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FACULDADE GUILHERME GUIMBALA

KALEBE SALES VIEIRA


JOÃO VITOR HECHT
MAYKON DUTRA
DÉBORA DOS SANTOS

EXERCÍCIO DA MENTE E DO CORPO:


PSICOLOGIA EM ARTES MARCIAIS

JOINVILLE
2017
KALEBE SALES VIEIRA
JOÃO VITOR HECHT
MAYKON DUTRA
DÉBORA DOS SANTOS

EXERCÍCIO DA MENTE E DO CORPO:


PSICOLOGIA EM ARTES MARCIAIS

Trabalho apresentado na Faculdade Guilherme


Guimbala como requisito para a matéria
Atividades Integrativas II, no segundo ano do
curso de Psicologia sob orientação do professor
Allan Gomes.

JOINVILLE
2017
RESUMO

Neste trabalho, pesquisamos os impactos aos aspectos psicossociais as práticas da


arte marcial Wing Chun têm no sujeito. Wing chun é uma arte marcial chinesa que
visa o controle sob seu corpo juntamente com sua mente, ele traz para o praticante
a arte de meditar, trabalhando questões tanto mental como física, tentando sempre
causar o maior impacto com a menor força possível. Utilizando o método de
entrevista com transcrição do áudio para melhor análise e separação de dados
obtidos com o instrutor e seus alunos, analisaremos em nossa pesquisa as
mudanças psicossociais que houve nos praticantes à longo prazo, resultados
chamaram atenção surgindo uma média em todos entrevistados sobre corpo e
mente, sempre ligando um ao outro e seu impacto no cotidiano. Técnicas como o
chamado ‘’sparring’’ utilizado não somente na arte marcial Wing chun, mas em
outras também com outro termo, trabalham a mente em situações de adrenalina ao
corpo, focando em acalmar a mente e juntamente acalmar o corpo, para maior
raciocínio em situações extremas e não deixar-se levar pelo emocional. Notamos
ligações fortes entre tais treinos a situações como uma entrevista de emprego ou
apresentação de trabalho, relatado pelos entrevistados, o ‘’sparring’’ pode remeter a
situações do cotidiano ajudando o sujeito a manter o equilíbrio de seu nervosismo, já
que ele trabalha a mente em situação de desconforto ou stress. A meditação e as
práticas marciais são a chave que em meio a essa pesquisa para possível abertura
de portas para outros estudos.
INTRODUÇÃO

Antes da constituição da psicologia já havia muitas formas de saberes sobre o ser


humano através de várias disciplinas como filosofia e religião. Essas duas vertentes
de pensamento foram grandes influenciadoras do modo de viver do ocidente,
através dos dogmas cristãos e a filosofia greco-romana. Até hoje houve pouca troca
cultural entre o ocidente e o oriente que por muito tempo viveu um tanto à parte de
toda a evolução da sociedade ocidental, práticas difundidas em sua cultura como a
meditação e as artes marciais hoje tem pouco espaço dentro da comunidade
científica, porém são muito influentes no estilo de vida oriental.

O Wing Chun é uma arte marcial chinesa que inicia por volta de 1733, se diferindo
das demais pela economia de movimentos, sendo um sistema de defesa pessoal.
Há momentos de meditação silenciosa e práticas com movimentos lentos e
contemplativos, mas também treinamentos de força, rapidez, resistência física,
alongamentos, mobilidade do corpo, exercícios isométricos, e mesmo combates
corpo a corpo1. Um dos mais famosos alunos da arte é o cineasta Bruce Lee, aluno
de Yip Man (um dos mais experientes mestres de Wing Chun da história, a quem foi
inspirada a trilogia O Grande Mestre).

O princípio básico do Wing Chun é utilizar a força do agressor contra o mesmo, onde
a defesa já funciona como ataque e vice-versa2. Algumas características da prática
seriam utilizar de movimentos simples, curtos e rápidos, e focar os ataques em
pontos vitais e áreas sensíveis, baseados na linha central (uma linha que começa na
parte central superior da cabeça e viaja pelo centro do tronco até chegar às partes
“baixas” do corpo. É considerada uma região vulnerável da nossa estrutura, devendo
ser protegida o tempo todo3).

