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Histórias de Sucesso
EXPERIÊNCIAS EMPREENDEDORAS
ORGANIZADO POR MARA REGINA VEIT

Histórias
de Sucesso
EXPERIÊNCIAS EMPREENDEDORAS

BELO HORIZONTE - 2003


Copyright © 2003, SEBRAE – Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas

TODOS OS DIREITOS RESERVADOS – É permitida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por
qualquer meio, desde que divulgadas as fontes.

Este trabalho é resultado de uma parceria entre o SEBRAE/NA, SEBRAE/MG, SEBRAE/RJ, PUC-Rio, IBMEC-RJ

Coordenação Geral
Mara Regina Veit
Coordenação e Concepção do Projeto Desenvolvendo Casos de Sucesso

Supervisão
Cezar Kirszenblatt
Daniela Almeida Teixeira
Renata Barbosa de Araújo

Apoio
Carlos Magno Almeida Santos
Dennis de Castro Barros
Izabela Andrade Lima
Ludmila Pereira de Araújo
Murilo de Aquino Terra
Rosana Carla de Figueiredo
Sandro Servino
Sílvia Penna Chaves Lobato
Túlio César Cruz Portugal

Produção Editorial do Livro


Núcleo de Comunicação do Sebrae/MG

Produção Gráfica do Livro


Perfil Publicidade

Desenvolvimento do Site
Daniela Almeida Teixeira
bhs.com.br

Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas


SEBRAE
Armando Monteiro Neto, Presidente do Conselho Deliberativo Nacional
Silvano Gianni, Diretor-Presidente
Paulo Tarciso Okamotto, Diretor Administrativo-Financeiro
Luiz Carlos Barboza, Diretor Técnico

SEBRAE-MG
Luiz Carlos Dias Oliveira, Presidente do Conselho Deliberativo
Stalin Amorim Duarte, Diretor Superintendente
Luiz Márcio Haddad Pereira Santos, Diretor de Desenvolvimento e Administração
Sebastião Costa da Silva, Diretor de Comercialização e Articulação Regional

SEBRAE-RJ
Paulo Alcântara Gomes, Presidente do Conselho Deliberativo
Paulo Maurício Castelo Branco, Diretor Superintendente
Evandro Peçanha Alves, Diretor Técnico
Celina Vargas do Amaral Peixoto, Diretora Técnica
O projeto
O Projeto Desenvolvendo Casos de Sucesso foi criado para que histórias emocionantes de
empreendedores, que fizeram a diferença em sua comunidade, em suas empresas, em suas
instituições, possam ser conhecidas, disseminadas e potencializadas na construção de novos
horizontes empresariais.

O método
O livro Histórias de Sucesso foi concebido com o intuito de utilizar o método de estudo de
caso para estruturar as experiências do Sebrae, e também contribuir para a gestão do
conhecimento nas organizações, estimulando a produtividade e capacidade de inovação, de
modo a gerar empresas mais inteligentes e competitivas.

A Internet
A concepção do Projeto Estudo de Casos para o Portal Sebrae www.sebrae.com.br pretende
divulgar e ampliar o conhecimento das ações do Sebrae e facilitar para as instituições e
profissionais que atuam na rede de ensino, bem como instrutores, consultores e instituições
parceiras que integram a Rede Sebrae, um conteúdo didaticamente estruturado sobre
pequenas empresas, para ser utilizado nos cursos de graduação, pós-graduação, programas de
treinamento e consultoria realizado com alunos, empreendedores e empresários em todo o
País.

O Site dos Casos de Sucesso do Sebrae, foi concebido tendo como referência os modelos
utilizados por Babson College e Harvard Business School , com o diferencial de apresentar
vídeos, fotografias, artigos de jornal e fórum de discussão aos clientes cadastrados no site,
complementando o conteúdo didático de cada estudo de caso. O site também contempla um
manual de orientação para professores e alunos que indica como utilizar e aplicar um estudo
de caso em sala de aula para fins didáticos, além de possuir o espaço favoritos pessoais onde
os clientes poderão salvar, dentro do site do Sebrae, os casos de sucesso de seu maior
interesse

A Gestão do Conhecimento
A partir das 80 experiências empreendedoras de todo o país, contempladas na primeira etapa
do projeto – 2002/2003, serão inseridos em 2004 outros casos de estudo, estruturados na
mesma metodologia, compondo um significativo banco de dados sobre pequenas empresas.

