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Em países como Estados Unidos, Canadá e Inglaterra, o

Direito possui uma classe essencial para a celeridade de seus


procedimentos: os paralegals. Na definição da American Bar
Association – órgão equivalente à OAB – o paralegal é definido
como “pessoa qualificada por formação, treinamento ou
experiência de trabalho, empregada por um advogado,
escritório jurídico, corporação, agência governamental ou
outra entidade, que desempenha especificamente trabalho
legal delegado, pelo qual o advogado é responsável”. No
Canadá, possuem curso universitário e agência reguladora
específica: ao ser licenciado pela Law Society of Upper
Canada, o paralegal ganha status independente.

Para uma idéia melhor das tarefas atribuídos aos paralegals,


as indústrias cinematográfica e televisiva de Hollywood nos
dão alguns exemplos práticos: além da já famosa Erin
Brocovitch, vivida por Julia Roberts nas telonas, temos Ellen
Roark, vivida por Sandra Bullock em Tempo de Matar(1996),
e o escritor Rick Castle, na série americana Castle(2009). O
denominador comum das funções exercidas pelos paralegals
é a eficácia no atendimento jurídico: o paralegal ocupa-se de
atividades administrativas, organizacionais e de pesquisa,
deixando o advogado livre para estudar os casos com mais
afinco, preparando melhor suas teses e argumentações e
produzindo resultados melhores e mais rápidos para seus
clientes. As funções dos paralegals podem aumentar ou
diminuir, conforme a área jurídica na qual se propõem a
trabalhar.
Esse fenônemo tem origem na década de 60, com a crescente
consciência pública acerca de seus direitos e a necessidade
premente de soluções para conflitos pelo Poder Judiciário. Os
grandes escritórios, na época, viram sua eficácia no
gerenciamento de causas aumentar exponencialmente e
proporcionalmente à contratação destes assistentes jurídicos.
A aquisição judicial é um sucesso nos países que a utilizam
desde então, contribuindo para a prosperidade dos escritórios
de advocacia.

No Brasil, a definição de paralegal, ou assistente legal, não


procede. A profissão não é regularizada no país, e para
alguns, sequer existe. Podemos, no entanto, comparar suas
atribuições com as de um estagiário de Direito. No entanto,
atualmente, o cenário jurídico brasileiro encontra-se no
mesmo patamar do panorama estrangeiro nos anos 60: o
volume de demandas aumenta exponencialmente, a
quantidade de trabalho é muito maior que a de outrora e em
todas as esferas jurídicas, presenciamos casos que exigem
mais tempo e atenção. O povo brasileiro não desperta
somente consciência de seus direitos, mas tem ciência das
tecnicalidades existentes para obtê-los, exigindo bem mais do
advogado constituído que o famoso “dia no tribunal”.
Claramente, este quadro torna a necessidade de assistência
ao advogado premente. Com isso, ganham os estudantes de
Direito: a procura por estagiários aumentou bastante nos
últimos anos.
Ainda assim, há tarefas para as quais o estagiário não está
preparado ou habilitado a executar, forçando o advogado a
trazer mais assistência para complementar os trabalhos, o
que torna os casos mais custosos e ocasiona atrasos. Para
garantir a excelência dos trabalhos, os escritórios de
advocacia costumam contar com equipes extensas de
especialistas: psicólogos, contadores, engenheiros, peritos em
geral. E estes acabam tornando-se paralegais de fato no
Direito brasileiro. Se existisse no Brasil a habilitação para a
profissão paralegal, devidamente regulamentada e com
atividades definidas e disciplinadas por órgão competente,
talvez estes custos pudessem ser reduzidos, o manejo das
lides pudesse ser mais rápido e os casos advocatícios, mais
rentáveis para todos os envolvidos.

