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Copyright @ 2017 Edgar, Marçal, et al. (Org.

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Marçal, Edgar. et al. (Org.)


Sistemas e Mídias Digitais: Uma introdução
/ Edgar Marçal et al. (Org.)
Campinas, SP : Pontes Editores, 2017.

Bibliografia.
ISBN - 978-85-7113-869-8

1. Sistemas digitais - 2. Meios auxiliares de ensino I. Título

Índices para catálogo sistemático:

1. Sistemas digitais - 001.535


2. Meios auxiliares de ensino - 371.32

PONTES EDITORES
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Campinas – SP – 13070-056
Fone: 55. 19 3252.6011
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SUMÁRIO

Apresentação

A Teoria Cognitiva de Aprendizagem Multimídia:


Compreendendo a sua Importância para a Formação
do Profissional de Sistemas e Mídias Digitais
Priscila Barros David, Cátia Luzia Oliveira da Silva

Matemática Aplicada à Multimídia


Antonio José Melo Leite Júnior, Clemilson Costa Santos

Modelagem 3D: Conceitos Básicos e Estado da Arte


Mara Franklin Bonates, Andrei Bosco Bezerra Torres

Os Desafios da Aprendizagem na Cultura Digital


Andrea Pinheiro Paiva Cavalcante, Cátia Luzia Oliveira da Silva

Desenvolvimento de Aplicações
Web e Banco de Dados
Emanuel F. Coutinho, Leonardo O. Moreira, Gabriel A. L. Paillard

Design de Jogos Digitais


Glaudiney Moreira Mendonça Junior, Natal Anacleto Chicca Junior,
Carlos Eduardo Brito Novais, Vicenzo Pegado, Lizie Sancho Nascimento
Estrutura Genérica de um Jogo Digital
Jefferson T. Freitas, João R. S. Filho, Artur O. R. Franco,
José G. R. Maia

Cibercultura: Aspectos Teóricos e Práticos


Fernando Lincoln Mattos, Eduardo S. Junqueira

Gestão de Negócios e Projetos Multimídia


Edgar Marçal, Henrique Silva

O desenho: Ensino, Aprendizado e sua Relevância


na Universidade
Liandro Roger Memória Machado, Natal Anacleto Chicca Jr.

A criação pelo Traço: Fundamentos e Aplicações do


Desenho nas Mídias digitais
Liandro Roger Memória Machado, Natal Anacleto Chicca Jr.

Engenharia de Software e Aplicações Multimídia


Emanuel F. Coutinho, Edgar Marçal, Ma. de Fátima C. de Souza

Mitologia e Psicologia como Fonte de Inspiração


e Criatividade
Levi Bayde, Giancarlo S. T. Júnior

Narrativas Multimídia: Alguns Conceitos


Glaudiney Moreira Mendonça Junior, Georgia da Cruz Pereira
Sistemas e Mídias Digitais, Universidade Federal do Ceará
Tecnodocência e Animação Digital:
Interdisciplinaridade na Formação de Profissionais
de Mídias Digitais
Luciana de Lima, Robson Carlos Loureiro, Neil Rezende

Princípios Básicos da Interação Humano-


Computador para Sistemas e Mídias Digitais
Ticianne Darin, Cátia Silva, Fátima Souza

Processo de Desenvolvimento e Avaliação de Jogos:


Um Estudo de Caso
Sibele Castro, Ticianne Darin

Compreender o Usuário: O papel da Cognição, da


Emoção e das Atitudes
Ana Cristina Antunes

Design de Interfaces Gráficas


Inga Saboia, Carlos Eduardo Brito Novais

Tudo o que Você Queria Saber Sobre Infografia


Inga Saboia, Carlos Eduardo Brito Novais
Apresentação
Os impactos das mudanças políticas, sociais e econômicas
que caracterizam a chamada Sociedade do Conhecimento introdu-
ziram profundas alterações nos mais diversos setores produtivos.
Tal fenômeno tem reflexo também nas instituições educacionais,
visto que a educação contribui com a formação de recursos huma-
nos e de cidadãos para atuar em linha com os novos paradigmas.
Essas transformações criam a necessidade de se preparar
os egressos das instituições de ensino para um ambiente caracte-
rizado pela transição de um modelo econômico industrial para um
modelo baseado nas informações e nos conhecimentos, acentua-
do pela rápida mudança tecnológica. Novos profissionais surgirão
e ocuparão postos-chave nessa nova ordem, atuando no desenvol-
vimento e produção de novos processos, práticas e produtos, fruto
dessa nova sociedade.
Nesse campo, destacam-se as áreas de sistemas multimí-
dia e mídias digitais, que ganharam grande impulso com o de-
senvolvimento acentuado dessas tecnologias. Atualmente, essas
ferramentas estão presentes em diversos campos da sociedade,
contribuindo para reduzir os custos da produção e da aquisição
dos meios digitais e para o aumento da difusão das chamadas re-
des sociais, do fenômeno dos videogames e dos diversos equipa-
mentos digitais existentes atualmente, como os dispositivos mó-
veis (e.g. smartphones e tablets), as redes sem fio e os sensores.
Nesse sentido, este livro introduz diferentes conteúdos
igualmente importantes que servem como alicerce teórico para
estudantes e profissionais nessa era da informação e comunica-
ção. Os capítulos não seguem uma sequência estabelecida nem
tem dependências entre si, o que dá uma flexibilidade ao leitor
para definir seu próprio roteiro de leitura e objetivos de apren-
dizagem. O livro está fundamentado em conteúdos do curso de
graduação em Sistemas e Mídias Digitais da Universidade Fe-
deral do Ceará que permeiam diferentes áreas, tais como: jogos,
educação, sistemas multimídia, cibercultura, design digital, mo-
delagem 3D, banco de dados, desenho e ilustração, programação,
animação digital, gestão de projetos, matemática aplicada, narra-
tivas e mitologia. Este livro, como seu título sugere, se propõe
a introduzir os assuntos contemplados nos capítulos, de forma a
esclarecer conceitos importantes e motivar o leitor a aprofundar
seus conhecimentos nas áreas de interesse.

Boa leitura,

Os autores.
A TEORIA COGNITIVA
DE APRENDIZAGEM
MULTIMÍDIA:
COMPREENDENDO A SUA
IMPORTÂNCIA PARA A
FORMAÇÃO DO PROFISSIONAL
DE SISTEMAS
E MÍDIAS DIGITAIS
A Teoria Cognitiva de Aprendizagem
Multimídia: Compreendendo a sua
Importância para a Formação do Profissional
de Sistemas e Mídias Digitais
Priscila Barros David, Cátia Luzia Oliveira da Silva

1. INTRODUÇÃO
A formação em Sistemas e Mídias Digitais propõe ativi-
dades teórico-práticas que coloquem os futuros profissionais da
área em contato com desafios reais de seu universo de atuação
em variados contextos. Uma dessas atividades é a produção de
materiais multimídia. Não é raro perceber que muitas vezes, esses
materiais apresentam também finalidades educacionais.
Busca-se neste capítulo, enfatizar o caráter interdisciplinar
da formação em Sistemas e Mídias Digitais, a fim de que trans-
cenda a instrumentalidade técnica no desenvolvimento de mate-
riais didáticos multimídia, promovendo, acima de tudo, o espírito
crítico no uso e no planejamento de tais recursos.
O desenvolvimento de materiais educativos multimídia ca-
receu, por muito tempo, de estratégias de design baseadas em evi-
dências empíricas. À medida que se tornaram recursos cada vez
mais disponíveis, seja na educação presencial, seja na educação
a distância, e empregados nos mais diversos níveis de educação,
os materiais multimídia com finalidades educacionais contavam,
sobretudo, com a opinião de especialistas para serem construídos.
Assim, usavam-se estratégias intuitivas e não critérios científicos.
Um exemplo é o emprego de heurísticas (guias de melhores prá-
ticas) na área de usabilidade.
Avanços cada vez mais rápidos na tecnologia e a expan-
são crescente de seu acesso têm propiciado maneiras de transcen-
der o puramente verbal, ampliando o alcance do uso de materiais
multimídia para fins didáticos. O desafio de favorecer a aprendi-
zagem com tais recursos, entretanto, permanece. Assim, como a
mensagem multimídia pode potencializar o entendimento, a com-
preensão humana? E, consequentemente, como se pode planejar
eficazmente a aprendizagem multimídia?
Neste capítulo, apresentaremos a Teoria Cognitiva de Apren-
dizagem Multimídia proposta por Richard E. Mayer, professor e pes-
quisador do Departamento de Psicologia da Universidade da Cali-
fórnia, Santa Bárbara, com importantes contribuições nos campos da
Aprendizagem Multimídia, Educação e Formação Humana.
O capítulo encontra-se dividido em duas seções. Na pri-
meira, discutiremos os conceitos e fundamentos da Teoria de
Aprendizagem Multimídia. Enquanto na segunda, apresentare-
mos as contribuições desta teoria à formação do profissional em
Sistemas e Mídias Digitais. Discutiremos essas contribuições bus-
cando relacionar os fundamentos da teoria de Richard E. Mayer
com outras teorias que têm servido de base para a formação deste
profissional, isto é, a Escola Psicológica da Gestalt, heurísticas de
usabilidade no campo da Interação Humano-Computador e fun-
damentos do Design Instrucional.
2. A TEORIA COGNITIVA DE APRENDIZAGEM
MULTIMÍDIA
A Teoria Cognitiva da Aprendizagem Multimídia surgiu
a partir do embasamento em pesquisas experimentais e seguindo
teorias sobre como as pessoas aprendem (MAYER, 2009, 2014).
Para Mayer, há dois objetivos básicos da pesquisa em multimídia:
contribuir com a prática educacional e contribuir com a teoria
da aprendizagem. Segundo o autor, as pessoas aprendem melhor
através de palavras e imagens do que somente através de pala-
vras. Educação multimídia é, por sua vez, a apresentação de ma-
terial usando tanto palavras, escritas ou faladas, quanto imagens,
estáticas ou em movimento. 
A Teoria da Carga Cognitiva (o esforço mental necessário
para processar os elementos textuais, visuais e sonoros) forneceu
as bases para a teoria formulada por Mayer. Ela é também baseada
em outros três princípios básicos: 1) no conceito de duplo canal,
advindo de Paivio (1991), segundo o qual os seres humanos têm
dois canais separados para processamento da informação, sendo
um para informação verbal e outro para a pictórica; 2) cada canal
possui capacidade limitada de processamento de informação; e
3) processamento ativo, quando ocorrem três processos contri-
buindo para a aprendizagem significativa (seleção, organização e
integração de informações).
Há também três tipos de processos cognitivos durante a aprendi-
zagem: processamento cognitivo estranho (aquele que não serve
ao objetivo educacional); processamento cognitivo essencial (serve
para representar o material essencial na memória de trabalho); pro-
cessamento cognitivo generativo (necessário para um entendimen-
to mais aprofundado, causado pela motivação do aprendiz). Assim,
a Teoria Cognitiva de Aprendizagem Multimídia é sistematizada
em doze princípios, que, por sua vez, são agrupados em três áreas
principais: reduzir o processamento estranho, administrar o proces-
samento essencial e fomentar o processamento generativo.
Para se reduzir o processamento estranho, existem cinco
princípios para que se aprenda melhor: 1) Coerência (material ir-
relevante, mesmo que interessante, deve ser excluído ao invés de
incluído, pois esse material compete por recursos cognitivos na
memória de trabalho e pode desviar a atenção); 2) Sinalização
(pistas que sinalizam a organização do material devem ser adi-
cionadas. A atenção do aprendiz é então guiada para elementos
essenciais da unidade); 3) Redundância (aprende-se melhor com
gráficos e narração do que com gráficos, narração e texto impres-
so); 4) Contiguidade Espacial (palavras e imagens corresponden-
tes devem ser apresentadas próximas umas das outras ao invés de
distantes entre si); 5) Contiguidade Temporal (palavras e imagens
correspondentes devem ser apresentadas simultaneamente ao in-
vés de sucessivamente).
Já para se administrar o processamento essencial e favore-
cer o processo de aprendizagem, há três princípios: 1) Segmenta-
ção (apresentar o material em segmentos de acordo com o ritmo
do aluno, ao invés de uma unidade contínua); 2) Preformação
(preceder a unidade com uma formação prévia sobre os termos e
as características dos componentes-chave); 3) Modalidade (apre-
sentar a unidade usando imagens e palavras faladas, ao invés de
imagens e palavras impressas. Isto previne o congestionamento
do mesmo canal sensorial).
E, finalmente, há quatro princípios para fomentar o pro-
cessamento generativo: 1) Personalização (o conteúdo deve ser
apresentado ao aluno de forma conversacional, ao invés de for-
mal); 2) Voz (o conteúdo deve ser apresentado com voz humana
ao invés de voz eletrônica); 3) Personificação (apresentar o agente
na tela com maneirismos similares aos humanos; 4) Imagem (não
necessariamente apresentar a imagem do falante na tela durante a
aprendizagem).
Os princípios trabalhados por Mayer têm inúmeras aplica-
ções práticas no design de materiais didáticos digitais, cuja finali-
dade primordial é aprimorar a aprendizagem do aluno. O conhe-
cimento de sua teoria é, portanto, fundamental para o profissional
em formação da área de Sistemas e Mídias Digitais.

3. A TEORIA DE APRENDIZAGEM MULTIMÍDIA E


A FORMAÇÃO DO PROFISSIONAL DE SISTEMAS E
MÍDIAS DIGITAIS
Nesta seção, passaremos a refletir sobre contribuições
que os Princípios de Aprendizagem Multimídia (MAYER, 2009,
2014) discutidos anteriormente, podem conceder a diferentes dis-
ciplinas envolvidas na formação em Sistemas e Mídias Digitais.
A partir do desenvolvimento de pesquisa na área de aprendiza-
gem multimídia (DAVID, et. al. 2015), as autoras deste capítulo
perceberam a relevância desta teoria para diferentes campos do
conhecimento e, a seguir, apontam importantes conexões entre
a teoria proposta por Richard E. Mayer e o Sistema de Leitura
Visual da Forma, trabalhado por Gomes-Filho (2000), com base
na Escola Psicológica da Gestalt, as Heurísticas de Usabilidade,
trazidas por Nielsen (1993) e também conexões com a área de
Design Instrucional.

3.1. Aprendizagem Multimídia e a Gestalt do Objeto


Entre as escolas psicológicas que mais trouxeram contri-
buições à área do design, da comunicação visual, das artes e, mais
recentemente, ao desenvolvimento de conteúdos multimídia po-
demos destacar a Gestalt. Este é um vocábulo alemão, geralmente
traduzido para o português como estrutura, figura, forma. Pela
busca do equilíbrio entre os estímulos externos e as forças inter-
nas do sistema nervoso central humano na percepção das formas
presentes no mundo, Gomes-Filho (2000), afirma que o termo
Gestalt acabou popularizando-se como boa forma.
Opondo-se fortemente ao subjetivismo, a Gestalt ou Psi-
cologia da Forma, apresenta seus postulados com base em ex-
perimentos cuidadosamente desenvolvidos, buscando explicar a
razão de algumas composições visuais agradarem mais que ou-
tras. Fundamenta-se no princípio da Pregnância da Forma, o qual
busca fatores de equilíbrio, clareza e harmonia visual, fatores in-
dispensáveis na formação de imagens para o ser humano. Apoia-
-se na fisiologia do sistema nervoso humano, ao explicar a relação
sujeito-objeto, no campo da percepção.
De acordo com Gomes-Filho (op. cit.), o fenômeno da per-
cepção visual é explicado pelos psicólogos da Gestalt com base
em forças externas e forças internas. As forças externas compre-
endem a estimulação da retina através da luz proveniente do obje-
to para o qual olhamos, nas condições em que ele se encontra. Por
sua vez, as forças internas, que seguem princípios específicos,
têm origem num dinamismo cerebral que tende a estruturar as
formas numa ordem determinada, subordinada a padrões, fatores
ou leis gerais. O autor descreve oito leis gerais, denominadas Leis
da Gestalt, cuja definição reproduzimos a seguir:
Unidade: É o conjunto de mais de um elemento, configu-
rando um objeto, o qual é percebido através de relações entre os
elementos que o constituem.
Segregação: Capacidade perceptiva de separar, identificar,
evidenciar ou destacar unidades formais em um todo compositivo
ou em partes de um todo.
Unificação: Igualdade ou semelhança dos estímulos pro-
duzidos pelo campo visual, conforme fatores de harmonia, equilí-
brio, ordenação visual e coerência da linguagem.
Fechamento: Formação de unidades em todos fechados,
pela continuidade numa ordem estrutural definida.
Continuidade: Impressão visual de como as partes se su-
cedem através da organização perceptiva da forma de modo coe-
rente: fluidez visual.
Proximidade: Elementos que, ao estarem próximos, po-
dem ser vistos como um todo ou como unidades em um todo.
Semelhança: Elementos com igualdade de forma e de cor
tendem a constituir unidades.
Pregnância: É a lei básica da percepção visual da Ges-
talt, segundo a qual as forças de organização da forma tendem
à harmonia e ao equilíbrio visual, facilitando a compreensão e a
interpretação.
Foi com base nessas leis, em categorias fundamentais e em
técnicas visuais aplicadas, que Gomes-Filho (op. cit.) estruturou
o que ele denominou de Sistema de Leitura Visual da Forma do
Objeto. O objetivo deste sistema consistiu em conferir fundamen-
to a práticas projetuais para a concepção de produtos fundamen-
tados nos princípios de ordenação, equilíbrio, clareza e harmonia
visual, segundo o autor, “alicerces da formulação gestáltica no
campo da percepção da forma” (p. 7).
Como parte de seu sistema, o autor aponta as categorias
conceituais fundamentais de Harmonia, Equilíbrio e Contraste
que têm como objetivo o embasamento e consistência às leis da
Gestalt, em especial à Pregnância da forma. A seguir, as defini-
ções apresentadas pelo autor (Gomes-Filho op. cit.):
Harmonia: diz respeito à disposição formal bem organizada
no todo ou entre as partes de um todo; predominam os fatores de
equilíbrio, ordem e regularidade visual inscritos no objeto (p. 39).
Equilíbrio: numa composição equilibrada, todos os fatores,
como configuração, direção e localização determinam-se mutua-
mente de tal modo que nenhuma alteração parece possível (p. 45).
Contraste: é a força que torna visível as estratégias da
composição visual, uma contraforça à tendência do equilíbrio ab-
soluto, pois estimula e atrai a atenção (p. 62).
É importante destacar que cada uma dessas categorias
possui desdobramentos internos que serão suprimidos neste capí-
tulo pelas limitações de espaço disponíveis. Para uma descrição
completa de todas as subcategorias fundamentais do Sistema de
Leitura Visual, vide Gomes-Filho (op. cit., pp. 37-74).
O Sistema de Leitura Visual da Forma compreende ainda
um conjunto de técnicas visuais aplicadas que, além de corrobo-
rarem à leitura visual da forma, também fornecem subsídios para
procedimentos criativos na concepção de projetos variados, dentre
eles, destacamos os produtos multimídia. O autor aponta 26 cate-
gorias conceituais aplicadas. Todavia, pelas mesmas razões citadas
anteriormente (limitação de espaço), realizamos uma seleção de
11 categorias que guardam relação mais direta com os Princípios
de Aprendizagem Multimídia, apontados em Mayer (2009, 2014).
Conjuntamente com os princípios, essas técnicas corroboram o de-
senvolvimento de tecnologias digitais multimídia:
Clareza: Manifestações visuais bem organizadas, unifica-
das, harmoniosas e equilibradas, que favorecem a compreensão
imediata do todo.
Simplicidade: Organizações que apresentam um baixo nú-
mero de informações ou unidades visuais; são de fácil assimila-
ção, leitura e compreensão.
Minimidade: Técnica econômica de ordenação visual que
realça os aspectos de clareza, e simplicidade, em função de um
mínimo de unidades ou elementos informacionais.
Profusão: Técnica visual com características de complexi-
dade que resulta em manifestações visuais carregadas, pela inclu-
são de detalhes e de elementos muitas vezes supérfluos.
Coerência: A organização visual do objeto resultante é
harmoniosa em relação ao seu todo, sobretudo pela compatibili-
dade de estilo e linguagem formal uniforme.
Arredondamento: Suavidade e maciez que as formas orgâni-
cas transmitem, geralmente associado ao fator de boa continuidade,
permitindo a leitura do objeto sem quebras ou sobressaltos visuais.
Redundância: Caracteriza-se, principalmente, pela repeti-
ção ou pelo excesso de elementos iguais, na maioria das vezes
supérfluos.
Espontaneidade: Caracteriza-se por uma falta aparente de
planejamento visual; possui grande carga emotiva e impulsiva em
que os elementos trabalhados são inseridos de maneira livre, obe-
decendo a uma ordem de composição.
Fragmentação: Técnica associada à decomposição de uni-
dades em peças separadas, que se relacionam entre si, porém, pre-
servando seu caráter individual.
Sequencialidade: Refere-se à ordenação de unidades ou de
elementos organizados de modo contínuo e lógico, em qualquer
tipo de disposição visual.
Ruído Visual: São interferências ou distorções que pertur-
bam a harmonia ou a ordem num objeto ou composição de ma-
neira parcial.
Para acesso à lista e descrição completa das técnicas visu-
ais aplicadas, vide Gomes-Filho (op. cit., pp. 74-88).
No Quadro 1, demonstraremos as relações entre os Princí-
pios de Aprendizagem Multimídia que acontecem dentro de cada
processamento cognitivo, discutidos por Mayer (2014), e suas re-
lações com as leis e categorias do Sistema de Leitura Visual da
Forma, preconizados por Gomes-Filho (2000):
Quadro 1. Aprendizagem Multimídia e o
Sistema de Leitura Visual da Forma

