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Acordo de não-persecução penal – Res. n.

181/2017 do Conselho Nacional do


Ministério Público
Camila Torres

Fontes utilizadas:
- Acordo de não-persecução penal: Inconformidade jurídico constitucional da Resolução nº 181/2017 do
Conselho Nacional do Ministério Público (Danni Silva). Disponível em: https://jus.com.br/artigos/60570;
- A legalidade do acordo de não persecução penal (Res. 181/17 CNMP): uma opção legítima de política
criminal (Rogério Sanches Cunha e Renne Souza). Disponível em:
http://meusitejuridico.com.br/2017/09/14/legalidade-acordo-de-nao-persecucao-penal-res-18117-cnmp-
uma-opcao-legitima-de-politica-criminal/;
- O acordo de não-persecução penal passível de ser celebrado pelo Ministério Público: breves reflexões
(Emerson Garcia). Disponível em: https://www.conamp.org.br/pt/biblioteca/artigos/item/1772-o-acordo-
de-nao-persecucao-penal-passivel-de-ser-celebrado-pelo-ministerio-publico-breves-reflexoes.html.
1. A Res. 187/2017 CNMP
A Resolução, nos consideranda, estabelece como objetivos tornar as investigações mais céleres,
eficientes, desburocratizadas, informadas pelo princípio acusatório e respeitadoras dos direitos
fundamentais do investigado, da vítima e das prerrogativas dos advogados. Nessa parte, também chama a
atenção a menção à necessidade de modernização das investigações visando a agilização, efetividade e
proteção dos direitos fundamentais dos investigados, das vítimas e das prerrogativas dos advogados,
superando um paradigma de investigação cartorial, burocratizada, centralizada e sigilosa. Também é
reiterada a opção constitucional pelo sistema acusatório, e não inquisitório, no âmbito do processo penal.

 A Resolução conceitua o Procedimento Investigatório Criminal (PIC) como sendo o instrumento sumário
e desburocratizado de natureza administrativa e inquisitorial, instaurado e presidido pelo membro do
Ministério Público com atribuição criminal, e terá como finalidade apurar a ocorrência de infrações
penais de natureza pública, servindo como preparação e embasamento para o juízo de propositura, ou
não, da respectiva ação penal (art. 1º).

 Também estabelece que o membro do MP deverá priorizar, sempre que possível, as apurações sobre
violações a bens jurídicos de alta magnitude, relevância ou com alcance de número elevado de
ofendidos (art. 1º, §1º).

 O PIC não é condição de procedibilidade ou pressuposto processual para o ajuizamento de ação penal
e não exclui a possibilidade de formalização de investigação por outros órgãos legitimados da
Administração Pública (art. 1º, §2º).

 O PIC deverá tramitar preferencialmente por meio eletrônico (art. 3º, §1º) e poderá ser instaurado de
ofício (art. 3º, caput)  no caso de instauração de ofício, o procedimento investigatório criminal será
distribuído livremente entre os membros da instituição que tenham atribuições para apreciá-lo, incluído
aquele que determinou a sua instauração (art. 3º, §5º). Ou seja, quem instaura de ofício não fica
prevento.

 O membro do Ministério Público deverá dar andamento às representações no prazo de 30 dias,


podendo este prazo ser prorrogado, fundamentadamente, por até 90 (noventa) dias, nos casos em que
sejam necessárias diligências preliminares.

 Se, durante a instrução do procedimento investigatório criminal, for constatada a necessidade de


investigação de outros fatos, o membro do Ministério Público poderá aditar a portaria inicial ou
determinar a extração de peças para instauração de outro procedimento.
 Nenhuma autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de função pública poderá opor
ao Ministério Público, sob qualquer pretexto, a exceção de sigilo, sem prejuízo da subsistência do
caráter sigiloso da informação, do registro, do dado ou do documento que lhe seja fornecido.

 As correspondências, notificações, requisições e intimações do Ministério Público, quando tiverem como


destinatário o Presidente da República, o Vice-Presidente da República, membro do Congresso
Nacional, Ministro do STF, Ministro de Estado, Ministro de Tribunal Superior, Ministro do TCU ou chefe
de missão diplomática de caráter permanente, serão encaminhadas e levadas a efeito pelo Procurador-
Geral da República ou outro órgão do Ministério Público a quem essa atribuição seja delegada (art. 7º,
§6º).

