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ARTIGO ORIGINAL

Comportamento do universitário da
área de biológicas da Universidade de
São Paulo, em relação ao uso de drogas*
Andrea Cecília Retamal Barría1, Sueli de Queiroz2,
Sergio Nicastri3, Arthur Guerra de Andrade4

RESUMO

Este trabalho apresenta dados a respeito do estilo de vida e atitudes diante do uso de tabaco, álcool e
outras drogas dos alunos da graduação da Universidade de São Paulo, Brasil, da área de biológicas. O
objetivo é detectar diferenças entre aqueles que declararam uso de tabaco ou outras drogas e aqueles que
negaram esse consumo nos últimos 12 meses.

Os dados foram coletados em 1996, de uma amostra probabilística de 1.198 acadêmicos da USP, campus
São Paulo, a partir de questionário anônimo e de auto-preenchimento.

Os nossos resultados mostraram que os usuários de tabaco e de outras drogas dedicam-se mais a
atividades socioculturais e gastam menos tempo com atividades acadêmicas, em relação aos não-usuários.
No que se refere a atitudes diante do uso de substâncias, observou-se que, de um modo geral, uma maior
proporção de usuários de tabaco e outras drogas aprova o uso de substâncias psicoativas em relação aos
não-usuários.

Unitermos: Abuso de substâncias; Tabaco; Atitudes; Universitários; Drogas.

ABSTRACT

Behavior of students of the University of São Paulo in relation to drug use

This paper presents data about lifestyle and attitudes related to tobacco, alcohol and drug use in
undergraduate students of Biological Sciences of the University of São Paulo, Brazil, comparing those
who informed use of tobacco and other drugs to those who reported no use of these substances in the last
12 months.

The data were collected in 1996 from a random sample of 1,198 students of the University of São Paulo.
The instrument used was an anonymous self-completed questionnaire.

Our results indicated that users are more dedicated to social or cultural activities and spend less time in
academic activities than non-users. The approval of experimental and regular drug use is related to the
patterns of drug and tobacco use, with users presenting higher rates of approval.

Keywords: Substance abuse; Tobacco; Attitudes; University students; Drugs.


INTRODUÇÃO

Dentro do contexto da elaboração de programas de prevenção ao uso de álcool e drogas para uma
população específica, devemos destacar três aspectos importantes a serem, necessariamente, bem
caracterizados previamente: o uso, que se refere à quantificação do consumo de álcool e drogas; as
atitudes, ou seja, o que pensam e fazem os indivíduos do grupo em questão em relação ao uso dessas
substâncias, e o conhecimento sobre a ação das drogas e seus efeitos colaterais.

Podemos destacar, ainda, que é de fundamental importância o conhecimento do padrão de consumo, das
atitudes e do conhecimento em relação às drogas que os futuros profissionais da área da saúde têm ou
adquirem ao longo da sua formação acadêmica, uma vez que esses universitários, em um futuro próximo,
estarão levando à comunidade as noções básicas de saúde, efeito multiplicador de suas informações.

Tendo em vista que os estudantes de Medicina têm sido, até o momento, o principal objeto de estudo da
maior parte das publicações científicas a respeito dos futuros profissionais da saúde, podemos tomá-los
como exemplo e traçar seu perfil diante das drogas.

A maioria dos trabalhos aponta para um consumo de substâncias psicoativas menor entre os alunos da
escola médica quando comparados com a população geral (Baldwin et al., 1991; Najem et al., 1995) e
outros estudantes universitários (Andrade et al., 1997).

Outro aspecto levantado é que os trabalhos indicam que a maioria dos futuros médicos, que refere
consumo de drogas, faz um uso esporádico e experimental dessas substâncias (Andrade et al., 1995). A
maior parte dos alunos tem experiência anterior ao ingresso na universidade com uma ou mais drogas
(Baldwin et al., 1991; Borini et al., 1994a; Kory & Crandall, 1984; Mesquita et al., 1995), graças à
introdução por parte de amigos e colegas (Mesquita et al., 1995). O álcool e o tabaco têm maior índice de
experimentação entre os 10 e 14 anos, enquanto que a maconha e os inalantes foram mais experimentados
entre os 15 e 19 anos (Mesquita et al., 1995).