Tipos de Princípios de Categorias


Leis da Técnicas Visuais
processamento Aprendizagem Conceituais
Gestalt Aplicadas
Multimídia Fundamentais

Clareza,
Unidades, Harmonia, Coerência,
Coerência
unificação Equilíbrio Simplicidade,
Minimidade
Sinalização Segregação Contraste Fragmentação
Profusão,
Estranho Redundância
Redundância
Continuidade,
Contiguidade Harmonia, Arredondamento,
Proximidade,
Espacial Equilíbrio Sequencialidade
Semelhança
Continuidade,
Contiguidade Harmonia, Arredondamento,
Proximidade,
Temporal Equilíbrio Sequencialidade
Semelhança
Segmentação Segregação Contraste Fragmentação

Arredondamento,
Preformação Fechamento
Sequencialidade
Essencial
Clareza,
Modalidade Pregnância Equilíbrio
Coerência

Personalização Espontaneidade

Voz Pregnância Harmonia Espontaneidade

Generativo Personificação Espontaneidade


Imagem Contraste Ruído Visual

Fonte: As próprias autoras.

Em consonância com o Princípio de Coerência, discutido


na seção 2 deste capítulo dentro do processamento estranho, ma-
teriais irrelevantes devem ser excluídos de conteúdos multimídia
com fins educativos. Corroborando com isso, operam as leis de
Unidade e Unificação da Gestalt, as quais primam pela harmonia
e pelo equilíbrio, além de clareza, coerência, simplicidade e mi-
nimidade na construção de uma composição visual, de forma a
configurar um objeto coerente.
Por sua vez, o Princípio de Sinalização defende que mate-
riais essenciais sejam destacados nos conteúdos multimídia. Isto é
confirmado pela lei de Segregação da Gestalt que privilegia a ca-
pacidade perceptiva de separar unidades formais em um todo com-
positivo, o que é favorecido pelo uso de contrastes e fragmentação,
técnica associada à decomposição de unidades interligadas.
Já o Princípio de Redundância, que busca preservar a con-
corrência de um mesmo canal de recepção de informações (visual
ou auditivo), é confirmado no Sistema de Leitura Visual da Forma
pelas técnicas de profusão e redundância, segundo as quais há a
inclusão de detalhes ou elementos supérfluos variados ou repeti-
dos. Mayer (2014), defende que estes detalhes sejam excluídos de
modo a evitar a sobrecarga de algum dos canais.
Os últimos princípios do processamento estranho, Conti-
guidade Espacial e Temporal, primam pelo posicionamento si-
multâneo de imagens e palavras correspondentes, ou de áudios
e imagens relacionados, de forma a favorecer a compreensão da
mensagem multimídia. Ambos os princípios encontram respaldo
na Gestalt, de acordo com as leis de Continuidade, Proximidade
e Semelhança, as quais, referendadas pelas categorias de harmo-
nia e equilíbrio bem como pelas técnicas de arredondamento e
sequencialidade, permitem a leitura do objeto sem quebras, de
forma contínua e organizada logicamente.
A administração do processamento essencial, por sua vez,
é amparada no Princípio de Segmentação que possibilita ao estu-
dante a leitura do conteúdo multimídia em seu ritmo. Tal princí-
pio encontra respaldo na lei de Segregação da Gestalt que traba-
lha a capacidade perceptiva de separar, identificar, evidenciar ou
destacar unidades formais em um todo compositivo, reafirmado
pelo uso de contrastes e por técnicas de fragmentação.
Ainda como parte do processamento essencial, Mayer (op.
cit.) defende a apresentação de conceitos-chave aos estudantes
(Princípio de Preformação), os quais favorecem a concentração
do leitor no encadeamento lógico dos conteúdos, uma vez que
ele já conhece os elementos centrais do material. As técnicas de
arredondamento e sequencialidade do Sistema Visual da Forma
confirmam a importância dessa fluidez, favorecendo a boa conti-
nuidade e permitindo a leitura do objeto sem quebras ou sobres-
saltos visuais, os quais poderiam desconcentrar o aluno.
O último princípio do processamento essencial é a Mo-
dalidade, que cumpre o objetivo de diminuir a carga do canal
visual ao apresentar o conteúdo multimídia na forma de áudio.
Em última análise, o Princípio de Modalidade busca facilitar a
compreensão e a interpretação dos conteúdos, mesmo propósito
da Pregnância, a lei básica da percepção visual da Gestalt, a qual
depende fortemente de equilíbrio, clareza e coerência nas compo-
sições multimídia.
Finalmente, o processamento generativo opera dentro do
universo da motivação do aprendiz, ao buscar características mais
humanas nos materiais multimídia, por meio dos princípios de
Personalização, Voz e Personificação. Na busca constante pela
estabilidade do nosso sistema nervoso, um elevado índice de
Pregnância, harmonia e espontaneidade nos materiais irá reiterar
fortemente os propósitos do processamento generativo. Por outro
lado, a presença de um agente estático nos conteúdos multimídia
(Princípio de Imagem), muitas vezes pode causar um contraste
desnecessário e um ruído visual, indesejáveis para uma leitura
adequada da composição em análise.
A seguir, passaremos a discutir as relações entre a Teoria
Cognitiva de Aprendizagem Multimídia e postulados centrais da
Interação Humano-Computador.

3.2. Aprendizagem Multimídia na Interação Humano-


Computador
Para o planejamento e a implementação de materiais mul-
timídia, os princípios estudados em Interação Humano-Computa-
dor (IHC) são fundamentais. IHC é “uma disciplina interessada
no projeto, implementação e avaliação de sistemas computacio-
nais interativos para o uso humano, juntamente com os fenôme-
nos relacionados a esse uso”. (Hewett et al. 1992, apud Barbosa;
Silva, 2010, p. 10). É uma área de estudo multidisciplinar que se
ocupa com a otimização da experiência de usuários de sistemas
e produtos interativos, aplicando diversos critérios de qualidade,
dentre eles a usabilidade e a acessibilidade, por exemplo. Usabi-
lidade, segundo Preece et al. (2005, p. 35), é “geralmente consi-
derada como o fator que assegura que os produtos são fáceis de
usar, eficientes e agradáveis – da perspectiva do usuário”. Estes
autores ainda recordam que a usabilidade implica algumas metas,
tais como: eficácia, eficiência, segurança, utilidade, ser fácil de
aprender e também de memorizar.
Nielsen (1993), propôs heurísticas (características desejá-
veis) para avaliação de usabilidade de interfaces interativas. Tais
heurísticas são: 1) visibilidade do status do sistema (o sistema
deve manter o usuário informado sobre o que está ocorrendo na
tela); 2) compatibilidade do sistema com o mundo real (a interfa-
ce deve dispor informação ao usuário em termos e formas que lhe
sejam familiares e naturais); 3) controle e liberdade do usuário (o
sistema deve permitir que o usuário execute ações e as desfaça
se necessário); 4) consistência e padrões (a interface deve seguir
convenções e demonstrar padronização); 5) prevenção de erros
(um sistema eficiente deve, antes de buscar solucionar erros, pre-
venir que eles ocorram); 6) reconhecimento ao invés de memória
(poupar a memória do usuário, tornando comandos visíveis e inte-
ligíveis); 7) flexibilidade e eficiência de uso (tornar o uso eficien-
te para usuários com diferentes níveis de experiência, permitindo-
-lhes contar com aceleradores, atalhos e modos de customização);
8) estética e design minimalista (informação irrelevante deve ser
evitada); 9) ajuda aos usuários no reconhecimento, diagnóstico e
correção de erros (mensagens de erro devem ser compreensíveis
aos usuários, em linguagem que lhes seja natural); e 10) ajuda e
documentação (quando necessário, o usuário deve encontrar in-
formação de qualidade de forma rápida e objetiva).
Embora a acessibilidade não seja abordada por Nielsen (op.
cit.), ela é um critério de qualidade de IHC que “está relaciona-
do com a capacidade de o usuário cessar o sistema para interagir
com ele, sem que a interface imponha obstáculos” (Barbosa; Silva,
2010, p. 32). Isto significa, essencialmente, que qualquer pessoa,
independentemente de suas capacidades físico-motoras, percepti-
vas, culturais e sociais, deve ter a possibilidade de usufruir os bene-
fícios da vida digital, tendo acesso, por exemplo, a todos os servi-
ços da rede mundial de computadores, sem barreiras.
Tendo em vista que os princípios apontados em Mayer
(2009, 2014) representam uma importante contribuição teórica
e empírica à elaboração de materiais didáticos digitais, e como
forma de demonstrar o alcance de sua teoria, apresentam-se no
Quadro 2 algumas conexões percebidas entre os seus princípios e
as heurísticas de usabilidade dispostas em Nielsen (1993).
Quadro 2. Aprendizagem Multimídia e Heurísticas de Usabilidade

Tipos de Princípios de
Heurísticas de Usabilidade
Processamento Aprendizagem Multimídia

Coerência Estética e Design Minimalista


Redundância Estética e Design Minimalista
Consistência e Padrões
Processamento Sinalização Visibilidade do status
Estranho Reconhecimento
Contiguidade Espacial Consistência e Padrões
Contiguidade Temporal Consistência e Padrões
Consistência e Padrões
Segmentação
Acessibilidade
Processamento
Preformação Ajuda e Documentação
Essencial
Modalidade Estética e Design Minimalista
Reconhecimento
Personalização
Acessibilidade
Reconhecimento
Voz
Acessibilidade
Processamento Personificação Reconhecimento
Generativo
Imagem Estética e Design Minimalista

Fonte: Nielsen (1993)

Contribuindo com a redução do processamento estranho,


observa-se, de acordo com o Quadro 2, que o Princípio de Coe-
rência guarda forte relação com a heurística de Estética e Design
Minimalista, a qual sugere que o material seja apresentado apenas
com as funções essenciais necessárias ao aprendizado do aluno.
Também relacionado à mesma heurística, o Princípio de Redun-
dância ressalta que seja evitado o congestionamento dos canais de
recepção: visual e auditivo. Ou seja, o tipo de informação apre-
sentado deve ser fornecido de forma sequenciada, por meio de
cada um dos canais, sem gerar concorrência entre eles. Assim,
quando os conteúdos didáticos deixam de cumprir o seu papel e
passam a distrair o aluno, há um aumento da carga cognitiva do
material, passando a prejudicar o processo de aprendizagem.
Por sua vez, o Princípio de Sinalização se relaciona com
as heurísticas de: Visibilidade do Status, pelo destaque a ser dado
em informações importantes incluídas no material, e Reconheci-
mento, pelo fato de a sinalização disposta em conteúdos multimí-
dia apoiar a apropriação dos conteúdos.
A heurística de Consistência e Padrões também se rela-
ciona com o Princípio de Sinalização dentro do processamento
estranho. Nesta perspectiva, informações irrelevantes tais como o
uso desnecessário de cores, gráficos e imagens, ao invés de con-
tribuir, podem dificultar o aprendizado do aluno, ao disputarem
importância visual com outros elementos da aula digital. Também
ligada aos Princípios de Contiguidade Espacial e Temporal, essa
mesma heurística indica que a importância de se preservar um pa-
drão no posicionamento e exibição de informações, em diferentes
telas, pode resultar em uma formatação que favoreça o reconheci-
mento dos conteúdos pelo usuário.
Observando-se o Princípio de Segmentação, elemento im-
portante no gerenciamento do processamento essencial, percebe-
-se uma forte relação com a heurística de Consistência e Padrões,
uma vez que, ao adotar a estratégia de segmentação de conte-
údos, um padrão deverá ser seguido em conteúdos multimídia.
Por exemplo, ao dividir-se o conteúdo de um curso ou disciplina
em tópicos, ou de um tópico em sub-tópicos, possibilita-se ao
estudante a opção de escolha do conteúdo a ser explorado, o que
favorece o acesso a um conteúdo específico.
Quanto ao Princípio de Preformação percebe-se uma rela-
ção com a heurística de Ajuda e Documentação. Por exemplo, ao
explorar determinado conteúdo audiovisual ou textual, por vezes,
é necessário conceder ao estudante recursos como legendas, glos-
sários, dicas, descrições, dentre outras funções, que o ampare em
suas mais variadas necessidades de aprendizagem. Estes recursos
podem ajudar o estudante a elaborar conhecimentos prévios sobre
determinado conteúdo.
Por último, percebe-se uma relação entre o Princípio de
Modalidade e a heurística de Estética e Design Minimalista. Isto
é constatado quando se evitam situações de competição entre os
canais de recepção (visual e auditivo), na exibição de informa-
ções. Assim, faz-se necessário atentar para que conteúdos extra,
incluídos no material, não venham a competir com informações
que são relevantes ao aprendizado do estudante, o que garantirá a
manutenção de sua atenção e evitará a dispersão.
Finalmente, há que se considerar a relação entre os Prin-
cípios de Personalização e Personificação e a heurística de Reco-
nhecimento, dentro do processamento generativo. Isto porque, ao
ser implementado um estilo conversacional no texto do material
multimídia, ou na exibição de outro tipo de conteúdo que crie
uma sensação de presença social nos materiais (e.g. vídeos com
narradores humanos, avatares que simulem gestos, movimentos
ou contato visual humano etc.) é importante que uma padroniza-
ção seja preservada ao longo de todo o material. Isto favorecerá
o reconhecimento dos temas pelo estudante, uma vez que ele não
precisará fazer um grande esforço de memória para compreender
o conteúdo compartilhado. A heurística de Reconhecimento tam-
bém guarda relação com o Princípio de Voz, pois a voz humana,
implementada no material multimídia, caso esteja padronizada,
pode levar o estudante a reconhecer determinadas estratégias, te-
mas ou conceitos a serem abordados em conteúdos multimídia
com objetivos educacionais.
No que concerne ao Princípio de Imagem, verifica-se uma
relação com a heurística de Estética e Design Minimalista quando
apresentações multimídia são exibidas. De acordo com o princí-
pio, a imagem específica do orador não necessariamente poten-
cializa o aprendizado. Nesta perspectiva, a escolha da imagem
deve ser feita de forma criteriosa e complementar o conteúdo que
está sendo fornecido na narração.
Na próxima seção, discorreremos sobre a importância da
Teoria Cognitiva de Aprendizagem Multimídia para o Design Ins-
trucional.