Essas notificações, quando tiverem como destinatários o Governador do Estado, os membros do


Poder Legislativo e os desembargadores, serão encaminhadas pelo Procurador-Geral de Justiça ou outro
órgão do Ministério Público a quem essa atribuição seja delegada (art. 7º, §7º).

O interrogatório de suspeitos e a oitiva das pessoas referidas nos §§ 6º e 7º do art. 7º (autoridades)


deverão necessariamente ser realizados pelo membro do Ministério Público. Somente em casos
excepcionais e imprescindíveis deverá ser feita a transcrição dos depoimentos colhidos na fase
investigatória.

O membro do Ministério Público poderá requisitar o cumprimento das diligências de oitiva de


testemunhas ou informantes a servidores da instituição ou a qualquer outro servidor público que tenha
como atribuições fiscalizar atividades cujos ilícitos possam também caracterizar delito, e a oitiva deverá ser
realizada, sempre que possível, no local em que se encontrar a pessoa a ser ouvida (art. 8º, §§ 1º e 2º).

A persecução patrimonial voltada à localização de bens ou valores lícitos equivalentes, com vistas à
propositura de medidas cautelares reais, será realizada em anexo autônomo do procedimento investigatório
criminal (art. 14, caput).

Publicidade do PIC: mediante pedidos de vista (art. 15, II).

Em caso de pedido da parte interessada para a expedição de certidão a respeito da existência de


procedimentos investigatórios criminais, é vedado fazer constar qualquer referência ou anotação sobre
investigação sigilosa (art. 16, parágrafo único).

A vítima será esclarecida sobre seus direitos materiais e processuais, devendo tomar todas as
medidas necessárias para a preservação dos seus direitos, a reparação dos eventuais danos por ela sofridos
e a preservação da intimidade, vida privada, honra e imagem (art. 17, caput).

A previsão de ACORDO DE NÃO-PERSECUÇÃO PENAL (art. 18): os delitos cometidos sem violência
ou grave ameaça à pessoa, não sendo o caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor ao
investigado acordo de não-persecução penal, desde que este confesse formal e detalhadamente a prática
do delito e indique eventuais provas de seu cometimento, além de cumprir os seguintes requisitos, de
forma cumulativa ou não:

I – reparar o dano ou restituir a coisa à vítima;

II – renunciar voluntariamente a bens e direitos, de modo a gerar resultados práticos equivalentes


aos efeitos genéricos da condenação, nos termos e condições estabelecidos pelos arts. 91 e 92 do Código
Penal;

III – comunicar ao Ministério Público eventual mudança de endereço, número de telefone ou e-mail;

IV – prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena


mínima cominada ao delito, diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo Ministério Público;
V – pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Código Penal, a entidade
pública ou de interesse social a ser indicada pelo Ministério Público, devendo a prestação ser destinada
preferencialmente àquelas entidades que tenham como função proteger bens jurídicos iguais ou
semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito;

VI – cumprir outra condição estipulada pelo Ministério Público, desde que proporcional e
compatível com a infração penal aparentemente praticada.

REQUISITOS PARA O ACORDO DE NÃO-PERSECUÇÃO PENAL


Delito sem violência ou grave ameaça;
Confessar a prática do delito;
Indicar provas;
Reparar o dano;
Renunciar a bens e direitos;
Comunicar mudanças de endereço e dados;
Prestação de serviços à comunidade;
Prestação pecuniária;
Outras condições.

 É dever do investigado comprovar mensalmente o cumprimento das condições, independentemente


de notificação ou aviso prévio;

 O acordo poderá ser celebrado na audiência de custódia;

 Descumpridas quaisquer das condições estipuladas no acordo, o membro do Ministério Público


deverá, se for o caso, imediatamente oferecer denúncia;

 O descumprimento poderá ser utilizado como justificativa para o não-oferecimento de suspensão


condicional do processo;

 Cumprido integralmente o acordo, o Ministério Público promoverá o arquivamento da investigação,


o que vinculará toda a Instituição.

HIPÓTESES EM QUE NÃO CABE ACORDO DE NÃO-PERSECUÇÃO:


Quando couber transação penal;
Dano superior a 20 salários-mínimos (ou outro parâmetro definido pelo órgão de coordenação);
Ter condenação definitiva, por crime, a pena privativa de liberdade;
O agente ter feito transação penal nos últimos cinco anos;
Não indicarem os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos
e as circunstâncias, ser necessária e suficiente a adoção da medida;
O aguardo para o cumprimento do acordo possa acarretar a prescrição da pretensão punitiva estatal.

