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Camilo Ferreira Botelho Castelo Branco, filho ilegítimo de Joaquim Botelho e de

Jacinta Maria, nasce em Lisboa, a 16 de março de 1825.

A biografia de Camilo é uma novela camiliana. A sua vida é uma sucessão de


acontecimentos trágicos: com um ano e meio de idade perde a mãe e, aos dez, o
pai. De início, vive o estigma da ilegitimidade e orfandade – temas recorrentes
em toda a sua obra.

É enviado, então, com a irmã mais velha, para morar em Vila Real (Trás-os-
Montes) com a tia paterna, Rita Emília, que lhe conta histórias de seu tio Simão
Botelho, que será o herói de Amor de Perdição. Depois passa a viver com a irmã
mais velha em Vilarinho da Samardã (freguesia do concelho de Vila Real) e estuda
latim e textos religiosos com o cunhado da irmã, o padre António de Azevedo.

Aos 16 anos casa-se com uma aldeã de quinze anos, Joaquina Pereira de França,
e passa morar com ela e com o sogro em Friúme (lugar conhecido também por
Ribeira da Pena). Continua os estudos com os padres das aldeias por onde passou.
Aprende francês, lê os clássicos gregos e latinos, os portugueses, além de muita
literatura católica. É um grande observador da vida e dos hábitos do povo das
serras, das gentes simples de Trás-os-Montes, o que se pode observar nos seus
romances e novelas. Participou episodicamente em restos de guerrilhas
miguelistas.

Abandonou a esposa e filha (Rosa), indo para o Porto, onde se matriculou no curso
de Medicina. Contudo, deixa a faculdade dois anos depois; em seguida matricula-
se em Direito, curso que também acaba por abandonar.

Mas foi no Porto que começou sua aventureira e tormentosa vida amorosa; o seu
drama pessoal. Aos 21 anos, foge de Vila Real para o Porto com uma outra jovem
Patrícia Emília, órfã e prima. Camilo é acusado de bigamia, é condenado e passa
algum tempo preso.

Em 1847 morre sua esposa, Joaquina Pereira; no ano seguinte, morre sua filha
Rosa; nesse mesmo ano, Patrícia Emília tem uma filha.

A partir de 1848, fixa residência no Porto e passa a fazer parte das tertúlias
literárias. É um rapaz impulsivo, escreve para os jornais e envolve-se
constantemente em campos de duelo (ferido) por amores e por rixas literárias.
Por esse tempo passa a fazer parte de círculos literários como autor de peças
teatrais e surgem aí as suas primeiras novelas, sob a forma de folhetins, nos
jornais O Nacional e O Eco Popular.
Nessa ocasião, envolve-se com uma freira, a jovem Isabel Cândido Moura, que
lhe educará a filha Bernardina Amélia, nascida em 1847, da sua relação com
Patrícia Emília; depois passa a viver com uma humilde costureira; tem
envolvimento com a poetiza – Maria de Felicidade do Couto Browne – e outros
casos com mulheres da sociedade.

Finalmente, o seu grande envolvimento amoroso é com Ana Plácido, mas, por
imposição paterna, esta casa-se com um rico comerciante “brasileiro” que
regressa de viagem (Manuel Pinheiro Alves), o que origina em Camilo uma
profunda depressão e aversão a figuras de portugueses enriquecidos no Brasil que
regressavam sem cultura nem princípios morais, como ele os caricatura em muitas
das suas novelas, apresentando-os como figuras grotescas.

Tal crise desencadeia nele, da mesma forma que o faria no coração de seus heróis,
uma “vocação” religiosa. Passa dois anos (1850 – 1852) num seminário do Porto,
à imitação do infeliz Eurico, o Presbítero de Alexandre Herculano, pretendendo ser
padre. Nesse tempo, escreve artigos para jornais absolutistas e clericais.

Seis anos depois, já é novelista reconhecido pelo público e pela crítica. Ana Plácido
deixa o marido para viver com o amante, o que era nesse tempo um escândalo
passível de ação judiciária. O escândalo traz notoriedade a Camilo. O casal,
perseguido pela justiça, passa algum tempo fugitivo, escondendo-se em vários
lugares, até que os dois amantes se veem forçados a entregar-se à prisão (Ana
em maio e Camilo em outubro). Acusados de adultério, ambos, são remetidos
para a Cadeia de Relação do Porto.