3.3. Aprendizagem Multimídia no Design Instrucional


O Design Instrucional (DI) é uma área de estudo e de prá-
tica que se ocupa com o desenvolvimento de oportunidades de
aprendizagem. Ele pode ser definido como “a ciência e a arte de
criar especificações detalhadas para o desenvolvimento, avalia-
ção e manutenção de situações que facilitam a aprendizagem e a
performance” (RICHEY et al. 2011, p. 3). O DI apresenta um pro-
cesso sistêmico, apoiado no conhecimento sobre como as pessoas
aprendem. Modelos de Design Instrucional geralmente aplicam
conceitos de análise, planejamento, desenvolvimento, implemen-
tação e avaliação, dentro de um processo iterativo de planejamen-
to (Silva et al. 2013). Assim sendo, essa disciplina complementa
a formação básica do profissional de Sistemas e Mídias Digitais
para a compreensão de quais conteúdos e de que forma as mídias
e os sistemas digitais podem ser utilizados no âmbito educacional
para aprimorar a aprendizagem.
Conhecimentos sobre a Teoria Cognitiva de Aprendizagem
Multimídia são importantes para o planejamento de oportunidades
educacionais, sobretudo considerando-se o contexto da aprendiza-
gem eletrônica, mediada pelas tecnologias da informação e comu-
nicação. Seja na educação a distância, semipresencial ou no apoio à
educação presencial, o uso de mídias, segundo Filatro (2008), deve
ser bem justificado pelo designer instrucional, de acordo com uma
determinada abordagem pedagógica/andragógica.
O design de conteúdos multimídia deve estar ancorado no
conhecimento sobre como as pessoas percebem o mundo e sobre
como elas aprendem. A teoria da carga cognitiva, que deu base
para a Teoria Cognitiva de Aprendizagem Multimídia, já expli-
cada anteriormente na seção 2, trata dessa capacidade limitada
de armazenamento da memória humana. Dessa forma, métodos
instrucionais orientam a seleção de informação que canalizará a
atenção de quem aprende, enfatizando o que é realmente essen-
cial e aprimorando a aprendizagem significativa.
Assim, no aprendizado eletrônico, multimidiático, faz-se
necessário aplicar os princípios discutidos por Mayer (2009, 2014),
a fim de se reduzir o processamento estranho, administrar o proces-
samento essencial e fomentar o processamento generativo.
O estudo desenvolvido pelas autoras deste capítulo, em
colaboração com outros pesquisadores (David et al. 2015), evi-
dencia a relevância deste conhecimento para o desenvolvimento
de aulas digitais voltadas à formação de professores de Física.
A pesquisa apresenta um checklist de natureza interdisci-
plinar para a avaliação de materiais didáticos digitais. Os parâ-
metros agregados ao instrumento congregam elementos de dife-
rentes campos de conhecimento e estão fundamentados em heu-
rísticas de usabilidade (Nielsen, 1993), nas Recomendações de
Acessibilidade para Conteúdo WEB (W3C, 2008) e em estudos
linguísticos, os quais encontram respaldo na Teoria Cognitiva de
Aprendizagem Multimídia de Mayer (2009, 2014). O instrumen-
to foi aplicado às aulas de uma disciplina de Física, ministrada
a distância dentro do Sistema Universidade Aberta do Brasil na
Universidade Federal do Ceará (UAB/UFC).
O estudo foi desenvolvido como parte de um projeto de
monitoria de graduação da Universidade Federal do Ceará. O pro-
jeto intitulado Materiais Didáticos Digitais como Agentes de Re-
dução da Evasão na Graduação a Distância1 buscou compreen-
der as possíveis relações entre a qualidade dos materiais didáticos
veiculados nas disciplinas dos nove cursos de graduação a dis-
tância do Sistema UAB/UFC, e seus índices de evasão. O intuito
do projeto foi formar um corpo de conhecimentos que permitisse
1
http://projetomddigital.wix.com/projeto
conceder orientações teórico-práticas aos professores autores de
materiais didáticos digitais na seleção e no desenvolvimento de
conteúdos multimídia adequados aos propósitos de aprendizagem
de seus estudantes, tendo em vista um maior nível de engajamen-
to e um menor índice de desistência nos cursos. No projeto, atu-
aram bolsistas oriundos de diferentes áreas de conhecimento, tais
como: Licenciatura em Letras, Pedagogia e do Bacharelado em
Sistemas e Mídias Digitais da UFC. Isto viabilizou a construção
do checklist interdisciplinar para a avaliação de materiais didáti-
cos digitais.
De posse do instrumento, David et al. (2015) o aplicaram
às aulas digitais de uma disciplina do 5o semestre do curso de
Licenciatura em Física Semipresencial do Sistema UAB/UFC,
a qual foi ofertada entre os meses de janeiro e junho de 2015.
A disciplina foi disponibilizada no ambiente virtual SOLAR2,
da própria UFC. Com uma carga horária de 96 horas/aula, seu
conteúdo foi dividido em 06 aulas, com duração média de 20 a
25 dias. Cada aula continha tópicos específicos de discussão, que
variavam em quantidade (entre quatro e seis tópicos por aula). A
disciplina totalizou 26 tópicos os quais foram avaliados indivi-
dualmente de acordo com os itens do checklist, fundamentado na
Teoria Cognitiva de Aprendizagem Multimídia.
Os resultados indicaram a adequação da disciplina investi-
gada à maioria dos aspectos tecnológicos e linguísticos contempla-
dos no instrumento. Os conteúdos disponibilizados aos estudantes
favoreceram a redução de processamento estranho, a administração
http://www.solar.virtual.ufc.br/
2
do processamento essencial e fomentaram o processamento gene-
rativo. O instrumento apontou, contudo, que há aspectos a serem
melhorados em futuras edições da disciplina, o que enfatiza, mais
uma vez, a relevância de que o design de conteúdos multimídia
esteja ancorado no conhecimento sobre como as pessoas percebem
o mundo e sobre como elas aprendem, o que envolve métodos de
análise, planejamento, desenvolvimento, implementação e avalia-
ção. Entendemos que o instrumento apresentado no estudo de Da-
vid et al. (op. cit.) pode ser uma contribuição nesta direção.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Teoria Cognitiva da Aprendizagem Multimídia não só
perpassa a formação do profissional de Sistemas e Mídias Digi-
tais, mas faz interface com várias áreas de estudo e comprova
sua importância, ao oferecer fundamentação sólida para o pla-
nejamento e implementação de produtos e sistemas multimídia,
sobretudo os que têm finalidades educacionais.
Entende-se, também, que tal formação deve transcender a instru-
mentalização tecnológica e dar lugar a um conhecimento mais
holístico, integrador, crítico e conectado à realidade socioeconô-
mica e cultural de onde se dará a atuação de tal profissional.
Finalmente, a Teoria Cognitiva da Aprendizagem Multimídia é
uma contribuição que merece mais destaque e estudos. Sobretu-
do, carece de difusão em nosso país por meio de literatura abun-
dante em língua portuguesa.
REFERÊNCIAS
BARBOSA, S.; SILVA, B. Interação Humano-Computador. Rio
de Janeiro: Elsevier, 2010.
DAVID, P. B.; SILVA , C. L. O.; SANTOS, I. O.; SANTOS, V.
E. C. Aprendizagem Multimídia na Formação Inicial de Profes-
sores de Física: um Checklist Interdisciplinar para a Avaliação de
Materiais Didáticos Digitais. IN: Anais do XX Congresso Inter-
nacional de Informática Educativa. Nuevas Ideas en Informática
Educativa. Santiago, Chile: Universidad de Chile, Facultad de Ci-
éncias Físicas y Matemáticas, v. 11. pp. 97-108, 2015.
ENGELMANN, A. A Psicologia da Gestalt e a Ciência Empíri-
ca Contemporânea. IN: Psicologia: Teoria e Pesquisa. Jan-Abr
2002, Vol. 18, n. 1, pp. 001-016, 2002.
FILATRO, A. Design Instrucional na Prática., São Paulo: Pear-
son – Prentice Hall, 2008.
GOMES-FILHO, J. Gestalt do Objeto. São Paulo: Editora Escri-
turas,2000.
MAYER, R. Multimedia Learning. New York, NY: Cambridge
University Press, 2009.
__________Research-Based Principles for Designing Multime-
dia Instruction. IN: Applying Science of Learning in Education:
Infusing Psychological Science into the Curriculum. 2014
NIELSEN, J. Usability Engineering. New York, NY: Academic
Press.1993.
PAIVIO, A. Dual Coding Theory: Retrospect and Current Status.
Canadian Journal of Psychology, 45(3), pp. 255-287, 1991.
PREECE, J.; ROGERS, Y.; SHARP, H. Design de Interação: Além
da Interação Homem-Computador. Porto Alegre: Bookman, 2005.
SILVA, C. L. O; LIMA, L.; LOUREIRO, R. C.; JUCÁ, A. O. Ensino
de Design Instrucional: Relatos de Experiência. IN: Anais do XIX
Workshop de Informática na Escola (WIE), 2013. Disponível em:
<http://www.br-ie.org/pub/index.php/wie/article/view/2632> Aces-
so em 15/04/2016.
RICHEY, R.C., KLEIN, J.D., TRACEY, M.W. The Instructional
Design Knowledge Base –Theory, Research and Practice. Rout-
ledge, NY, 2011.
MATEMÁTICA
APLICADA
À MULTIMÍDIA
Matemática Aplicada à Multimídia
Antonio José Melo Leite Júnior, Clemilson Costa Santos

1. INTRODUÇÃO
A Matemática é uma das ciências/linguagens mais antigas
da humanidade. No entanto, seu conhecimento, apesar de funda-
mental, muitas vezes ainda causa aflição ao aprendiz, seja devido
à sua necessidade intrínseca de abstração ou ao emprego de méto-
dos inadequados de estudo, observação e uso. Bem mais recente,
mas talvez tão enigmática quanto, a Multimídia é um campo do
conhecimento humano cujas aplicações moldam os tempos atu-
ais; porém, a criação de páginas web, aplicativos para dispositi-
vos móveis ou jogos digitais, dentre muitos outros de seus usos,
ainda recebem uma aura de mistério, ou mesmo glamour elitista,
incompatível com sua ideia de simplificar a comunicação entre
homem e computador.
O objetivo deste trabalho é unir Matemática e Multimídia
através do desenvolvimento de exemplos práticos, permitindo ao
leitor compreender conceitos de ambas as áreas de conhecimento
e propor suas próprias possibilidades de construção mista. Para
tanto, será revivida uma prática peculiar, hoje quase esquecida,
que remonta a mais de trinta anos atrás: o desenvolvimento de
programas de computador pela mais pura e simples diversão.
Sendo a primeira parte de algo que se espera tornar bem
maior, os autores aguardam o posterior contato do leitor, através
dos e-mails fornecidos, para a continuação desse trabalho, futura-
mente cobrindo outros ramos da Matemática e aplicações da Mul-
timídia, buscando-se sempre aprimorar a experiência de ensino/
aprendizagem aqui revisitada.

2. METODOLOGIA ADOTADA
Nos anos 80, com a popularização dos microcomputadores
de 8 bits, tornou-se comum a publicação de livros voltados a ensi-
nar programação (DATASSETE, 2016). Às vezes vendidas até no
formato de fascículos colecionáveis, comercializados em bancas
de jornais, essas publicações geralmente abordavam exemplos
práticos de como solucionar questões sérias ou mesmo somente
se divertir com o computador (INPUT, 2016). Cada problema era
rapidamente exposto e orientações gerais sobre a solução eram
brevemente discutidas. Empregando a linguagem Basic, comum
nos primeiros computadores pessoais, eram apresentados códigos
que deveriam ser digitados pelos aspirantes a programadores. A
ideia principal não era exatamente ensinar programação, mas sim
demonstrar os possíveis usos daquela grande novidade, o micro-
computador, no dia-a-dia. É importante lembrar que, à época, o
termo “usuário” sequer era comum, pois ainda havia poucas apli-
cações realmente profissionais para os microcomputadores dispo-
níveis. Essa foi a era da microcomputação como hobby e do sur-
gimento dos “micreiros”, indivíduos sem muita formação técnica
mas que, bastante decididos, criavam seu próprio software por
pura diversão: cálculos de impostos, simulações simples de con-
ceitos físicos, desenho de figuras e criação de jogos, por exemplo.
Apesar do pouco aprofundamento, percebeu-se que a sim-
ples introdução de questões e a exposição das respectivas solu-
ções acabou estimulando a elaboração de novos materiais pelos
próprios desenvolvedores amadores. Ocorreu, assim, um proces-
so bastante particular de aprendizagem, onde um conhecimento
básico fomentava a análise de novos problemas e, com um pouco
de tempo, raciocínio, pesquisa e – por que não? – sorte, a respec-
tiva solução surgia. Daí em diante, um ciclo se firmava, onde as
soluções geradas serviam de base para outros problemas, mais
complexos, que mais cedo ou mais tarde acabariam sendo resol-
vidos. Esse ciclo, além de servir à evolução do processo de apren-
dizagem, logicamente também proporcionava ricos momentos
para amadurecimento do indivíduo em diversos âmbitos.
É bem verdade que o conhecimento adquirido nesse
processo não necessariamente apresentava uma estrutura formal
ou bem consolidada. Mas servia de base para uma melhor
compreensão da máquina e – mais importante – o aprimoramento
da capacidade de resolver problemas. Posteriormente, muitos
desses desenvolvedores amadores acabaram buscando a
profissionalização. Mas mesmo aqueles que não continuaram a
lidar diretamente com a programação de computadores obtiveram
algum tipo de ganho, seja pessoal ou profissional.
É com base nessa prática de geração cíclica de conhecimen-
to que este trabalho foi estabelecido. Assim, a seguir, para cada
ramo da Matemática considerado nesse trabalho (aritmética, geo-
metria e trigonometria), serão apresentados diferentes problemas
onde a ciência e criatividade, juntas, podem auxiliar diretamente na
busca de respostas no campo da Multimídia. Para cada um desses
problemas, uma solução será apresentada em linguagem Proces-
sing, com ambiente de desenvolvimento gratuito, compatível com
diversos sistemas operacionais e muito fácil de operar Processing
(2016). Para simplificar os raciocínios necessários, as soluções
apresentadas serão baseadas em modelos simplificados (figuras
geométricas elementares, bases de comportamentos, etc.).
As principais linhas do código apresentado serão propo-
sitalmente explicadas de forma bastante breve, compondo uma
tabela. Essas explicações serão necessariamente curtas, uma vez
que somente o julgado essencialmente necessário será revelado
ao leitor, levando-o a questionar algumas decisões tomadas no
código. Depois será solicitada a realização de alguns exercícios
simples, geralmente abordando a alteração, retirada ou inclusão de
algumas linhas do código exposto. Pesquisando em outras obras
ou na internet, o leitor deverá tentar resolver os problemas pro-
postos. Tais exercícios servirão de base para esclarecer os pontos
intencionalmente deixados duvidosos, buscando-se garantir uma
melhor compreensão da solução como um todo. Ao final de cada
sessão será proposto um desafio, que o leitor deverá tentar resol-
ver por conta própria, com base nos problemas discutidos e nos
respectivos exercícios propostos.
3. PROBLEMAS, EXERCÍCIOS E DESAFIOS
A seguir começam a ser apresentados os ramos da Ma-
temática selecionados e os respectivos problemas, exercícios a
serem resolvidos e desafios propostos em três ramos específicos
da Matemática: aritmética, geometria e trigonometria.

3.1. Aritmética
A aritmética (do grego arithmós: número) é o ramo da Ma-
temática que lida com os números e as suas respectivas operações.

3.1.1. Problema 1: O Carro de Corridas com Problemas


Um carro de corridas deve se deslocar de um lado ao outro
em uma estrada. No entanto, seu motor apresenta problemas e,
por isso, o carro não consegue manter uma velocidade constante,
às vezes acelerando um pouco mais ou um pouco menos (Figura
1).
Figura 1: O Carro de Corridas com Problemas, Problema 1.

Fonte: Elaborado pelos autores.


Código
01 int PosicaoCarro = 0;
02 int Avanco;
03
04 void setup(){
05 size(800, 50);
06 }
07
08 void draw(){
09 background(0);
10 Avanco = int(random(10));
11 PosicaoCarro = PosicaoCarro + Avanco;
12 rect(PosicaoCarro, 0, 100, 50);
13 }

Explicação
Linhas Instruções
01 É criada a variável PosicaoCarro e iniciada com o valor 0
02 É criada a variável Avanco
04 É definida a função void setup(), cujo conteúdo (delimitado por { e }) é executado
inicialmente
05 É aberta uma janela de 800 pixels de largura por 50 pixels de altura
08 É definida a função void draw(), cujo conteúdo (delimitado por { e }) é executado
ciclicamente logo após o fim da função void setup
10 Utilizando random e int, é sorteado um valor entre 0 e 10 e armazenado em Avanco
11 O valor de Avanco é adicionado ao valor de PosicaoCarro
12 Utilizando rect, é desenhado um retângulo com as seguintes propriedades: canto
superior esquerdo na posição horizontal igual a PosicaoCarro e posição vertical 0, e
largura de 100 pixels e altura de 50 pixels
Exercícios
O que aconteceria se a linha 09 fosse apagada? O que o
número no interior de background representa?
O comando println é geralmente utilizado para compreender
o funcionamento de partes específicas do código, apresentando
informações no console do ambiente de desenvolvimento Proces-
sing. Explique o que acontece se for inserida o seguinte código
abaixo da linha 11: println(PosicaoCarro);.
Caso quiséssemos que o carro mantivesse uma velocidade
constante, o que deveria ser alterado no código?
Altere o código para que o mesmo possa operar com car-
ros e ruas de diferentes dimensões.

3.1.2. Problema 2: Pintura Digital


Empregando uma única cor, um artista gostaria de criar uma
imagem com pinceladas de diferentes intensidades (Figura 2).
Figura 2: Pintura Digital, Problema 2.

Fonte: Elaborado pelos autores.

Código
01 color Cor = color(255, 64);
02
03 void setup(){
04 size(800, 600);
05 background(0);
06 noStroke();
07 fill(Cor);
08 }
09
10 void draw(){
11 if(mousePressed == true)
12 ellipse(mouseX, mouseY, 20, 20);
13 }
Explicação
Linhas Instruções
01 É criada a variável Cor e iniciada com a tonalidade branca semitransparente

11 Utilizando if, é verificado se é verdade que o botão do mouse está pressionado,


nesse caso sendo a linha seguinte executada
12 Utilizando ellipse, é desenhado um círculo com as seguinte propriedades: centro na
posição horizontal igual à posição horizontal do cursos do mouse e posição vertical
na posição vertical do mouse, e raio de 20 pixels

Exercícios
Na linha 01, o que representam cada um dos dois números no
interior de color?
O que aconteceria se a linha 06 fosse apagada?
Explique o que aconteceria se a linha 12 fosse substituída por
ellipse(mouseX, mouseY, mouseX, mouseY);.
Altere o código para que o mesmo possa operar com pincéis e
telas de diferentes dimensões.