Esta obra tem sido construída com participação e dedicação de vários profissionais, técnicos
do Sebrae, consultores e professores da academia de diversas instituições, com o objetivo de
oportunizar aos leitores estudar histórias reais e transferir este conteúdo para a gestão do
conhecimento de seus atuais e futuros empreendimentos.

Mara Regina Veit


Gerente de Atendimento e Tecnologia do Sebrae/MG, Coordenadora do Sebrae da Prioridade
Potencializar e Difundir as Experiências de Sucesso 2002/2003, Concepção do Projeto Desenvolvendo
Estudo de Casos e Organizadora do Livro Histórias de Sucesso – Experiências Empreendedoras.
Pedagoga, Pós-graduada:Treinamento Empresarial/PUCRS, Administração/ UFRGS, MBA/ Marketing-
FGV/Ohio, Mestranda Administração/FUMEC-MG, autora do livro Consultoria Interna - Use a rede de
inteligência que existe em sua empresa. Ed. Casa Qualidade - 1998.
NOVOS FRUTOS DO CERRADO
MATO GROSSO

INTRODUÇÃO

O distrito de Batovi pertence ao município de Tesouro, região


Sul do estado de Mato Grosso, distante 370 km da capital Cuiabá.
A vocação do distrito no fim do século XIX, era essencialmente mineradora.
A exploração do diamante, base de sustentação econômica que lhe
deu origem, entrou em decadência a partir de 1960.
O garimpo manual foi sendo substituído pelo mecanizado,
ocasionando problemas ambientais, além de reduzir o número de pessoas
empregadas na atividade garimpeira. Esses fatores fizeram com que, no
período de 1970 a 2002, o município sofresse um lento e contínuo
p rocesso de êxodo de pessoas, o que inclusive provocou o
desaparecimento de dois distritos vizinhos, Cassununga e Monchão
Dourado.
Mesmo diante dessas dificuldades, uma parcela significativa de ex-
garimpeiros e suas famílias não se afastou do município e continuou à
procura de outros meios de subsistência. Por volta do ano de 1997,
parte dessas famílias voltou-se para a agricultura, iniciando o plantio
do maracujá, motivadas pela iniciativa de produtores da vizinha cidade
de Poxoréo. Cerca de 40 famílias se uniram e formaram uma associação,
com o apoio do prefeito de Te s o u ro, Sr. Luis Fernando Marq u e s ,
agregando outros importantes parceiros para o fortalecimento dessa
atividade.

"Por falta de dinheiro, muita gente mudou daqui. Mudar para


uma cidade grande lhe traz problemas. Hoje, você encontra muita
gente que saiu daqui com problemas, e nós, que ficamos,
conseguimos reverter essa situação", disse Sr. João Evangelista,
Presidente da Associação de Produtores.
Elizabete Izidória de Amorim Ferreira, Líder da Agência do Sebrae Mato Grosso em
Rondonópolis, elaborou o estudo de caso sob a orientação de Helene Kleinberger Salim,
baseado no curso Desenvolvendo Casos de Sucesso, realizado pelo Sebrae, Ibmec-RJ e PUC-RJ.