O cárcere durou um ano e dezasseis dias, período em que recebe a visita do rei
D. Pedro V. Aí, Camilo ocupou o tempo a escrever, entre outros escritos, num
momento psicológico de alta tensão trágica, em 15 dias, o Amor de Perdição
(1862).

Julgados em tribunal, foram absolvidos do processo porque o marido de Ana


Plácido morre e, portanto, termina o crime de adultério. Passam a viver juntos,
finalmente.

O resto é suplício de um homem que se torna forçado a produzir por encomendas.


É o escritor mais lido de Portugal.

Em 1864, transfere-se para São Miguel de Seide, para uma quinta da propriedade
do filho de Ana Plácido, mulher com quem viveu até seus últimos dias. O
isolamento é quebrado somente por curtas ausências, sendo as mais longas no
Porto.
Esta vida em comum não é pacífica e muitos dramas a tornam lúgubre: nesse
tempo já apresentava sinais de doença. O seu estado de saúde agravou-se em
1867, o que não o impediu de produzir dezenas de obras. Os factos trágicos
pareciam não lhe dar descanso: a morte de Manuel Plácido, com 19 anos (que
nascera em 1858 e que se pensa ser filho de Camilo, apesar de nessa altura Ana
Plácido viver ainda com o marido); a loucura do filho Jorge (possivelmente seria
esquizofrénico); a vida boémia do filho Nuno.

Numa atitude tipicamente romântica, pondo em prática, por exemplo, um plano


disparatado para raptar uma jovem herdeira rica, que casará com Nuno, à maneira
dos heróis das suas novelas (1881). A jovem acaba por morrer três anos mais
tarde, de tuberculose, assim como a filha que entretanto nascera, continuando
Nuno a sua vida de leviandade. Este é expulso de casa, depois de uma briga.

As dificuldades financeiras obrigam Camilo a vender, em leilão, a sua preciosa


biblioteca – 5.000 volumes minuciosamente escolhidos, reunidos ao longo de
quarenta anos. Camilo tenta obter o título de visconde (assim como Garrett e
Castilho) e faz o possível para que Nuno também possa usufruir desse título, na
esperança que isso o ajude a mudar de vida. Essa luta pelo título nobiliárquico
desenrola-se de 1870 a 1885, sendo-lhe finalmente concedido o ambicionado
título (e ao filho dois anos depois).

Enfim, o casamento do escritor com Ana Plácido ocorre em 9 de março de 1888.


Como se todo aquele sofrimento não bastasse, Camilo já estava quase cego, em
consequência de uma sífilis crónica, mas o escritor nutria esperanças, ainda, de
voltar a ver. Depois de ser consultado, em casa, o médico comunica que a cegueira
é irreversível, e enquanto Ana Plácido acompanha o doutor até a porta, Camilo
suicida-se com um tiro no ouvido direito, assim, acabava o mais importante e
prestigiado escritor do ultrarromantismo em Portugal, exatamente, às 15h15 do
dia 1º de junho de 1890.

Amor de Perdição

A estética de Camilo é a estética de ambiguidade, não só por esta adesão/repúdio


do romantismo que se manifesta de forma mais ou menos explícita mas por uma
série de outros processos formais, estilísticos, discursivos. A sua visão do mundo,
sempre dualista, revela-se nos títulos dos seus livros (Amor de Salvação/Amor de
Perdição; Estrelas Propícias/Estrelas Funestas; O Bem e o Mal) e até na
organização e títulos dos capítulos.
Dividido em vinte capítulos, mais a introdução e a conclusão, o livro segue uma
sucessão temporal rigidamente cronológica. Amor de Perdição tem como subtítulo
Memórias de uma família. De facto, o autor narra episódios da família Correia
Botelho, ou seja, muitas das situações vividas pelo escritor e de sua própria
família. Seus fundamentos são históricos, embora não se possa determinar com
exatidão até onde vai a verdade histórica, onde começa a fantasia. Simão Botelho
existiu na realidade. Por trás dele, tio de Camilo, o próprio escritor apaixonado e
desequilibrado.

