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São, pois os saberes (gênero) produzidos sobre o que seja a mulher que estão
condicionando o seu lugar no mercado de trabalho, e em outras dimensões da vida
social. Saltemos, pois, para as últimas décadas do século XX e início do XXI. No
Brasil, com o processo de redemocratização e as atividades dos movimentos
feministas, teremos uma ressignificação da “imagem social da mulher” (RODRIGUES
E COSTA, P. 24); sublinhando que esses não foram os únicos acontecimentos a
propiciar essa mudança, mas foram dos mais vitais. Há um questionamento sobre os
saberes que normatizam a existência da mulher, a exemplo da psicanálise, e de quem
são os sujeitos e instituição responsáveis pela produção desses saberes, culminando
com a mulher requerendo para si o direito de determinar o que ela é, algo negado
desde a ilustração. Já nos anos oitenta se tem uma clareza sobre os limites de
qualquer especialização do comportamento da mulher, desenvolve-se uma
consciência de “que qualquer definição, de papéis, da identidade e dos códigos de
comportamento da mulher é instável e transitória. Aparecem com maior clareza os
limites daquilo que seria característico da natureza social da mulher” (Ibidem).
Mesmo com essa nova consciência, com a crítica dos saberes sobre a mulher,
a sua situação continua desigual no mercado de trabalho, ainda que se tenham
concretizado mudanças nas últimas décadas. Se, por um lado, a partir da década de
80 um novo processo de integração da mulher ao mercado de trabalho deflagrasse,
por outro, e de lá até a atualidade, muitos problemas não foram resolvidos: as
mulheres ainda não conseguem alcançar cargos de chefia na mesmo proporção que
homens; a ausência de instituições de cuidados de crianças impede uma maior
inserção da mulher no mercado, pois cuidar dos filhos ainda é visto como uma tarefa
a qual a mãe é quem deve se dedicar; outro setores em que a mulher ainda tem sua
participação limitada são as dos três poderes do nosso Estado, algo que restringe o
campo de ação da mulher em políticas que possibilitem uma transformação estrutural
da sociedade (NUNE, 2014). O problema da mulher no Brasil, na sociedade ocidental
é estrutural. Apesar da efervescência de acontecimentos que atingem as formas de
dominação, os saberes normatizadores, os mecanismos de manutenção do status do
masculino em nossa realidade social − os desafios das mulheres não acabaram.
Podemos, a partir Fernando Braudel, dizer que os acontecimentos ainda não
modificaram suficientemente as nossas conjunturas econômica, social, política e
cultural, inscritas na média duração.
Diante da constatação dessa realidade social, o que poderíamos fazer? Sendo
um problema que atravessa não somente o mercado de trabalho, mas todas as
dimensões da vida social, as contribuições individuais tornam-se, inevitavelmente,
limitadas. Os movimentos feministas continuam na luta contra; políticas públicas
também têm sido praticadas, ainda que numa quantidade insuficiente; as mulheres
tornaram-se, individualmente, mais conscientes de sua situação, buscando, elas
mesmas, formas de contornar a assimetria nas relações sociais e pessoais. A nós,
enquanto professores, a abordagem de questões sobre gênero, sobre desigualdades
sócias entre homens e mulheres, sobre a própria história da mulher através do tempo,
possibilitaria o desenvolvimento de uma consciência história e social que estaria nos
fundamentos da transformação da realidade social, sem a qual uma mudança
profunda não é possível.