Paralela à questão deste fenômeno judiciário, há a


problemática dos bacharéis de Direito impossibilitados de
exercer a carreira, pela falta de habilitação no Exame da
Ordem. Adriana de Barros Souzani e Pedro Benedito Maciel
Melo alertam que os índices de reprovação nos Exames de
Ordem ultrapassam os 90% em alguns estados, deixando
milhares de bacharéis à deriva pelo país – e sem uma
profissão definida. Não cabe discussão ao mérito destes
índices neste artigo, mas sim a responsabilidade da classe
advocatícia diante daqueles que recebem o grau e o título
honoris causa de doutor, e são impedidos de utilizar seus
conhecimentos para pleno exercício da carreira para a qual se
prepararam – e que às vezes, inconformados com sua
condição, exercem ilegalmente, trazendo riscos ao interesse
comum e também à reputação da classe. Assim como as
equipes especialistas contratadas, podemos enquadrá-los
como paralegais de fato - de forma completamente irregular:
sua remuneração não possui qualquer critério, sendo sujeita
à vontade do advogado ou escritório que solicitar seus
serviços e tendo uma carga de trabalho muito maior, por
vezes desproporcional às tarefas designadas.

Com a proliferação de cursos de Direito no país, a


concorrência na área aumenta de forma assustadora. Assim
sendo, para muitos profissionais do Direito, é apenas natural
a exigência cada vez maior de especializações, cursos e
conhecimentos obtidos por seus empregados em sua área de
atuação. Isto dito, é fácil notar que, na prática jurídica, as
porcentagens obtidas no Exame da Ordem preterem o mérito
acadêmico pessoal – para as vagas de estágio, alunos das
universidades com maior índice de aprovação no Exame da
Ordem são preferidos em detrimento dos estudantes de
outras instituições; como se a universidade fizesse o aluno, e
não o oposto. Pode-se inclusive inferir que a falta de
oportunidade de estudos práticos prejudica os resultados
obtidos em provas como o ENADE e o Exame da Ordem. Por
receio do volume de candidatos – e futuros concorrentes – no
mercado, criamos nichos corporativos internos
excessivamente exigentes, avaliando estudantes pela forma.
Com isso, acabamos fechando portas pelos motivos errados, e
como advogados, temos certa responsabilidade pelas
conseqüências negativas concernentes à classe.
O instituto da assistência legal, adequado para o
ordenamento jurídico brasileiro, proveniente de um Estado
positivista de grande porte, poderia auxiliar a sanar as
problemáticas abordadas pelo texto – as relações
custo/eficácia de serviços advocatícios, o volume excessivo de
bacharéis no mercado sem perspectiva de profissão e/ou
carreira, os riscos oriundos do exercício não-regulamentado
da advocacia pelos mesmos e o zelo excessivo pela reserva de
mercado da classe. Cabe lembrar que, nas ocasiões supra
citadas, o instituto já existe: não pode, porém, permanecer
sem regulamentação, encarecendo serviços prestados para o
cliente e trazendo cargas absurdas de trabalho para cada
setor a que se destinam. É preciso que as entidades
competentes iniciem estudos acerca da regulamentação deste
instituto, largamente utilizado de maneiras que podem vir a
ser conflituosas com nosso ordenamento jurídico.

Tanto os estudos para regulamentação quanto a adequação


normativa do instituto são estritamente necessários e de
competência exclusiva da OAB; cabe ressaltar que, apesar de
parecer um remédio milagroso para os problemas aqui
enfrentados, o modelo paralegal só é visto em prática – e com
sucsso – nos países de ordenamento jurídico
consuetudinário, onde há certa flexibilidade nas formalidades
processuais. Simplesmente implementá-lo, sem as devidas
ressalvas e considerações, poderia complicar os trâmites
processuais em todas as esferas jurídicas. Sem contar que,
sem a devida atenção às necessidades da implementação e
adequação do instituto, corremos riscos sérios de inflar a
máquina estatal administrativa e, pior ainda, facilitar nichos
de corrupção, que na atual conjuntura proliferam
espontaneamente.

Criar novos institutos num país tradicionalista como o Brasil


é difícil; inovar no Direito brasileiro, organismo normativo
extremamente rígido, é tarefa hercúlea. Mas, diante da
possibilidade – e oportunidade – de, com uma mera
adaptação dos ritos, acelerar a máquina judiciária e
solucionar problemas sociais e organizacionais com relação
direta à nossa classe, o mínimo esperado é que se tente. O
Direito é, para muitos, um organismo vivo, evoluindo com as
necessidades da sociedade, que também está em constante
evolução; seria apenas lógico que o ordenamento jurídico em
voga acomodasse esta adaptação, ou pelo menos estudasse
sua aplicabilidade, para satisfazer as necessidades da
sociedade atual, na era da internet, ávida por resultados
rápidos e eficientes.

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