1
n: http://www.cebb.org.br/grupo-de-wing-chun-arte-marcial-em-joinville-participe/
2
In: https://pt.wikipedia.org/wiki/Wing_Chun
3
In: http://pt.wikihow.com/Aprender-Wing-Chun
A prática da meditação tem sua origem nas filosofias espirituais do Oriente, mas
somente a partir da década de 60 o movimento de trazer essa cultura oriental para
solos do Ocidente tomou forma. Assim, juntamente com o maior interesse da
população em conhecer e praticar a meditação a ciência começa a realizar
pesquisas acerca da prática. Segundo Halsh & Shapiro (2006), citado por Menezes
& Dell’aglio, (2009):

“Desde então, uma das áreas de maior interface com a meditação e as


filosofias relacionadas é a psicologia. A meditação já foi bastante referida e
estudada por psicanalistas como Erich Fromm e Karen Horney, sendo
associada e comparada à escuta flutuante que o psicanalista deve ter.
Também foi tema de estudo de Jung, o qual acreditava que a meditação era
uma das formas de o sujeito acessar imagens arquetípicas; de Perls, que
enfatizou a importância do aqui-e-agora. É também considerada pela
abordagem transpessoal uma poderosa ferramenta para atingir outros
níveis de consciência.”

Com base nos materiais científicos coletados, a meditação é dividida em dois


métodos principais: a meditação concentrativa (quando o foco da atenção é sobre
um único elemento, por exemplo, a respiração, um mantra ou algum som. Está
relacionada às funções de orientação e monitoramento) e a meditação mindfulness
(sem que nenhum tipo de elaboração ou julgamento sejam utilizados, a experiência
do momento presente é aceita de maneira agradável e bondosa, acolhendo-a. Está
ligada ao estado de alerta). Alguns autores consideram a existência de um terceiro
método, a meditação contemplativa, algo como uma meditação em conjunto, com
uma integração de habilidades dos outros dois métodos.

Seguindo a base epistemológica da psicologia cognitiva e comportamental, a


meditação caracteriza-se na interpretação e reflexão dos fatos do nosso cotidiano,
dando uma importância maior do que os próprios fatos em si. Também é descrita
como uma forma de treinamento mental no qual se busca educar e policiar a psique
ou mente humana. Conforme estudos, Bishop et al (2004) nos apresenta a diferença
entre terapia e meditação:
“A diferença, contudo, é que, na prática da meditação, os conteúdos que
emergem à consciência não devem ser confrontados ou elaborados
intencionalmente, apenas observados, de forma que a prática se transforme
em um aprendizado de como não deixar influenciar-se pelos mesmos e
compreendê-los como fluxos mentais.”

Segundo estudos, foi observado que a prática da meditação pode auxiliar na


redução de pensamentos distrativos, ligada totalmente ao treino de focalização do
cérebro. Reduz e ajuda no controle do estresse, como também está associada à
diminuição da ansiedade. Conclui-se que através da meditação é possível atingir um
estado de hipometabolismo basal (quantidade calórica necessária para o organismo
manter-se vivo) ao mesmo tempo em que a mente se mantém alerta, desenvolvendo
a capacidade de ter controle sob determinadas funções fisiológicas. Além de
mudanças fisiológicas, a meditação também produz mudanças estruturais sobre a
plasticidade do cérebro, influenciando o cotidiano em geral e memórias, como de
trabalho ou escola. Segundo Carter (2005) e Slagter (2007), citados por Menezes &
Dell’aglio (2009):

“Estudos utilizando tarefas comportamentais mostraram que o treino da


meditação pode modular mecanismos atencionais e aumentar a capacidade
do processamento de informação mediante um maior controle da
distribuição dos recursos mentais.”

Segundo uma pesquisa realizada por Menezes e Dell’aglio (2009) com pessoas que
praticam a meditação há mais de um ano, foi realizada a seguinte pergunta: “como a
meditação reflete em sua vida?”. Basicamente foram especificadas seis principais
dimensões influenciadas pela prática: a cognição (maior autoconhecimento, clareza
e compreensão de si e das coisas, maior capacidade de atenção e concentração,
objetividade), o emocional (aumento de tranquilidade, paz, equilíbrio emocional,
redução do estresse e ansiedade, bem-estar e qualidade de vida, além de mais
autoestima e segurança), o físico (relaxamento do corpo e melhor qualidade do sono
e da saúde em geral), o social (aspectos interpessoais, como maior aceitação dos
outros e sensação de pertença a um grupo) e o espiritual (aspectos de ordem
superior, como um sentimento de conexão com algo maior, aproximação de Deus e
equilíbrio espiritual). Os centros de meditação comumente oferecem atividades
complementares, como retiros e palestras, a fim de que o praticante tenha uma
maior compreensão dos preceitos que sustentam a prática de meditação As
respostas obtidas na pergunta aberta sobre como percebem a meditação intervindo
em suas vidas, indica que os praticantes experimentam e mantêm a prática
meditativa por sentirem uma série de resultados positivos, que abrangem diferentes
âmbitos de sua vida

