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Psicanálise Somática Orgonômica∗

NICOLAU MALUF JÚNIOR.

10 de novembro de 2006

I-Uma questão que temos sempre presente na clínica e na formulação de uma teoria da clínica diz respeito à constituição
e organização daquilo que podemos chamar de unidade bio-psíquica. Nessa perspectiva, como definimos o que constitui
esse corpo e esse psiquismo é de importância fundamental. Se esse corpo que nos interessa é definido como hipo ou hiper-
tônico, se tem um desenvolvimento comprometido do ponto de vista embriológico, se há o registro de um desenvolvimento
neuro-muscular problemático e assim por diante. E também, se esse psiquismo é definido como mera auto- percepção, ou
produto da organização de diferentes centros e conexões nervosas, ou ainda consequência de recalcamentos e depositário
de conflitos inconscientes. De certa forma, cada escola de orientação psico- corporal elege dois aspectos relativos aos
dois domínios diferentes, vê a relação soma-psique de acordo com esses princípios e desenvolve uma metodologia clínica
própria. Todos os que estão familiarizados com os trabalhos de Reich sabem da ênfase que coloca na questão do núcleo
somático da neurose e da importância do manejo do caráter como forma organizada dos modos de defesa. Num momento
posterior de seu trabalho, Reich afirma que é secundário o manejo dos conteúdos psíquicos, a meta é a eliminação da
estase energética, e isso se daria através basicamente do lidar com as dinâmicas corporais. Mas o mesmo Reich, no A
função do orgasmo,(Reich,1942,1975) só para citar um exemplo, diz que quando uma couraça muscular não cede, deve-se
passar para a análise do caráter e vice-versa, observação que é frequentemente esquecida . Embora a orgonoterapia tenha
surgido da vegetoterapia e esta da análise do caráter, Reich não nos deixou uma metodologia que integrasse, de forma
coerente, a análise do caráter e a orgonoterapia. Estas seguem sendo metodologias paralelas, e como me ocupo desta
questão já há muitos anos, tenho minhas próprias conclusões a respeito do como dessa integração. Este trabalho, embora
não seja uma apresentação geral dessas conclusões, decorre desta preocupação, ou seja, o aperfeiçoamento cada vez maior
do nosso instrumental teórico e clínico.
II- Nem sempre os males do espírito foram vistos como separados dos males do corpo, como sabemos. Essa é uma aquisi-
ção relativamente recente, se pensarmos em termos históricos, a partir de Descartes, inaugurando o corpo como realidade
objetiva e conduzindo à separação entre corpo e mente. Mas, existe, todavia, uma doença, descrita há mais de 4.000anos,
e que parece não se curvar a todos os esforços diagnósticos e curativos da medicina: A histeria...aliás, é a histeria que vai
dar surgimento a uma outra e revolucionária forma de pensar o sofrimento humano: a psicanálise (Ávila,1997,pag.37).
A dicotomia mente-corpo entra em questão. Por outro lado, a posteriori,naquela que deveria ser uma disciplina que
enfocaria especificamente o fenômeno somato-psíquico, sutilmente desenvolve-se uma nova inversão: a noção de um
psiquismo que determina acontecimentos no somático, o corpo recebendo agora o status de acessório (Maluf jr. 1997)
Num artigo de 1921, A energia das pulsões, Reich(1921) define a natureza da pulsão como sendo a expressão motora do
prazer experimentado e com isso nos lembra mais uma vez que é a representação da pulsão que está no psiquismo, não
sua energia. Uma idéia não é ativa em si mesma, é necessário uma catexis de energia ligada à ela. Na neurose, portanto,
o recalcamento tem como correspondente processos somáticos de desvio e interrupção da expressão de impulsos ou ex-
citação corporal.O recalcamento não se dá sem a existência de mecanismos corporais com função semelhante. Não é um
fenômeno meramente psíquico. Por sua vez, a couraça muscular impede não só as correntes vegetativas, mas também
uma excitabilidade vegetativa que é característica da energia orgone em movimento, impedimento esse que afeta espe-
cificamente as funções auto- perceptivas. Sabemos que nas análises, a simples interpretação de conteúdo, sem a análise
∗ (originalmente publicado em “Reich Contemporâneo Perspectivas Clínicas e Sociais”. Rio de Janeiro: Sette Letras, 1998.)