Ficha de leitura
. Enredo

Nesta obra, há uma coincidência com a vida do autor: é certo que a obra de Camilo
e a sua vida foram lidas uma em função da outra, como reforço mútuo. E essa
conjunção produzia um determinado sentido, tinha uma consequência estética. A
maneira como Camilo, que era um homem que vivia da pena, fez render esse
ponto, com a legenda que criava em torno de si mesmo.

O detalhe notável é a constante referência de Camilo ao fato de escrever para


viver, e de ter, assim, de dar ao público o que ele quer comprar. A novela passional
é originada pelo clima emocional da época que foi absorvido pelo mundo
novelístico de Camilo e nessa atmosfera satura de paixão e lágrimas, de grandezas
e misérias, as personagens movem-se, tal como acontece com o seu criador, não
só pelos impulsos próprios, mas também pela estimulação do meio mórbido em
vivem. E, ainda, que a família de Camilo era da mesma espécie de “brigões” e
“cobiçosos” que havia a rodo em Portugal no correr do século XIX, na crise que se
seguiu à independência do Brasil.

Quanto à família da qual proveio Camilo, eis o apanhado mais geral: um avô
magistrado reconhecidamente corrupto; um tio assassino – o tema de Amor de
Perdição – que, depois de mil tropelias pouco românticas, acabou degredado para
a Índia; uma tia de má fama, concubina de um ricaço, cuja fortuna esbanjou
depois de espoliar a herança da filha de seu primeiro casamento e também a dos
seus sobrinhos (Camilo, entre eles); o pai, que viveu amancebado sucessivamente
com três criadas.

Esta obra-prima da ficção de língua portuguesa parece ter encontrado na tragédia


Romeu e Julieta, de Shakespeare, uma referência marcante da novela passional
de Camilo, que segundo o filósofo e escritor espanhol Miguel de Unamuno é a
maior novela de amor da península Ibérica.
O romance reúne, em síntese, elementos típicos de uma mundividência que tem
raízes na cultura portuguesa, particularmente na sua expressão literária, desde
épocas remotas.

Dois quartos da novela constam de uma lenta narração sobre o namoro entre
Simão Botelho e Teresa de Albuquerque, a separação do casal por rixas familiares,
a obstinação de Teresa mantendo-se fiel a Simão, não cedendo à insistência do
pai, Tadeu de Albuquerque, em casá-la com o fidalgo Baltasar Coutinho.

Por outro lado, Simão, estudante em Coimbra, regressa a Viseu, resolvido a


resgatar a amada, mantida num convento, à guisa de castigo por sua teimosia.
Simão, que não conta com o apoio de sua própria família, mantém-se escondido
na casa de João da Cruz, um ferrador. Contando com a cumplicidade do ferrador
e da filha Mariana, o jovem está a salvo. Mariana apaixona-se pelo hóspede e
auxilia-o de todas as formas, no sentido de que comunique com a amada Teresa.

O capítulo 10 pode ser considerado o clímax da narrativa: é quando se dá a morte


de Baltasar Coutinho. Simão Botelho tenta encontrar-se com Teresa, aquando da
mudança do convento de Viseu para Monchique. Baltasar provoca-o e Simão atira
matando-o. Assim os acontecimentos precipitam-se.

Os outros dois quartos da novela, ou seja, do capítulo 11 em diante, preparam o


desenlace trágico. Simão é preso na cadeia da Relação, no Porto. Teresa é mantida
enclausurada no convento de Monchique, também no Porto. Julgado e condenado
à morte na forca, Simão passa os dias em desespero, tendo ao lado a fiel
companhia de Mariana. Domingos Botelho, pai de Simão e corregedor, nega-se a
auxiliar o filho e só o faz tardiamente, quando então consegue comutação da pena
e um degredo para as Índias.

O final trágico dá-se quando da partida de Simão para o exílio. Teresa assiste do
mirante do convento à passagem do navio que leva a seu amado e vem a falecer.
Simão, não resistindo à dor de perder a amada, também morre, no navio. Mariana
suicida-se, abraçada ao cadáver do jovem, já lançado ao mar.