3.1.3. Desafio 1
Crie um jogo onde dois carros apostam uma corrida. Um
dos carros deve ser controlado através do mouse, pelo ser huma-
no, e o outro carro deve ser controlado pelo computador. Ao final,
o jogo deve indicar no console qual foi o carro vencedor.
3.2. Geometria
A geometria (do grego geo: terra;  metria: medida) é o
ramo da Matemática que lida com formas, posições e dimensões
de figuras no espaço.

3.2.1. Problema 3: Tabuleiro de Xadrez


Um tabuleiro de xadrez é apresentado na tela. Apesar de
seguir à risca o modelo clássico, onde há 64 casas brancas e pre-
tas alternadas, esse tabuleiro pode ser alterado, ganhando novas
dimensões ou arranjos, com mais ou menos casas (Figura 3).

Figura 3: Tabuleiro de Xadrez, Problema 3.

Fonte: Elaborado pelos autores.


Código
01 void setup(){
02 size(400, 400);
03 for(int X = 0; X < 8; X++)
04 for(int Y = 0; Y < 8; Y++){
05 if ((X+Y) % 2 == 1)
06 fill(0);
07 else
08 fill(255);
09 rect(X*50, Y*50, 50, 50);
10 }
11 }

Explicação
Linhas Instruções
03 Utilizando for, é criado um laço que faz a variável X crescer de 0 até 7, executando
o que se encontra na linha seguinte
04 Utilizando for, é criado um laço que faz a variável Y crescer de 0 até 7, executando
todo o conteúdo seguinte, delimitado por { e }
05 Utilizando if, é verificado se o resto da divisão (%) da soma de X e Y por 2 é igual
a 1, nesse caso sendo a linha seguinte executada
07 Utilizando else, caso a comparação do if anterior não seja verdade, é executada a
linha seguinte
09 Utilizando rect, é desenhado um retângulo com as seguintes propriedades: canto
superior esquerdo na posição horizontal igual a X x 50 e posição vertical Y x 50, e
largura e altura de 50 pixels
Exercícios
Altere o código para que o mesmo gere tabuleiros com
outras dimensões, mas mantendo o mesmo número de casas ori-
ginal.
Altere o código para que o mesmo gere tabuleiros com
outras dimensões e com diferentes números de casas horizontais
e verticais.
Altere o código para que a ordem de preenchimento das
casas seja modificada, sendo agora a primeira preta, a segunda
branca e assim sucessivamente.
Explique porque o código não seria mais executado corre-
tamente caso as variáveis X ou Y fossem do tipo float.

3.2.2. Problema 4: A Pulga Indecisa


Uma pulga se encontra indecisa para onde ir. Inicialmente
ela se desloca num sentido, mas inverte seu movimento sempre
que encontra um limite da tela, procedendo desta forma indefini-
damente (Figura 4).
Figura 4: A Pulga Indecisa, Problema 4

Fonte: Elaborado pelos autores.

Código
01 int PulgaX = 10;
02 int DeslocaX = 5;
03
04 void setup(){
05 size(600, 600);
06 }
07
08 void draw(){
09 background(0);
10 ellipse(PulgaX, 300, 20, 20);
11
12 PulgaX = PulgaX + DeslocaX;
13
14 if(PulgaX >= 590)
15 DeslocaX = -1 * DeslocaX;
16
17 If(PulgaX <= 10)
18 DeslocaX = -1 * DeslocaX;
19 }

Explicação
Linhas Instruções
01 É criada a variável PulgaX e iniciada com o valor 0

02 É criada a variável Deslocax e iniciada com o valor 5

10 Utilizando ellipse, é desenhado um círculo com as seguinte propriedades: centro


na posição horizontal igual a PulgaX e posição vertical 300, e raio de 20 pixels
12 O valor de DeslocaX é adicionado ao valor de PulgaX
14 Se o valor de PulgaX for maior ou igual a 590, a linha seguinte deve ser execu-
tada
15 O valor de DeslocaX é multimplicado por -1

17 Se o valor de PulgaX for menor ou igual a 10, a linha seguinte deve ser execu-
tada
18 O valor de DeslocaX é multimplicado por -1

Exercícios
Na linha 02, o que aconteceria se DeslocaX recebesse o
valor inicial 7?
Considerando a alterações proposta no item anterior, por
que se deve utilizar preferencialmente <= e >= em vez de < e >?.
Empregando o operador lógico ou, representado por ||,
unifique o teste presente nas linhas 14 e 15, criando uma única
linha com if.
Altere o código para que o mesmo possa movimentar cor-
retamente uma pulga de diâmetro 50 pixels, considerando a veri-
ficação dos limites da tela.

3.2.3. Desafio 2
Crie uma aplicação onde uma grade, formada por minús-
culos quadrados com 3 pixels de lado, se estende por toda a tela e
uma pulga se desloca simultaneamente tanto na horizontal quanto
na vertical, invertendo seu sentido de sua movimentação sempre
que atinge um dos limites da tela.

3.3. Trigonometria
A trigonometria (do grego trigono: triângulo; metria: me-
dida) é o ramo da Matemática que estuda as relações existentes
entre os lados e os ângulos de um triângulo.

3.3.1. Problema 5: Dividindo uma Pizza


Um grupo de amigos se reúne para comer uma pizza. Al-
guns querem somente uma fatia; mas alguns, mais gulosos, querem
duas ou mais. Como o dinheiro está curto, a ideia é comprar a pizza
e dividi-la corretamente no número de fatias necessário (Figura 5).
Figura 5: Dividindo uma Pizza, Problema 5.

Fonte: Elaborado pelos autores.

Código
01 int NumeroFatias = 7;
02
03 void setup() {
04 size(600, 600);
05 float AnguloFatia = 2 * 3.14157 / NumeroFatias;
06 for(int I=0; I<NumeroFatias; I++)
07 arc(300, 300, 500, 500, I * AnguloFatia, (I + 1) * An-
guloFatia, PIE);
08 }
Explicação
Linhas Instruções
01 É criada a variável NumeroFatias e iniciada com o valor 7

05 É criada a variável AnguloFatia e o valor da mesma é calculado como 2 * Pi / Nu-


meroFatias
06 Utilizando for, é criado um laço que faz a variável I crescer de 1 até NumeroFatias,
executando o que se encontra na linha seguinte
07 Utilizando arc, é desenhado um arco com base numa elipse teórica com as seguintes
propriedades: centro na posição (300, 300), largura e altura iguais a 500 pixels. O
ângulo inicial do arco é igual a I x AnguloFatia radianos e o final é (I+1) x Angulo-
Fatia radianos.

Exercícios
Altere o valor de NumeroFatias presente na linha 01 e
avalie como o código calcula corretamente o tamanho de cada
fatia da pizza apresentada na tela.
O que seria necessário modificar no código para que a piz-
za desenhada se estendesse até as extremidades da tela?
Utilizando o comando println, mostre o valor da variá-
vel AnguloFatia no console e observe que o mesmo é calcula-
do em radianos.
Com base no valor de AnguloFatia, crie uma nova variável
(AnguloFatia2) que representará o ângulo de cada fatia, porém agora
transformado em graus. Apresente seu valor também no console.
3.3.2. Problema 6: Tempestade em Alto-Mar
Um barco enfrenta uma tempestade em alto-mar, subindo
e descendo cada uma das ondas. Curiosamente, porém, todas as
ondas possuem as mesmas características (altura, profundidade,
distâncias entre picos e vales, etc.) (Figura 6).

Figura 6: Tempestade em Alto-Mar, Problema 6.

Fonte: Elaborado pelos autores.


Código
01 float X = 0;
02
03 void setup() {
04 size(600, 600);
05 }
06
07 void draw(){
08 background(0);
09 float Y = sin(X);
10 arc(20 * X, 20 * Y + 300, 50, 30, 0, 3.14157, PIE);
11 X = X + 0.1;
12 }

Explicação
Linhas Instruções
01 É criada a variável X e iniciada com o valor 0

09 É criada a variável Y e o valor da mesma é calculado como seno de X

10 Utilizando arc, é desenhado um arco com base numa elipse teórica com as
seguintes propriedades: centro na posição horizontal igual a 20 x X e posição
vertical igual a 20 x X + 300, largura de 50 pixels e altura de 30 pixels. O ângulo
inicial do arco é igual a 0 radianos e o final é igual a Pi radianos.
11 É adicionado 0,1 ao valor de X.
Exercícios
O que aparece na tela se a linha 08 for apagada?
O que cada um dos dois números 20 controla na linha 10?
O que o número 300 controla na linha 10?
O que mudaria se, em vez de seno, fosse utilizada a função cosse-
no (comando cos) na linha 09?

3.3.3. Desafio 3
Crie uma aplicação onde um barco enfrenta a tempestade
do problema anterior, porém assim que sai da tela pela direita,
reaparece na mesma pela esquerda e continua seu movimento nas
ondas.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho teve como objetivo demonstrar aplicações
práticas do uso da Matemática na Multimídia. Para tanto, foi ado-
tada uma metodologia que consistiu em apresentar problemas es-
pecíficos, discutir uma solução para os mesmos e propor a reso-
lução de exercícios relacionados. Assim, busca-se tanto dissemi-
nar a importância da Matemática como elemento fundamental na
construção de soluções no campo da Multimídia quanto demons-
trar quão simples e instigante pode ser lidar com a programação
de computadores.
Sendo esta a primeira parte de um trabalho maior, que de-
verá englobar vários outros ramos da Matemática e suas respec-
tivas aplicações na Multimídia, os autores aguardam, através dos
e-mails fornecidos, comentários, sugestões e dúvidas, inclusive
aquelas relacionadas aos desafios apresentados, a fim de aprimo-
rar o material vindouro e aperfeiçoar a técnica de ensino/aprendi-
zagem aqui utilizada.

REFERÊNCIAS
DATASSETTE. Sua fonte de informações para equipamentos
clássicos. Disponível em: <http://www.datassette.org/>. Acesso
em 13.out.2016.
INPUT. Learn Programming – For Fun and The Future. Dis-
ponível em: <http://www.bombjack.org/commodore/magazines/
input/input.htm>. Acesso em 13.out.2016.
PROCESSING. Download Processing, Browse and Tutorials.
Disponível em: <http://processing.org/>. Acesso em 13.out.2016.
MODELAGEM 3D:
CONCEITOS BÁSICOS E
ESTADO DA ARTE
Modelagem 3D:
Conceitos Básicos e Estado da Arte
Mara Franklin Bonates, Andrei Bosco Bezerra Torres

1. INTRODUÇÃO

Neste capítulo são abordados os conceitos e técnicas re-


lacionados às áreas de Modelagem 3D e Animação Digital, bem
como uma breve apresentação do estado-da-arte.
A modelagem de objetos tridimensionais em computador
está presente em diversas áreas de mídias digitais. Maquetes ele-
trônicas, aplicações de simulação científica, prototipação para
impressão 3D e a criação de personagens e cenários para jogos e
animações 3D (e até mesmo 2D) são alguns dos exemplos que po-
demos citar. Um fator essencial para a criação de animações 3D é
o conhecimento de técnicas de modelagem tridimensional para a
construção de personagens e demais elementos de uma produção
de animação. Para a correta movimentação de um personagem
em animação 3D, é importante o conhecimento de técnicas de
modelagem específicas para esse fim. Além disso, é indispensá-
vel o conhecimento de aspectos de eficiência em modelagem, de
modo a se conseguir criar objetos tridimensionais com o mínimo
consumo de recursos computacionais.
2. MODELAGEM TRIDIMENSIONAL
Aplicações em mídias digitais, em grande parte, incluem
objetos com atributos volumétricos, ou seja, modelos tridimen-
sionais. O processo de construção de tais objetos em computa-
dor  se  dá por meio da utilização de softwares que possibilitam
ao artista a criação de modelos 3D, sem a necessidade de se co-
nhecer modelos matemáticos ou estratégias de representação em
computador. Nesta seção,  é dada  especial ênfase a Modelagem
Tridimensional voltada à criação de elementos presentes em ce-
nas de animação digital 3D.

2.1 Por quê estudar Modelagem 3D?


Uma área em expansão atualmente é a produção de anima-
ções digitais. No caso da animação digital 3D, faz-se necessária
a construção de cenários tridimensionais, bem como a criação de
personagens e game assets3. E, mesmo na animação 2D, é cres-
cente a adoção de objetos, cenários e até mesmo de personagens
totalmente tridimensionais, com técnicas de renderização que si-
mulam o visual do desenho tradicional, para aumentar a veloci-
dade da produção da animação. A esta técnica dá-se o nome de
Animação Híbrida, ou Animação 2D/3D. Exemplos de animação
híbrida podem ser encontrados em filmes como The Triplets of
Belleville, Iron Giant e Treasure Plane. (O’HAILEY,2010).

3
São denominados game assets os elementos que compõem um jogo eletrôni-
co, como, por exemplo, personagens, objetos 3D, sons, dentre outros.
Ferramentas computacionais de custo acessível e até mes-
mo gratuitas popularizam o acesso ao universo da produção de
animações digitais 3D, ampliando possibilidades para artistas e
aprendizes interessados em ingressar nessa área. Existem inú-
meros softwares para modelagem tridimensional, que podem ser
categorizados de acordo com o público-alvo e o seu objetivo. Na
Tabela 1 são apresentados alguns dos softwares existentes.

Tabela 1: Softwares de Modelagem 3D


Nome Licença Versão Acadêmica Informações Adicionais
Blender Open Source Abrange todas as áreas, da
modelagem a efeitos pós-ren-
derização
3ds Max Comercial Sim, gratuita1 Uso em modelagem, anima-
ção, jogos, arquitetura
Maya Comercial Sim, gratuita2 Ganhou mercado por sua ex-
tensibilidade e flexibilidade

Rhinoceros Comercial Sim, paga2 Foco em modelagem NURBS


e de precisão
ZBrush Comercial Sim, paga2 Modelagem escultural utili-
zando pixols3
Cinema 4D Comercial Sim, gratuita2 Forte adoção na área de mo-
tion graphics

Fonte: Os próprio autores.

Esta ampla variedade de ferramentas disponíveis favorece


o surgimento de produções independentes e até mesmo a forma-
ção de pessoal especializado apto a colaborar com empresas de
grande porte, como estúdios de animação e empresas de desen-
volvimento de jogos digitais. 
Mas, o que faz a diferença entre um entusiasta curioso e
um colaborador contratado por um estúdio? A resposta é: o co-
nhecimento aprofundado de como tirar melhor proveito dessas
ferramentas de modelagem tridimensional

2.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA E ESTADO DA ARTE

Figura 1: Ivan Sutherland demonstrando o sistema Sketchpad.

Fonte: (Carlson, 2007)

Com o intuito de demonstrar que a computação gráfica po-


dia ser usada tanto para fins técnicos como para fins artísticos,
Ivan Sutherland desenvolveu, em 1963, o Sketchpad. O sistema
foi resultado de seu trabalho de tese de doutorado no MIT e per-
mitia a um usuário criar -- pela primeira vez de maneira interativa
-- elementos gráficos em computador a partir de desenhos de pri-
mitivas. Os desenhos eram feitos utilizando-se uma invenção re-
cente na época: a caneta ótica, como é demonstrado na Figura 1.  
Desta forma, o sistema quebrou o paradigma de que a uti-
lização de computadores estava restrita a cientistas, tornando essa
atividade mais intuitiva e acessível a artistas. O Sketchpad é con-
siderado um programa que revolucionou a interação homem-má-
quina e um precursor das ferramentas CAD4 modernas. 
Em 1972, os estudantes de pós-graduação da Universidade
de Utah, Edwin Catmull e Fred Parke trabalharam em um projeto
que resultou na criação de uma animação intitulada A Compu-
ter Animated Hand. Como o título sugere, o filme mostra uma
animação digital 3D de uma mão realizando movimentos como
ainda não se tinha visto.
Deste trabalho, é interessante destacar o processo de mo-
delagem da mão animada (Figura 2): foi criado um modelo físico
da mão esquerda de Edwin Catmull e uma malha de polígonos
foi desenhada sobre a superfície do modelo. Feito isso, o modelo
pintado foi digitalizado usando uma digitalizadora 3D. 

4
Sigla para Computer Aided Design, é o termo utilizado para designar softwares para facilitar o
projeto e a criação de modelos em computador.
Figura 2. Edwin Catmull desenhando, digitalizando
e renderizando modelo de sua mão

 
Fonte: (Catmull et al., 1972)

Os experimentos realizados para a produção do filme for-


neceram elementos para importantes estudos em Computação
Gráfica e Modelagem Tridimensional. A produção, por sua rele-
vância também para o cinema de animação digital, é considerada
revolucionária, tendo sido adicionado, em 2011, ao Registro Na-
cional de Filmes dos Estados Unidos (National Film Registry).
A propósito, o leitor deve achar familiar o nome de um dos es-
tudantes envolvidos na produção do filme: Edwin Catmull é co-
fundador e presidente da Pixar e presidente da Walt Disney Ani-
mation Studios.  
Dez anos mais tarde, em 1982, a computação gráfica ga-
nha espaço em produções cinematográficas, como, por exem-
plo, Tron, que foi produzido pela Disney e obteve grande visibi-
lidade devido à utilização de uma quantidade massiva de recur-
sos de computação gráfica para a época. No mesmo ano, temos a
primeira sequência inteiramente produzida digitalmente no filme
Star Trek II: a Ira de Khan. O filme apresenta cenários tridimen-
sionais gerados por fractais e renderização de partículas.
Os anos 80 marcaram também a utilização de modelos tri-
dimensionais em jogos eletrônicos. Um dos primeiros jogos arca-
de 3D de sucesso foi Battlezone (1980). Apesar de ainda utilizar
apenas formas vetoriais sem preenchimento de volume (shading),
ele já permitia uma livre navegação no espaço virtual (Figura 3).
Inclusive, chegou a ter uma  versão especial desenvolvida para
o exército dos EUA treinar soldados no uso de tanques (Figu-
ra 4) (Bradley Trainer, 2016).

Figura 3. Battlezone (1980). Figura 4. Arcade Bradley Trainer.