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das resistências, leva à mera intelectualização. Por outro lado, encontramos pacientes que, estimulados, emocionam-se
fàcilmente, de uma maneira catártica e repetitiva, onde a pseudo- expressão emocional é substitutiva e está a serviço das
defesas.Voltemos à noção de caráter e à idéia de somatória organizada de modos de defesa. A especificação “organizada”
aponta aqui para o fato do caráter ter um funcionamento autônomo, que vai além da simples somatória das resistências, e
que tem a capacidade de manter o equilíbrio neurótico, economicamente falando, mesmo quando essas resistências, cor-
retamente reconhecidas, são atacadas de forma isolada. Por sua vez, somaticamente, de nada vale reconhecer a existência,
a localização e a função de uma couraça muscular, segundo uma concepção reichiana ou qualquer outra, se a sua função
restritiva como um todo não for abordada. À questão, então, do tipo de referencial que usamos na definição da natureza
da constituição da dimensão psíquica e do somático, e à questão do tipo de relação existente entre esse soma e esta psique,
segue-se a consideração de um funcionamento que é de conjunto, e, ainda, da relação que a parte guarda com o todo.
III- Como orgonomista de carteirinha, sempre admirei Freud. E, creio eu, pelos mesmos motivos que mantiveram esta
admiração em Reich, embora esta não o impedisse de questioná-lo( a Freud) e criticá-lo. Da mesma forma, Reich sempre
deixou claro como a orgonomia nasceu do estudo da vida emocional, numa ótica freudiana, e essa vinculação permanece
válida. Mas quero deixar claro desde logo que, especialmente com relação ‘a clínica, considero o instrumental psica-
nalítico, quando isolado, extremamente menor e insuficiente, quando comparado ao desenvolvimento da orgonoterapia
e orgonomia. Não que esta última seja, em si mesma, melhor, mais verdadeira, mas simplesmente porque, pela suas
próprias características, leva à inter-relação e amplia o leque de possibilidades(Maluf jr,1997). O termo psicanálise, no
título deste trabalho, advém do fato de ser parte importante no seu desenvolvimento a utilização das premissas freudia-
nas, em especial, a noção de incosciente. E, nesse sentido, acredito estar de acordo com a definição de Mezan de que,
psicanalíticas são todas as escolas de pensamento que adotam como verdadeira a hipótese de inconsciente como formu-
lada por Freud(Mezan, 1996, pag348). Portanto, é a aceitação da hipótese e sua utilização que são questões centrais e
definitivas, e não um setting particular e a concomitante utilização exclusiva do verbal como instrumento específico. Esta
explicação é necessária porque mesmo entre os reichianos mais ortodoxos existem discussões à respeito de quanto este
referencial continuava presente por volta do período orgonômico, e alguns entendem que não. Meu ponto de vista é que
nunca foi abandonado por Reich, seus escritos levando muitas vezes a confundir a explicitação e ênfase na pontuação
dos fenômenos orgonóticos, com ausência de interesse nos relacionais e transferenciais. Myron Sharaff, colaborador e
autor da mais completa biografia sobre Reich, e que foi também seu paciente, diz que este, no período citado, apesar de
cansado da psicanálise, nunca deixou de prestar considerável atenção aos traços de caráter. Sharaff relata uma ocasião em
que, após algumas interpretações, Reich teria dito: ’Você vê, este trabalho envolve muito mais do que espremer músculos.