HISTÓRIAS DE SUCESSO - EXPERIÊNCIAS EMPREENDEDORAS EDIÇÃO 2003


A COLHEITA DO SONHADO MARACUJÁ

HISTÓRIAS DE SUCESSO - EXPERIÊNCIAS EMPREENDEDORAS EDIÇÃO 2003

JOÃO EVANGELISTA, PRESIDENTE DA ASPRAB


E PRINCIPAL IDEALIZADOR DO PROJETO DA FÁBRICA
NOVOS FRUTOS DO CERRADO - MT 3

OS DIAMANTES NÃO SÃO ETERNOS

O s primeiros habitantes da região chegaram por volta de 1897,


atraídos pela notícia de que a terra era riquíssima em diamantes e ouro.
Em 1909, tornou-se intensa a abertura de novos garimpos e
Tesouro surgiu logo após, com crescente número de aventureiros, não
só de garimpo mas também de agricultura e criação de bovinos.
No período de 1909 a 1924, foram registradas intensas disputas
pelo poder econômico e político na região, o que não impedia o seu
crescimento, com a chegada de cada vez mais novos aventureiros. A
localidade experimentou décadas de progresso, o que possibilitou, na
década de 1940, a abertura de um campo de aviação e até os grandes
compradores de diamantes de Cuiabá e Rio de Janeiro passaram a
freqüentar Tesouro.
Ao mesmo tempo, sua população passou a usufruir de um meio
de transporte mais rápido. Alterações no status social de consumo
foram notadas. A memória de seus moradores insiste em referenciar
esse período como o de ouro da sua história.
Na época do Recenseamento Geral de 1950, a localidade de Tesouro
possuía na vila uma população de 1.002 pessoas. Batovi, que mais
tarde passou a ser distrito de Tesouro, contava com 688 habitantes e
Cassununga com 332 moradores.
A emancipação política de Tesouro, em 1953, foi reflexo, entre
outras coisas, de seu amadurecimento econômico. Refletiu que aquela
sociedade havia criado raízes e encontrado soluções para equacionar
a sobrevivência do município. Nessa época, a cidade contava com
3.523 habitantes, incluindo a população dos distritos de Batovi e Cassununga.
E n t retanto, poucos anos após sua emancipação política, o
município começou a vivenciar as primeiras crises na produção
diamantífera. Por outro lado, o sistema de trabalho implantado nos
garimpos, a forma de remuneração dos garimpeiros, o sistema de
compra e venda de diamantes e o contrabando não permitiram que os
garimpeiros acumulassem capitais. Uma expressão corriqueira da
época era:
Coordenação Técnica do Projeto: Dalila Jabar Torre do Vale, Iane Silva Thé Pontes, Israel de
Alencar Maranhão e Mariam Fujica Adachi Oliveira.

HISTÓRIAS DE SUCESSO - EXPERIÊNCIAS EMPREENDEDORAS EDIÇÃO 2003


NOVOS FRUTOS DO CERRADO - MT 4

"O diamante não gosta de quem é avarento; tem de gastar para


achar mais diamantes".

Sendo assim, à medida que os diamantes tornaram-se mais difíceis


de s e rem explorados, começava uma crise econômica, o que ficou
evidente a partir dos anos 60, por meio de um forte indicador: a migração
populacional.
POPULAÇÃO DE TESOURO – 1960 A 2000
HABITANTES TOTAL HOMENS MULHERES

1.960 6.395 3.448 2.927


1.970 5.796 3.039 2.757
1.980 3.693 2.039 1.654
1.990 4.548 2.482 2.026
2.000 3.130 1.684 1.446
Fonte: IBGE Censos Demográficos: Estado de Mato Grosso.
Entre as décadas de 1960 e 1980, o número da população do
município reduziu em quase 50%. Esse esvaziamento da cidade foi
originado pela combinação de diversos fatores: o enfraquecimento do
garimpo na região, o surgimento de novos garimpos no Estado, a
utilização de máquinas e implementos nas lavouras – reduzindo o
número de pessoas empregadas nessa atividade e não permitindo a
absorção da mão-de-obra liberada pelo garimpo.
Além de persistir cada vez em menor escala, o garimpo manual
aos poucos foi sendo substituído pelas dragas (garimpo mecanizado).
Nos anos 90, isso ficou bem evidenciado quando a população
experimentou um período de crescimento e depois voltou a decrescer
quando essa forma de extração também começou a não apresentar os
resultados esperados.
As histórias do município de Tesouro e do distrito de Batovi se
entrelaçam. Assim como na cidade, poucas alternativas restaram para
o seu povo. Mas o garimpo não acabou da noite para o dia. Mesmo
nas dificuldades, o povo do Batovi foi indo embora aos poucos.
Trinta anos se passaram desde a morte anunciada do garimpo na
década de 1960, até meados da década de 90. Em 1994, a crise chegou
ao seu auge, e os moradores do Batovi, que resistiam até então,
começaram a buscar formas alternativas de sobrevivência.
HISTÓRIAS DE SUCESSO - EXPERIÊNCIAS EMPREENDEDORAS EDIÇÃO 2003
NOVOS FRUTOS DO CERRADO - MT 5

"Em 94 tinha muita draga na região, mas foi acabando. Já não


havia mais condições. Então, surgiu a idéia de formar a
associação, na dificuldade que estava atravessando. Ti n h a m
acabado o Monchão Dourado e o Cassununga dos três distritos, o
único que estava faltando era o Batovi. Se não fosse a associação,
já teria acabado também", disse João Evangelista, ex-garimpeiro e
o presidente da associação.