 
Fonte: (Allan, 2013) Fonte: (Bradley Trainer, 2016)
Avançando para a década de 1990, podemos destacar
técnicas de modelagem sendo aplicadas a efeitos especiais pro-
duzidos em computador em filmes, como: “O Exterminador do
Futuro II”  (1991), em que o antagonista aparece feito de me-
tal líquido, podendo mudar de forma; e “Jurassic Park” (1993),
usando animatrônicos e computação gráfica para recriar criaturas
com comportamento e aparência bastante realistas. Já em 1995,
temos “Toy Story” (1995), considerado o primeiro longa-metra-
gem inteiramente criado em computação gráfica, foi desenvolvi-
do pela Pixar. 
Atualmente, a utilização de modelos tridimensionais e de
computação gráfica só aumenta. Tais recursos podem ser vistos
em produções como “O Senhor dos Anéis”, “Gravidade”, “Ava-
tar”, “Transformers”, “As Aventuras de Pi”, entre outros, e torna-
-se cada vez mais difícil distinguir computação gráfica de captura
real, mesmo em produções menores, como em “Deadpool” (Figu-
ra 5), que custou 58 milhões de dólares, enquanto “X-men Apo-
calypse” custou 234 milhões.  
Figura 5. Cena do filme Deadpool em modo wireframe
e após renderização e adição de efeitos.

Fonte: (Failes, 2016)

Em 1994 foi lançado Descent, um jogo que inovou ao per-


mitir que o jogador se locomovesse com 6 graus de liberdade (Fi-
guras 6 e 7). Os cenários e os inimigos eram modelos tridimensio-
nais com texturas, enquanto os powerups (itens que davam algum
tipo de bônus ao jogador) eram representados através de sprites.
Vale lembrar que ainda não existiam placas gráficas aceleradoras
no período, então todo o processo de renderização era realizado
via software. 
Figura 6.Descent (1994).

Fonte: (Klepek, 2011)

.
Figura 7. Representação de 6 eixos de liberdade

Fonte: (Gonçalves, 2014)


Cerca de 15 anos mais tarde, chegamos ao ponto onde um
jogo,  Crysis, consegue gerar gráficos foto-realísticos  em tempo
real que impressionam e chegam a ser quase indistinguíveis de
uma fotografia (Figura 8).

Figura 8. Comparação entre fotos (esquerda) e


cenas renderizadas em tempo real no Crysis (direita).

 Fonte: (Crysis Engine2 VS Real Life, 2008)

A nova tendência do mercado é o de realidade virtual, com


o Oculus Rift e o HTC Vive sendo os primeiros equipamentos de
alta qualidade e preços acessíveis disponíveis para o consumidor
final. Com o HTC Vive, o grau de liberdade é a movimentação do
próprio usuário, que pode andar livremente (dentro dos limites
dos sensores) e inspecionar de perto, e de qualquer ângulo, todo o
cenário e objetos à sua volta (Figura 9). 
Figura9. Ambiente real e ambiente virtual
que a jogadora está visualizada

Fonte: (Nextshark, 2016)

3.CONCEITOS E FUNDAMENTOS
Os modelos construídos em computador são, na verdade,
o resultado do processo de desenvolvimento de uma representa-
ção matemática da superfície tridimensional de um objeto. Dessa
forma, a revisão de alguns conceitos básicos de matemática, ge-
ometria e até física ajuda na compreensão do funcionamento de
ferramentas computacionais, bem como auxilia o usuário na esco-
lha das melhores estratégias de modelagem a serem adotadas em
cada caso. Nesta seção, discutiremos alguns dos conceitos básicos
presentes em operações de modelagem de objetos tridimensionais.
3.1Geometria
Existem atualmente vários softwares para a criação de mo-
delos tridimensionais. As características e maneiras de operá-los
podem variar. No entanto, os objetos que poderemos construir são
formados pelos mesmos elementos básicos estudados em geome-
tria básica do ensino médio: pontos, linhas e planos. 
Na terminologia da modelagem 3D, esses elementos
são referidos, respectivamente, como vértices, arestas e polígonos
(ou faces).

3.2Sistemas de Coordenadas
Em modelagem 3D, um dos desafios enfrentados pelo es-
tudante é justamente a capacidade de estender a visão do espaço
plano, com o qual estamos acostumados a trabalhar, para o espaço
tridimensional no qual o objeto a ser construído e manipulado
será inserido. A dificuldade se acentua pelo fato de que, apesar
de estarmos trabalhando em um ambiente tridimensional, a visu-
alização da cena criada se dá por meio de um dispositivo que é
inerentemente 2D: a tela do computador. 
O usuário de uma ferramenta de modelagem 3D deve
atentar para os sistemas de coordenadas com os quais pode traba-
lhar (Figuras 10 e 11). Eis a definição dos três principais sistemas
de coordenadas: 
• Sistemas de coordenadas do mundo: possui origem
fixa na posição (0, 0, 0). É conhecido como sistema de coordena-
das global e é definido para cada cena criada;
• Sistema de coordenadas do objeto:  é um sistema de
coordenadas local a cada objeto inserido na cena. Movimentações
individuais de cada objeto em uma mesma cena são feitas em
torno do sistema local a cada objeto. Tipicamente, o sistema local
é chamado de centro do objeto, mas não necessariamente está
situado no centro geométrico dele; 
• Sistema de coordenadas da câmera: espaço onde é for-
mada a imagem para exibição da cena construída.

Figura10. Eixo central indicando o sistema de coordenadas


do mundo (global) e eixos coordenados indicando o
sistema de coordenadas de cada objeto (local).

Fonte: (Wikibooks, 2013)


Figura11. Sistema de coordenadas da câmera. Os eixos estão situados
sobre o plano de projeção (que forma a imagem a ser exibida).

Fonte: (Wikibooks, 2013) 

3.3 Primitivas
Como vimos na subseção 2.3.1, os objetos tridimensionais
são representados em computador por meio de seus vértices, ares-
tas e polígonos, podendo ou não conter faces. Objetos sem faces
são aqueles representados em wireframe. 
Cada software oferece um conjunto de objetos prontos,
que chamamos de primitivas. A partir dessas primitivas, podemos
rapidamente iniciar o trabalho de modelagem e criação de objetos
tridimensionais mais complexos. Para exemplificar, algumas das
primitivas mais comuns encontradas em ferramentas de modela-
gem tridimensional, estão ilustradas na Figura 13. 
Figura 13. Primitivas de modelagem do software gratuito Blender.

Fonte: Os próprios autores.

3.4 Operações Básicas


Independente do software escolhido para a criação de mo-
delos 3D, as técnicas aplicadas no processo de construção desses
modelos são as mesmas. Compreendendo a lógica por trás desses
procedimentos, podemos, na maioria dos casos, migrar nossos
modelos de uma ferramenta de software para outra sem um gran-
de esforço de aprendizado ou de portabilidade. 
O conhecimento de técnicas elementares de geometria,
luz e cor são importantes para que o usuário tire melhor provei-
to de uma ferramenta de modelagem tridimensional. Além disso,
o conhecimento de técnicas introdutórias de computação gráfica
auxilia o usuário a ter uma compreensão melhor de como essas
ferramentas funcionam. Como consequência, o modelador pode-
rá obter melhores resultados com um uso eficiente de recursos
computacionais. 
Nesta subseção, são abordadas, de maneira sucinta, algu-
mas das técnicas de modelagem comumente aplicadas. Tais téc-
nicas foram desenvolvidas fazendo uso de alguns dos conceitos
básicos anteriormente mencionados. 
3.4.1Modelagem Poligonal
Caracteriza-se pela manipulação do conjunto de polígonos
que constituem um objeto tridimensional. As operações podem
ser aplicadas tanto a vértices como a arestas, bem como faces. 
Ao conjunto de polígonos, utilizados para representar
um objeto tridimensional, chamamos de malha poligonal. Esta
malha pode ser estruturada por diferentes tipos de polígonos,
ilustrados na Figura 14: Tris (triângulos), Quads (quadriláteros)
e N-gons (qualquer polígono com mais de 4 lados).

Figura 14. Tri, Quad e N-gon.

Fonte: (Mayden, 2015)

A escolha do tipo de polígono a ser aplicada a uma ma-


lha poligonal dependerá do propósito de construção do modelo.
Uma discussão detalhada sobre as características de cada tipo de
polígono, bem como suas vantagens e desvantagens, está fora do
escopo deste capítulo, mas pode ser facilmente encontrada em
livros e fóruns de discussão online. 
3.4.2Extrusão
Esta operação permite a criação de uma forma 3D a partir
de dois elementos básicos: uma forma selecionada e uma direção
de extrusão. A Figura 15 resume o processo. Esta operação é im-
portante para a criação de objetos mais complexos a partir de uma
primitiva. Esta estratégia de modelagem é chamada de Box Mo-
deling. Como exemplo, é possível, a partir de um simples cubo,
criar um objeto mais complexo (Figura 16). 

Figura 15. Processo de extrusão aplicado a um plano, gerando um cubo.

 
Fonte: (Holanda, 2016)
Figura 16. Exemplo de construção de um modelo
aplicando-se a técnica de box modeling.

 
Fonte: (College, 2015)

Como se pode perceber pela  Figura  16, a extrusão, por


si só, não é suficiente para a aplicação de  box modeling. Mais
técnicas precisam ser aplicadas e estudadas, como subdivisão de
polígonos e recorte de faces. Cabe ao leitor uma pesquisa sobre
essas técnicas adicionais. 

3.4.3Revolução
Estendendo a ideia da extrusão para uma trajetória cur-
vilínea em torno de um eixo de rotação, obtemos um sólido de
revolução, como mostra a Figura 17. 
Figura 17. Sólidos gerados por revolução e os perfis que os originaram

 
Fonte: (12CAD, 2014)

3.4.4 Iluminação 
Um requisito básico para que a cena 3D construída possa
ser visualizada, é a presença de pelo menos uma fonte luminosa.
Ferramentas de modelagem proveem a possibilidade de adicionar
uma ou mais fontes luminosas, de modo que o usuário possa criar
efeitos desejados, ou, simplesmente, obter uma ambientação ade-
quada à cena, dando noção de profundidade, volume e até mesmo
de localização de objetos. 
A definição de tipos de fontes luminosas e de como elas
são refletidas compõem um Modelo de Iluminação e de Refle-
xão. Para o modelo de Iluminação, os tipos de fontes luminosas
mais comuns estão ilustrados na Figura 18. 
O modelo de reflexão disponibiliza, em ferramentas de mo-
delagem 3D, os seguintes tipos de reflexão, ilustrados na Figura 19. 
Finalmente, para se aplicar um modelo de iluminação e
de reflexão, costuma-se empregar um modelo de tonalização. Ele
determina quão suave será a aparência da superfície de um objeto.
As opções de tonalização básicas podem ser vistas na Figura 20. 
Figura 18. Algumas luminosas encontradas
em ferramentas de modelagem 3D

 
Fonte: (Manssour & Cohen, 2006)

Figura 19. Modelos de reflexão da luz

 
Fonte: (Manssour & Cohen, 2006)
Figura 20. Tonalização constante (ou Flat) e tonalização Smooth


 Fonte: (Johnson, 2016)
Para complementar a aparência final dos objetos presentes
em uma cena 3D, podemos atribuir às suas superfícies algumas
propriedades de materiais. Essas propriedades conferem ao objeto
a aparência de madeira, vidro, plástico, metal, dentre outros. Além
disso, é possível atribuir uma textura ao material. A aplicação de
textura por meio de uma ferramenta de modelagem simplifica so-
bremaneira a finalização de um objeto, evitando a necessidade de
se criar uma geometria muito complexa para a superfície de um
objeto, consumindo menos tempo de trabalho. A Figura 21 ilustra o
exemplo de aplicação de textura a um cubo 3D: 
Figura 21. Exemplo de aplicação de textura

Fonte: (Aeharn, 2016)

Há outras maneiras de alterar a geometria (ou simples-


mente a aparência) da superfície de um objeto 3D, como, por
exemplo, displacement map, bump mapping e normal mapping.
Deixaremos ao leitor a indicação para pesquisas futuras. 

3.4.5 Efeitos Especiais 


Como foi discutido no início deste capítulo, a modelagem
3D ganhou espaço no cinema e em jogos. Em particular, uma de
suas aplicações é a criação de efeitos especiais. Objetos tridimen-
sionais sem geometria definida podem ser criados com o uso de
uma ferramenta de modelagem tridimensional. Para tanto, tais
ferramentas disponibilizam recursos como sistemas de partículas
e modelagem fractal. Sistemas de partículas são utilizados para
representar objetos com características fluidas, tais como fumaça,
nuvens, fogo, entre outros. Já a modelagem fractal é utilizada para
a criação de objetos compostos de pequenas partes que, juntas, for-
mam um todo. Dentre os exemplos de objetos com essas caracterís-
ticas, podemos citar: plantas, flocos de neve e relevos de terrenos. 

4.CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste capítulo, foi apresentado um breve apanhado de
conceitos relacionados à área de Modelagem Tridimensional. Em
especial, foram feitas algumas considerações acerca de aspectos
relevantes à modelagem voltada à produção de objetos 3D para
animação. O tema é bastante extenso e, neste capítulo, foi abor-
dado apenas um pequeno subconjunto de técnicas básicas com o
intuito de prover ao estudante um ponto de partida para ingressar
no fascinante mundo da Modelagem 3D. É recomendado ao leitor
buscar mais referências e tutoriais para conhecer novas técnicas e
aprimorar seus estudos. 
REFERÊNCIAS
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http://www.computeraideddesignguide.com/basic-tools-in-3d-
-in-autocad/, Acesso em 28 de Junho de 2017.
AHEARN, Luke. 3D Game Textures: Create Professional Game
Art Using Photoshop. CRC Press, 4aedição. 2016.
ALLAN, M. Battlezone Arcade Game. 2013 Disponível em:
http://hubpages.com/games-hobbies/Battlezone-Arcade-Game.
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BRADLEY, Trainer.Disponível em: http://www.safestuff.com/
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CARLSON, Wayne. A Critical History of Computer Graphics
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-state.edu/~carlson/history/. Acesso em: 28 de Junho de 2017.
CATMULL, Edwin, & PARKE, Fred. A Computer Animated
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KLEPEK, P. (2011). Phew, Descent WiiWare Still in Develop-
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2017.
OS DESAFIOS DA
APRENDIZAGEM NA
CULTURA DIGITAL
Os Desafios da Aprendizagem
na Cultura Digital
Andrea Pinheiro Paiva Cavalcante, Cátia Luzia Oliveira da Silva

1. INTRODUÇÃO
A aprendizagem tem sido favorecida no contexto da ciber-
cultura pela possibilidade de uso das tecnologias digitais nas mais
variadas modalidades educacionais e ainda em espaços formais e
não formais de educação. Hoje, todos nós nos deparamos com o
desafio colocado pelas tecnologias da informação e da comunica-
ção (TDIC), que é aprender com o uso de tais recursos.
Apresenta-se uma nova possibilidade, que vai além da
apropriação tecnológica para potencializar o processo de ensino-
-aprendizagem. Isto é, nasce uma nova forma de pensar o tra-
balho educacional com esses recursos, qual seria o de propiciar
novas formas de expressão, de fomentar a criatividade e a autoria.
Mas de que maneira as mediações tecnológicas estão favorecendo
a autonomia e o pensamento crítico dos aprendentes?
Quando se trilha o caminho de uma prática pedagógica que
prime por valores tais como o protagonismo social, a cidadania,
a democracia, a leitura crítica dos meios, a livre expressão comu-
nicativa, a gestão compartilhada dos meios de comunicação, pro-
move-se a conversão da comunicação em processo educativo. Já
não se usa simplesmente esses meios digitais instrumentalmente
para aprender. Ao contrário, a comunicação torna-se inerente ao
processo educativo, promovendo um processo onde o educando é
ao mesmo tempo emissor e receptor.
O presente texto tem com objetivo discorrer sobre as ofi-
cinas realizadas nas aulas-passeio da disciplina de Educomuni-
cação do Curso de Sistemas e Mídias Digitais, da Universidade
Federal do Ceará. Entende-se por educomunicação “um conjunto
das ações inerentes ao planejamento, implementação e avaliação
de processos, programas e produtos destinados a criar e a forta-
lecer ecossistemas comunicativos”. (SOARES, 2011, p. 44, grifo
do autor). Ecossistema, aqui, refere-se a uma figura de linguagem
que designa a construção de relações que favorecem o diálogo
social, em um dado espaço. A educomunicação tem a intenção de
contribuir com uma formação mais crítica, mais humanista e mais
comprometida com as demandas sociais.
As oficinas constituem uma ação que potencializa o pro-
cesso de ensino-aprendizagem por meio de atividades de alfabe-
tização mediática. Tais atividades também se configuram como
uma oportunidade de reflexão crítica e ainda de expressão das
subjetividades dos estudantes em cenários educativos reais. É um
trabalho que transcende a instrumentalidade técnica e que se apoia
no pensamento, por exemplo, de Paulo Freire (1988), para quem
a aprendizagem está baseada no diálogo, na troca de saberes e
na possibilidade de aprender a “ler o mundo para transformá-lo”
(FREIRE,1988), de Kaplún (2014), que entende que “educar é
sempre comunicar” e que “toda educação é um processo de co-
municação”, de Bordenave (1984) e sua “pedagogia da problema-
tização”, cuja ênfase está no processo, mais do que nos conteúdos
e nos resultados, para que o sujeito aprenda a aprender. Caval-
cante e Silva (2015) situam, ainda, as aulas-passeio no contexto
do conhecimento pluriversitário e complexo. Em contraposição
a um conhecimento essencialmente disciplinar e hierarquizado,
emerge um conhecimento contextual e transdisciplinar, que San-
tos (2011) nomeia como conhecimento pluriversitário.
(...) é o resultado de uma partilha entre pesquisa-
dores e utilizadores (...) e obriga a um diálogo ou
confronto com outros tipos de conhecimento, o que
o torna internamente mais heterogêneo e mais ade-
quado a ser produzido em sistemas abertos menos
perenes e de organização menos rígida e hierárquica
(Santos, 2011, p.42).

Morin (2011), por sua vez, entende que está na ideia de com-
plexidade a chave para a ruptura com a fragmentação científica.
Devemos, pois, pensar o problema do ensino, consi-
derando, por um lado, os efeitos cada vez mais gra-
ves da compartimentação dos saberes e da incapaci-
dade de articulá-los, uns aos outros; por outro lado,
considerando que a aptidão para contextualizar e
integrar é uma qualidade fundamental da mente hu-
mana, que precisa ser desenvolvida e não atrofiada
(MORIN, 2011, p.16).