Nos não somos contra a boa psicanálise”.(Sharaf,1993,pag.314).Mas, na visão de Sharaff, a impaciência então existente
em Reich com as técnicas verbais influía em sua capacidade como clínico. Mas o meu objetivo não é o de retornar ou
recuperar qualquer suposto desvio, e sim o de apresentar uma alternativa. Um novo caminho, com novas possibilidades.
Não substitui outros, acrescenta, especifica, como é típico quando da utilização do princípio orgonômico-funcional. Esse
caminho considera, na orgonoterapia, a diferença entre demanda de cura e desejo dela ( desejo de não sair da neurose), a
ótica do inconsciente, a dinâmica da transferência, a dimensão relacional do adoecer, e a existência de um sujeito. Mas
essa consideração se dá no campo das premissas Reichianas, ou seja, a base física e material da vida pulsional, a noção
de unidade bio-psíquica, o referencial orgonômico, etc... Como eixo central desse trabalho, e enfatizando a dimensão
da neurose, deixando, por enquanto outras categorias de lado, está a questão: É a retirada do recalque prioritariamente
um processo de conscientização, que levaria à uma mudança nos modos de mentalização? É a um processo meramente
psíquico que Freud faz referência quando diz; ali onde estava o id, estará o ego? A experiência clínica mostra que, além da
presença dos afetos, essencial é a vivência das excitações corporais correspondentes, uma experiência corporal específica,
um sentir-viver. Sem isso, é mera intelectualização. O paciente não está fundamentalmente impedido de “saber”, está
impedido de experenciar e saber. Uma vez isso alcançado, a mentalização alcança outro patamar.
A orgonoterapia entende a relação Soma-psique de uma maneira particular, como componentes de uma Unidade funcional.
Nessa concepção, soma e psique são variações de um princípio original que guardam entre si uma relação ao mesmo
tempo mutuamente excludente e complementar. Essa postulação traz como consequencia: 1-Existe necessariamente um
denominador comum entre soma e psique. 2-Essa relação tem essa característica, a de antagonismo-complementariedade.
3-Qualquer intervenção terapêutica, quando se dá de forma coerente com essa dinâmica, necessariamente atua sobre esses
dois domínios, mesmo quando a ênfase da intervenção é sobre um ou outro em especial.

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A vegetoterapia tem origem quando Reich, ao aprofundar o trabalho nas resistências de caráter, constata a existência
das correntes vegetativas e da excitação pre’- orgástica, e suas ansiedades específicas. Assim começa a compreensão do
contínuo soma-psique e aqui o conceito de genitalidade ganha sua base de confirmação fisiológica e biológica. Assim,
uma intervenção de base caractero-analítica definida, gera não só um fenômeno psíquico(retirada do recalque, qualidade
da transferência, alteração dos modos de resistência), mas também um acontecimento somático( correntes plasmáticas,
reações neuro-vegetativas, excitações corporais localizadas, et.), de acordo com o conhecido sobre o funcionamento or-
gonômico no vivo. É necessário repetir, para se ter clareza, que não é qualquer intervenção, no psiquismo ou no somático,
que trará repercussões também no domínio paralelo, e sim aquelas intervenções que se dão de acordo com o funcionalismo
energético descrito por Reich. A psicanálise somática orgonômica é apenas uma forma especial de aplicação das noções
da análise do caráter, agregando-se a ela o saber da orgonomia, fenômenos como: fluxos e excitação plasmática, direção