Aplicação das categorias da narrativa:


Acção:

A acção é fechada, pois o público é informado sobre o destino final das


personagens centrais (Simão, Teresa e Mariana). A ação é formada a partir de
uma sucessão de sequências narrativas, ligadas por casualidade. Contudo os
acontecimentos posteriores são sempre uma consequência dos anteriores -
encadeamento.
· Sequências narrativas ligadas à intriga central:

- nascimento de Simão Botelho;

- visão mútua de Simão e de Teresa e nascimento do seu amor;

- relação secreta entre Simão e Teresa;

- simão hospeda-se em casa de João da Cruz;

- encontro entre Simão e Baltazar;

- Teresa é mandada para o convento de Monchique e, posteriormente, para um


convento no Porto;

- Simão mata Baltazar e recusa fugir à polícia;

- Simão é condenado à morte, por enforcamento;

- morre João da Cruz;

- partida de Simão para o degredo;

- morte de Teresa;

- morte de Simão;

- suicídio de Mariana.

Pode ser considerada uma obra de ação aberta: Camilo convida o leitor a fazer
uma reflexão acerca dos preconceitos existentes e caducos, em Portugal, sobre o
amor.

· Interação das personagens centrais:

- afastamento crescente dos amantes, partindo de uma rua até à despedida de


Teresa que parte para o convento de Monchique;

- adiamento do encontro dos amantes no Céu: representação metafísica e


romântica do amor.

- Mariana cada vez se aproxima mais de Simão, apesar de classes sociais


diferentes, desde o primeiro encontro até ao suicídio de Mariana;

- movimento ultrarromântico, há a ligação em vida e após a morte.

Narrador

Não participante – heterodiegético – é apenas narrador, não é personagem,


recorrendo à terceira pessoa gramatical; é omnisciente, pois tem um
conhecimento total e absoluto sobre a história e as personagens dessa história:
sabe o que é exteriormente observável, mas também o que faz parte do interior
das personagens; o narrador é judicativo/ parcial, pois expressa opiniões e
emoções.

Espaço

O espaço físico, em Amor de Perdição, conhece um afunilamento progressivo à


medida que a acção trágica se encaminha para o seu clímax e, posteriormente,
para o desenlace final. Assim, de um espaço amplo exterior onde as personagens
evoluem livremente, passa-se para um espaço fechado e reduzido onde as
personagens são encarceradas. Este espaço reduzido simboliza a prisão da própria
vida, visto que estão enclausuradas na dimensão da própria tragédia.

Verifica-se, ainda, que, quanto maior é a privação de liberdade, menor é o espaço


onde evoluem as personagens.

Alguns elementos relacionados com os espaços que adquirem uma simbologia


importante nesta obra:

· as grades: além das grades materiais que impressionam Simão, simbolizam os


obstáculos sociais que motivam o seu encarceramento.

· a janela: é a ligação entre o interior e o exterior; é conotada, simbolicamente,


com a interioridade de Simão e de Teresa e com a sociedade. Funciona, ainda,
como a cisão entre as personagens e ao espaço social onde estão inseridos.
Associada aos olhos, que são o “espelho da alma”, refletem o interior psíquico das
personagens que se situa a outros níveis presentes na obra, através dos
sentimentos dos protagonistas: aqui (hostil) que se opõe ao além (esperança e
ilusão fecundante).

· os fios: simbolizam a ligação eterna dos amantes (cartas) que não se desfaz
após a morte, é uma união total do par amoroso. Os próprios amantes acreditam
nessa união eterna (as cartas são testemunhas dessa teoria). O fio é também o
símbolo do destino (mito das 3 moiras). O tempo liga-se directamente ao destino
que terá de ser cumprido. Com a morte esse fio quebra-se, Mariana antes de
suicidar lança as cartas e o seu avental ao mar reatando de novo os amantes.

· o mar: é fonte de vida, o corpo de Simão, metaforicamente, sítio de


renascimento. O mar espelha o céu, espaça onde os amantes poderiam consumar
o seu amor puro, pois na terra eram condenados pelos homens.

· o avental: assume um valor polissémico, ligado à condição social de Mariana e o


seu sofrimento; ela limpa as suas lágrimas quando chora por Simão. Referências
ao seu estado de loucura, quando Simão está na prisão, num caixote encontram-
se as cartas de Teresa e o avental de Mariana. A sua simbologia reúne o trabalho
e o martírio, significando o percurso de Mariana na terra que é uma forma de
purificação.