DOCES MARACUJÁS

O recomeço...
Após todos esses anos sobrevivendo da exploração da terra, os
garimpeiros decidiram continuar retirando dela o seu sustento e da sua
família, mas, desta vez, de forma diferente. Decidiram tratar a terra de
outra forma, dedicando-se à agricultura, ou melhor, à fruticultura, uma
vez que no vizinho município de Poxoréo estava sendo desenvolvido
um grande projeto de plantio de maracujá.
Poxoréo tinha uma história parecida com a de Tesouro e Batovi:
remanescente do garimpo e com tipo de solo semelhante. Se o
maracujá estava dando certo lá, porque não em Batovi? A partir dessa
constatação, os garimpeiros uniram-se para enfrentar um novo desafio:
aprender a ser agricultor.
Nos meados de 1997, além de estarem iniciando uma nova
atividade, outra dificuldade foi superada: os agora agricultores não tinham
a terra para trabalhar. Encontraram ajuda na nova gestão da prefeitura
de Tesouro e, juntos, conseguiram apoio do governo do Estado. Para
iniciarem o plantio, o Estado entrou com a terra – 60 hectares – e a
prefeitura com a derrubada do cerrado. No início, cada família plantava
como podia, cada uma de acordo com os recursos de que dispunha.
Fizeram, então, com o apoio do Sr. Altair, então responsável pelo
escritório local da EMPAER – Empresa Matogrossense de Pesquisa
Agropecuária e Extensão Rural, um projeto com o governo do Estado
no qual reivindicaram e conseguiram, por meio da Associação,
HISTÓRIAS DE SUCESSO - EXPERIÊNCIAS EMPREENDEDORAS EDIÇÃO 2003
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recursos para financiar a estruturação da lavoura, arame, postes, um


motor e um reservatório de água.
Os lotes de plantio foram divididos entre as famílias, que inicialmente
eram 17. Em 1998, todas as famílias estavam plantando em lotes próprios
e esperavam a primeira safra do sonhado maracujá.
A partir daí, além do cuidado diário com a plantação, os pro d u t o re s
começaram a ter outras preocupações: Vender para quem? Como? Se
não possuíam nem uma carroça para puxar a produção!

“E AGORA, JOÃO?”

C omeçou, então, um novo ciclo, o da colheita. Os frutos, que


antes os garimpeiros tinham de revirar a terra para encontrar, passaram
a brotar das finas hastes e das lindas flores dos pés de maracujá.
Entretanto, quando tudo parecia estar dando certo, um novo golpe do
destino: superando todas as previsões de produtividade, deu tanto
maracujá, tanto, que muito se perdeu. Nem os porcos e as galinhas
conseguiram comer tanto maracujá. Pela inexperiência na comercialização,
falta de estrutura e veículo, em 1999, perderam-se 100 toneladas do
maracujá plantado em 1998.

"No primeiro ano, esse povo que entrou no maracujá, entrou,


porque tavam assim no sofrimento mais triste, já porque os
garimpos tavam ruim, aí eles não tinham um meio de ganhar a
vida e enfrentaram o maracujá, e aí começou. No primeiro ano,
deu muito maracujá, mas o prejuízo foi pior, porque eles entraram
nesse negócio e não tinham um carro, não tinham condições, não
tinham comprador. Aí, eles perderam muito maracujá... Depois,
arrumaram um caminhãozinho velho, que toda vez que ia
(a Cuiabá) levava uma multa, mas ainda vendiam uns poucos de
maracujá", disse Dona Angélica, 70 anos, chefe de família.
O chamado povo do maracujá percorreu o caminho em busca de
uma vida melhor, mas bastante duro e cheio de percalços. Houve

HISTÓRIAS DE SUCESSO - EXPERIÊNCIAS EMPREENDEDORAS EDIÇÃO 2003


NOVOS FRUTOS DO CERRADO - MT 7

muita produção, muito ânimo, quando acreditavam que tudo ia dar


certo. Tiveram também momentos de desânimo coletivo, de vontade
de largar tudo. Mas persistiram em busca de um lugar ao sol.

O CONVITE!

E
m 1999, o município era um dos mais carentes do Estado,
possuindo baixo IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) e, por
esse motivo, foi indicado pela Coordenação Executiva Estadual do
Programa Comunidade Ativa 1 e pela Coordenação Estadual do
Programa Sebrae de Desenvolvimento Local a ser um dos três
municípios a integrar a fase piloto do DLIS – Desenvolvimento Local
Integrado e Sustentável, juntamente com o Proder Especial.
O passo inicial foi a mobilização e a sensibilização, atividades
desenvolvidas pelo Sebrae/MT e PROSOL – Fundação de Promoção
Social de Mato Grosso, com a ajuda da prefeitura municipal. Para essa
etapa, foram convidadas toda a sociedade e entidades civis
representativas. Entre os convidados, participantes desde a primeira
reunião, o pessoal da ASPRAB – Associação dos Produtores Rurais de
Batovi.
Dessa reunião em diante, a associação de produtores passou a ter
o apoio de todas as entidades da cidade, pois as dificuldades por que
passavam tornaram-se problemas de todos, tornando a associação mais
integrada com a comunidade.

