIBLIOVECA DE CTEICias HUMANAS E EDUCAGKO BERTON ¢ COSMO LTDA PSTCOLOGEA ESCOLAR: TEORTAS ¢RITICAS ‘Terme No. 579/04 Registre No.367174 RS 14,40 37/32/2004 x 7 a C0 MIG 30 55 e& SUMARIO Apresentagio . ei Marisa Eugénia Melillo Meira Mitsuko Aparecida Makino Antunes Construindo uma concepeio critica de Psicologia Escolar: Contribuigdes da Pedagogia Histérico-Critica ¢ da Psicolo; Sécio-Historiea Marisa Eugenia Melillo Meira Psicologia da Educagao: Cumplicidade Ideol6gica Ana Mercés Bahia Bock Queixa Escolar e Atuacio Profissional: Apontamentos para a formagio de psicslogos Ana Karina Amorim Checchia Marilene Proenga Reballo de Souza Psicologia e Educagao no Brasil: Um olhar Histérico-Cr Mitsuko Aparecida Makino Antunes Sobre os autores.. Querxa EscoLar E ATUAGAO PROFISSIONAL: APONTAMENTOS PARA A FORMACAO DE PsiIcOLoGos Ana Karina Amorim Checehia™ Maritene Proenga Rebello de Souza 1. ALGUMAS CONSIDERAGOES SOBRE A FORMACAO E A PROFISSAO A profissiio de psicdlogo, regulamentada em 1962 pela Lei n° 4119, de 27 de agosto, vem se mantendo como uma profis- so que amplia significativamente seu quadro ano a ano. Até 0 fim da década de 1960, a Faculdade de Filosofia Ciéncias e Letras da Universidade de Sao Paulo (USP) havia formado apenas setenta e oito psiclogos e, hoje, somos uma categoria de aproximadamente sessenta e dois mil profissionais no Esta- do de Sao Paulo. O Estado de Sao Paulo & 0 que concentra também o maior niimero de cursos de graduagao em Psicologia, com aproximada- mente 35% dos cursos do Brasil. Em 1970, havia em Sao Paulo apenas trés cursos de Psicologia, expandindo-se para quarenta cur- sos oferecidos hoje. Destes, dezessete encontram-se na capital ¢ Grande Siio Paulo € os demais no interior do Estado. A grande maioria dos estabelecimentos de ensino superior responsiivel pelos Nossos agradecimentos 3. FAPESR, pelo apoio. 106 Ana Kanisa Aatonist Crtrccima » Manitent PRorsca REBELLO DE SOUZA trinta e cinco cursos oferecidos pertence a entidades mantenedoras privadas, sendo dois tergos deles reconhecidos na déeada de 1970" Diferentemente do ensino privado, o ensino ptiblico superior ofe- rece um miimero muito menor de cursos de Psicologia, apenas cinco, sendo um na capital ~ Instituto de Psicologia da Universidade de Si Paulo — e os demais no interior: na Faculdade de Filosofia, Ciéncias e Letras de Ribeiro Preto, na Universidade Estadual Paulista Jalio de Mesquita Filho, funcionando nos campi de Assis e Bauru e 0 Curso de Psicologia na Universidade Federal de Sd Carlos/SP. Esses dados nos mostram que anualmente sio diplomados cen- tenas de novos psicélogos, centrando-se a nossa preocupagio em relagdo 4 formagio desses profissionais, Essa formacdo € também de responsabilidade de seus professores que, a partir de sua concep- gio sobre que profissional querem formar, imprimem em seus cursos as suas visdes de mundo. ‘A questo da formagaio e da profissio do psicélogo passou a ser objeto de estudo de muitos profissionais preocupados em compreen- der sua histéria e implantagio na sociedade brasileira, destacando- se entre eles Mello (1978), Crochik (1987), Carvalho (1986), Achcar (1994), somando-se tais pesquisas a levantamentos realizados pelos Srgios representativos da categoria profissional como o Conselho Federal de Psicologia (1988, 1992, 1994). ‘A pesquisa pioneira na drea é datada do fim dos anos 1960 © infcio de 1970, por meio do levantamento realizado por Mello (1978) das ocupagdes exercidas pelos psicdlogos formados até este mo- mento, na cidade de Sio Paulo. Nesse trabalho, a profissio é enten- dida como uma forma de aplicagiio de conhecimentos cientificos © Barbara Freitag em seu livro Fscala, Estado e Sociedade explica 0 grande mimero de cearsos siperiores autorizados na déeada de 1970 no Brasil, mantidos por entidades com fins luceativos como fruto da politiea © da legislaglo edueacionais nos primeiros anos a ditadura militar, Por wn lado, a Constituigio de 1967 passa a estabelecer que 0 fensino privado receba verbas e ajuda tenica do Governo Federal incluindo bolsas de Saude © outros beneficies. Por outro, 4 ampliago da escolaridade para oito anos nas fescolas piblicas, faz 0 ensina médio. importante reduto das escolas privadas, tenba Stas matriculas diminuidas. Dessa forma, 0 ensino privado transfere sua rea de atuagio prineipalmente para o Ensino Superior de Graduagio © Pos-Gradungio, uma Fscotan # ATUAGAO PROMSSIONAL la drea e que se constitui enquanto tal na acumulados em determinad: Na introdugao de seu trabalho @ atuagdo social de seus profissionais. autora afirma: Parece, por si mesmo evidente, que 0 aparecimento de uma nova profissio esté relacionade com problemas © necessidades socials, para os quais se busqite solueao. Uma profissdo que atenda a essas necessidades, afua significativamente no plano social. Se nao atende, ov 0 faz de maneira inadequada, 0 futuro da profiss ‘em jogo (pp. 12-3, grifo nosso). ‘A pesquisadora analisa a profissfio examinando as Fares qe favoreceram e consolidaram suas linhas gerais no inicio de sua im plantagio. A Psicologia, embora nao se earacterizando enqvan' profissio até 1962, mantinba o seu cariter de aplicagio nas sets da Prdtstria, educacional e clinica. A passagem para a profissionalizagao fiao se det sem que problemas fundamentais deixassem de ser en frentados, conforme aponta Mello (op. ci®): Hoje, a profissao e 0 ensino da Psicologia enfremtam dificuldades que, aparentemente, nascem da separacae entre técnica e ciéncia, A separagao é real. AS técnicas foram e sao transplantadas de seus paises de origem en- quanto técnicas e com vistas @ aplicago imediata. A cién- ‘cia da qual elas derivam aparece como wm acessorio & uutilizagdo das técnicas. Mas essa utilizagao das teenicas se dé & margem do Ensino Superior “Assim, a partir da Lei n° 4119 os profissionais deve ser diplomados em cursos superiores de Psicologia. mas ‘a Psicologia Aplicada jd possuia uma