Após observar-se essa relação entre meditação e aspectos psicológicos positivos,


muitos autores a concebem como uma técnica útil para tratamentos psicoterápicos.
Acreditam que a meditação e outras técnicas orientais e de relaxamento também
vêm sendo utilizadas em sistemas de saúde de alguns países, como Nova Zelândia.

Apesar de já existir um campo no conhecimento psicológico acerca da meditação


não há um mesmo arcabouço teórico para os efeitos de exercícios físicos, muito
menos para as artes marciais. Porém já se tem conhecimento sobre alguns dos
efeitos psicológicos advindos da ativação fisiológica. Costa et al. (2007)
considerando a depressão como “tristeza, baixa da autoestima, pessimismo,
pensamentos negativos recorrentes, desesperança e desespero [...] associada a
uma alta incapacidade e perda social”, denota que existem diversas teorias sobre
como o exercício físico pode auxiliar no alivio dos sintomas depressivos. Algumas
hipóteses de como a atividade física age sobre a ansiedade e depressão são a de
secreção de endorfina, causando um estado de euforia natural; A regulação dos
neurotransmissores de noradrenalina e serotonina, que aliviam os sintomas da
depressão e a hipótese cognitiva, de natureza psicológica, onde os exercícios
sustentados por longos períodos ou intensivamente melhorariam a imagem de si
mesmo, melhorando a autoestima. As pesquisas indicam que o exercício físico pode
ser uma terapia adjuvante altamente benéfica a psicoterapia e prescrição
medicamentosa já estabelecida para o tratamento da depressão. Além de seus
benefícios fisiológicos, a atividade física também acarreta benefícios psicológicos
como: “melhor sensação de bem estar, humor e autoestima, assim como, redução
da ansiedade, tensão e depressão”.
Estudos sobre relações interpessoais apontam que uma ativação fisiológica
desencadeia uma atribuição cognitiva, dando sentido ao sentimento do indivíduo
com base nos fatores externos a sua volta. Esses pressupostos deram origem a
teoria da atribuição enviesada indicando que “diferentes níveis de excitação
provocam nas pessoas diferentes reações emocionais, consoante as designações
cognitivas elaboradas para cada situação” Cotton (1981), Foster et al. (1998) apud
Rodrigues & Garcia-Marques (2005).

Rodrigues & Garcia-Marques (2005) realizaram um estudo com indivíduos do sexo


feminino para averiguar a relação entre a ativação fisiológica advinda de um
exercício físico e um possível aumento na atração geral ou romântica sentida. O
experimento foi executado separando as mulheres, estudantes de psicologia entre
18 e 31 anos, em quatro grupos, onde dois apresentaram o nível de atração sentida
por um indivíduo apresentado em um vídeo de cinquenta segundos após ativação
fisiológica descendo escadas no campus universitário, um grupo imediatamente
após o exercício e o outro três minutos depois após outro filme apresentado. Os
outros dois grupos também preencheram a escala de atração sentida pelo mesmo
indivíduo apresentado em vídeo, mas sem a ativação fisiológica anterior, tanto
imediatamente como também após o filme de três minutos. Os resultados do
experimento mostraram que as mulheres que passaram por ativação fisiológica
tiveram um nível de atração superior ao dos outros grupos, apesar das diferenças
não serem muito significativas estatisticamente, os autores argumentam que há
muitos fatores que podem ter afetado as resposta das entrevistadas, como o fato da
maioria delas já estar em um relacionamento amoroso, não se sentirem a vontade
em expressar atração amorosa por alguém que conheceu através de um breve
vídeo e a subjetividade do que é considerado atraente para cada um. O problema
que o presente trabalho pretende resolver é fornecer um melhor entendimento de
como essas práticas podem afetar a vida de um sujeito emocionalmente,
socialmente e culturalmente.