2. Críticas e defesas
Rogério Sanches Cunha defende o acordo de não-persecução, situando-como modalidade de justiça
consensuada e inspirada no plea bargaining de origem estadunidense. Nas palavras de Sanches Cunha:

“A definição de requisitos para a mitigação do princípio da obrigatoriedade da ação penal, por meio de uma
norma infralegal, equivale a legítima e salutar penetração das decisões valorativas político-criminais no
sistema do Direito Penal a que se refere Claus Roxin. Ao Ministério Público, titular exclusivo da ação penal,
é franqueado inegável protagonismo de agente definidor de políticas criminais, notadamente na fase
inquisitorial, sendo que o recorte efetuado pela resolução é absolutamente legítimo, sobretudo se
considerarmos o ciclo restrito de infrações que serão por ele alcançadas”.

No ponto, ele relembra que as audiências de custódia, por exemplo, também foram regulamentadas
por resolução do CNJ e os procedimentos de Verificação Preliminar de Informação (VPI) utilizados pela
Polícia Federal antes de instaurar inquérito.
Sua conclusão é de que, do ponto de vista da relação de custo-benefício, fruto da onda
consequencialista em que se encontra o direito atualmente, é muito mais vantajoso uma imediata decisão
negociada do que uma decisão proferida ao longo de anos, incapaz de “cumprir com as funções da pena” e
de “recompor o sentimento social de validade das normas”.
Jadel Silva, por outro lado, critica a Resolução, sustentando que “o CNMP não se reveste de
legitimidade para criar um novo modelo de processo penal, sem o respaldo de lei própria”.
Danni Silva, igualmente, critica a Resolução pelo fato de a norma admitir a aplicação de medidas
coercitivas, como a prestação de serviço e prestação pecuniária, alicerçados na mera confissão do
investigado. Para ela, “O “acordo de não-persecução” demonstra um inquestionável não exercício da ampla
defesa, que leva, subsequentemente, a renúncias ao contraditório e à ampla defesa. (...) A proposta do
CNMP implica em patente efeito impeditivo da punibilidade, aniquilando, no mérito, a pretensão punitiva
estatal, o que, não só exige mecanismos de controle interna corporis do Ministério Público, como também,
via função judicial anômala, a teor do art. 28 do Código de Processo Penal. Não existe violação aos primados
do nemo tenetur durante a confissão externada na prática do “acordo de não-persecução” pois, a defesa
abdica do silêncio, na busca pela atividade premial. Sobretudo, a manobra processual penal deve ser
regulamentada pela Lei e não por Resolução”.
A polêmica quanto à constitucionalidade da norma levou o MP/MG exarar recomendação conjunta
determinando aos órgãos de execução que se abstenham de celebrar acordos de não-persecução penal, até
que, em oportuna revisão da Resolução 181/2017 haja competente regulamentação das inovações previstas.
Outras unidades também recomendaram a não aplicação imediata. No entanto, ao que consta, o CNMP
determinou sua imediata observância: http://www.conjur.com.br/2017-set-29/mesmo-contrarios-regra-
mps-adotar-nao-persecucao-penal.
A OAB ingressou com a ADI 5793 contra a Resolução n. 181/2017 (https://jota.info/justica/oab-
quer-suspender-nao-indiciamento-de-investigados-13102017).
Os argumentos da OAB contra a resolução são:
 Violação ao princípio da legalidade, pois só lei poderia disciplinar o tema;
 Ao inovar em matéria processual penal, o CNMP teria usurpado a competência privativa da União;
 O acordo não é submetido à homologação do Poder Judiciário, de modo que é precário e suscetível
a questionamentos futuros, já que não há prévia submissão a esse crivo (“O tratamento dispensado
pela Resolução à matéria impede a apreciação de questões que são de competência jurisdicional
exclusiva, quais sejam: aferição de excludente de ilicitude, excludente de culpabilidade, extinção de
punibilidade e atipicidade”);
 O acordo é incompatível com o princípio da impessoalidade da Administração Pública, consagrado
no art. 37, caput, da Constituição Federal, permitir que o Ministério Público possa escolher quem ou
o que deverá investigar, sem a observância de parâmetros objetivos;
 No Estado republicano, não há espaço para discricionariedade em matéria de persecução criminal,
devendo a opção pela investigação direta ministerial ocorrer em circunstâncias específicas, que
justifiquem a dispensa do aparato policial.

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