histéria que im prime seu selo nos novos cursos ¢ na profissao. Por unt 1:4 Kanua ANonnd CHBCCHTA F MaruteNe Paosnc Reneito bs Sovza Qua Esco eATUAG: lado, os cursos se manifestam impotentes para dinami- r a profissao ¢ ultrapassar as formulas socialmente pobres das velhas profissdes liberais. Por outro, os cur- sos universitérios continuam néo reali: Go cientifica, capaz de criar um padrio diverso do sim- ples consumo de conhecimentos que séo wransplantados, no mais das veces, em fungao das técnicas. Em suma, an- tes de 1962, os cursos superiores de Psicologia n&o eram profissionalizantes; apés a regulamentagao dos cursos, e da profissdo, tornaram-se estritamente profits sionalizantes, de acordo, alids, com a prépria Lei n° 4119. Entretanto, se essa profissionalizagao do Ensino Superi- or eliminou a precariedade na formagio dos “tecnicos ‘ou a profissdo, sé 0 fez ao custo de uma adesdo indiscriminada aos padrées societérios de culto ao pro- Jissional liberal (p. 41) indo sua voca- Os primeiros currfculos dos cursos de formagiio reafirmavam cariter clinico e de profissional liberal do psicslogo, com discipli- nas que enfatizam na formagio o Psicodiagnéstico, as Psicoterapias ¢ as Técnicas de Exame Psicolégico, priorizando 0 atendimento individual do cliente, nos moldes do modelo médico de consult6rio. Essa formagiio hegeménica levou a atrofia de 01 tras areas de atuagio historicamente anteriores propria pritica clinica como as areas de industrial e educacional/escolar. Como analisa Mello, se hd uma perda em relagao ao profissional, ha uma perda maior ainda quanto ao sistema de ensino como um todo. Dessa forma, conclui a pesquisadora: O resultado mais aparente, desse modo de pensar a Psicologia e suas aplicagées, é que os cursos ganharam uma unidimensionalidade compacta, de maneira que n&o apenas formam psicdlogos clinicos, mas transformam os alunos, gragas ao contetido predominante das dis plinas, em: psicélogos elinicos (p. 60). As criticas apresentadas neste trabalho no inicio dos anos 1970, sfo retomadas em pesquisa realizada pelo Conselho Federal de Psi- cologia ~ CFP (1988) no abrangente trabalho intitulado “Quem & 0 psicdlogo brasileiro?’ com informagées recolhidas entre 1985-7 nas oito Regides Administrativas dos Conselhos no Brasil. Os dados encontrados referendam os de 1970 em muitos aspec- tos. As criticas apresentadas por Mello (op. cit.) ¢ a andlise das limitagSes da profisso em um contexto social parecem ter surtido um pequeno efeito numa profissZio em acelerada expansiio, como se anecessidade de profissionalizar se sobrepusesse 2 discus peito da finalidade dessa formagio e, portanto, da realizagio de qual- quer modificagao nos rumos das disciplinas ¢ das reas de aplic em Psicologia. Resumiremos, aqui, algumas das constatagdes dese amplo levantamento do perfil profissional. A pesquisa do Conselho Federal de Psicologia concluiu, dentre outras coisas, que a profisstio de psicdlogo, no Br stio com um perfil eminentemente clinico e feminino. Na 6" Regizio Administrativa do Conselho, que compreendia os estados de Sa0 Paulo, Mato Grosso ¢ Mato Grosso do Sul, na ocasidio da pesquisa, 60% dos psicdlogos atuavam na area de Psicdlogia Clinica, contra 16,7% em Psicologia Escolar. Destes, apenas 11% trabalhavam em. hospitais e servicos pulblicos, tendo a maioria sua insergdo em con- sult6rios ¢ clinicas privadas. A pritica psicol6gica mostrava-se basi- camente centrada na psicoterapia individual (42,9%) e na aplicagdo de testes (33,5%), com o predominio da Psicandlise enquanto teoria que embasa a atuagio da maioria dos psicdlogos. Dos prof 85,7% eram mulheres. Esses dados trazem algumas constatagdes bastante importantes quando comparados com os estudos sobre o exercicio da protisstio realizados nos anos 1960 por Mello (op. cit): apesar de todo 0 co- nhecimento acumulado e os possiveis campos alternativos de atua- cdo do psic6logo, este ainda se apresenta predominantemente en- quanto um psicoterapeuta. Segundo Botomé (1988), ionais, 10 __ ANAKanna Avon. Curcema x Manne Proenca Remsiio pe Souza isso se deve formagdo e aos servigos de Psicologia serem, fundamentalnente, voltados para as solicitagées que tradicionalmente definiram 0 mercado de trabatho para esses profissionais (p. 276, grifo nosso). A segunda constatacdo desse levantamento & de que a formagio, de maneira geral, enfatiza o atendimento individual e em pequenos gtupos, utilizando-se de um modelo padrao de atendimento ao cli- ente, calcado no modelo médico de atendimento, que 0 psicslogo car rega, independentemente de onde trabalha, acoplado a uma auséncia de clareza na utilizagdio de modelos alternativos de trabalho. Outros aspectos da profissio anallisados pela pesquisa de 1988 refe- rem-se aos temas da distingdo entre drea de conhecimento, campo de atuacdo profissional e mercado de trabalho, assim como da reflextio sobre para que parcela da populacio esta voltada a atuagdo do psicdlogo. Embora 0 campo de atuagio seja bastante vasto em Psicologia, a pesquisa do CFP mostra que sua aplicagao se restringe a poucas possibilidades e, nesse sentido, a andlise apresentada pelo pesquisa dor enfatiza a importancia da interdiseiplinaridade ou da multidisciplinaridade para que profissional se aproprie das di versas facetas dos fendmenos em questdo. Ainda quanto ao campo profissional, a critica incide sobre os curriculos, que acabam por ex cluir os varios aspectos da realidade social do pafs, aspectos estes que deveriam estar no centro das preocupagées curriculares dos cursos de formagiio de psicdlogos. Outro tema abordado pelo autor refere-se a questo: que psi- célogo queremos formar — um generalista ou um técnico? As ises curriculares, por ocasido da pesquisa de 1988, t&m como resposta a énfase na formagio e utilizagao de técnicas psicolégicas ¢ uma profusio de linhas te6ricas, ressaltando as patologias em de- trimento de alternativas de trabalho que as previnam. Ou