1
Vide www.sebrae.com.br.

HISTÓRIAS DE SUCESSO - EXPERIÊNCIAS EMPREENDEDORAS EDIÇÃO 2003


NOVOS FRUTOS DO CERRADO - MT 8

MARACUJÁ NA CABEÇA!

C omeçou então uma nova jornada em busca da capacitação dos


agricultores de Batovi. Uma das primeiras atividades foi uma palestra
abordando o tema associativismo, com a finalidade de reforçar a
importância de continuarem lutando juntos, pois assim seriam mais
fortes para superar outros desafios.
Outra ação que reforçou os trabalhos da associação foi a
designação de um gestor da própria cidade para auxiliar a identificação
e a implantação de melhorias e manter comunicação constante e
rápida com os parceiros, a fim de que as ações corretivas fossem
executadas o quanto antes.
Apesar do desejo e da crença em um futuro melhor, algumas
famílias deixaram o distrito de Batovi e o plantio do maracujá, porque
não tinham condições de aguardar o tempo em que o maracujá daria
retorno financeiro. Com a finalidade de mantê-los juntos, foi dada
continuidade às ações de associativismo, para evidenciar que unidos
poderiam alcançar mais rapidamente um futuro melhor.
No início de 2000, todos os integrantes da associação participaram
da elaboração de um documento em que ficaram registradas as
dificuldades pelas quais vinha passando a entidade, gerando idéias
para sanar essas dificuldades. Nesse momento, estavam presentes além
do Sebrae, a Prefeitura e a EMPAER.
Uma das propostas foi a de visitação a um local que já tivesse
passado pelo processo de implantação da atividade de fruticultura e em
condições semelhantes às de Batovi, e assim foi organizada uma visita
técnica ao pólo de fruticultura em Petrolina/PE, em agosto de 2000.
Estiveram presentes, nessa visita, 26 produtores de maracujá. O
principal objetivo dessa jornada técnica foi verificar, comparar e trazer
para Batovi os métodos utilizados no manejo do maracujá e de outras
frutas, pois os produtores já estavam pensando em diversificar o
plantio, utilizando a terra de espaçamento entre os pés de maracujá, e
assim trouxeram, dessa viagem, algumas mudas de goiaba.
Das safras colhidas até o ano de 2000, praticamente todo o volume
comercializado foi do produto in natura. A fama da plantação de
maracujá em Batovi chegou longe. A Maguary, grande produtor de
HISTÓRIAS DE SUCESSO - EXPERIÊNCIAS EMPREENDEDORAS EDIÇÃO 2003
NOVOS FRUTOS DO CERRADO - MT 9

sucos no Brasil, contatou a associação e passou a adquirir os seus


frutos, mas somente os que atendessem às suas exigências de qualidade.
Os frutos que não estavam conforme o tamanho especificado eram
comercializados nos supermercados da capital Cuiabá, e de
Rondonópolis – maior centro consumidor mais próximo. Mesmo com
essa comercialização, ainda havia um alto índice de desperdício, pois
a associação dependia do comprador para levar os frutos da lavoura.
Portanto, quando não aparecia comprador, havia perda de produção.
Uma alternativa utilizada para amenizar essa situação foi a de
arranjar um caminhão e ir vender os frutos diretamente na feira livre
em Cuiabá. Essas viagens ficaram caras e eram perigosas, em virtude
do estado de conservação do caminhão utilizado, mas eles optaram
por correr o risco, e lá vendiam todo o maracujá que conseguiam
carregar.

"TUDO VALE A PENA SE A ALMA NÃO É PEQUENA"

M esmo de forma precária, os agricultores e suas famílias


começaram a produzir a polpa do maracujá. Utilizando-se de métodos
artesanais, separavam as sementes da polpa, acondicionavam em
garrafas de refrigerantes de 2 litros re a p roveitadas e guardavam para
venda ou consumo próprio em refrigeradores comuns.
Tudo era feito de forma comunitária. O espaço para a despolpa
era uma palhoça de pau-a-pique, e faziam uma escala para utilização,
assim como para a única despolpadeira manual. A balança e a seladora
manual também eram utilizadas de forma comunitária, quando as
polpas eram acondicionadas em sacolas transparentes de 100g. Até
então, o produto in natura ou em polpa não possuía identidade nem
marca própria.
Já pensando na safra de 2000, foi realizada, em Cuiabá, uma
pesquisa sobre o consumo do maracujá e sua polpa, que sinalizou a
demanda do produto na capital do Estado. Os grandes supermercados
e atacadistas de frutas também foram visitados, a fim de conhecerem o

HISTÓRIAS DE SUCESSO - EXPERIÊNCIAS EMPREENDEDORAS EDIÇÃO 2003


NOVOS FRUTOS DO CERRADO - MT 10

produto e a capacidade de fornecimento dos fruticultores de Batovi.