Ao decorrer do século XX, principalmente após a Segunda Guerra Mundial, Duarte


(1994) discorre sobre como o conceito de doença mental, que surgiu com o
dualismo entre corpo e mente cartesiano, começa a assumir suas formas
contemporâneas, uma psicológica e a outra sociológica. A primeira foi instruída
principalmente pelo desenvolvimento da psicanálise, uma teoria que não considera a
realidade humana completamente estrita ao corpo, dando espaço para uma alma
que pode sofrer perturbações psíquicas, psicológicas, inconscientes, etc. A segunda
forma, surge da crítica social contra a crescente desigualdade gerada pelo
desenvolvimento do industrialismo e capitalismo, logo se procura subordinar as
perturbações da mente a um condicionamento social de nossas experiências
pessoais. Mais recentemente, se junta essas duas perspectivas em uma luta contra
o reducionismo biomédico, surgindo então o distúrbio ou aflição psicossocial.

A justificativa é de adquirir conhecimento sobre os mais diversos aspectos que


constituem a humanidade, principalmente quando se diz respeito a práticas que até
hoje estão inseridas em nosso meio. Atualmente oriente e ocidente efetuam trocas
de informações sobre seus mais diversos aspectos, são muitos os meios de
deslocação e comunicação que permitem essa troca, trocas que podem gerar
diferentes manifestações subjetivas na sociedade. Este projeto de pesquisa tem a
intenção de abrir espaço para novas discussões acerca de um estudo que se
propaga pelo conhecimento empírico, com a possibilidade de descobrir novas
formas de auxiliar a terapia, que veem o corpo mais como um todo.

Nossa hipótese é de que a meditação e a prática de artes marciais são ótimas


reguladoras do corpo, promovendo ao sujeito um melhor entendimento e
consequentemente relação com o mesmo, fato esse que irá refletir em outros
aspectos da vida do sujeito, melhor entendimento e relação com seu trabalho, com
sua família, com seus sentimentos, enfim, um melhor entendimento e relação com a
vida.

METODOLOGIA

O presente artigo tem por objetivo Investigar aspectos psicossociais presentes nas
práticas da arte marcial de Wing Chun no Centro de Estudos Budistas Bodisatva
(CEBB) com o instrutor e seus alunos. A investigação será conduzida através da
Observação das aulas de Wing Chun na CEBB, entrevistar com o instrutor e seus
alunos de como as práticas da CEBB afetaram suas relações interpessoais, para
então comparar os dados levantados com a pesquisa bibliográfica, adquirindo um
melhor entendimento da harmonia entre a mente e o corpo e construir conhecimento
científico acerca da cultura oriental.

O seguinte projeto visa efetuar uma pesquisa qualitativa, que segundo Minayo
(2002) se preocupa com uma realidade que não pode ser quantificada, “ela trabalha
com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o
que corresponde a um espaço mais profundo das relações”. Com dois alunos de
Wing Chun no Centro de Estudos Budistas Bodisatva (CEBB) e seu instrutor, a
coleta de dados será feita através de uma observação das aulas seguido de uma
entrevista em pautas que será gravada e transcrita para melhor entendimento dos
aspectos psicossociais de cada indivíduo que participar da pesquisa. A análise dos
dados então será executada mediante a observação das experiências em campo
sem interferência dos pesquisadores comparado à pesquisa bibliográfica. Serão no
fim identificados e separados através dos áudios transcritos das entrevistas as
relações entre o tempo que se pratica e como afetou suas emoções e relações
sociais. Espera-se como resultado adquirir conhecimento científico acerca da
meditação e da prática de artes marciais, como também um melhor entendimento de
como essas práticas afetam os aspectos psicossociais de um sujeito.