seja, a for- magao, entdo, tem se pautado em um trabalho curativo, com énfase em modelos de longa duracio no tratamento individual, considerando © autor, que © psicdlogo deva trabalhar na rea, prioritariamente, da prevencdo de satide mental. an; (Qunxa Escotan # ATUAGHO PROMSSONA. érie de As constatagées de Mello e de Botomé sugerem uma propostas alternativas para a formagio do psicélogo. Mello (op. ci) {lise com o capitulo intitulado “Em defesa da Psicolo- gia” em que considera uma mudanga na imagem da profissio, atra- vés da ampliagao do seu aleance, saindo de um atendimento as elites nos consult6rios privados e caminhando no sentido da contribuigao dos conhecimentos psicolégicos para a satide mental da populagio. ‘A autora aponta para o fato de que os rumos da profissZio em Sao Paulo nao sao reflexos dos avancos da Psicologia na época e que as mudangas precisariam ocorrer nos rumos da profisszio “no sentido de tornd-los mais compativeis com 0 contetido essencialmente social das técnicas psicolégicas” (p. 113). Se acompanharmos alguns dos dados da pesquisa apresentada pelo Conselho Federal de Psicologia, veremos que essa ampliagio de fato ocorreu quanto ao alcance: 0s psicdlogos ndio mais tém como clientes apenas as elites; a imagem profissional, a representagdio do psicdlogo e da Psicologia se popularizou. Mas, 0 que podemos afir~ mar, é que 6 mesmo nfo aconteceu com 0 modelo de atendimento & populagio..Mesmo trabalhando nos servigos piblicos, as maneiras de realizar b trabalho ainda apontam para concepgdes com énfase na andlise psicanalitica dos fendmenos psiquicos e atendimentos in- dividuais, na sua maioria. Uma questo importante a ser analisada ao se considera magio do psicdlogo, € que se soma ais anteriores, refere-se mento histérico em que a maior parte dos cursos de Psicologia foi implantada no Brasil: no fim dos anos 1960 ¢ durante « década de 1970. Ou seja, em pleno periodo de excegiio politica, com a implan- tagdo do Regime Militar. Pelo seu cardter repressor, encontrou na Psicologia aim aliado para a fomentagao de uma “ideologia de adap- tacdo do individuo & sociedade”, considerada como adequada, segu- ra, merecedora de crédito. Uma época que procurou banir di Universidades ¢ do pais todo aquele que defendia concepgdes mais afore 40 mo- ‘A reapelto dessa questio, ver a Tese de Doutorado de Ceeflia Coimbra, intitulads Gerentes da Ordem: slgumas pritieas “Psi” nos anos 70 no Brasil 112 Awa Kanna Asonan Cinccra # Man se Paorsea Resin De SovzA criticas de homem e sociedade, acreditando que, com isso, também exilaria as idéias e as concepgdes que questionavam a organizagio © funcionamento de uma sociedade que produz e mantém a desigual- dade social. Ao explicar a realidade por meio de aspectos psicoldgi- cos apenas, os curriculos de Psicologia passaram a reforgar 0 inves- timento no individuo, como aquele que precisa ser tratado em seus males psfquicos, desvinculando a dimensio intrasubjetiva da realida- de social, Mas novas demandas sociais tém se colocado aos psicdlogos, questionando as concepgoes vigentes, Os questionamentos partem da andlise das raizes historicas da propria Psicologia enquanto Ciéncia'*. A incluso das contribuigdes do pensamento critico sociolégico a compreensio do conhecimento psicolégico vem permitindo aprofundar aspectos até entiio considerados como meras diferengas tedricas ou metodolégicas da drea e langar o desafio da construcio de uma Psicologia do oprimido e nao mais do desajustado. 2. As PRATICAS EMERGENTES NA ATUACAO PSICOLOGICA: A PsicoLoGia CLINICA E no bojo de tais preocupagées, ou seja, com a intencao de apre- sentar alternativas de atuagio do psicélogo que estejam na contra mao do tradicionalmente estabelecido, que uma pesquisa, encomen- dada pelo Conselho Federal de Psicologia (1994), foi a campo em TTA discussio da Psicologia sob a 6tica da “abordagem critica & Psicologia ciemtific: apresentada por Maria Helena Souza Patto em seu trabalho intitulado Psicologia & (cologia: uta introdugio critica a Psicologia Escolar, wrizendo importante contsibuigtio para a consirugio de ume olltra ética na compreensio da escola © dos problemas pecolarcs, Explicita a auiora que 0 termo “eritica” é utilizado no sentido dado por Manns (1077) ¢ que signifiea “situar o conbecimento, ir & sua taiz, definir os seus Compromissos sociais e histrices, locaizar a perspectiva que o constr, descobrir a fmaneisa de pensar e interpretar @ vida social da classe que apresenta esse conhecimento com 9 universal” e nio apenas o de sejeltar um tipo de conkecimento em nome de Guuro, a partir de eriterios puramente eiocionais (Apud Patto, p. 78-9) QurtxA Escort E ATUACAO PRONSSIONAL 13 busca de experigncias alternativas de trabalho do psicdlogo. Tendo como critérios 0 compromisso com as classes populares e a utiliza- Jo de modelos institucionais de atuagio, 0s pesquisadores foram em busca de “informantes qualificados”, organizando esses dados no livro intitulado Psicdlogo Brasileiro: préticas emergentes e de- safios para a formacao. ‘Uma das novidades que este levantamento apresenta refere-se mudangas que surgem na area de Psicologia Cliniea, quer nos referenciais teéricos utilizados, quer nas préticas de atuagiio propos- tas. Segundo Lo Bianco et al. (1994), hii uma tendéneia a incorporar ‘© “contexto social” 3 Psicologia Clinica, referindo-se “a algo que € constitutivo do préprio sujeito-alvo dos cuidados psicoldgicos € nilo algo que faz sentir sua pressio ou sua ‘influéncia’ sobre ele” (p. 12). As priticas clinicas passaram a acontecer fora dos consult6rios, ampliando 0 campo de atuagdo para hospitais ¢ na area da satide de maneira geral ¢ incluindo acdes coletivas de satide. A saida da clini- ca privada para a area da satide € apontada como uma das principais modificagdes que emergem no trabalho psicolégico clinico. Tais agdes tém se constituido em hospitais gerais e psiquidtricos, ambulat6rios, unidades bisicas