Diante dos baixos valores pagos pelo maracujá in natura, seja pelo
seu tamanho ou por não possuirem veículo, os ex-garimpeiros
começaram a vislumbrar novos horizontes para a sua produção e, com
apoio e assessoria dos parceiros envolvidos, traçaram novos e
audaciosos planos.
As novas metas passaram a ser: construir uma pequena fábrica de
polpa de frutas, adquirir um caminhão para a associação, fazer o
transporte dos frutos in natura que atendessem às exigências dos
consumidores e também comprar um caminhão frigorífico, para o
transporte das polpas. Para transformar esses sonhos em realidade, a
Associação dos Produtores Rurais de Batovi apresentou dois projetos
de financiamento, um ao FUNDEI – Fundo de Desenvolvimento
Industrial de Mato Grosso, referente à fábrica de beneficiamento da
polpa, e outro, para os caminhões, ao PADIC – Programa de Apoio
Direto às Iniciativas Comunitárias.
O projeto da fábrica foi entregue à Secretaria de Indústria e
Comércio do Estado de Mato Grosso, responsável pela análise e
aprovação das propostas de financiamento, em agosto de 2000. E
apostando na liberação desses recursos, começou toda a mobilização
para a instalação da pequena indústria:
• A Prefeitura doou a área e bancou a construção do prédio.
• A PROSOL adquiriu parte dos equipamentos necessários.
• O Sebrae trouxe um especialista para orientar no dimensionamento
e suporte na aquisição das máquinas.
A proposta para a aquisição dos caminhões foi para a Secretaria
Estadual de Agricultura do Estado de Mato Grosso, com financiamento
concedido em junho de 2002.

FOI DIA DE FESTA!

B atovi amanheceu em festa no dia 8 de junho de 2002. Depois


de uma longa espera, ajustes, negociações, pedidos e até pressões,
nesse dia, foi inaugurada a tão sonhada fábrica, com direito a nome e
HISTÓRIAS DE SUCESSO - EXPERIÊNCIAS EMPREENDEDORAS EDIÇÃO 2003
NOVOS FRUTOS DO CERRADO - MT 11

tudo: FRUTOVI , FRU - de fruta e TOVI – de Batovi, a querida terra que


essas corajosas e gratas famílias não quiseram abandonar.
Foi um dia inesquecível! Muitas autoridades, povo chegando de
avião, povo chegando de carrão, e teve muito, muito suco, de
maracujá, é claro! Mas o bonito foi ver o chamado povo do maracujá
fazendo a pose para a foto, em frente à fábrica. Uma grande fileira na
frente, agachados e abraçados e outra grande fileira em pé, também
abraçados, um ao lado do outro, igual pose de time de futebol, só
que aquele time estava tirando a foto depois do jogo, e a cara de
felicidade deles? Só vendo!

MAS TUDO CONTINUOU DANDO CERTO?

N ão! A obra da pequena indústria foi entregue com diversos


p roblemas: piso desnivelado, parede empenada, deficiências na
instalação elétrica, e isso fez com que a fábrica não tivesse condições
de receber autorização da vigilância sanitária para funcionar. E lá foram
eles outra vez. Fizeram o que puderam, chamaram os parceiros,
pediram ajuda. O Sebrae/MT enviou alguém para levantar e
acompanhar as adequações que a construtora fez na obra. O SENAI
também foi procurado e, utilizando da sua experiência junto às
indústrias, providenciou as adequações para a liberação da vigilância
sanitária. A prefeitura cobrou providências imediatas por parte da
construtora. E, enquanto isso, grandes clientes esperavam para ser
atendidos com a polpa do maracujá de Batovi.
Mas, para uma comunidade que passou por tanto sofrimento, não
foi isso que os desanimou. Essa brava gente brasileira, sobrevivente e
lutadora por dias melhores, possuia fé, e se a fé removeu montanhas,
é claro que também consertou a fábrica.
A importância da fábrica reside em dois pontos: a diminuição e
quase total eliminação do desperdício, e a agregação de valor ao fruto,
uma vez que o quilograma do maracujá in natura era vendido por
R$ 0,20, enquanto que a polpa valia R$ 1,30. Em média, eram
HISTÓRIAS DE SUCESSO - EXPERIÊNCIAS EMPREENDEDORAS EDIÇÃO 2003
NOVOS FRUTOS DO CERRADO - MT 12

necessários 4kg de maracujá para a produção de 1kg de polpa.