Participaram das aulas-passeio e da oferta de oficinas, tam-


bém, estudantes de Design Instrucional do Curso de Sistemas e
Mídias Digitais. Design Instrucional é disciplina que estuda o pla-
nejamento e desenvolvimento de oportunidades de aprendizagem,
dentro de uma abordagem sistêmica. (SILVA et al, 2013). É uma
área que pode ser definida como “a ciência e a arte de criar especi-
ficações detalhadas para o desenvolvimento, avaliação e manuten-
ção de situações que facilitam a aprendizagem e a performance”.
(RICHEY, KLEIN & TRACEY, 2011, p. 3). Aqui, a ótica do tra-
balho desenvolvido em Design Instrucional primou, contudo, pelo
planejamento que enfatizasse o processo educacional, a vivência
dos interagentes, ao invés da busca de resultados previamente defi-
nidos. Foi nesta mudança de perspectiva que o Design Instrucional
trabalhou conjuntamente com a Educomunicação.
Este artigo está organizado em três seções além desta in-
trodução. No próximo tópico, discorremos sobre as aulas passeio,
atividades onde estão inseridas as oficinas. Na seção denominada
“Oficinas Educomunicativas” apresentamos as oficinas realiza-
das ao longo de dois anos e quais as contribuições que elas deram
à formação dos alunos da disciplina, bem como do público par-
ticipante de tais atividades formativas. E nas conclusões, indica-
mos a importância de uma formação educomunicativa no ensino
superior como estratégia de ampliar a preparação profissional do
estudante de graduação ao mesmo tempo em que se estimula a
aproximação da Universidade com a vida social.
2. AULAS-PASSEIO E A APRENDIZAGEM NA PRÁTICA
As aulas de campo, inspiradas nas aulas-passeio ou au-
las-descoberta de Freinet (1998), são realizadas a cada semestre
e tal qual propunha Freinet, são saídas “ao ar livre” para que os
estudantes descubram novos cenários e paisagens, estabeleçam
contatos, percebam novas possibilidades de aprendizagens.
No contexto da disciplina, as aulas de campo se caracteri-
zam por serem momentos que implicam deslocamentos para ou-
tros territórios fora de Fortaleza, com distâncias que variam entre
130 km e 600 km: viagens para o litoral de Trairi e para a região
do Cariri, no sul do estado com vistas a conhecer as práticas edu-
comunicativas de uma escola de ensino fundamental e médio, na
localidade de Canaan e da Fundação Casa Grande, no município
de Nova Olinda.
A Fundação Casa Grande – Memorial do Homem Kari-
ri, fundada em 1992, é uma organização não governamental cuja
missão é “a formação educacional de crianças e jovens protago-
nistas em gestão cultural por meio de seus programas: Memória,
Comunicação, Artes e Turismo” (s/d).
O programa de Comunicação reúne a emissora de rádio
comunitária, a Casa Grande FM, a série documental produzida
semanalmente, “100 Canal”, a editora que produz jornal, histórias
em quadrinhos e outros materiais gráficos, o Teatro Violeta Arra-
es, que através de parceria com o SESC, tem programação regular
de espetáculos musicais e teatrais. Toda a produção de conteúdo,
desde a emissora de rádio até a série “100 Canal”, é integralmente
feita pelas crianças e adolescentes, que também se revezam na
gestão dos referidos espaços.
O contexto das aulas de campo que acontecem em Trairi
é bem diverso, visto tratar-se de uma instituição educacional. Na
sala de aula, os alunos vivenciam experiências de educomunicação,
tais como o Bioclick, projeto do ensino de Biologia que propõe a
observação da fauna e da flora do município litorâneo de Trairi,
para além dos livros didáticos e das aulas expositivas. Tal projeto
consistiu na realização de concurso fotográfico sobre o ecossistema
local, através de registro fotográfico, por meio de telefone celular,
para publicação no perfil Rizoma do Canaan, no Facebook. Na rede
social foi possível interagir com os conteúdos publicados, amplian-
do assim, o diálogo antes restrito ao espaço da sala de aula.
Na visita a Trairi, além de conhecer as atividades realizadas
pelos professores educomunicadores, os estudantes da Universida-
de Federal do Ceará são convidados a conhecer aspectos do meio
ambiente local, como o mangue do Rio Mundaú, comprometido
devido às inúmeras fazendas de carcinicultura da região, bem como
o engenho de cana de açúcar onde se fabrica rapadura e outros pro-
dutos e ainda o trabalho da Associação de Moradores de Canaan,
que mantém uma emissora de rádio de alto-falantes, uma biblioteca
comunitária e oferece cursos gratuitos de informática.
As oficinas, que são realizadas durante as aulas de campo,
buscam trabalhar novas possibilidades nos processos educativos,
na procura de uma atuação mais efetiva, por parte dos estudantes,
da dinâmica de construção de novos saberes. Objetivou-se que as
oficinas tivessem um caráter de “intervenções” geradoras de um
incremento dos conhecimentos de seus participantes, e facilita-
dores; visando ao desenvolvimento dos conteúdos e informações
abordados, de forma a gerar um benefício coletivo a todos os en-
volvidos na sua execução.
Todas as oficinas ministradas foram planejadas de forma
a buscar trabalhar não apenas o processo a ser desenvolvido, mas
sim, primordialmente, a forma como os participantes reagem às
mesmas, dentro de um entendimento amigável, que fosse gerador
de um conflito de opiniões dentro de um modelo participativo que
desencadeasse a construção de um saber coletivizado. Passamos a
ilustrar algumas das oficinas que já foram ofertadas. No presente
texto vamos nos deter na descrição das oficinas de contos digitais
e de campanhas educativas no rádio, como referências emblemá-
ticas desse processo de apropriação tecnológica.

3. OFICINAS EDUCOMUNICATIVAS
O plano de trabalho da disciplina de Educomunicação
apresenta natureza teórico-prática e busca, em sua metodologia,
refletir os valores educomunicativos fundamentais, ao desenvol-
ver conhecimentos, habilidades e competências ao longo do se-
mestre que permitam ao aluno exercitar os conceitos estudados.
As oficinas, juntamente com outras atividades, fazem parte desse
plano e representam, muitas vezes, a primeira oportunidade didá-
tica dos alunos envolvidos.
3.1 Oficina de Contos Digitais
A contação digital de histórias é uma atividade que alia a
prática milenar de contar histórias às novas tecnologias da informa-
ção e comunicação. As histórias digitais normalmente apresentam
foco em um tópico particular, voltadas a um determinado ponto de
vista. Como o próprio nome implica, a história digital é formada
por uma mescla de imagem digitais, textos, músicas e narrações.
Seja qual for a natureza do conto digital, há a presença do
esforço para entender e explicar o mundo, gerando assim uma
construção de conhecimento. O ato da construção de uma história
revela intenções comunicativas e é parte significativa do processo
de construção de saberes. Destacando-se, ainda, o fato de que os
contos digitais têm seu foco na construção de narrativas pesso-
ais, sendo comum o desenvolvimento de narrativas em primeira
pessoa, como forma de se alcançar mais impacto comunicativo.
Tais características possibilitam a construção de materiais com
conteúdo autoral, gerando a libertação do consumo de produtos
massificados, trabalhados de forma genérica por terceiros não in-
seridos nos contextos locais.
Em relação às necessidades físicas para a realização da ofi-
cina, geralmente são necessários computadores conectados à in-
ternet, microfones, fones de ouvido e scanner. Dentre as possibili-
dades de uso de programas e aplicativos de edição, optou-se pelo
Windows Movie Maker, em decorrência de seu número satisfatório
de recursos e pelo mesmo ser disponibilizado de forma gratuita.
O objetivo da oficina é a capacitação dos participantes,
para que possam desenvolver a construção de contação digital de
histórias de forma clara, bem realizada e produzida. Para tanto, é
ofertada a oportunidade de se desenvolver conhecimento sobre
os objetivos, e possibilidades de usos, de histórias digitais em
um contexto educativo; bem como aprender sobre o uso, e poten-
cialidades, de hardwares e softwares específicos para a criação,
produção e desenvolvimento de produções próprias.
A oficina é dividida em dois momentos, com quatro horas
de duração no total. No primeiro momento, são dedicados vinte
minutos para as apresentações e introdução ao assunto (oficinei-
ros e participantes, apresentação de histórias digitais); trinta mi-
nutos para tutorial do software (Windows Movie Maker); quarenta
minutos de definição e roteiro das histórias escolhidas (como fa-
zer, divisão das competências, produção); e trinta minutos para a
coleta de materiais (captura e edição de imagens e sons). Em um
segundo momento, quarenta minutos são destinados à produção
inicial (desenvolvimento da primeira versão em meio digital);
vinte minutos para revisão de conteúdo (revisão coletiva da pro-
dução); trinta minutos para revisão técnica (ajustes necessários);
e trinta minutos para as apresentações das histórias produzidas.

3.2. Oficina de Campanhas Educativas de Rádio


As rádios escolares se propõem a ser educativas e comuni-
tárias. Em regra, tem seu estúdio localizado nas próprias instala-
ções da escola; e por serem um meio de comunicação ágil, barato
e abrangente possibilitam o fomento de discussões de interesses
próprios das escolas, e comunidades, nas quais estão inseridas.
São, portanto, importante instrumento no fomento de discussões
de interesse local, e do fortalecimento de uma produção educativa
com características pessoais, não generalista. Tornam-se assim,
espaço privilegiado de produção de conteúdos de comunicação de
interesse específico da coletividade na qual estão inseridas.
Observando esse contexto, e para uma realização ideal da ofi-
cina, é necessário que a escola disponibilize: gravador de voz, com-
putador com o software livre Audacity, mesa de som, papel, caneta
ou lápis. De forma alternativa, pode-se utilizar um gravador de voz
portátil, fones de ouvido, caixas de som portáteis e um notebook.
O objetivo da oficina é trabalhar questões práticas sobre
meios e modos de utilização de uma rádio escolar, por meio do fo-
mento da troca de saberes, sem hierarquias de conhecimento, com
o intuito de incentivar uma educação e comunicação dialógicas.
Para tanto, a oficina é planejada para contemplar o uso da lingua-
gem publicitária, em decorrência de sua objetividade e poder de
sedução, na transmissão de ideias, necessidades ou sentimentos.
A adaptação desta linguagem a uma campanha educativa passa a
ser construída pela participação e acompanhamento de tudo, por
todos, desde o conceito da campanha passando pela gravação e
seguindo até a edição do material. Busca-se que o material produ-
zido reflita uma reflexão social crítica, bem como, que torne uma
experiência publicitária em algo com fundamentos educativos.
A oficina é dividida em dois momentos, com três horas
de duração ao todo. No primeiro momento, temos vinte minutos
para uma roda de conversa inicial visando avaliar o conhecimento
prévio dos participantes sobre programação de rádio, o contexto
da radiodifusão local e o contato anterior do grupo com produção
de conteúdos midiáticos; e quarenta minutos destinados as pos-
sibilidades de construção de uma campanha educativa, o escopo
dos temas a serem abordados, e a apresentação de campanhas já
realizadas. Em um segundo momento, temos noventa minutos
destinados as possibilidades de execução da produção, divisão
de tarefas entre os participantes e produção em si (vozes, trilhas,
efeitos) da campanha; e trinta minutos para a apresentação dos
materiais finalizados.

4. CONCLUSÕES
As vivências relatadas apontam para a relevância dessa
atividade para o exercício da teoria discutida em sala de aula. É
um meio, sobretudo, de vivenciar a própria prática educomunica-
tiva, em consonância com seus princípios fundadores. Além de
possibilitarem a aproximação do contexto universitário do con-
texto social (seja em organizações não-governamentais, seja em
escolas ou em outros cenários), contribuindo para o desenvolvi-
mento de práticas dialógicas e participativas, favorecem novas
formas de aprendizagem que ultrapassam a mera aquisição de
conhecimento técnico.
Assume-se uma visão mais holística, por exemplo, do
processo de ensino-aprendizagem com as mídias, interligando o
conhecimento tecnológico a outros tipos de conhecimento (e.g.
pedagógico e de conteúdos de ensino), além de se priorizar o pro-
cesso de comunicação e expressão numa dinâmica colaborativa.
Outro benefício é que os participantes da oficina começam a com-
preender os benefícios de projetos multimídia através do design
de seus próprios produtos educacionais, deixando de ser meros
consumidores de conteúdos.
Entende-se que as vivências educomunicativas no ensino
superior, discutidas neste texto, ensejam uma melhor sistemati-
zação, de forma a contribuir para a expansão de tais práticas no
âmbito de outras instituições de ensino. Percebe-se ainda que é
necessário ampliar a interlocução com outros segmentos da socie-
dade no sentido de oferecer aulas de campo em outros contextos.
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so em 15/04/2016.
DESENVOLVIMENTO DE
APLICAÇÕES WEB E
BANCO DE DADOS
Desenvolvimento de Aplicações
Web e Banco de Dados
Emanuel F. Coutinho, Leonardo O. Moreira, Gabriel A. L. Paillard

1. INTRODUÇÃO
Com as facilidades advindas pelo uso da Internet, muitas
áreas e tecnologias comuns ao desenvolvimento de sistemas tam-
bém tiveram que se adaptar. Devido a facilidade e amplo acesso
aos navegadores, por parte dos usuários, surgiu então uma grande
necessidade pelo desenvolvimento de aplicações para executar
em um ambiente web. O desenvolvimento de software (aplica-
ções ou sistemas) se iniciou com aplicações desktop (aplicações
utilizadas diretamente no computador, sem depender de conexão
com a Internet) (ACADEMIA DO CÓDIGO, 2015). Uma vez
que a Internet se tornou popular, as aplicações web se tornaram
extremamente importantes tanto para a comunidade de desenvol-
vedores, quanto para os usuários de aplicações. Exemplos de apli-
cações desktop são o Microsoft Word e Excel, e o Media Player.
Exemplos de aplicações web são sites de comércio eletrônico,
web banking e redes sociais.
É comum no desenvolvimento de sistemas a utilização de
bancos de dados para o armazenamento de dados tanto do usuá-
rio quanto da própria aplicação. Esses bancos de dados também
evoluíram de forma a possibilitar a execução de operações mais
robustas e complexas, e manipular grandes volumes de dados.
Nesse contexto, a união do desenvolvimento de aplicações web
com a utilização de bancos de dados tem se mostrado uma grande
área de atuação, tanto para a academia quanto para a indústria,
devido a inserção de temas relacionados à pesquisa e ao desen-
volvimento de sistemas de informação.
A adoção de banco de dados em aplicações diminui a in-
consistência dos dados, padroniza o acesso aos dados, aumenta
o compartilhamento de dados em alta escala e agrega uma maior
segurança na manipulação dos dados (DATE, 2004). Com isso,
as aplicações podem focar no desenvolvimento das regras de ne-
gócio e deixar a cargo dos bancos de dados a complexidade do
gerenciamento dos dados utilizados pela aplicação, simplificando
e aumentando a produtividade no desenvolvimento de aplicações
orientadas a dados. Esse capítulo tem como objetivo apresentar
uma breve visão sobre o desenvolvimento de sistemas web com
persistência em bancos de dados relacionais, algumas tecnologias
associadas e a aplicabilidade no contexto do desenvolvimento de
sistemas multimídia.

2. GERENCIAMENTO EM BANCO DE DADOS


RELACIONAL
Antes do surgimento dos bancos de dados, a abordagem
de persistência baseada em arquivos era o meio para manipula-
ção de dados por parte das aplicações orientadas a dados (DATE,
2004) (ELSMARI, e NAVATHE, 2005). Na manipulação de da-
dos baseada em arquivos, o programador projeta e implementa os
arquivos necessários para uma aplicação específica. Além disso,
esses arquivos e os algoritmos de manipulação dos dados fazem
parte da programação da aplicação. Com isso, cada aplicação
necessitaria manipular os dados de forma disjunta, dificultando
a integração de aplicações distintas, mas que manipulassem os
mesmos conjuntos de dados. Como consequência, favorecendo
a ocorrência de redundâncias nos dados, ou seja, cada aplicação
possuiria cópias dos mesmos dados e realizaria a manipulação
sem nenhum controle ou integração. Essas redundâncias resul-
tam em um espaço de armazenamento desperdiçado e um esforço
adicional para manter os dados de mesma natureza, atualizados
(ELSMARI, e NAVATHE, 2005).
Na abordagem que utiliza bancos de dados são eliminados
esses problemas acarretados pelas redundâncias dos dados. Em
um banco de dados, os dados ficam centralizados em um reposi-
tório e que podem ser acessados por vários programas aplicativos
e de diferentes tecnologias ou linguagens de programação. (ELS-
MARI, e NAVATHE, 2005). Segundo Date (2004), um banco de
dados pode ser considerado como um repositório para uma cole-
ção de arquivos de dados dispostos em uma estrutura que facilita
o armazenamento e a recuperação dos dados nestes arquivos. Els-
mari e Navathe (2005), destacam que as principais características
da abordagem de banco de dados em contraste com a abordagem
de persistência baseada em arquivos são: natureza autodescritiva
do banco de dados; isolamento entre os programas aplicativos e
os dados; suporte para as múltiplas visões dos dados; comparti-
lhamento de dados e processamento de transações de multiusuá-
rios. Tais características são alcançadas pelo uso de banco de da-
dos e são implementadas por um Sistema Gerenciador de Banco
de Dados (SGBD).
Um SGBD é formado por um conjunto de programas que
permite aos usuários criar e manter um banco de dados. Portanto,
um SGBD tem como objetivo facilitar os processos de definição,
construção, manipulação, proteção e compartilhamento do banco
de dados entre vários usuários e programas aplicativos (ELSMA-
RI, e NAVATHE, 2005). A definição de um banco de dados faz a
especificação dos tipos de dados, as estruturas e as diversas restri-
ções para que os dados sejam armazenados de forma correta em
um banco de dados. Já a construção de um banco de dados é dada
pelo processo de armazenar os dados em algum formato persis-
tente controlado pelo SGBD. A manipulação, por sua vez, agrega
funções como as consultas em banco de dados para recuperar um
dado específico e, também, atualização do banco de dados para
refletir as mudanças requeridas pelos programas aplicativos. O
compartilhamento permite que vários usuários, simultaneamente,
acessem o banco de dados. Por fim, a proteção agrega funções
para proteger os dados contra falhas de software ou hardware.
Além disso, a proteção também está relacionada a segurança dos
dados contra acessos indevidos ou para usuários não autorizados.
Os bancos de dados relacional utilizam o modelo relacio-
nal para representar o banco de dados como uma coleção de re-
lações (ELSMARI, e NAVATHE, 2005). Cada relação é similar
a uma tabela de valores, onde cada linha na tabela de valores é
chamada de tupla e, cada coluna da tabela de valores é chamada
de atributo. Todo atributo possui um domínio associado, ou seja,
o domínio é um conjunto de valores atômico e define o tipo de
dados que pode ser armazenado pelo atributo. Para exemplificar
a nomenclatura do modelo relacional, pode-se utilizar o exemplo
de uma tabela de clientes de uma loja. A tabela de clientes possui
os registros de todos os clientes de uma loja em particular. Assim,
cada tupla da relação clientes descreve um cliente em particular.
Em uma tupla, os atributos código, nome e e-mail descrevem as
características de um cliente específico. Com relação aos domí-
nios de cada atributo, pode-se dizer que o domínio do atributo
CPF é um número inteiro longo, nome é cadeia de caracteres e
e-mail também é cadeia de caracteres. Com isso, pode-se per-
ceber que ao associar um domínio a um atributo, aplica-se uma
restrição de tipos de dados que um atributo pode armazenar.
A Structured Query Language (SQL) é considerada um
dos maiores motivos para o sucesso dos bancos de dados rela-
cionais (ELSMARI, e NAVATHE, 2005). A SQL é uma lingua-
gem de banco de dados completa, pois possui instruções para
definição dos dados, consultas e atualizações. Com isso, a SQL
é dividida em duas vertentes: Data Definition Language (DDL)
e Data Manipulation Language (DML). Toda execução de uma
instrução SQL DDL afeta diretamente ao catálogo do banco de
dados, ou seja, definição das tabelas (relações), colunas (atribu-
tos), restrições de dados etc. Já a execução de uma instrução SQL
DML produz resultados que podem recuperar dados já existentes
nas tabelas (relações), inserir novas linhas (tuplas) em uma tabela
(relação), alterar linhas (tuplas) de uma tabela (relação) e, tam-
bém, remover linhas (tuplas) de uma tabela (relação).