de satide, em creches, escolas ¢ organizacdes. ‘A questo da atuagiio do psicdlogo clinico nos hospitais psiquid- tricos € destacada nesse trabalho em fungio do fortalecimento de priticas alternativas enquanto fruto do avango na discussio sobre situagdo desumana em que vivem os internos dos manicémios no Brasil. Embora 0 movimento de questionamento da internagio psi- quiatrica no modelo manicomial esteja presente em varios pai curopeus ¢ nos Estados Unidos desde a década de 1940, no Brasil, as repercussdes que geram mudangas substantivas no sistema de atendimento ao paciente so ainda um fenémeno recente. A principio, as mudangas relativas ao tratamento e compreen- so da doenca mental nos meios psiquidtricos e psicolégicos ocorri- am enquanto experiéneias isoladas em alguns hospitais psiquidtricos que acabavam esbarrando em questées de cariiter estrutural e até egal, impedindo seu avango. O esgotamento da tentativa de realiza- tio de mudangas enquanto agdes isoladas de grupos profissionais deu origem a organizagao, em nivel 1, de um movimento que incorpora a critica de uma sociedade sem manicémios e que passa a se constituir a partir de 1987 (op. cit. p. 29). Esse movimento envol- ve a categoria como um todo, com 0 apoio dos Conselhos Regionais ¢ Federal, na constituigao de uma legislagdo que contemple as dis- cussdes ¢ avangos na drea e a multiplicagio de experiéncias bem- sucedidas ¢ alternativas & hospitalizagdo pura ¢ simples. Muitas dessas exper se fazem presentes em administragdes mu cipais e estaduais de ideologias emancipatérias e voltadas a modelos de gestdo mais democriticos e de participagao popular. A construgao de praticas alternativas no campo manicomial é fruto de discussdes que questionam a participagio do psi manutenciio de uma sociedade asilar, a servigo da adaptagao, da opressio, da exploragio, da desigualdade, do estigma, da exclusio. Tais praticas alternativas baseiam-se, por sua vez, em outras con- cepgbes de Ciencia, de Homem e de Sociedade que questio- am concepgdes que discriminam a diferenga e, mais do que isso, justificam-na com argumentos técnicos ¢ teéricos. Tais mudangas so fruto do questionamento feito a prépria Psicologia enquanto Ciéncia¢ a0 seu papel social nas sociedades contemporaneas, trazidas pelo mo- vimento da antipsiquiatria, pelo movimento italiano gestado e implanta- do por Basaglia em Trieste, assim como por aqueles que propunham Hava ore aco © gerenciamento hospitalar (op. cit. p. 27). jona neias 6logo na cusses apresentadas, parece haver um questionamento dos referenciais te6ricos psicanaliticos onde a “dimensao individual, interpessoal” daria lugar para a “insergdo social” do sujeito. Nao mais trabalhar prioritariamente na elfnica privada oportuniza outras frentes de atuagio do psicélogo clinico apresentadas pela andlise dos autores, destacando-se 0 trabalho em Psicologia Hospitalar ¢ Ambulatorial, em que 0 psicélogo deixa de atender em sua sala ¢ passa a percorrer as enfermarias, organizar agdes junto a diversos grupos de pacientes intemos por enfermidades de caracterfsticas di- versas, ndo psiquidtricas, propondo novas formas de organizagio Qua Escouan z ATUAGRO PRORSSIONAY como, por exemplo, a permanéncia do enfermo com acompanha- es, dando suporte a muitos dos sofrimentos advindos mento de famili da propria hospitalizagao e da enfermidade. O proceso de democratizagao do Estado brasileiro também se faz presente na ativa participagiio dos profissionais da area de satide no sentido de “implantar um programa nacional de servicos bisicos de satide, sob a responsabilidade direta do setor piiblico™ (op. eft. p. 438). Esse projeto se viabiliza através do SUS — Sistema Unificado de Satide com a participagiio de varios profissionais de dreas afins X médica, destacando-se a insergdo do psicélogo. Este sistema de satide envolve trés niveis de tengo: atendimentos primarios, que icluem ages preventivas ou remediativas de baixa complexida- de; secundarios, as ages especializadas, que requerem seguimen- tos ¢ tercidrios, as agées especializadas especificas as situagdes hospitalares (op. cit. pp. 38-9). No sistema, a prioridade de atuagdo do psicélogo estaria no nivel preventivo de atengio (primario), 0 que de imediato de- monstra um grande descompasso com a formagio comumente re- cebida por esse profissional na sua formag&o académica, calcada no diagndstico e tratamento dos problemas existentes, aponta Lo Bianco et al., 0 que traz questes importantes para possiveis mudangas na formagdo profissional. Porém, a absorcao de diretrizes politicas que so discutidas e implementadas na area da satide ainda se encon- tram pouco presentes nos programas ¢ nas discusses que aconte- ‘cem na formacdo do psicdlogo. A relagiio entre politicas ptiblicas de saide e prética psicolégica, na formagio do psicdlogo, inexiste ou ¢ considerada como experiéncia que sera adquirida na formagdo apés fa graduagio (nos cursos de especializagio e pés-graduagdes) ou ainda no fazer didrio profissional. No levantamento das dreas alternativas de atuagiio, observa- mos a auséncia de mengo ao psicdlogo clinico com a enorme de- manda de problemas escolares que recebe ao participar de servi- gos de atendimento piiblico na area de satide. As observagses trazidas pelo levantamento feito pelo CFP dio conta apenas de 116 AwaKarisa Assonan Cuncenta & Marana PRoexca REBELLO De SOUL trabalhos de pesquisaago realizados com prostitutas e meninos de rua, utilizando as propostas argentinas de grupos operativos (op. cit. p. 42-3). Embora 0 campo de atuacdo tenha se ampliado, 0s novos rumos metodolégicos e técnicos parecem manter muito de modelos da Psico- Jogia classica, apenas revestidos de uma roupagem nova, multidiseiplinar, grupal, conjugando técnicas de diversas correntes psicoldgicas, enfatizando intervengdes de cariter focal ¢ breve. Embora essa and- lise nao seja feita por Lo Bianco et al., pode ser apreendida a partir da