Apesar de, na maioria dos casos, observar-se um contato prévio à universidade com álcool e outras
drogas, o aumento progressivo no consumo dessas substâncias, à medida que o curso de Medicina avança,
levando a maiores índices de consumo, nos últimos anos, é referido por vários autores (Andrade et al.,
1995; Borini et al., 1994a).

O entendimento dos motivos que levam esses jovens a fazer uso de tais substâncias é fundamental. O
prazer é o motivo principal para o uso de álcool e outras drogas ilícitas, seguido por ansiedade e pressões
dos exames como razões do consumo (Ashton & Kamali, 1995). Outras motivações importantes devem
ser citadas: curiosidade, tensão psicológica, relaxamento, melhora da performance e auto-medicação
(Baldwin et al., 1991; Mesquita et al., 1995).

O sexo masculino apresenta maior consumo de álcool e outras drogas em relação ao sexo feminino
(Andrade et al., 1997), com exceção feita ao consumo de anfetaminas (Mesquita et al., 1995).

Outras variáveis, tais como a presença ou não de atividade profissional, prática de esportes, morar ou não
com a família, não mostraram nenhuma correlação positiva ou negativa com o consumo de álcool (Borini
et al., 1994a). Observa-se, entretanto, a existência de um consumo maior de drogas (com exceção do
álcool, do tabaco e da cocaína), nos últimos 30 dias, entre os alunos que moram sem a família e que
pertencem à área de biológicas (Andrade et al., 1997).

A influência do consumo de álcool pelos pais sobre os filhos ainda apresenta dados controversos na
literatura (Borini et al., 1994a; Kory & Crandall, 1984; McAuliffe et al., 1991). Uma correlação entre um
maior consumo de substâncias psicoativas e um menor grau de dedicação aos estudos parece existir
(Borini et al., 1994a). Também parece haver uma associação entre o uso de drogas e estudantes mais
velhos, e também com aqueles que faltam às aulas com maior freqüência (Kory & Crandall, 1984).
Dentre os alunos da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), o álcool é a droga
que conta com os maiores índices de aprovação tanto para a experimentação quanto para o seu uso
regular, seguido da maconha. A cocaína e as anfetaminas apresentam os maiores índices de reprovação
para o uso freqüente (Mesquita et al., 1995).

Seria de se esperar que esses acadêmicos fossem jovens de maior conhecimento sobre os conceitos e
efeitos do abuso de álcool e outras substâncias psicoativas dentro da população universitária como um
todo. Contudo, encontramos dados que refletem a ignorância desses aspectos por parte dos estudantes de
Medicina (Borini et al., 1994b; Masur & Zwicker, 1978; Montes, 1984). Associado a isso, os futuros
médicos demonstram uma sensação de proteção graças ao seu hipotético conhecimento (Mesquita et al.,
1995).

Nesse sentido, o objetivo desse trabalho é traçar um perfil dos universitários da área de ciências
biológicas, dentro da qual estão inseridos futuros profissionais da saúde, em relação ao seu estilo de vida
e às suas atitudes diante do uso de álcool e drogas, buscando diferenças entre aqueles que fazem uso
dessas substâncias e aqueles que não o fazem.

MATERIAL E MÉTODOS

Esse trabalho utilizou-se do banco de dados de pesquisa sobre o uso de álcool e drogas entre os alunos da
graduação da USP, campus São Paulo, realizada em 1996 pelo Grupo Interdisciplinar de Estudos de
Álcool e Drogas (GREA) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas (Andrade et al., 1997).