3. DESENVOLVIMENTO WEB
O núcleo do desenvolvimento de aplicações em rede de
computadores consiste em escrever programas que executem em
sistemas finais diferentes e que se comuniquem por meio da rede.
Um exemplo disso é um navegador que é executado na máqui-
na do cliente e se comunica com um outro programa, o Servidor
Web, que se localiza em uma máquina em um outro local, um pro-
vedor de internet (KUROSE e ROAA, 2010). Para o cliente ou
usuário da aplicação, essa comunicação é transparente, pois o que
importa é a execução do programa aplicativo que se deseja utili-
zar. Sendo assim, para se desenvolver uma aplicação, é necessário
que se tenha um software que seja executado em vários sistemas
finais. Esse software pode ser desenvolvido em diversas lingua-
gens de programação, por exemplo Java ou Python, e podem ter
capacidades visuais e de interação ou não. Para se implementar
uma aplicação web não é necessário implementar códigos para o
hardware, ou seja, para elementos do núcleo da rede como rotea-
dores. O foco é na camada de aplicação, ou seja, na camada mais
próxima do cliente ou usuário final.
A Figura 1 apresenta uma visão geral de uma arquitetura
para aplicações web em diversas camadas. A Camada de Dados
tem como objetivo fazer a abstração da gestão dos dados manipu-
lados pelas aplicações. Nesta camada estão um ou mais Servido-
res de Dados que possuem instalações de SGBDs e suas respecti-
vas configurações de segurança, desempenho e consistência. Na
Camada de Aplicação podem estar disponibilizados um ou mais
Servidores de Aplicações. Um Servidor de Aplicação é responsá-
vel pelo gerenciamento das aplicações, fornecendo um ambiente
para instalação e execução das aplicações. Com isso, abstrai-se
algumas complexidades de um sistema computacional, deixando
o foco do desenvolvedor na implementação das soluções de ne-
gócios das aplicações. Além disso, na adoção de um Servidor de
Aplicação, alguns aspectos de implementação como segurança,
disponibilidade e balanceamento de carga são agregados à apli-
cação com um esforço mínimo de configuração. É válido ressal-
tar que um Servidor de Aplicação pode responder a aplicação de
qualquer ambiente, inclusive web.
Figura 1. Arquitetura geral de uma aplicação web

Fonte: Os próprios autores.


Já na Camada Web pode existir um ou mais Servidores
Web que são responsáveis por responder as requisições HTTP
oriundos da Camada de Apresentação. Como exemplos das requi-
sições que podem ser respondidos pelo Servidor Web: documen-
tos HTML, CSS, JavaScript, imagens etc. Apesar que um Servi-
dor Web típico responde a conteúdos estáticos, existem vertentes
que respondem a conteúdos estáticos e dinâmicos. Os conteúdos
estáticos são arquivos que já existem e não mudam o conteúdo
conforme uma requisição. Já os conteúdos dinâmicos são gerados
a partir da execução de algum programa escrito em uma lingua-
gem de programação no lado servidor, por exemplo: Java, php,
Python, ASP etc. Ao fornecer a funcionalidade de responder a
conteúdos dinâmicos pode-se dizer que é um Servidor de Aplica-
ções Web. Por fim, a Camada de Apresentação possui as interfa-
ces de submissão de requisições e visualização das respostas dos
conteúdos que foram solicitados. Neste nível é possível encontrar
os navegadores que processam respostas no formato HTML, os
dispositivos móveis e as aplicações console.
Uma típica aplicação web utiliza, normalmente, como in-
terface para o usuário os navegadores web, como o Mozilla Fire-
fox, Microsoft Internet Explorer e Google Chrome (ACADEMIA
DO CÓDIGO, 2015). Esse é um dos motivos pelos quais as apli-
cações web são tão populares atualmente, se considerarmos que
todo computador possui um navegador e acesso à Internet. Além
disso, também é possível acessar a mesma aplicação de qualquer
sistema operacional para PCs e dispositivos móveis, por exemplo
Linux, Windows, Android ou MacOS.

3.1. Exemplos de Tecnologias Web


Atualmente, para o desenvolvimento de aplicações web
existem diversas tecnologias. Algumas delas possuem foco no vi-
sual, na interface do usuário, como HyperText Markup Language
(HTML) e Cascading Style Sheets (CSS). Essas tecnologias pos-
suem estruturas próprias para suportar o desenvolvedor a traba-
lhar o lado mais próximo do cliente final, que é a interface (uma
página web, por exemplo). Um exemplo de trecho de código des-
sas linguagens de programação pode ser visualizado na Figura 2.
Figura 2. Exemplo de código em HTML e CSS

Fonte: Os próprios autores.


Outras tecnologias estão mais associadas às operações do
lado servidor. Um exemplo desse tipo de tecnologia é o Servlet,
que são classes Java que capturam informações ou ações do usuá-
rio ou de outras aplicações, realiza um processamento, e devolve
um resultado referente à razão de sua criação (funcionalidade)
(BASHAM et al., 2008). Um exemplo de trecho de código de um
Servlet pode ser visualizado na Figura 3.

Figura 3. Exemplo de um trecho de código de um Servlet

Fonte: Os próprios autores.


Figura 4. Diagrama representativo do MVC

Fonte: Os próprios autores.

3.2. Model View Controller (MVC)


O Model View Controler (MVC) é um padrão de projeto
baseado em camadas e amplamente utilizado para o projeto de apli-
cações (GUANGCHUN et al., 2003). O padrão é dividido em três
camadas: modelo, visão e controle. A camada de modelo é com-
posta pelos dados, regras de negócio ou lógica da aplicação. Já a
camada de visão é responsável pelo gerenciamento e apresentação
dos dados e informações na área visualização da aplicação. A úl-
tima camada, a de controle, interpreta os comandos provenientes
da camada de visão e mapeia para os modelos correspondentes. A
Figura 4 exibe o fluxo de dados em um modelo MVC.
A divisão em camadas do padrão MVC favorece, em ge-
ral, dois aspectos: modularidade e extensibilidade. A modulari-
dade é alcançada pela divisão da aplicação em módulos de forma
que sejam independentes. Por exemplo, ao substituir a camada
de visão por uma de outra tecnologia, o custo de manutenção ou
rescrita da aplicação tenderia a ser relativamente baixo, devido
ao fraco acoplamento e independência entre os módulos. Como
consequência da modularidade, o padrão favorece também a ex-
tensibilidade, pois permite que novas funcionalidades sejam adi-
cionadas sem grande impacto nas existentes.
Diversos frameworks comerciais e não comerciais, desen-
volvidos para diferentes tecnologias e contextos de aplicações,
seguem o padrão MVC (BARRETT e DELANY, 2004). A seguir
serão apresentados alguns frameworks da tecnologia Java volta-
dos para o padrão MVC e persistência de dados.

3.3. Frameworks MVC


O Apache Struts é um framework baseado no padrão
MVC com o objetivo de criar aplicações web em Java de forma
moderna, simples e elegante (APACHE, 2016]. Assim, o Struts
facilita o gerenciamento, a manutenção e a reutilização de có-
digo. O Struts contém um vasto número de bibliotecas de tags
(tag library) e classes utilitárias que facilitam e simplificam o de-
senvolvimento web (KHIN, 2009). O fluxo de desenvolvimento
utilizado pelo Struts força os desenvolvedores a seguir o padrão
MVC. Na camada de visão o Struts utiliza a tecnologia JavaSer-
ver Pages (JSP) [Basham et al. 2008] agregado ao uso do conjun-
to de tag library contido no framework.
No Struts, a camada de controle utiliza o conceito de clas-
ses Action que é uma visão simplificada e abstrata de um Servlet.
No entanto, uma classe Action simplifica o processo de entrada de
parâmetros oriundos da camada de visão e também o retorno dos
resultados de processamento para a camada de visão. Uma classe
Action atua como um JavaBean, onde os métodos getters (méto-
dos para obter dados) são utilizados para recuperar parâmetros
vindos da camada de visão e os métodos setters (métodos para
alterar dados) são usados para passar valores, como resposta, para
a camada de visão. Além disso, no Struts existe um meio para
mapear as regras de navegação, ou seja, como as classes Action
são ativadas dada uma URL e como são chamadas as JSPs como
retornos dos métodos das Actions.
Assim como o Struts, o JavaServer Faces (JSF) é um ou-
tro framework MVC com o objetivo de facilitar o desenvolvi-
mento de aplicações web na linguagem Java [Cordeiro 2014]. No
entanto, o JSF possui um maior foco na implementação de inter-
faces de usuário baseadas em componentes (LEONARD, 2014).
Com isso, o JSF fornece uma infraestrutura para a criação de no-
vos componentes, deixando os desenvolvedores mais concentra-
dos nas regras de negócio das aplicações do que na parte visual
e de interação com os componentes visuais. No JSF o modelo
é responsável por encapsular os objetos de negócio e manter o
estado da aplicação. Já a visão é responsável pela interface com
o usuário, definir a forma como os dados são disponibilizados na
interface gráfica e encaminhar as ações do usuário ao controlador
(ANDRADE. 2015). Por fim, o controlador possui a responsabili-
dade de realizar a comunicação entre o modelo e visão, intercep-
tando as requisições do usuário e traduzindo em uma operação no
modelo.

3.3. Frameworks para Persistência de Dados


O Java DataBase Conectivity (JDBC) é uma API compos-
ta por um conjunto de classes e interfaces que permite a utilização
e o gerenciamento de banco de dados relacional. Basicamente, o
JDBC fornece três serviços: a especificação e o estabelecimento
de conexão com o banco de dados relacional, envio e gerencia-
mento de instruções SQL e, por fim, o processamento dos resul-
tados das instruções SQL. Um dos problemas do JDBC, quan-
do usado diretamente é que ele é muito trabalhoso, no sentido
de converter objetos Java em instruções SQL e converter tuplas
oriundas de consultas do banco de dados em objetos Java.
A Java Persistence API (JPA) é uma tecnologia que imple-
menta mecanismos de persistência em Java, permitindo a função
de mapeamento objeto-relacional e soluções escaláveis de persis-
tência em aplicações corporativas (SOUSA et al., 2015) (KEITH
e SCHINCARIOL, 2013). O uso de tecnologias que favoreçam
ao mapeamento objeto-relacional é importante para facilitar ao
acesso aos dados sem o uso de uma linguagem de banco de da-
dos. Com isso, é possível persistir e recuperar tuplas de banco de
dados relacional sem o uso da linguagem SQL. Além disso, essas
tuplas, quando oriundas do banco de dados relacional, são au-
tomaticamente convertidas em objetos Java. Ao persistir objetos
Java no banco de dados relacional existe uma etapa de inspeção
das instâncias destes objetos para converter em instruções SQL.
Portanto, os frameworks de persistência, que implementam JPA,
atuam como uma camada de abstração no acesso aos dados e sin-
cronizando instâncias de objetos Java e instruções SQL.
O Hibernate é um framework de persistência objeto-rela-
cional para aplicações Java. Este framework de código fonte aber-
to e implementa o padrão JPA. Por ser o framework objeto-rela-
cional é necessário que o usuário realize a etapa de mapeamento
das classes Java que represente o esquema do banco de dados
relacional. Uma vez realizado o mapeamento objeto relacional, a
aplicação poderá manipular os objetos mapeados que essas ações
serão refletidas no banco de dados relacional. Muitas vezes por
questões de desempenho e para realizar consultas complexas aos
dados, o Hibernate disponibiliza o Hibernate Query Language
(HQL). O HQL é uma linguagem similar ao SQL, mas totalmente
orientada a objetos. Portanto, compreende os conceitos de asso-
ciações, herança e polimorfismo. É válido ressaltar que o HQL
não se limita apenas a consultas de leitura ao banco de dados
relacional, mas também as consultas de escrita.
4. RELACIONAMENTO COM OUTRAS ÁREAS E COM
MULTIMÍDIA
O desenvolvimento de aplicações/sistemas web com ou
não a utilização de banco de dados é uma atividade que permeia
diversas áreas. Muitas dessas áreas são comuns a processos de de-
senvolvimento de aplicações e sistemas, sendo muito importante
a integração e comunicação com profissionais diversos. Consi-
dere um empresário que deseja automatizar a operação da sua
empresa. Para isso, ele entra em contato com uma startup que
desenvolve sistemas de automação empresarial. Após reuniões
iniciais, onde normalmente são discutidos aspectos contratuais e
do escopo do projeto e do produto, pode-se iniciar o desenvol-
vimento do projeto. Essa fase inicial envolve profissionais com
perfil de analista de sistema para elicitar e identificar requisitos
da aplicação da empresa. Muitas vezes é necessário conhecer o
funcionamento da empresa, e transcrever para o meio digital. Du-
rante essa etapa, seja ela realizada de uma vez só, ou em peque-
nas fases, se discute muitas vezes como a interface gráfica do
usuário. Esta atividade muitas vezes envolve profissionais com
conhecimento em web design e usabilidade. Nesse momento, a
atividade de programação já está envolvida, pois componentes e
plataformas influenciam em como a interface gráfica será projeta-
da. Muitas vezes diversas tecnologias são aplicadas nesta camada
de interface, como linguagens de programação (e.g. HTML e Ja-
vaScript) e Cascading Style Sheets (CSS).
Do lado do servidor, aspectos de redes de computadores e
sistemas distribuídos devem ser considerados. Imagine que a apli-
cação da empresa seja acessada por vários usuários remotos de
maneira simultânea e por meio de diferentes dispositivos, como
telefones celulares, tablets e notebooks. Diversos aspectos devem
ser considerados, como segurança, tempo de resposta, qualidade
do serviço, e influenciam diretamente no desempenho do ambien-
te e consequentemente da aplicação. É fundamental que o projeto
e a programação web seja realizada com cuidado no lado servidor,
pois essa camada da aplicação não é vista pelo usuário, mas ela
é responsável pela ligação entre a interface do usuário e o acesso
aos dados.
Multimídia pode ser definida como programas e sistemas
os quais a comunicação entre homem e computador se dá através
de múltiplos meios de representação da informação, tais como
som e imagem animada, além da imagem estática normalmente
utilizada em aplicativos gráficos (FILHO, 2011). Em ambientes
multimídia temos em geral emprego de imagem, podendo ser es-
tático ou animações, e som. A multimídia necessita de um dis-
positivo (normalmente um computador), para ser apresentada
(FILHO, 2011). Esse dispositivo deve possuir as seguintes ca-
racterísticas: acesso não linear, interatividade e integração com
programas aplicativos.
Nesse contexto, é muito comum que aplicações multimí-
dia utilizem diversos conceitos e tecnologias discutidos previa-
mente nos capítulos anteriores e no exemplo supracitado para seu
desenvolvimento. Sites ou infográficos interativos, aplicações em
HTML e JavaScript, onde o usuário pode interagir com os da-
dos, seja para entretenimento ou para aplicações empresariais, ou
simplesmente pequenos jogos que envolvam hardware e software
variados são exemplos de aplicações multimídia.

5. CONCLUSÃO
Esse capítulo apresentou alguns aspectos relacionados ao
desenvolvimento de sistemas web e bancos de dados, algumas
tecnologias associadas e a aplicabilidade no contexto do desen-
volvimento de sistemas multimídia. Entendemos que atualmente,
principalmente com a grande dependência e difusão da internet,
as aplicações estão cada vez mais dependentes de aplicações web
e banco de dados, independente de plataformas ou tecnologias.
Uma formação mínima em banco de dados e em programação para
web requer um conhecimento prévio de lógica e fundamentos de
programação, capacidades de análise e projeto (tanto da aplicação
web quanto do banco de dados), e conhecimentos técnicos para a
integração e pleno funcionamento das duas áreas. Assim, para um
profissional desenvolvedor de aplicações multimídia, é essencial
que se tenha conhecimentos de desenvolvimento de aplicações
web e banco de dados, mesmo sem ser um programador, pois atu-
almente com a difusão da Internet e aplicações móveis, pelo me-
nos a linguagem do desenvolvimento de aplicações deve ser de
comum conhecimento.
REFERÊNCIAS
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gramacão desktop? blog da academia do código. Disponível em:
http://blog.academiadocodigo.com.br/2015/04/oque-e-progra-
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Desempenho entre Implementações de Persistência Java. In XXX
Simpósio Brasileiro de Banco de Dados (SBBD) - Sessão de De-
mos e Aplicações, pages 161–166. 2015.
DESIGN
DE JOGOS
DIGITAIS
Design de Jogos Digitais
Glaudiney Moreira Mendonça Junior, Natal Anacleto Chicca Junior,
Carlos Eduardo Brito Novais, Vicenzo Pegado, Lizie Sancho Nascimento

1. INTRODUÇÃO
Embora sejam fenômenos bastante familiares no nosso co-
tidiano, jogos são extremamente difíceis de definir. Prova disto é
o fato de terem sido utilizados pelo filósofo Wittgenstein, no seu
livro Investigações Filosóficas, como exemplo de quão problemá-
tica e arbitrária é a associação de um conjunto de objetos sob um
rótulo comum.
Considere, por exemplo, os procedimentos que nós
chamamos “jogos”. E com isso eu quero dizer jogos
de tabuleiro, jogos de cartas, jogos de bola, jogos
olímpicos e por aí vai. O que todos eles possuem
em comum? (...) Nós vemos uma complicada rede
de similaridades que se cruzam e se sobrepõe: por
vezes semelhanças gerais, em outras semelhanças
nos detalhes (WITGENSTEIN, 1958, p. 66).