de fluxo, forma do orgonome, luminação etc..., um saber que era inexistente à época da formulação dos princípios da
análise do caráter. Essa junção, por sua vez, é feita de acordo com a noção de organização sistêmica de um ponto de vista
reichiano, isto é, oposição-complementaridade, qualidade psíquica - quantidade somática, alcance e predomínio tempo-
rário de um sub-sistema com relação ao conjunto, etc... Esta psicanálise somática, centrada na transferência e na análise
do caráter, transcende a condição do lidar com idéias, representações e conflitos inconscientes. Faz isso colocando ênfase
no desenvolvimento e percepção das excitações corporais decorrentes do desligamento de catexia vinculada à idéias, e da
vivência das correntes vegetativas surgidas a partir da diminuição da função defesa do caráter, numa espécie de circuito
auto-alimentado. A mesma intervenção pode, dependendo do momento vigente no processo, existir como interpretação
de resistência de caráter ao mesmo tempo em que afeta a função defesa somaticamente atuante, ou reintegrar conteúdos
anteriormente recalcados enquanto aumenta a capacidade de vivência das correntes plasmáticas. A atividade clínica do
prestar atenção à si mesmo, do contato, do discernir e definir as correntes vegetativas, é acompanhada, nos processos
associativos ou quando a transferência está em foco, de um fluxo de fantasias e vivências emocionais, fluxo esse que é
maior, mais intenso, mais organizado e mais abrangente do que quando é empregado o método analítico ou a aborda-
gem biofísica em separado ou com um tipo diferente de justaposição. É o desligamento e o fluir de novo de um certo
quantum de energia das idéias sob pressão que permite a transformação da personalidade. Isso quer dizer não só novas
cadeias associativas mas também um redirecionamento dessa energia.A condição de elaboração não é somente, portanto,
a de uma conscientização de afetos, impulsos e desejos, mas implica também numa capacidade aumentada do lidar com
as excitações corporais. Os processos de transformação de formas de mentalização, são, também, de transformação de
capacidade excitativa. E nesse sentido, essa capacidade, a de lidar com excitações, deixa de ser um problema relativo uni-
camente ao campo das psicoses ou das condições fronteiriças, para ter relevância geral. A relação soma - psique enfocada
desta forma dá especial atenção à idéia reichiana de que os primeiros registros mnésicos são registros de MOVIMENTO
no plasma corporal( Reich, 1949,1973,pag92) e de como é similar às idéias de Grodeck, a noção de que é a educação e
não a maturação QUE PROGRESSIVAMENTE ELIMINA DO ADULTO A CAPACIDADE DE CONTATO VEGETA-
TIVO(grodeck,1992,pag3). Assim, podemos explicitar bem a diferença entre um ego maduro que é capaz de lidar com
intensidades sensorias sem se deixar engolfar, e a noção, mais comumente aceita, de capacidade egóica e supressão de
intensidade e descarga de impulsos. A literatura psicanalítica está cheia de exemplos do segundo caso.
IV- O reconhecimento da existência das correntes vegetativas e sua importância para o esclarecimento e resolução de
questões clínicas e teóricas continua a ser um fator decisivo, principalmente no referente às noções de ligação, sublimação
e descarga. O fato de, no referencial reichiano, lidarmos com a noção de uma natureza física, material, das excitações
corporais, e o fato de sabermos que a noção de sexualidade psíquica não implica na de energia psíquica, é fundamental.