Nessa pesquisa, os alunos foram divididos entre as áreas de humanas, exatas e biológicas. A população,
por nós estudada, compreendeu a amostra dos alunos da graduação da área de biológicas, em que a taxa
de resposta ao questionário foi de 83% sobre o total da amostra sorteada (n = 1.198). As unidades
pesquisadas foram: Escola de Educação Física, Escola de Enfermagem, Faculdade de Ciências
Farmacêuticas, Faculdade de Medicina, Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Faculdade de
Odontologia, Faculdade de Saúde Pública, Instituto de Biologia e Instituto de Psicologia.

A coleta de dados foi feita com questionário anônimo e de auto-preenchimento, baseado em modelo
proposto pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que incluiu questões a respeito das seguintes
drogas: álcool, tabaco, maconha, alucinógenos, crack/cocaína, anfetaminas, anticolinérgicos, ansiolíticos,
tranqüilizantes, antidistônicos, opiáceos, sedativos, barbitúricos e anabolizantes.

Fizemos os cruzamentos dos dados de estilo de vida e atitudes e o padrão de consumo, que correspondeu
ao uso de tabaco e ao uso de "drogas" (termo que abrange todas as substâncias pesquisadas no
questionário, com exceção do álcool e tabaco), referido nos últimos 12 meses. O padrão de consumo do
álcool foi excluído da nossa pesquisa, uma vez que não foram detectadas diferenças significativas deste
em comparação com as áreas de exatas e humanas (Andrade et al., 1997).

A análise dos dados foi feita por meio do teste do qui-quadrado e o nível de significância foi considerado
como sendo igual a 0,05.

Com o intuito de facilitar a descrição dos dados, usaremos termos como usuários e não-usuários (para
designar o uso ou não de drogas), e os termos fumantes e não-fumantes (para definir o uso ou não de
tabaco no mesmo período). Chamamos a atenção para o fato de que, apesar desses termos, o padrão de
consumo escolhido (12 meses) não define uso freqüente, abuso ou dependência.

RESULTADOS

As questões a respeito do estilo de vida dos estudantes quanto à presença ou não de consumo de drogas
encontram-se na tabela 1.
O uso de drogas parece estar relacionado com uma disponibilidade de tempo maior nos finais-de-semana
(45,6% dos usuários dispondo de todo o seu tempo, contra 37,3% dos não-usuários; p = 0,041). As
atividades nas horas livres referidas pelos usuários de drogas têm um padrão diferente em relação aos
não-usuários (p = 0,001). Entre os usuários, 67,5% referiram atividades fora de casa (sair/viajar com
amigos/namorado(a); atividades culturais como cinema, teatro e shows; freqüentar bares e festas), contra
55,4% dos não-usuários. A prática de esportes aparece com porcentagens semelhantes nos dois grupos
comparados.

Os indivíduos que não referiram uso de substâncias psicoativas demonstram um maior grau de
insatisfação quanto à freqüência com que praticam suas atividades de lazer (63,3% não estão satisfeitos);
enquanto entre os usuários, observa-se um equilíbrio maior entre satisfeitos e insatisfeitos (p < 0,001).

Uma maior proporção de não-usuários (39,5%) relata não faltar às aulas ou só o faz em caso de doença.
Essa proporção é significativamente menor entre os usuários (21,3% desses indivíduos; p < 0,001).

Usar ou não drogas relaciona-se aos lugares freqüentados dentro da universidade por esses jovens (p <
0,001). Os três lugares mais freqüentados pelos não-usuários são associações esportivas, (27,5%);
lanchonetes (25,3%) e bibliotecas (25,2%). Enquanto os usuários apresentam maior preferência pelas
associações esportivas (34,4%), seguido pelos centros acadêmicos (25,4%) e lanchonetes (25,4%). É
interessante ressaltar que apenas 8% do usuários de drogas freqüentam bibliotecas.

Conforme os dados apresentados na tabela 2, observa-se que quanto à aprovação da experimentação de


uma série de substâncias psicoativas (álcool, maconha, cocaína, crack, tranqüilizantes, anfetaminas e
inalantes), há diferenças estatisticamente significativas entre os grupos de usuários e não-usuários para
todas as drogas (p < 0,001 para todas as substâncias), ocorrendo uma maior aprovação em relação a todos
os tipos de drogas por parte dos primeiros.