A aceitação dos maracujás de Batovi, pelas grandes indústrias de
produção de suco natural, é devida ao seu grau de docilidade, ou seja,
um maracujá menos ácido que os demais. Enquanto a espécie de
maracujá plantado atinge os graus 8 e 9 de docilidade em outras
regiões, em Batovi, esses graus passam dos 12 e 13.
Após a superação de muitas dificuldades, em dezembro de 2002,
os produtores preparavam-se para comercializar a polpa do maracujá,
negociando com grandes compradores, inclusive de outros Estados.
Outro benefício relevante que o maracujá trouxe para Batovi foi a
fixação das famílias que hoje trabalham nessa lavoura. Uma média de
quatro pessoas por família, sendo 60 famílias envolvidas com a nova
atividade, aproximadamente 240 pessoas que não foram embora do
distrito. Se isso não tivesse ocorrido, com certeza Batovi teria o mesmo
destino dos distritos vizinhos de Cassununga e Monchão Dourado, a
completa extinção.
Para o funcionamento da fábrica, que possui capacidade de
beneficiamento de 10.000 kg por mês, houve a necessidade de comprar
frutas produzidas nos municípios vizinhos – Guiratinga, Poxoréo,
Campo Verde, Dom Aquino, o que iniciou uma onda de fortalecimento
das associações de produtores rurais desses municípios. A exemplo da
ASPRAB, formou-se uma associação de costureiras em Tesouro, que
possuía 18 máquinas industriais em dezembro de 2002 e recebeu
consultoria técnica do Sebrae/MT e do SENAI.

ENFIM, JUNTOS E FELIZES

C om o aumento da produção, a comercialização seria


direcionada a partir de 2003 para as regiões Centro-Oeste e Norte do
país, atendendo aos estados de Goiás, Tocantins, Rondônia e Acre.
Essa perspectiva estimulou outros produtores a ingressarem na
associação, fortalecendo ainda mais a ASPRAB.
O surgimento da indústria resgatou outras atividades da comunidade,
HISTÓRIAS DE SUCESSO - EXPERIÊNCIAS EMPREENDEDORAS EDIÇÃO 2003
NOVOS FRUTOS DO CERRADO - MT 13

exemplo: produção de doces, licores e compotas. O aspecto cultural


também foi reavivado e as pessoas passaram a participar e a organizar
os eventos da comunidade, festas culturais, promoções, festivais de
praia e oficinas culturais.
No estado de Mato Grosso esse exemplo de articulação de parcerias
em função do desenvolvimento de uma comunidade foi inédita.
Não havia registro de um grupo participante do DLIS, com tamanha
capacidade de se articular, cobrar e formar parcerias para a criação de
uma indústria associativista. Os componentes da Associação de Produtores,
juntamente com os membros gestores do DLIS – capacitados pela
FUNDAPER – Fundação de Amparo à Pesquisa, Assistência Técnica e
Extensão Rural de Mato Grosso, articularam parcerias com os governos
federal, estadual e municipal nos aspectos financeiros, tecnológicos e
sociais para a realização dessa ação.
Com os esforços dos parceiros envolvidos, a FRUTOVI – Indústria
de Polpas de Batovi – adquiriu equipamentos de alta tecnologia, inclusive
computador de última geração. Para a comunidade local, esse foi o
primeiro contato com equipamentos tão modernos, o que significou
motivo de orgulho, para todos.
A principal atividade econômica do distrito do Batovi tinha sido o
garimpo, o que provocou intensa degradação ao meio ambiente. A
mudança para a atividade agrícola foi também uma alternativa para a
manutenção da belíssima paisagem local, característica desse distrito.
Além do aspecto ambiental, essa atividade econômica também
teve reflexo na população mais jovem, que passou a auxiliar seus pais
na lavoura e a demonstrar intenções de continuar morando lá.
A inclusão social foi evidenciada por meio do avanço das
atividades econômicas da comunidade, que passou de garimpeiros
para agricultores e depois industriais, protagonistas do próprio destino.