exposigdio das informagdes dadas pelos entrevistados. Ao final desse importante trabalho, os autores apresentam algu- mas das principais implicagdes das questées levantadas para a for- magio do psicélogo. Essa andlise é realizada em dois grandes eixos: dos requisitos ¢ competéncias necessirios para a realizagdo de um trabalho profissional de qualidade e as caracteristicas e estru- tura de formagio profissional que possibilitem efetivamente mudan- gas na pritica clinica. Com relagio ao primeiro eixo, os autores destacam que bi uma necessidade de apresentar ao aluno um “eonhecimento do fend- meno clinico contextualizado”, ou seja, apontar para a necessica- de de mudangas conceituais que alterem a concepcdo que deposita a anilise ¢ a pratica psicol6gicas sobre um sujeito abstrato e abstraido de seu contexto social, questionando o uso excessivo de bibliografias estrangeiras, gerando uma mera transposigio de teorias. Outro aspecto enfatizado quanto a requisitos ¢ compet refere-se & necessidade de una leitura das demandas especificas postas pelo contexto institucional, (...) reconhecendo o fendmeno satide-doenga como um fendmeno social; dessa perspec- tiva, 0s casos clinicos individuais ndo seriam vistos como representando um processo dindmico de expressto da satide-doenca, mas envolveria o entendimento de como esse conjunto aparece em relagdo d populagdo. Assim, Quetws Escoran ® Aracko Pronsstonat 7 se evitaria a psicopatologizagdo de caracteristicas apre= sentadas pela populacéo economicamente menos favorecida (op. cit. pp. 56-7). A leitura institucional também deve incluir a apreensdo do obje~ to de trabalho como coletivo, gerando priticas coletivas de planeja- mento ¢ ago, assim como o aprendizado de atuagio em equipes multiprofissionais. Uma das habilidades consideradas fundamenta s para a pritica clinica € a observagao, entendida como “um olhar atento a todas as informag6es, caracteristicas, elementos que cercam 0 fendmeno cli- nico € © contexto em que 0 mesmo ocorre” (op. cit. p. 57), inclusive o olhar que possibilite questionar a propria teoria em questo. A grande polémica esté no ato pedagégico que permite a ampliagao desse olhar e que dé espago para a critica tedrico-metodolégica Outro aspecto undnime na formagiio reside na incluso de con- tetidos advindos da Filosofia, da Antropologia e da Sociologia, anali- sando as teorias no seu aspecto hist6rico, explicitando os diferentes contextos do pensamento que constituem o terreno para o surgimento das correntes de pensamento em Psicologia. Os autores também ressaltam que a insere¢ao em equipes multidisciplinares torna indi pensdvel 0 conhecimento das “bases biolégicas do comportamento humano e de seus distiirbios” (op. cit. p. 61), bem como do conjunto de conhecimentos que envolve a area de satide publica. Quanto a estrutura de curso oferecida, os professores entrevis- tados sZo unanimes em apontar que o trabalho clinico descontextualizado & fruto de uma pritica semelhante apresentada a0 aluno durante a sua formagaio, Suas consideragdes viio no sentido de um estreitamento de relacdes entre universidade © comunidade, assim como no ensino de praticas alternativas as priticas psicanal cas tradicionais (op. cit. p. 63). Embora a andlise apresentada pelos professores entrevis traga avancos importantes no que se refere & necessidade de mu- dangas na abordagem e ampliagao do alcance do trabalho do ados 118 Awa Kantva Awon Crrccina & Manis Proesica Restizo pt Souza psicélogo, sabemos que as Clinicas-Escola, onde se desenvol- vem, geraimente, os estégios praticos de atendimento clinico recebem, em sua maioria, a populagio mais pobre, isto é, a mesma populagtio que procura as unidades basicas de satide ¢ os hospit piblicos. Ou seja, o psicdlogo estaria, em tese, trabalhando com a mesma clientela, podendo desenyolver por meio da universidade, pniticas to alternativas quanto as que seriam realizadas em outros equipamentos de satide (Souza, 1996). 3. PRATICAS EMERGENTES NA ATUACAO PSICOLOGICA? A PSICOLOGIA ESCOLAR Com relagio A rea de Psicologia Escolar, a pesquisa realiza- da pelo CFP e apresentada por Mahuf (1994) considera como priti- cas emergentes aquelas que propiciaram aos psicélogos que as de- fendem “uma profunda revisao € reformulacéo dos esquemas conceituais que sustentaram sua formagiio em Psicologia durante 0 curso de graduagio” (p. 166) € acrescenta que essas mudangas tiveram suas origens em experiéncias de trabalho junto a escolas, comunidades ¢ instituigdes de satide que, de alguma forma, possibili- taram “o contato direto com uma clientela tfpica, isto é, proveniente de classes populares, que representam a maioria da populagdo brasi leira” (p. 166). Os avangos no fazer psicoldgico na érea de Psicologia Escolar, segundo a pesquisadora, apresentam-se em dois sentidos: na supe- ragio da nogio unilateral de adaptagaio da crianga ao sistema escolar e na atuagio do psicélogo enquanto um profissional independente do corpo administrativo da escola. As duas maneiras de conceber a atuagao do psicslogo vém no bojo de uma outra compreensio que questiona as concepgdes de ajustamento da crianga a escola, independentemente do tipo de es- cola que Ihe é oferecida, instrumentada por teorias que fazem a cri- Qurtxs Escotan EATUAGAO PROMSSIONAL tica & Psicometria e a Psicologia Diferencial e que permitam conhe- cer a “realidade escolar”, explicitando os processos que acontecem intramuros, no dia-a-dia do fazer docente. Assim, analisa Maluf: & dentro desses novos referenciais que entendemos estar se delineando a prética do psicélogo educacional que enfrenta o grande problema do sistema educacional brasileiro, que através da rede pitblica de ensino funda- mental atende as criancas provenientes das classes po- pulares gue se constituem na grande maioria do alunado de 1° grau. Esse problema é sem diwvida a baixa produ- tividade do sistema, expressa em termos de repeténcia, evasdo, fracasso, exclusdo. Esse