A aprovação do uso freqüente das drogas citadas (Tabela 3) não apresentou diferenças significativas entre
usuários e não-usuários para a aprovação do uso de tranqüilizantes e de inalantes. Para drogas como o
álcool e a maconha, as diferenças entre a aprovação desse uso por parte de usuários e não-usuários são
significativas:

entre os primeiros, 45,1% aprovam o consumo regular de álcool (p < 0,001) e 40,7% o da maconha (p <
0,001); entre os últimos, 26% aprovam o uso de álcool e 6,1% o da maconha. Para as demais drogas:
cocaína, crack e anfetaminas, as diferenças também são significativas (p = 0,001, p = 0,042, p = 0,011,
respectivamente).
A experimentação de inalantes corresponde à terceira maior aprovação entre aqueles que consomem
drogas (39,7%), precedida apenas do álcool (95%) e da maconha (79,7%), e, quando se questiona o uso
freqüente, não são observadas diferenças significativaspara esse tipo de substância. O mesmo padrão é
observado para os tranqüilizantes.

Na tabela 4, encontram-se os dados de estilo de vida relacionados ao consumo de tabaco. Foram


observadas diferenças significativas com relação às atividades praticadas nas horas livres entre os que
fumam e os que não fumam (p = 0,010). Os fumantes estão mais ligados a atividades fora de casa,
indicando uma vida social mais importante. Por outro lado, estes são menos adeptos a práticas esportivas
(11,4%), quando comparados aos não-fumantes (15,2%).
Os fumantes freqüentam, de modo diferente que os não-fumantes, os lugares dentro da universidade (p <
0,001). Vão menos a centros esportivos e bibliotecas em comparação aos não-fumantes, preferindo
centros acadêmicos e lanchonetes.

Os usuários de tabaco também demonstram, no geral, proporções maiores de aprovação da


experimentação e do uso freqüente dessas substâncias em relação aos não-usuários de tabaco (Tabelas 5 e
6). À exceção da aprovação da experimentação de tranqüilizantes e crack e da aprovação do uso freqüente
de inalantes, anfetaminas e tranqüilizantes, os indivíduos que fumam aprovam mais a experimentação e o
uso regular de substâncias que aqueles que não fumam. Ainda nesse trabalho, obtivemos outros dados de
interesse. A introdução ao uso de drogas (exceto álcool e tabaco), entre os usuários de drogas e os
fumantes, parece ter, como principais agentes, colegas e amigos, o que ocorre com 71,3% dos usuários e
58% dos fumantes.
O uso atual de drogas está relacionado a uma experimentação de substâncias psicoativas (exceto álcool e
tabaco) prévia à faculdade, com 54,8% dos usuários afirmando essa experiência, contra apenas 12,4% dos
não-usuários.

Para usuários e fumantes, o próprio efeito que a droga proporciona é a principal motivação para o uso
freqüente de drogas (17,6% e 13,8%, respectivamente). Observa-se, porém, que entre os estudantes que
referiram uso de drogas, a maioria negou fazer uso regular dessas substâncias (69,6%), o mesmo
ocorrendo entre os fumantes (74,9%). Vale lembrar que, nessa questão, estava incluso o consumo de
álcool, podendo, as respostas, referirem-se a essa substância.

DISCUSSÃO

Esta pesquisa visa à determinação de dados relacionados ao consumo de drogas para a elaboração de
campanhas de prevenção. Pelos nossos resultados, podemos acrescentar alguns aspectos que devem ser
considerados dentro do contexto dessa população, principalmente porque alguns dos dados apresentados
são inéditos, já que poucos trabalhos semelhantes são encontrados na literatura. É interessante notar que o
consumo de drogas está relacionado a uma vida social mais intensa, talvez porque fora de casa ou em
grupos, o acesso às drogas seja mais fácil, ou então porque esses indivíduos são, devido à educação que
receberam ou ao meio onde estão inseridos, mais "abertos", com menos "tabus" em relação a esse
consumo. Além disso, esses estudantes dedicam-se menos aos estudos tendo em vista que faltam mais às
aulas e que poucos freqüentam bibliotecas. Essa relação entre uma menor dedicação aos estudos e um
maior consumo de drogas, presente nos nossos achados, também foi descrita por outros autores, como
Borini et al. (1994a) e Kory et al. (1984), em alunos de Medicina.