RESULTADOS

A partir da análise dos dados levantados durante as entrevistas foi-se notado as


contribuições que a prática de sparring tem no aumento da percepção e controle
emocional, segundo Stiller (2014) pode-se definir sparring como uma forma de
treinamento sob a tutela de um treinador ou mediador experiente com o objetivo de
melhorar suas técnicas, habilidades e condição física. Uma metodologia de
treinamento presente em diversas práticas de artes marciais, composta de uma
forma livre de combate, em que o maior objetivo é colocar na prática as teorias e
técnicas aprendidas anteriormente. Pode ser nomeado também como “treino
preparatório”, pois a prática será exercida sobre as regras e condutas de um tutor
mais experiente, em que seu papel não é ser um adversário ou oponente e sim uma
ferramenta de aperfeiçoamento das técnicas transmitidas aos seus alunos. Como
explica S3: “Os dois estão profundamente conectados, e atuam como um”.
Conforme nos apropriamos das entrevistas, percebemos o quanto a palavra sparring
está presente em todas as narrativas coletadas. Ambos os participantes praticam o
Wing Chun e o sparring há mais de um ano. Segundo S3: “Como faço muito
sparring, não só no Wing Chun, mas principalmente em outras artes marciais, vejo
que o corpo reflete o estado que a mente se encontra”. O sparring tende a ser um
momento mais tenso e que exige de maior atenção, concentração e esforço
cognitivo, pois será nesse processo em que o sensei exigirá de seu aprendiz as
técnicas e movimentos aprendidos em uma situação de combate, incorporando a
teoria ao sistema fisiológico e cognitivo.

Conforme cita S2: “A mente é como se fosse a raiz, se você trabalha a mente,
aprende a lidar com o restante”. Em um momento de tensão como tende a ocorrer
no sparring, o praticante é estimulado através da meditação (que ocorre antes e
depois do treino físico) a obter o máximo de relaxamento, para que, no momento da
prática, possa executar seus movimentos com o máximo de leveza e precisão.
Segundo CARTER (2005) e SLAGTER (2007) “o treino da meditação pode modular
mecanismos atencionais e aumentar a capacidade do processamento de informação
mediante um maior controle da distribuição dos recursos mentais”.

Sabendo que o Wing Chun segue uma linha de “economia de movimentos” (o


máximo de relaxamento, para nos golpes, exigir o mínimo de energia com o máximo
de impacto e eficiência), na prática do sparring o praticante tende a desenvolver uma
percepção mais aflorada e abrangente do que se passa ao seu redor, para que no
momento correto possa desferir seu golpe precisamente. Como citou S1: “Você vai
ter que cultivar esse relaxamento, também por exigir muita minúcia nos movimentos,
exige uma atenção maior, precisa desenvolver uma capacidade de concentração
para pode seguir”, relacionando-se com a pesquisa aplicada por Menezes e
Dell’Aglio (2009) em que participantes mostram o quanto a cognição é influenciada

Outro ponto importante também levantado pelos entrevistados foi a influência das
práticas nas relações sociais, todos os entrevistados relacionaram melhorias em
suas relações sociais com as práticas da CEBB, principalmente do Wing Chun. S1:
“Melhora em todos os âmbitos, relação com o namorado ou namorada, relações com
os amigos e a família e tudo”. Relataram diminuição de ansiedade. S2: “Eu perdi um
pouco o medo de falar o que eu estou sentindo, estou começando a perder esse
medo”. Também foi relatado aumento da autoestima. S3: “Me sinto mais confiante,
com um olhar mais amplo do que tinha antes”. Essas informações dialogam com
estudos de Costa et al. (2007) onde a depressão, transtorno que pode ser
“associada a uma alta incapacidade e perda social” pode ser tratado através das
ativações fisiológicas do exercício físico assim como também proporcionar sensação
de bem-estar, humor e autoestima.

Os entrevistados denotam que se exige um relaxamento para ter a coordenação


motora e detalhamento do corpo que são necessários para as técnicas do Wing
Chun serem eficientes. S1: “Pode-se perceber que o relaxamento depende de um
fator mental, um relaxamento da mente. Você vai ter que cultivar esse relaxamento”.
O relaxamento durante a execução das técnicas segundo os entrevistados é um
fator que gera mais força para o golpe, uma potência que é desencadeada apenas
pelo relaxamento. S2: “O ponto importante do Wing Chun não é a força física e sim o
relaxamento, [...] justamente pra causar o máximo de impacto com o mínimo de
energia”.