Desta forma, continua presente, simbolicamente, a tragédia do triângulo amoroso,


vitimado por um destino que os conduz à morte, única solução para a realização
de uma vida cujos anseios mais profundos das personagens eram irrealizáveis.

Tempo:

· tempo diegético (tempo vivido pelas personagens) – acção decorre entre os finais
do século XVIII e início do século XIX.

O tempo diegético (tempo da história) caracteriza-se por:

· a cronologia;

· a linearidade.

Na introdução, abarcam-se 40 anos, são os antepassados de Simão.

A acção decorre em 6 anos (1801 - 1807):

· 1801, Domingos Botelho corregedor em Viseu, Simão tem 15 anos.

· 1803, Teresa escreve uma carta a Simão, revelando as intenções de seu pai de
a enviar para um convento.

· 1804, Simão é preso.

· Prisão de Simão de 1805 a 1807. Antes de embarcar para o degredo, fica 20


meses na prisão.

· 17/3/1807, Simão parte para a Índia.

· 28/3/1807, ao romper da manhã, Simão morre.

· tempo do discurso (forma como o narrador elabore o seu relato).

Visto que o discurso é linear, o narrador segue a ordem cronológica dos


acontecimentos (podemos referir, no entanto, a analepse em que João da Cruz
conta a forma como matou o almocreve; há resumo na introdução).

Conotações simbólicas do estado do tempo:

Simão morre “ao amanhecer, depois de um formoso dia de Primavera” (o dia 28


de Março), que se seguiu a vários dias de tempestade. A primavera e a manhã
estão conotadas com a luz, com a pureza de um tempo, ainda libertos de
corrupção. Trata-se de um momento de promessa e de felicidade. Assim, da
escuridão e da morte, relacionadas com o caos, nasce o amor verdadeiramente
purificada por um tempo transcendente ao dos humanos – é o período da
realização e da plenitude.
É ainda importante notar que, ao sétimo dia de viagem, acalmou a tempestade –
o número 7 corresponde ao dia da Ordem, aquele em que, após a criação do
mundo, Deus descansou. O 7 remete para a luz e para a plenitude temporal. E,
ao nono dia, Simão delira pela última vez e são as cartas e as promessas de
felicidade que ecoam na sua memória. O 9 é o número da gestação, o do final de
um ciclo para iniciar outro.

Personagens:
· Simão

- nasceu em 1784.

- tinha 15 anos, à data de inicio da ação, em 1801; estuda humanidades em


Coimbra.

- apresenta características hereditárias psíquicas e fisionómicas (anúncio do


realismo): “génio sanguinário”, rebeldia e coragem, inconformismo político –
herança de seu tio paterno, Luís Botelho (que matara um homem, em defesa de
seu irmão Marcos) e de seu avô paterno, Fernão Botelho (que fora encarcerado
por suspeita de uma tentativa de regicídio, em 1758 (cf. Cap. I) e ainda de seu
bisavô Paulo Botelho Correia (que era considerado “o mais valente fidalgo que
dera Trás-os-Montes” (cf. Cap. I). É belo como a sua mãe, ainda que viril.

- após a visão de Teresa, Simão transforma-se: distancia-se da ralé de Viseu;


torna-se caseiro; cumpre os seus deveres de estudante; passeia pelo campo,
procurando o espaço natural, em detrimento do espaço social.

- quando Teresa é obrigada a sair da janela, local onde via Simão e,


posteriormente, quando lhe comunica o desejo do seu pai de que ela se case com
o seu primo Baltasar, Simão revela-se de novo rebelde. A par desta faceta, irá
porém surgir uma outra: a sua nobreza de alma, que se manifesta no momento
em que deseja poupar um dos criados de Baltasar, que tentara matar Simão, pelo
facto de o homem se encontrar ferido.

- surge, entretanto, mais outra faceta de Simão: a de poeta, que se manifesta nas
cartas que escreve a Teresa (cf. Cap. X).

- o seu sentimento exacerbado de honra é também notável – ele manifesta-se


pelo facto de Simão enfrentar sempre aqueles que se lhes opõem, pelo facto de
se ter negado a fugir, depois de ter morto Baltasar, em legítima defesa, e ainda
por recusar qualquer ajuda da família, aceitando a sua condenação à forca e,
depois, ao degredo. O seu código de honra conduzi-lo-á, em última análise, à sua
tragédia. Este sentimento valer-lhe-á a admiração de personagens como João da
Cruz e ainda daquelas que se situam numa esfera social marcada por valores
conservadores, como é o caso do desembargador Mourão Mosqueira.