O não discernimento dessa diferença criou um impasse que resultou na formulação de uma hipotética pulsão de morte,
com consequências catastróficas para a clínica, como já examinado anteriormente por Reich. Apenas como ilustração, já
que neste trabalho procurei apontar para a possibilidade de utilização dos fenômenos orgonóticos durante o trabalho de
análise, vamos utilizar um longo, belo e minucioso estudo de caso, publicado por Freud, o do Homem dos Lobos. Neste,
especial relevância é dada a um sonho ocorrido na infância, sonho este que deu origem à uma fobia infantil que, posteri-
ormente, transformou-se em uma neurose obsessiva. Nele, o paciente vive a experiência de estar sendo olhado fixamente
por lobos que estão postados sobre uma árvore, e que o olham através da janela do seu quarto. O paciente acordou em
pânico. paralelamente, tem início a fobia. As associações que encaminharam a interpretação do sonho levaram Freud a
entender a imobilidade dos lobos no sonho como sendo uma referência a movimento, uma distorção do que teria sido a

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observação, por parte do paciente e quando com cerca de dois anos e meio, da cena primária e dos movimentos durante
a relação entre os pais. O pânico , por sua vez, é inicialmente entendido como uma espécie de rechaço de um desejo
homossexual.( Obviamente, nesta narrativa que faço aqui , há uma redução ao extremo de uma exposição rica em detalhes
e em complexidade). Um orgonomista poderia concluir: sim, a representação do movimento reconhecida na imobilidade
dos lobos é importante, e sua relação com o desejo,( homossexual ou não) também. Mas ele, o orgonomista, poderia
reconhecer a presença das correntes vegetativas ( representadas pela sua distorção, a imobilidade).Tomada dessa forma,
a cena dos lobos aponta para a presença da experiência corporal da própria criança como sendo também constituinte
daquilo que dá inicio à fobia. Como o próprio Freud menciona,...Tenho observado que, com frequência, a atenção das
crianças é mais facilmente captada pelo movimento do que pelas formas em repouso, e que as crianças baseiam se nesses
movimentos para fazer associações que nós, os adultos, não estabelecemos... (freud, 1981,pag.1990-). Não é difícil ver
aqui a relação existente entre a percepção dos movimentos no plasma corporal, como descreveu Reich, quando a criança
ainda mantém intacta essa capacidade, e essa capacidade associativa nas crianças. Desse modo, e de forma resumida é
claro, é possível pensar-se na vinculação entre o sonho dos lobos, as sensações de MOVIMENTO(correntes vegetativas)
no corpo, e o estabelecimento da patologia. Não é possível deixar de imaginar que curso seguiria o trabalho clínico com
o uso da abordagem somática, dado o fato que a fobia infantil deu origem a uma neurose obsessiva . Essa perspectiva, a
de imaginar como seria o curso do processo, torna-se possível pelo fato de Freud, como é habitual, nos fornecer um rico e
detalhado texto, num estilo hábil, entusiasmado e corajoso. Podemos assim ter uma idéia bastante precisa das dificuldades
que enfrentou naquilo que foi definido como uma neurose rebelde.Mas podemos também, examinando este relato, rea-
firmar a importância da utilização preferencial do modelo econômico, à maneira Reichiana, quando, neste mesmo relato,
Freud descreve a modificação de um sintoma somático( prisão de ventre crônica) ‘a partir de uma intervenção que leva
em consideração uma característica histérica do paciente.( Pag1982)Esse e outros momentos, em que uma intervenção
caractéro-analítica seria não só possível, como necessária , e de que uma intervenção biofísica era imprescindível, nos
leva a entender as repetidas dificuldades e a estagnação no processo clínico deste paciente de uma maneira diferente do
que, por exemplo, encontramos em Sherrine N. Borges, ao comentar o mesmo estudo de caso: “...Ao contrário do que se
esperava, a interpretação das recordações mais antigas, as da cena primária, não devolvia ao eu nenhum entendimento
que o movesse a ser racionalmente razoável, mantendo-se intratável e não sendo mais o aliado esperado. Se continu-
ava a ser verdadeiro que o eu podia responder adequadamente a alguma das exigências que a realidade da experiência
analítica lhe impunha, algo tinha que ser revisto em toda a estrutura do psiquismo. Esse impasse só seria superado
com a Segunda teoria pulsional quando o conflito psíquico aparecerá sob a forma de um novo dualismo pulsional, entre
as pulsões de vida e de morte...(Borges,1995,pag122-123). A verdadeira questão, isso sim, é: por que as intensidades
corporais são vividas como ameaçadoras nesta criança.