Também se nota a partir das entrevistas como as práticas podem diminuir a tensão
e a ansiedade, trazendo um relaxamento através das expressões emocionais do
corpo manifestados durante as práticas que estabelecem uma relação mais íntima
dos sujeitos com o que sentem. S1: “Posso perceber que eu como por ansiedade, se
estou mais relaxado com a mente um pouco mais estável, como porque tenho a
necessidade física de me alimentar”. É mencionado também como não só as
práticas como o budismo ao todo auxiliou na relação intrapessoal. S2: “Eu sempre
fui um cara que controlava minha irritação, controlava, de segurar, de reter, o
budismo me ajudou a não reter, a soltar. [...] Não me preocupar com isso. [...]
Acolher acho que é o termo correto, [...] É lidar, observar”. Conforme pesquisa feita
por Braga et al. (2016) a ansiedade que está associada ao aumento da frequência
respiratória pode ser regulada através de técnicas de respiração e meditação, que
podem mudar a dominância de pessoas estressadas e ansiosas em ativação
simpática para a parassimpática, que controlam sintomas de ansiedade. Costa et al.
(2007) também denota a capacidade dos exercícios físicos de trazerem benefícios
psicológicos como “redução da ansiedade, tensão e depressão”.

A atenção também é um aspecto importante nas práticas, segundo os entrevistados.


S1: “O shamata, um método específico de treinamento da atenção, [...] observa o
universo interno, desenvolve nossa atenção, podemos observar com minúcia o que
surge de nossos pensamentos e emoções mais detalhadamente, através do silêncio
e de ficar parado, vemos aquilo que se move”. A prática do Wing Chun necessita de
um grau de atenção e concentração que exige muito mentalmente, práticas que
fermentam a atenção são importantes para a eficiência das técnicas S1: “pessoas
que tem dificuldade, um déficit de atenção, tem dificuldade de aprender inicialmente,
porém com a prática elas vão melhorando sua atenção”. O método shamata de
meditação também é conhecido como mindfulness, que segundo Menezes &
Dell’aglio, (2009) é onde nenhum tipo de elaboração ou julgamento é utilizado, a
experiência do momento presente é aceita de maneira agradável e bondosa,
acolhendo-a enquanto ligada ao estado de alerta.

A atenção e o relaxamento se mostram importantes para as melhorias nas relações.


S1: “Quando você oferece pro outro a atenção, você oferece algo que é precioso,
quando você consegue oferecer sua atenção você muda sua relação com o outro”.
Estudos de Santos et al. (2015) discutem sobre a importância da atenção
compartilhada no desenvolvimento da linguagem, comunicação e engajamento
social como também da cognição social. S1: “Vejo isso com minha própria mãe se
estou mais relaxado e estável, por mais que ela esteja perturbada, eu consigo
oferecer isso para ela, oferecer meu relaxamento, minha estabilidade, minha
atenção para ela, isso ajuda muito ela sem ser necessário dizer uma palavra”. O
entrevistado fala que através das expressões emocionais que tem durante as
práticas aprendeu a desenvolver um maior controle emocional em outras situações
para além da luta S1: “Aprendi a desenvolver o gatilho de como relaxar, como lidar
com aquilo no meio da raiva, na hora que alguém te agride. Na luta fisicamente
como também pode ser verbalmente, fora de uma luta, as emoções que surgem são
similares”.
É possível afirmar com bases na leitura de Taisen Deshimaru (2013), como na
entrevista em si, que o entrevistado notou melhoras nas suas relações sociais, pois
ao praticar a meditação através do combate, ele abandona o seu ‘’ego’’, e caminha
para a autodescoberta de sua mente, junto ao cosmos e Buda, pois tudo esta ligado
no universo. Zen significa o esforço do homem na pratica da meditação, o zazen.

A junção da mente e o corpo, o exterior e o interior, são filosofias e estudos antigos


do oriente, e que formam uma unidade. Uma mudança irá influenciar nas próprias
ações e as relações ao seu arredor, ou seja, toda essa pratica faz alcançar a mente
absoluta, abandonando o egoísmo. O entrevistado pratica o shamata, que serve
para aperfeiçoar a atenção e desta forma ele afirma que quando oferece atenção
para alguma pessoa ou grupo, resulta em mudança na sua relação com o outro.

Essa mudança de comportamento faz com que ocorra um movimento dialético, pois
acontecem transformações significativas no contexto social. O entrevistado
encontrou um gatilho para manter-se relaxado quando fica com raiva, angustiado,
tudo isso é possível por causa da luta e dos treinos, já que os sentimentos durante a
luta se assemelham fora dela, então ele consegue ter esse controle, bloqueando
essas vibrações ruins que possam a vir tirar sua tranquilidade e manter o equilíbrio
mental e físico.