- o sentimento de dignidade é, por outro lado, inseparável da possibilidade de


realização do seu amor – é assim que Simão não acede ao pedido de Teresa, para
que cumpra os dez anos de pena, em Portugal, na cadeia, afirmando: “Quero ver
o céu no meu último olhar, não me peças que aceite dez anos de prisão. Tu não
sabes o que é a liberdade cativa dez anos! Não compreendes a tortura dos meus
vinte meses.” Com efeito, para Simão o amor associa-se à liberdade e à sua
integridade pessoal. Simão representa o herói romântico antissocial, por
excelência. Ele significa a oposição a uma sociedade podre e aos seus valores anti-
humanos. Na sua última carta a Teresa, incluída no Cap. XIX, escreve: “Vou.
Abomina a pátria, abomina a minha família; todo este solo está nos meus olhos
coberto de forcas, e quantos homens falam a minha língua, creio que os ouço
vociferar as imprecações do carrasco. Em Portugal, nem a liberdade tem
opulência; nem já agora a realização das esperanças que me dava o teu amor,
Teresa!”.

§ morre a 28 de março de 1807, no beliche do navio que o transportava para o


degredo e o seu corpo é lançado ao mar.

· Teresa

- tem 15 anos.

- destaca-se pela sua beleza.

- é o paradigma da mulher-anjo, pela sua delicadeza e pela grandiosidade dos


seus sentimentos.

- revela autonomia, para a época, sobretudo, quando se recusa a casar com


Baltasar.

- é astuta, determinada e orgulhosa.

- manifesta uma força de vontade e uma desenvoltura viris.

- esta personagem não tem uma evolução psicológica, pelo que é considerada
uma personagem plana.

· Mariana

. tem 24 anos.

- o narrador salienta a sua beleza física.


- caracteriza-se pela sua intuição, pelo poder de predição, enfim, pelo misticismo
popular.

- apresenta complexidade humana, ao nível das emoções que experimenta e da


esperança que acalenta de poder ser amada por Simão e ficar junto dele.

- esta personagem apresenta a evolução psicológica, pois o seu amor motiva as


suas esperanças e os seus desalentos, oscilando entre emoções que fazem vibrar
a sua dimensão humana.

· João da Cruz

- é uma personagem que se aproxima bastante do protótipo do homem popular


português.

- pela antítese das emoções que experimenta e pelas atitudes que apresenta, é
considerado o tipo do “bom bandido”.

- ele é, simultaneamente, bondoso, grato, corajoso e violento.

- caracterizam-no, ainda, a sua linguagem de cariz popular, pelo realismo da


expressão.

· Baltasar

- é a personagem que, pelos seus defeitos, se opõe a Simão, fazendo sobressair


as qualidades exemplares do herói.

- é cobarde, mesquinho e vingativo.

- a sua vaidade torna-o incapaz de esquecer o seu orgulho ferido e de


compreender o amor que Simão e Teresa sentem um pelo outro.

- representa os valores sociais instituídos e fossilizados, contribuindo para a


tragédia final.

· Tadeu de Albuquerque e Domingos Botelho

- representam o antagonismo motivado pelo preconceito de honra social.

- são inflexíveis nas suas decisões e baseiam-se no seu próprio orgulho e nas suas
conveniências sociais.

- preferem perder os filhos, reduzindo-os à dimensão de objetos, a perder a


dignidade social.
· D. Rita Preciosa

- representa a convencionalidade do sentimento materno – age mais por obrigação


familiar do que por motivos afetivos; ajuda Simão porque esse é o seu papel e
não porque o amor de mãe a leve a perdoar e a compreender as atitudes do filho.

· Ritinha

- distingue-se das outras irmãs de Simão pela sua capacidade afetiva.

- representa, para Simão, o único laço familiar genuíno. Porque é conduzida por
aquilo que sente e não pelas convenções que lhe são impostas.

- a sua ligação a Simão leva-a a ser ela a relatora da sua história ao autor da obra,
quando este era criança.

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