problema, que nao é s6 da crianga ou das condigdes familiares mas é sobre- tudo das condigées de ensino escolar, pode ser tratado também, — embora nao sé ~ no nivel do atendimento in- dividual ou grupal dos alunos (op. cit. p. 186). Considera que a tarefa do psicélogo & contribuir com 0 seu co- nhecimento sobre as relagdes que se processam na institui¢ao para repensar as relagdes escolares e as subjetividades produzidas nes sas relagdes. A mudanga de referenciais teéricos na compreensio das questdes escolares tem promovido 0 “desenvolvimento de prati- cas pedagdgicas de melhor qualidade” (op. cif. p. 178), em “parce- ria com 0 educador” (p. 182). ‘A consideracio do contexto em que 08 comportamentos ocor- rem, bem como 0 entendimento das demandas em seu contexto institucional, apontados por Lo Bianco et al. (op. cit.) como avangos na area de Psicologia Clinica, so aspectos referidos por esta autora como fundamentais para a compreensao das relagdes de seletividade no proceso educacional. Mas é importante destacar que, na andilise critica que sustenta a reflexiio tedrica em Psicologia Escolar, 0 con- texto é entendido de maneira diferente da concepgio clinica. Nao a.anillise psicolégica que passa a incluir 0 contexto social, mas passa, sim, a considerar que 0 contexto histérico, social e institucional em RIM Cuenta E MARLENE PROENCA REBELLO DE SOUZA. que a escola € produzida precede e inclui a anilise psicoldgica dos processos ¢ relagdes institucionais escolares que produzem 0 fra ISSO OF © sucesso escolares. Ou seja, a dimenso social e his inclui a dimensao psicol6gica, e nZo 0 contritio. Outra discussiio que emerge dos depoimentos de psicdlogos que trabalham em Educagdo refere-se a0 contrato a ser estabelecido entre psicdlogo e escola. Os trabalhos atuais vém refletindo uma posigdo de insergo do psicdlogo e/ou sua equipe numa relagio de consultoria ou assessoria ao corpo docente e/ou administrativo esco- ares, Esse contrato possibilitaria, entre outras coisas, uma relagio de maior independéncia do psiclogo quanto ao “staff” escolar, pos ilitando outras formas de insergdo frente as dificuldades vividas no dia-a-dia da escola. Um dos primeiros passos do contato do psicélogo com as esco- as encontra-se no sentido de reverter a visio tradicional de atendi- mento aos “problemas de aprendizagem”, como relata Maluf: 0 psicélogo atende & solicitagito de uma escola, para ajudar a resolver problemas decorrentes da aceitagao de criangas da favela, e egressas da FEBEM, A comuni- dade as discriminava, ndo aceitando que convivessem na escola com seus fithos. O psicdlogo comeca por fa- zer 0 reconhecimento da escola e do bairro; ouve as professoras @ as criancas. Num determinado momento, as professoras mostraram o desejo de entender como iviam e 0 que queriam da escola e das eri- quais wrabathavam (p. 176). pensavam, ancas com as ‘A mudanca do referencial teérico, partindo de uma leitura institucional, possibilita a criagio de instrumentos de abordagem das dificuldades diferentes dos tradicionalmente usados e que in- cluem os aspectos individuais de uma outra maneira, considerando que muitas das atitudes apresentadas pelas criangas sio fruto de relagdes de exclusdo por elas sofridas. Muitas de suas agdes pas- sam, sob esta ética, a ndo mais ser consideradas como violentas, I mas como estratégias de sobrevivéncia as hostilidades recebidas diariamente, Os instrumentos de abordagem utilizados: entrevistas, observa- goes, visitas domiciliares, conversas informais, caracterizagiio do bairro, dentre outros, tém como objetivo entender, o mais amplamente possivel, a complexidade da realidade escolar. Realidade esta que se apresenta difusa e fragmentada na queixa que chega ao psicdlogo. Ainda na década de 1990, importante contribuigao para a ques- do da atuaco profissional de psicdlogos na drea de Educagiio com- parece nas pesquisas de Tanamachi (1992, 1997). A autora analisa a produgio académico-cientifica na drea de Psicologia Escolar das décadas de 1980 ¢ 1990 referentes a Dissertagdes e Teses produzi- das nos principais programas de pés-graduagaio do pats. ‘Segundo analisa Tanamachi (2000, pp. 80-1), na década de 1980, a Psicologia Escolar manifestou 0 intuito de superar as tradicionais concepgdes adotadas até entdo, passando a “analisar criticamente a histOria da Psicologia aplicada A Educagao”, indicando alguns pres- supostos norteadores para a nova concep¢ao: &) baseiam-se em con- cepgées progressistas de Educagdo que, criticamente, buscam en- tender 0 homem concreto (como produto das relagdes sociais — no nivel da sociedade mais ampla); b) atentam para pressupostos tesri- co-metodolégicos que permitam analisar criticamente temas ¢ teori- as da Psicologia, buscando explicar 0 homem como um ser biol6gico, social ¢ hist6rico; c) superam concepgdes de Educacio e de Psico- logia que enfatizam aspectos ora microestruturais, 01 macroestruturais; € apresentam respostas para a dicotomia posta entre sociedade e individuo. A autora acrescenta a idéia de que 0 movimento critico de Pst Escolar aponta para a tentativa de se cologia descrever, explicitar e principalmente construir/pro- por respostas e explicagdes concretas que permitam tra~ duzir 0 resultado dos estudos desenvolvidos na década de oitenta, por meio de acdes tebrico-praticas possiveis e necessérias ao desenvolvimento da Psicologia na Edu. cagao escolar (Tanamachi, 2000, p. 83) Além disso, os principais elementos que compéem as formas de atuagio do psicélogo escolar so apontados pela autora, com base na conclusio da tese defendida por Cunha em 1994, que enfatiza: a) necessidade do psieslogo escolar considerar em sua pritica, simul- taneamente, “os determinantes sociais na organizagio escolar e na definigo dos problemas de ensino/aprendizagem, assim como as- pectos subjetivos a eles inerentes”; e procurar favorecer uma transformagao enriquecedora que busque 0 crescimento ¢ 0 de- senvolvimento criativo de alunos, professores ¢ pais; b) 0 entendi- mento da escola a partir “dos pressupostos da anélise hist6rico- critica como fonte de interpretagiio da realidade educacional atual a fim de possibilitar uma ago transformadora; c) a idéia de que 0 objeto da Psicologia Escolar é 0 sujeito psicolégico, cujos processos de subjetivacdo e objetivagdo devem ser enfocados em suas relagdes tanto com os condicionantes da estrutura escolar quanto da estrutura dos préprios in~ dividuos (Cf. Cunha, apud, Tanamachi, 2000, pp. 97-8). Alguns trabalhos escritos no fim dos anos 1990 confirmam tal tendéncia. Com base na abordagem caleada na consideracio das raizes s6ciohistéricas dos fendmenos escolares, Yazile (1997) desta- ca as determinagées histéricas e as forcas sociais conservadoras gue influenciam 0 quadro atual da Educagio no Brasil; Souza (1997) enfatiza o papel das representagdes atuais acerca das ¢ determinantes e produtoras das relagdes estabelecidas entre profes. sor ¢ aluno — a desvalorizacio contribui para a marginalizagio dos alunos; Cunha (1997) ressalta a necessidade da escuta do psicdlogo, que deve ouvir os professores e alunos; por fim, Salotti (1997) enfatiz nportincia da anilise critica do sistema escolar no trabalho do psicdlogo ¢ denuncia a discriminagao nas Classes Expeciais para Deficientes Mentais Leves. como Queixa Escotan E ATUAGAD PROMSSIONA.. Segundo Souza (19972), os aspectos relatives ao quadro de fracasso escolar no Brasil acabam por se refletir nos servigos de atendimento a satide mental oferecidos & populagdo na drea de Psicologia, tendo como principal motivo de encaminhamento a queixa escolar, A queixa escolar vem sendo entendida como fruto de problemas individuais e familiares do aluno encaminhado, ¢ atendida por meio de priticas psicodiagnésticas baseadas em pro- cedimentos centrados na entrevista inicial, anamnese, aplicagao de testes, encaminhamento para psicoterapia ¢, em alguns casos, orientagdo de pais. Souza (19972, pp. 26-7) acrescenta a idéia de que, ao realizar (0 leva em con- este tipo de processo psicodiagnéstico, o psicslogo sideragio qualquer tipo de influéncia exercida pelo contexto escolar ou pelas relagdes de ensino-aprendizagem sobre a queixa escolar. Esta é entendida como individual, pertencente 8 erianga (ow adoles- cente) encaminhada, de modo a atribuir-se um cardter estritamente psicolégico as dificuldades vividas pelo aluno no processo de escolarizagao. Assim, a queixa escolar é tida como uma dificuldade do aluno em aprender, decorrente de déficits cognitivos e/ou intelec- tuais e emocionais. ‘Além disso, deve-se atentar para o fato de que a predominancia desse modelo clinico psicolégico acaba por se refletir nas concep- ces dos professores, psicdlogos ¢ da sociedade em geral. Com rela~ go a este aspecto, Patto (1984, pp. 166-172) chega a ilustrar 0 modo predominante de representagao dos psicélogos acerca da realidade educacional no Brasil, segundo o qual as dificuldades da escola, as- sim como as causas de reprovagio, seriam advindas do corpo dis- cente € sua familia, E com base em dados como estes, a autora aponta para a “enxurrada de preconceitos ¢ esteredtipos tipica da “toria da caréncia cultural” ¢ a “psicologizago de um problema politico” (p. 172). A necessidade de uma compreensio dialétiea acerca da rela- do entre 0 individuo e 0 contexto histérico enfatizada por Meira (2000), que reflete sobre o pensamento critico em Psicologia Esco- 124 AwaKantsa Awoniy Curcetia Marment PROrs¢a Renetto ne Souza lar, com base em concepgies eriticas de Educ: Segundo esta autora, as produces tedricas embasadas nesta abor- dagem critica apontam para a tendéncia de reflextio acerca de te- ma ‘andilise critica dos pressupostos mais gerais da Psico- logia Escolar; criticas ao modelo clinico de atuag’o; desvelamento do processo de produgio social do fracasso escolar; busca de no- vas formas de pensar os processos de avaliagio psicolégica € re- flexdes sobre a redefinigio do papel da Psicologia na formagao docente”(p. 13), Paito (1997, pp. 11-2) também ilustra alguns aspectos relatives a abordagem critica — calcada na consideragao das raizes sociohist6ricas dos fendmenos escolares — ao se referir a certos autores responsiveis pela obra em questo (em cujo prefiicio aquela escreve). De acordo com Patto, tais autores voltam-se para a trama institucional a fim de compreender as criangas rotuladas como “desajustadas”, crendo na sua capacidade de aprender; “oferecem sugestdes a psic6logos aflitos que se perguntam 0 que fazer depois de criticado 0 modelo médico” e buscam a movimentacio ou vitalizagio na qual predominam a “cristalizacdo” ¢ o rétulo nas insti- tuigdes escolares. Ou seja, propdem alternativas de atuacdo psicol6. gica, com base em uma concepgio critica acerca da escola & dos instrumentos utilizados na Area de Psicologia. Souza e Machado (1997) alegam que @ atitude de néo se difun- dir as criticas acerca de concepgdes preconceituosas corresponde a compactuar com 0 quadro de exclustio dos alunos. E acrescentam: “nossas evidéncias nos fizeram mudar ‘o olhar’, 0 *foco’, de nossas crengas, mudar as perguntas € as priticas em relagiio aos professo- criangas e pais das escolas ptiblicas, enfim, mudar nossa manei- ra de intervir” (pp. 35-6). Freller (1997a) acrescenta que 0 objetivo desta atuagtio (que nbém considera a familia e os professores, no se limitando ao res, Meira afima, sinda, que a énfase em pressuposios erficos relatives a coneepydes dé homem e sociedade esti presente em textos produvidos por autores dentre 08 quais| tneontranse Maluf e Palo, spontadas anteriormente no relatério em questt0. Quins Escoran x ATvacdo Paowssional 125 aluno) consiste na eriagdo de um espago ond todos os envolvidos possam “formular questdes, expressar seus conflitos, culos, buscar determinantes histéricos ¢ especificos de cada caso para procurar estratégias que possam promover