Por fim em comum entre os entrevistados foi a relação do mindfulness ou shamata


com a compaixão, a palavra shamata advém da linguagem Páli, idioma de origem
budista, que significa “recordar-se continuamente do objeto de atenção”. Segundo
Souza (2016) ainda não existe um consenso para a tradução da palavra, sendo
utilizada na maioria das vezes para designar uma “atenção plena”. A palavra pode
ser utilizada tanto para referir-se a um processo psicológico, quanto a um conjunto
de técnicas e práticas meditativas. Desta forma, podemos definir com mais clareza a
atenção plena como uma prática que integra diversos aspectos fisiológicos, em que
a atenção do sujeito é direcionada de forma intencional ao momento presente, sem
estarem presas ao passado ou a pensamentos futuros, com uma ação de aceitação,
concentração e receptividade.
Conforme S2 nos declara: “Não tenho que ficar te agradando, se realmente algo te
incomodou, desculpa, não foi minha intenção, mas cara, eu não vou ficar me
preocupando com o seu ego ferido.”, com a descaracterização dos atos como
positivos ou negativos, o mindfulness tem a intenção de admitir que o sofrimento é
parte constituinte da vida, aceitando a dor de modo que seja a única maneira de
transformar algo insuportável passível de ser tolerada. Dessa forma, o indivíduo
atinge um nível de consciência elevado sobre determinada dificuldade, de modo que
quando confrontado a ela, não age irracionalmente ou de maneira subordinada,
observando de forma mais ampla o contexto em geral (Souza, 2016). Ainda S2
completa: “Eu sempre fui um cara que controlava minha irritação, controlava, de
segurar, de reter, o budismo me ajudou a não reter, a soltar, o que eu quero dizer,
não soltar simplesmente de ir pra cima e brigar, mas soltar, não me preocupar com
isso”.

Neff (2003), com base na literatura budista, definiu compaixão como um estado de
espírito compreensivo ao sofrimento do próximo, de modo que você compreende a
dor e desperta um desejo de cuidar ou aliviar o determinado sofrimento. A religião
budista tem seus princípios fundamentadas na compaixão e no amor ao próximo, de
modo que você transmita paz e sossego a qualquer ambiente ou situação que você
tenha de enfrentar. Juntando as práticas meditativas fundamentas nos princípios
budistas e as artes marciais, os praticantes desenvolvem uma auto percepção com
menos julgamentos e mais compreensão, o que reflete em potencial no momento da
luta. Segundo S1: “Através da luta, é possível perceber quais são as suas
expressões, teus impulsos e como eles se seguem, sua raiva, seu medo, como se
fosse uma leitura de sua vida”.

Porém, para desenvolver-se um sentimento de compaixão para com os outros, é


indispensável um estado de consciência aberto e acolhedor de nós mesmos, que
podemos definir como autocompaixão. Segundo Gilbert (2006), autocompaixão diz
respeito a despertar sentimentos de cuidado e bondade para conosco próprios,
tomando uma atitude mais compreensiva perante nossas experiências. Podemos
alinhar com a declaração de S3, que explica: “Tanto em compaixão com o outro,
quanto em habilidade de notar sutilezas no comportamento em mim e nos meus
arredores”.

Podemos então constatar que a influência da cultura budista, pela questão empática
e harmoniosa, associada a prática do estado de mindfulness, em que a percepção é
abrangida de modo que aceitamos as coisas como elas são, tende a desenvolver
nos praticantes um sentimento de acolhimento frente aos seus problemas e
problemas dos outros. S1 reforça que: “Começamos a ficar mais atentos, então
cuidamos mais dos outros, desenvolve mais compaixão, pois começamos a observar
mais os outros, seus obstáculos”.

CONCLUSÃO

O presente trabalho abordou temas que envolvem a luta marcial, meditação,


psicologia e a relação dialética entre elas. Com a saída em campo, é possível
afirmar mediante entrevistas que a meditação trouxe benefícios na vida desses
sujeitos de forma abrangente socialmente, mediante aperfeiçoamento da atenção e
compreensão com seu semelhante. Desta forma o wing chun nos mostra os
aspectos psicossociais que se estabelecem nessa prática milenar do oriente e a
contribuição da troca cultural, atravessando o tempo e os povos. Mediante
conclusão, consideramos de suma importância o estudo realizado, os
conhecimentos adquiridos e compartilhados no âmbito acadêmico, pois a psicologia
visa a promoção da saúde e as relações sociais constituídas e como esses
movimentos acontecem e se entrelaçam.
REFERÊNCIAS

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