HISTÓRIAS DE SUCESSO - EXPERIÊNCIAS EMPREENDEDORAS EDIÇÃO 2003


NOVOS FRUTOS DO CERRADO - MT 14

CONCLUSÃO

IMPACTOS DA FÁBRICA DE POLPAS


DE MARACUJÁ NO DISTRITO DE BATOVI
ANTES DA DEPOIS DA
ITEM
FÁBRICA FÁBRICA
Hectares plantados/maracujá 30 60
Índice de desperdício na lavoura 40% Zero
Número de compradores 2 6
Número de caminhões Zero 2
Valor total do investimento - R$ 120,000.00
na fábrica
Número de pessoas que Zero 11
trabalham na fábrica
Ganho por família (média) R$ 50,00 R$ 200,00*
Tipos de frutas plantadas 1 (Maracujá) 2 (Maracujá e Goiaba)
Fonte: ASPRAB – Associação dos Produtores Rurais de Batovi – agosto 2002.
* Com a fábrica operando a 100% da sua capacidade, a expectativa de ganho por família é de
R$ 400,00.

A s ações desenvolvidas em Tesouro e Batovi, neste caso, enfocando


especificamente a fábrica de polpas, comprovaram que existem pessoas
capazes de tomar iniciativas, assumir responsabilidades e alavancar
recursos da própria sociedade para realizar projetos inovadore s .
O movimento de transformação da realidade pelo qual passou
Batovi serviu de exemplo para as comunidades próximas, que
passaram também a buscar em seu próprio meio, alternativas para
resolver seus problemas.
Neste imenso país, degradado por atividades exploratórias, Batovi
não é o único exemplo, mas certamente servirá de inspiração para
alguém, esteja onde estiver, que inconformado com o direcionamento
do destino, também mude a sua realidade. Basta acreditar.

HISTÓRIAS DE SUCESSO - EXPERIÊNCIAS EMPREENDEDORAS EDIÇÃO 2003


NOVOS FRUTOS DO CERRADO - MT 15

PONTOS PARA DISCUSSÃO

• Temos um problema de requalificação profissional. Será que as


pessoas estão motivadas e conscientes de que essa necessidade
existe em todas as profissões? Quais seriam as alternativas se não a
requalificação profissional? Até que ponto a mudança de emprego
ou de cidade interferiria nessa situação?

• O subsídio de entidades assistenciais ajudaria o processo de


implantação das pequenas iniciativas empresariais?

• Quando esse subsídio acabar, como se administraria o impacto dessa


falta com os beneficiários?

• Por que alguns grupos tendem a permanecer mais tempo juntos do


que outros? O que os diferem dos grupos que se afastam na
ocorrência das primeiras adversidades?

Diretoria Executiva do Sebrae Mato Grosso (2002): Eneida Maria de Oliveira, José Guilherme
Barbosa Ribeiro e Leide Garcia Novaes Katayama.

Agradecimentos:
Blairo Borges Maggi - Governador do Estado de Mato Grosso; Dalila Jabar Torre do Vale -
Líder da Unidade de Desenvolvimento Local Sebrae/MT; EMPAER - Empresa Matogrossense de
Pesquisa, Assistência e Extenção Rural; Eneida Maria de Oliveira - Diretora Administrativa do
Sebrae/MT; Francivone Bezerra da Costa Bíscaro - Técnica da Agência Sebrae Rondonópolis;
Girleno Gomes Moreira - Técnico da Agência Sebrae Rondonópolis; Guilherme Luiz Teixeira
Alves - Líder da Unidade de Desenvolvimento Setorial Sebrae/MT; Iane Silva The Pontes -
Técnica da Unidade de Desenvolvimento Local Sebrae/MT; Israel de Alencar Maranhão -
Técnico da Unidade de Desenvolvimento Setorial do Sebrae/MT; Jandir José Milan - Pre s i d e n t e
do Conselho Deliberativo Sebrae/MT; João Evangelista de Souza - Presidente da Associação
dos Produtores Rurais de Batovi; José Guilherme Barbosa Ribeiro - Diretor Superintendente
do Sebrae/MT; José Valdir Santiago Júnior - Líder da Unidade de Tecnologia Sebrae/MT; Keila
Beatriz de Morais - Estagiária da Agência Sebrae Rondonópolis; Leide Garcia Novaes
Katayama - Diretora Técnica do Sebrae/MT; Márcia Regina Silva Gebara - Presidente da
PROSOL; Mariam Fujica Adachi Oliveira - Líder da Prioridade Potencializar e Difundir
Experiências de Sucesso - Sebrae/MT; Prefeitura Municipal de Tesouro e SENAI - Serviço
Nacional de Aprendizagem Industrial.

HISTÓRIAS DE SUCESSO - EXPERIÊNCIAS EMPREENDEDORAS EDIÇÃO 2003

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