V- Dissemos antes que existe uma vinculação entre processos somáticos e psíquicos, e que uma intervenção feita de forma
coerente com a estrutura produz efeito nos dois domínios(soma-psique.). Assim, uma abordagem baseada em noções de
desenvolvimento psico-sexual e da organização do aparelho psíquico, mas também em noções de economia energética e
biofísica orgônica, amplia seu potencial de ação pelo simples fato de poder reconhecer a natureza e a organização das
produções somáticas advindas das intervenções no psiquismo( a excitabilidade vegetativa). Desta forma , percebe-se que,
no manejo da transferência, toda estruturação defensiva, de qualquer tipo ou ordem, origina-se à partir de um núcleo
básico, somático, o temor ‘a vivência orgástica, que psiquicamente manifesta-se como evitação de intensidades corporais
ou de sua percepção, quando existente. Na psicanálise somática de base orgonômica, a intervenção considera:
1-Conteúdos específicos e defesas específicas.
2-O caráter como concatenação de forças defensivas.
3-Aumento e direcionamento da excitabilidade vegetativa durante o trabalho analítico.
4- O desenvolvimento das correntes vegetativas e a ansiedade orgástica, que está na base de toda função defensiva. A
utilização da análise do caráter que dá ênfase à sua função ( a do caráter), que é a de evitar a vivência ou a percepção das
intensidades corporais, como é característico da psicanálise somática orgonômica, cria várias possibilidades:
1-A de uma intervenção direta na condição somática através do verbal, por ex., mudança de tonus muscular acompanhando
a abordagem de resistências, interpretação e fluxos vegetativos.
2- Em função de uma ênfase na auto- percepção ao longo do processo e do aumento da excitabilidade vegetativa, esta

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abordagem tem uma ação altamente organizadora das funções do ego e é especialmente útil ao lidar-se com condições
fronteiriças, sendo uma forma de intervenção não corporal no segmento ocular.
3-Pelos mesmos motivos, é eficaz nas fobias em geral e particularmente na chamada síndrome do pânico, onde a avaliação
clínica frequentemente confunde a ansiedade orgástica com a ansiedade de depressão.
A designação Psicanálise Somática Orgonômica aponta apenas para uma utilização específica de conceitos caractero-
analíticos e orgonômicos, não sendo de modo algum uma tentativa de criação de uma nova escola ou algo assim. Mas
os princípios e a noção de organização que orientam sua utilização fazem dela algo diferente da psicanálise, da psicosso-
mática psicanalítica, de psicoterapias corporais de base analítica etc. Também da análise do caráter e da orgonoterapia,
se vistos isoladamente. A utilização precisa de um referencial econômico energético, que prioriza a forma (função) em
relação ao conteúdo, mas não elimina sua importância, nos dá suporte para lidar com o âmago das funções defensivas, em
termos caracteriais ou somáticos, afastando a possibilidade de um psicologismo vazio ou a descarga motora que é defesa,
não expressão.

Referências
[1] Reich,W(1975). A função do orgasmo. São Paulo: Brasiliense.

Ávila, Laslo A.(1997) A Alma, o Corpo e a Psicanálise. Em Psicologia ,Ciência e profissão, n3.
Maluf jr, Nicolau j (1997).Orgonomia e Ciência Contemporânea. Arquivos Brasileiros de Psicologia.Vol.49, n.o2.UFRJ-
IMAGO- CNPQ.
Reich, W. (1921-1955) The Energetics of Drives. Orgonomic Medicine, vol 1 n.01.
Mezan, R.(1996).Paradigmas e modelos na psicanálise Atual. Em Psicanálise Hoje, Petrópolis, Editora Vozes.
Sharaf, M.(1993) Fury on Earth. New York. St. Martin,s Press /Marek.
Reich, W.(1973). Ether, God and Devil.New York, Farrar, Straus and Giroux.
Groddeck, G.(1992). Estudos Psicanalíticos Sobre Psicossomática. São Paulo, Editora Perspectiva.
Freud, S.(1914-1981). O Homem dos Lobos. Obras Completas, Tomo II, Espanha, Editorial Biblioteca Nueva.
Borges, Sherrine N.(1995). Metamorfoses do Corpo. Rio de janeiro, Editora Fiocruz.

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