O não-consumo de drogas está relacionado a uma menor disponibilidade de tempo livre nos finais-de-
semana e um maior grau de insatisfação com a freqüência das atividades de lazer, talvez devido ao fato
desses universitários serem mais dedicados aos estudos, ocupando o seu tempo livre com esse tipo de
atividade, ou, então, por freqüentarem cursos com carga horária maior. Ou, ainda, porque os usuários
ocupam-se mais com atividades ligadas à obtenção e ao consumo de drogas, ou pelo fato de dedicarem-se
menos aos estudos e organizarem mais atividades em grupo, como, por exemplo, festas.

No que se refere à aprovação do uso regular e da experimentação de drogas, os nossos dados apresentam-
se concordantes com aqueles encontrados por Mesquita et al. (1995), no seu estudo envolvendo alunos da
FMUSP, com o álcool e a maconha sendo as substâncias com maiores índices de aceitação por esses
universitários.

O fato de tanto a experimentação quanto o uso freqüente serem mais aceitos por aqueles que fizeram uso
de drogas pode ser explicado na medida em que esses tendem a ser coerentes com suas próprias atitudes.
Porém, observamos que esses indivíduos aprovam mais a experimentação de inalantes e de
tranqüilizantes, desaprovando de igual forma o uso regular dessa substâncias, em comparação aos não-
usuários. E, ao observarmos a cocaína e o crack (drogas teoricamente mais perigosas), nota-se uma
aprovação maior tanto da experimentação quanto ao uso regular. Assim, provavelmente entre aqueles que
aceitam a experimentação de cocaína e crack, estão inseridos estudantes com maior predisposição ao
consumo regular e que, por conseguinte, aprovam esse uso. Além disso, poderíamos supor que os
inalantes e os tranqüilizantes são vistos como substâncias apenas para serem experimentadas e, quem
sabe, usadas eventualmente.

Os fumantes, aparentemente, levam uma vida mais sedentária, preocupando-se pouco com sua própria
saúde; uma vez que praticam menos esportes e freqüentam menos os centros esportivos, assim como
mantêm o hábito de fumar, ainda que esporadicamente. Assim como os usuários de drogas, os fumantes
estão mais ligados a atividades socioculturais e são menos dedicados às atividades acadêmicas. Embora
nossos dados não permitam uma investigação aprofundada sobre fatores de iniciação do tabagismo,
podemos conjeturar que os fumantes de nossa amostra adquirem esse hábito por estarem mais expostos e
ligados a outros fumantes quando vão a festas ou outros eventos, considerando o cigarro como um meio
de aproximação entre as pessoas.

É interessante notar que a aprovação da experimentação não é significativamente diferente para todas as
drogas entre os que fumam, desaprovando, do mesmo modo, a experimentação do crack e de
tranqüilizantes, assim como, o uso regular de tranqüilizantes, anfetaminas e inalantes. Apesar dos
fumantes aprovarem mais drogas como o álcool, a maconha e a cocaína, o fato de o cigarro ser uma droga
lícita e bem difundida na sociedade talvez faça com que o seu consumo esteja mais presente em pessoas
não necessariamente "abertas" ao uso de drogas ilícitas, possibilidade que poderia ser reforçada pelas
aprovações em menor porcentagem quando comparamos com o uso de drogas.