o desenvolvimento da crianga” (p. 76). A autora aponta a hipétese de que este tipo de enfoque contribua para que a instituicdo escolar, assim como a crian- cae a familia enfrentem melhor os problemas ¢ mudem seus luga- res. Sayfo e Guarido (1997, p.84) afirmam que este tipo de trabalho ‘em questio visa buscar a dimensio psicolégica ~ dada pela subjetivi- dade — no interior das priticas educativas. E, finalmente, Souza Machado (1997b) enfatizam a necessidade de se intensificar a “problematizagiio” das relagdes (p .48). Isto posto, deve-se ressaltar 0 fato de que so imprescindiveis 0 estudo e a andlise de aspectos que compdem uma formagao profis- sional que favorega a realizago de uma prética de atendimento psicolégico que busque a ruptura do fracasso escolar, tal como se propée com a abordagem apontada acima ~ criticando € buscando problematizacio, considerando a complexidade das priticas envol- vidas na vida escolar. As reflexes, que serfo apresentadas a seguir, so fruto de tra- balho de pesquisa, centrado em um estudo de caso de um grupo de psicdlogos que atuam no proceso de formacio profissional, bem como de estudantes de graduacio, que vivenciaram esta formagiio. ‘A pesquisa foi realizada a partir da anillise de relatorio de estagio € de entrevistas com psicélogos e alunos do curso de Graduagao em Psicologia. Este trabalho teve como objetivo investigar alguns as- pectos que compiem esta pritica, atentando para algumas reper cussdes desta experigncia na formagio/atuagao profissional dos alu- nos. Assim, neste capitulo, sero apontados alguns elementos que constituem esta modalidade de entendimentofatendimento & queixa escolar, cuja intervengio é norteada por uma abordagem erftica em Psicologia Escolar. Com isto, pretendemos contribuir com a forma- Go de psicélogos que se deparam com a queixa escolar no contexto do fracasso educacional brasileiro. repensar vin 126__ Axa Kamina Avon Cutccata x Mannie Proenca Reiao br Souza. 4. ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DE UMA ATUAGAO/ FORMAGAO EM PsICOLOGIA ESCOLAR EM UMA PERSPECTIVA critica Reflexdes decorrentes das criticas te6rico-m cologia ¢ & Psicologia Escolar nas iiltimas décad postas de atuagiio/formacao do psicélogo escolar norteadas por tais contribuigdes, possibilitam a articulagao de elementos que con- sideramos constitutivos de uma praxis de atendimento em Psicolo- gia Escolai Os pressupostos que embasam a agio psicolégica em uma abordagem critica frente 4 queixa escolar compreendem os seguintes elementos: compromisso com a luta por uma esco- la demoeriitica e com qualidade social; ruptura epistemolégica relativa A visio adaptacionista de Psicologia e construcio de uma praxis psicoldgica frente 4 queixa escol a) A finalidade da atuacao do psicélogo na Educagio deve-se pautar no compromisso com a luta por uma escola democrética, de qualidade, que garanta os direitos de cidadania a criangas, adoles- centes € profissionais da Educagio. Este compromisso € politico envolve a construgiio de uma escola participativa, que possa se apro- priar dos conflitos nela existentes e romper com a producto do fra- casso escolar. Esta ruptura permite contribuir para o bem-estar das criangas, assim como para a aprendizagem das mesmas € superagao dos obstéculos que barram o desenvolvimento de seu potencial, ¢ a promogao do autoconhecimento, de modo a possibilitar ages na comunidade em que vivem. Dentre os complexos aspectos impli cados na tentativa de se romper com esta producao do fracasso escolar, podem ser apontados, por exemplo, os relativos ao traba- Iho realizado com os professores, visando-se contribuir para a rea- iza¢30 profissional dos mesmos, bem como para a methoria de sua competéne' a, com énfase na conscientizagdo acerca da todolégicas & Psi- las, bem como pro- era Bscorant p ATUAGAO PROFIONAL, pratica pedagégica e de aspectos ético-politicos presentes em tal atuagio profissional b) Ruptura epistemol6gica: bus truir o conhecimento “a partir das minorias populares oprimidas” conforme aponta Martin-Baré (1998) — dando voz aqueles que, na maioria dos espacos sociais, nao a tém. Ou seja, enfatiza-se a cons- trugdo de uma “pedagogia do oprimido” e o resgate do lugar do sujet to na pritica pedagdgica, Deste modo, rompe-se com interpreta que “coisificam este sujeito” (Martin-Bar6, op. cit.) e tansformam- no em objeto de interpretagdo e andlise de teorias que traduzem a complexidade do fendmeno social a instancias meramente intrapsiquicas. Nesta concepeiio, o foco do encaminhamento anteriormente depo- sitado na crianga se desloca para a rede de relagdes produzida no ambi- to escolar: enfatiza-se a consideracio de diversos fatores implicados na produg3o da queixa escolar, criticando-se, assim, a culpabilizagio da crianga pelo fracasso escolar ¢ 0 modelo diagnéstico, Com relagio a tais aspectos, Meira (2000, p. 63) refere-se & importancia de que “os psicdlogos escolares rompam com as expli- cages pseudocientificas que buscam situar a origem dos problemas ‘educacionais no aluno e/ou em sua famflia, pela via de uma reflexdo critica sobre as priticas sociais e escolares que os produzem”. Se- gundo a autora, este é 0 elemento “mais fundante” da concepcao que embasa uma prética psicolgica em uma perspectiva critica em Psicologia Escolar (op. cit.. p. 63). ‘Ao criticar © modelo diagnéstico € a nilo consideragaio do cor texto escolar em que a queixa é produzida, Machado (1997, p. 99- 100), refere-se a relevaneia em se realizar uma pritica psicoldgica “voltada a intervengiio nas relagdes”. Em tal abordagem atenta-se, portanto, para o campo de forgas atuantes na problematica escolar. apontando-se a idéia de que os problemas escolares siio produzidos em uma hist6ria coletiva. Ressalta-se, ainda, o fato de se atentar para aspectos especificos de cada escola, bem como remeté-los 20 contexto socioecondmico em que esta se situa. 1 de uma nova forma de cons:

You might also like