Baldwin et al. (1991) encontrou uma alta proporção (cerca de 90%) de alunos de escolas médicas que
fizeram uso prévio, ao ingresso na universidade de álcool, tabaco, maconha e anfetaminas. Os nossos
resultados indicam que boa parte dos estudantes da área de biológicas experimentaram drogas antes de
entrar na universidade. Entretanto, não se levou em consideração, em nosso trabalho, o consumo de
álcool e tabaco previamente ao ingresso na universidade.

Com relação às motivações para o consumo dessas substâncias, Ashton et al. (1995) encontraram o prazer
como fator principal, o que poderia ser considerado concordante com o presente trabalho, no qual os
próprios efeitos da droga são apresentados como a motivação mais importante entre os usuários.

A experimentação de drogas previamente ao ingresso à universidade, com exceção do álcool e do tabaco,


é significativamente maior entre aqueles que usaram drogas, indicando que mais da metade desses
estudantes já apresentavam uma maior predisposição ao uso de drogas, dada pela própria educação ou
pelo meio no qual estão inseridos, como já dito anteriormente, ou ainda, por uma predisposição de caráter
genético. Entretanto, a universidade é fator importante para o acesso às drogas, uma vez que 45,2% dos
usuários iniciaram esse consumo após o ingresso à faculdade, provavelmente pelo fato de que,
principalmente no primeiro ano, os eventos sociais (como festas, cervejadas e competições esportivas)
são importantes para a integração de calouros e veteranos. Além disso, a época da faculdade é vista como
uma das mais difíceis da vida, principalmente os últimos anos, podendo explicar um consumo progressivo
de substâncias psicoativas, usadas como escape para o estresse, ou como estimulantes para o estudo e o
trabalho.

A utilização do padrão temporal de consumo nos últimos 12 meses, apesar de abranger tanto indivíduos
que fizeram uma única experimentação quanto aqueles que fazem uso freqüente, deve englobar, em sua
maioria, indivíduos que fazem um uso esporádico de substâncias psicoativas, considerando-se que a
maioria dos estudantes que relataram uso de drogas nos últimos 12 meses negaram o uso freqüente de
drogas, inclusive do álcool.

CONCLUSÕES

Os usuários de drogas nos últimos 12 meses são indivíduos que dispõem de um tempo livre maior,
apresentando uma vida social mais importante, mais satisfeitos com esse tempo livre, menos dedicados
aos estudos, freqüentando, dentro da universidade, lugares como centros esportivos, acadêmicos e
lanchonetes, aprovando mais a experimentação e o uso freqüente de drogas.

De igual modo, podemos descrever os usuários de tabaco, nos últimos 12 meses, como indivíduos que
têm uma vida social mais importante, menos dedicados aos estudos, freqüentadores de centros
acadêmicos e lanchonetes, menos adeptos a atividades esportivas, aprovando mais a experimentação e o
uso freqüente da maioria das drogas.

O conhecimento das características dessa população específica e a sua contínua atualização é


indispensável. Estratégias de prevenção e informação relacionadas ao uso e abuso de substâncias
psicoativas devem ser estabelecidas, pois boa parte desses jovens, em um futuro próximo, terão acesso a
diversas substâncias medicamentosas (como no caso de estudantes de Medicina, que passam a poder
prescrever medicamentos), ou desempenharão papel educacional importante dentro da população
estudantil e geral.

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*
Trabalho realizado no GREA _ Grupo Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas do Instituto de
Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Projeto de
Iniciação Científica da FAPESP (Processo no 97/06067-5).

1
Residente do 1o ano IPq _ Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

2
Mestre em Saúde Pública. Pós-graduanda da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.

3
Doutor em Medicina, Mestre em Saúde Pública. Responsável pelo Setor de Prevenção do GREA.

4
Professor titular de Psiquiatria da Faculdade de Medicina do ABC e coordenador geral do GREA.

Endereço para correspondência:

Andrea Cecília Retamal Barría

Grupo Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas (GREA)

Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

Av. Ovídio Pires de Campos, s/n, 3o andar _ São Paulo, SP _ CEP 05403-010 _ E-mail:
retamales@uol.com.br

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