Apesar de ser tópico de estudo extremamente complexo,


ou talvez exatamente por causa disso, os jogos e as brincadeiras
tiveram definições esboçadas por várias áreas do conhecimento:
Matemática, Física, Biologia, Psicologia, Filosofia, Sociologia,
Antropologia, Arte, Comunicação e muitas outras. Atualmente
não dispomos de uma definição unificada de jogo, na verdade
nem sequer sabemos se isto é possível.
A questão “todas as coisas chamadas jogos têm al-
guma coisa em comum?” é bem diferente da questão
“todas as coisas que são jogos têm alguma coisa em
comum?”. Se, obviamente, algumas dessas coisas
que são chamadas jogos são assim denominadas de
maneira metafórica, descuidada, arbitrária ou estú-
pida, então é previsível que não se encontre nada de
importante em comum a todas elas (SUITS, 2014).

Entretanto, na atuação profissional do Designer de Jogos,


a escolha de uma definição de jogo que seja adequada ao produto
que está sendo desenvolvido é de fundamental importância. Não
somente para orientar as decisões sobre quais elementos compo-
rão o sistema lúdico, mas também para facilitar a comunicação
entre os diversos envolvidos no processo de desenvolvimento.
Uma atividade voluntária exercida dentro de certos
e determinados limites de tempo e espaço, segundo
regras livremente consentidas, mas absolutamente
obrigatórias, dotado de um fim em si mesmo, acom-
panhado de um sentimento de tensão e alegria e de
uma consciência de ser diferente da vida cotidiana
(HUIZINGA, 1980, p. 33).

Huizinga (1980) traz o jogo como elemento cultural de-


senvolvedor da civilização e tão importante ao homem quanto o
raciocínio. Em sua definição, destaca a voluntariedade dos joga-
dores, os limites espaciais e temporais do jogo, a existência de
regras, com propósito endógeno, que gera sentimentos e que é
diferente da vida real.
Costikyan (2002) diz que “um jogo é uma forma de arte
na qual os participantes, denominados jogadores, tomam deci-
sões, a fim de gerir os recursos através de elementos de jogo na
busca de um objetivo”. Considera o jogo como uma forma de
arte, o que traz uma nova visão sobre como os jogos podem trazer
a reflexão e mover as pessoas. Ele também considera que o jogo
possui valor endógino, ou seja, seus elementos só possuem valor
dentro do próprio jogo.
Já Fullerton (2008), afirma que “um jogo é um sistema fe-
chado, formal, que envolve os jogadores em um conflito estrutu-
rado, e resolve-o na forma de um resultado desigual”. Apresenta o
jogo como um sistema formal, que possui conflito que é resolvido
de forma desigual, ou seja, uns perdem e outros ganham.
Schell (2010) considera que o ser humano e inerentemen-
te interessado em solucionar problemas e, quando e encarado de
forma lúdica transforma-se em um jogo. Em seu trabalho ele ob-
serva diversas definições e aponta que as principais característi-
cas presentes:
• São jogados voluntariamente;
• Têm objetivos;
• Têm conflitos;
• Têm regras;
• Podem levar a derrota ou a vitória;
• São interativos;
• Têm desafios;
• Podem criar valores internos próprios;
• Envolvem os jogadores; e
• São sistemas fechados, formais.

2. INTRODUÇÃO A HISTÓRIA DOS JOGOS


Apesar de pressupormos que existam desde a pré-história,
os jogos têm sido objeto de estudo há pouco mais de um século. De
acordo com Ranhel (2009), Stewart Culin é considerado um dos
primeiros pesquisadores do campo, por seus artigos sobre jogos da
China, Japão, África, dos índios americanos e de rua, publicados
entre 1898 e 1924. Até este período, não havia registro de jogos
digitais, pois a revolução tecnológica estava no seu início.
O surgimento dos jogos eletrônicos, segundo Gularte
(2010), deu-se por dois motivos: a popularização dos arcades, na
década de 30, e o avanço no campo da eletrônica, após a Segunda
Guerra Mundial.
Kent (2001) afirma que o jogo Baffle Ball criado por Da-
vid Gottlieb, em 1931, marca o começo dessa história. Formado
por um gabinete de madeira com um pistão, o jogador tinha como
objetivo acertar a bola, que era lançada em um plano inclinado,
em um dos oito buracos protegidos por pinos. Este dispositivo
ainda não precisava de energia para funcionar. Somente dois anos
depois foram inseridas caçapas eletrônicas para contar a pontua-
ção. Esta invenção serviu de inspiração para os arcades e asseme-
lha-se as máquinas de pinballs presentes em fliperamas.
Assim, com a Segunda Guerra Mundial, os Estados Uni-
dos, a Inglaterra e a Alemanha foram alguns dos países a investi-
rem na criação de computadores. Por se tratar de um equipamento
muito caro e ocupar um espaço físico grande, os primeiros com-
putadores só eram encontrados em universidades e laboratórios.
Portanto, após esse período, alguns estudantes tiveram acesso a
essas máquinas e puderam realizar experimentos. Surgem aí, os
primeiros jogos eletrônicos (GULARTE, 2010).
Até o presente momento, ainda há divergências quanto a
quem seria o verdadeiro pai dos videogames, pois alguns autores le-
vam em consideração o período da criação dos dispositivos; outros,
o início da sua comercialização; se era totalmente eletrônico ou não,
ou ainda a visibilidade que tiveram. Independente dessa discussão,
serão apresentadas abaixo as primeiras tentativas neste campo.
Conforme Gularte (2010), no final da década de 40, Tho-
mas T. Goldsmith Jr. e Estle Ray Mann criam um jogo em um
tubo de raios catódicos no qual o monitor apresentava círculos
fixos e o jogador deveria acertá-los controlando um ponto vetorial
de forma analógica.
Ainda de acordo com ele, em 1951, foi desenvolvido o
primeiro computador voltado para jogos, o NIMROD. Ele deve-
ria executar apenas um game, o NIM, controlado por chaves e
botões, mas não era fácil de usar, exigindo a leitura do manual.
Ocupava um espaço de três metros de comprimento, dois de altu-
ra e um de profundidade, o que era comum para a época.
Em 1958, segundo o documentário “Era do Videogame”,
Willy Higinbotham utilizou um computador do laboratório mili-
tar, Brookhaven National Laboratories, onde trabalhava no Esta-
do de Nova York, para criar o primeiro jogo multiplayer baseado
no tênis de mesa, o qual denominou de Tenis for Two (Figura 01).
Ele era exibido em um osciloscópio e servia de atração para os
visitantes deste local.
Figura 01: Tennis for Two sendo executado em um osciloscópio.

Fonte: Cullen (2012).

Em seguida, Steve Russell em conjunto com outros estu-


dantes do Massachusetts Institute of Technology (MIT), lançaram
o Spacewar (Figura 02), em 1962, jogo criado para demonstrar as
potencialidades do computador PDP-1. Ele simulava um campo
estrelar aleatório, onde cada jogador controlava a sua nave. O obje-
tivo era destruir o oponente usando mísseis lançados pelas naves e
não ser atingido pelos asteróides presentes na simulação de espaço
sideral, no qual o jogo estava contextualizado (KENT, 2001).
Este jogo é reconhecido mundialmente, pois serviu de ins-
piração para diversos outros clones, como o Galaxy Game, em
1971. Considerado por Gularte (2010) como o primeiro arcade
e jogo eletrônico comercial, por sua adaptação a um gabinete de
madeira, que permitia a inserção de moedas.
Figura 02: Jogo Spacewar! no computador DEC PDP-1.

Fonte: MIT Museum (2013).

Até o início da década de 60, os jogos eletrônicos ainda não


haviam sido comercializados, pois só funcionavam em computa-
dores, cujo preço restringia seu uso a poucas instituições. Ainda
segundo Kent (2001), os únicos computadores com monitor nos
E.U.A. estavam nas Universidades de Utah, Stanford e no MIT.
Foi então que, Ralph Baer teve a ideia de criar jogos para
televisão e com a ajuda de Bill Harrison e Bill Rusch, e alguns
funcionários da Sanders Associates, criaram o Brown Box, primei-
ro console de videogame para ser usado em casa. Após ter seus
direitos comprados para ser comercializado pela Magnavox, este
dispositivo passou a ser chamado de Odyssey. Ele não apresentava
saída de áudio e os gráficos só ganhavam cor graças ao sistema de
tela translúcida da TV, mas isto não impediu a Magnavox de vender
350.000 unidades até 1975, de acordo com a “Era do Videogame”.
Figura 03: Brown Box e Odyssey comercializado pela Magnavox.

Fonte: Cullen, 2014.

Conforme Kent (2001), já no final da década de 60, o jogo


Spacewar inspirou outra personalidade na história dos videoga-
mes, Nolan Bushnell. Até então, estudante de Engenharia Eletrô-
nica da Universidade de Utah, Bushnell criou o primeiro arcade,
com um jogo similar ao Spacewar, o qual foi lançado em 1971 e
foi chamado de Computer Space.
Após o fracasso de vendas com o Computer Space, Nolan
Bushnell funda com Ted Dabney, a empresa Atari em 1972. Com
a contratação do engenheiro Al Alcorn, Bushnell convence-o a
fazer um jogo arcade de moedas parecido com o Table Tennis do
Odyssey, afirmando ter um contrato com a General Electric. O
contrato era de mentira, mas serviu de estímulo para o Al Alcorn
terminar o então Pong, em apenas três dias.
Bushnell pretendia vender a licença do Pong para a em-
presa Bally, mas para isso, decidiu fazer um teste antes a fim de
verificar a aceitação do público, deixando o protótipo da máquina
em alguns bares. O sucesso foi tanto que em um dia já havia pes-
soas fazendo fila para jogar. O dono do Andy Capp’s Tavern, um
dos locais onde foi deixado, pensou que o aparelho tinha quebra-
do, quando, na verdade, o compartimento de fichas não suportou
o peso delas. Logo, ele desistiu da venda e resolveu produzir por
conta própria (KENT, 2001).
Observando o sucesso no mercado, Bushnell teve a ideia
de produzir o Home Pong (Figura 04), versão doméstica do jogo
e, diferente do Computer Space, teve mais de 150.000 unidades
vendidas do console Atari.
Figura 04: Pong (versão arcade).

Fonte: Cox (2012).


Segundo Gularte (2010), no período de 1978 a 1983, o
mercado de jogos estava bem aquecido e era disputado por mode-
los arcades e consoles. Essa época foi considerada a Era de Ouro
dos Videogames.
Surgiram, então, jogos como: o Space Invaders do
Toshihiro Nishikado e o Pac-Man (Come-Come) do Toru Iwata-
ri. O primeiro fez tanto sucesso que o Japão teve que aumentar a
produção de moedas de 100 yens. Já o Come-Come foi o primeiro
a ter uma mascote e ainda hoje é possível jogá-lo.
Com o sucesso da Atari, diversas empresas apostaram no
mercado e passaram a produzir jogos para consoles sem se preo-
cuparem com a qualidade (jogabilidade, divertimento ou princí-
pios conceituais), ocasionando uma saturação e desinteresse do
público. Esse fato gerou a chamada “Crise do Videogame” em
1983, que levou diversas companhias a falência.
Apesar dos primeiros jogos eletrônicos terem sido desen-
volvidos para computadores, a fim de demonstrar a qualidade de
seu processamento ou o poder de programação, como já citado;
eles só ganharam espaço no mercado nesse período.
Empresas como Eletronic Arts e outras, especializadas
em produção de softwares, passaram a se consolidar no desen-
volvimento para computadores domésticos. Até então, segundo
Gularte (2010), os jogos para computador eram apenas para um
jogador por vez e questões quanto à usabilidade de um teclado
eram levantadas, pois joystick era um artigo caro.
No final da década de 70, a Nintendo, uma empresa de
brinquedos, procurou um artista para elaborar um novo jogo ele-
trônico e contratou Shigeru Miyamoto. Por não ter o conheci-
mento na área de programação, Miyamoto preocupou-se mais
em desenvolver uma história interessante. Com isso, criou-se o
primeiro jogo eletrônico de plataforma com narrativa, chamado
Donkey Kong (Figura 05).
Figura 05: Donkey Kong.

Fonte: http://www.giantbomb.com/donkey-kong/61-311/

O jogo Donkey Kong, tinha como um de seus personagens


principais o Jumpman, hoje conhecido como Mario, o encanador,
que inspirou a um novo jogo eletrônico chamado Super Mario
Bros. O design inovador do personagem Mario, combinado com
o enredo de ultrapassar todos os obstáculos para salvar uma prin-
cesa, tornaram-o um sucesso e a salvação para a indústria de vi-
deogames (CHAPLIN, 2006).
A partir daí, os jogos digitais só evoluíram, passando a ter
o áudio com qualidade de CD, o vídeo com suporte para compu-
tação gráfica, consoles e computadores mais rápidos, narrativas
diversificadas, público segmentado, entre outras características.
Na década de 90, a difusão da internet contribuiu para
grandes avanços. Jogos para computadores, antes individuais,
passaram a possibilitar a interação com outros jogadores em qual-
quer lugar do mundo, ganhando visibilidade, nesse período, jogos
como: Half-Life e Counter-Strike.

3. GÊNEROS
Os gêneros de jogos são categorias baseadas em uma com-
binação de tema, ambiente, apresentação, perspectiva do jogador
e estratégias de jogo (NOVAK, 2010). Cada jogador tem prefe-
rência por um gênero específico que, por sua vez, são mais con-
venientes em plataformas específicas. Diferente dos livros ou dos
filmes, os gêneros de jogos não estão necessariamente ligados à
história, ao enredo ou à ambientação. Eles são definidos pela for-
ma como o jogo é jogado, ou seja, seu estilo (NOVAK, 2010).
As classificações são muito variadas e não seguem um de-
terminado padrão. Por isso, é muito comum encontrar divergên-
cias entre as definições das classificações e, até mesmo, encontrar o
mesmo jogo em categorias diferentes. Para complicar ainda mais,
alguns jogos podem realmente pertencer a mais de uma categoria.
Desta forma, não se busca estabelecer um guia definitivo,
apenas apresentar alguns exemplos de gêneros de classificação.
Os exemplos apresentados são mais focados em jogos eletrôni-
cos, que podem ser definidos e classificados a partir de sua produ-
ção, de seus gráficos e também de seu estilo.
Em relação à produção, os jogos podem ser:
Independente (indie, independent): feito por apenas uma
pessoa ou por uma pequena equipe, com orçamentos menores,
podendo ser financiado pelos próprios produtores, por produtoras
maiores ou por plataformas de financiamento coletivo (como ca-
tarse ou kickstarter).
Arcade: conhecido também como máquina de fliperama,
caracteriza-se por ser produzido em um conjunto completo (jogo,
monitor e gabinete).
Advergame (advertising game): voltado diretamente para
publicidade de algum produto ou empresa.
Educacional: utilizado para atividades educacionais, ge-
ralmente em escolas e universidades.
Social: promove a interação de pessoas através de uma
rede de dispositivos.
Comercial: desenvolvido por grandes produtoras com
muitos funcionários e grande logística associada. Os jogos clas-
sificados como AAA podem ser considerados grandes produções.
Em relação aos gráficos, os jogos podem ser:
Textual: formato mais antigo de jogo, baseados em inte-
rações via texto.
Vetorial: usa primitivas geométricas como pontos, linhas e
curvas, que podem ser utilizadas para criarem perspectivas 2D e 3D.
Bidimensional (2D): jogos que utilizam imagens bidimen-
sionais e que podem ter enquadramentos diferentes. Podem ser:
• Visão aérea (top-down): por sobre a cabeça do persona-
gem, podendo se movimentar em qualquer ângulo.
• Visão lateral (side-scrolling): muito comum em jogos
de plataforma, o personagem geralmente se move da esquerda
para a direita. Efeitos de parallax são aplicados nos cenários para
simular profundidade
Pseudo-3D (2.5D): visão 2D que simula o efeito tridimen-
sional, a partir de um determinado ângulo. Podem ser:
• Isométrico: visão do jogo baseada na perspectiva isométrica
• Oblíquo: visão do jogo baseada na projeção oblíqua.
• Billboarding: elementos 3D pré-renderizados e compos-
tos em planos bidimensionais.
• Escalamento do eixo Z: a cena 3D é feita através do
escalonamento de elementos 2D.
Tridimensional (3D): jogo que utiliza gráficos tridimensionais.
• Câmera fixa: em um ponto e, geralmente, utiliza-se de
uma imagem pré-renderizada como plano de fundo.
• Primeira pessoa: câmera posicionada nos olhos da
personagem.
• Terceira pessoa: câmera posicionada próxima ao perso-
nagem, acompanhando sua movimentação pelo cenário. Possuem
variações em relação ao uso da câmera: câmera fixa (não rota-
ciona), câmera tracking (acompanha a rotação da personagem) e
câmera interativa (usuário rotaciona).

Em relação ao estilo, os jogos podem ser:
Ação: o objetivo é destruir rapidamente os inimigos, evi-
tando, ao mesmo tempo, ser destruído. Busca ser mais simples
para evitar o excesso de informações em um ambiente frenético.
A coordenação visio-motora é necessária para dominar esses jo-
gos, conhecidos como jogos de reflexo, em virtude dos movimen-
tos rápidos da mão ao pressionar os botões. Podem ser:
• Plataforma: concentra-se na movimentação rápida dos
jogadores, saltando e desviando de obstáculos e coletando itens.
• Tiro: concentra-se no combate entre um jogador e ou-
tros personagens, geralmente com armas de fogo e outras armas
controladas pelas mãos do personagem. O ponto de vista do jo-
gador varia em: primeira pessoa (first-person shooter ou FPS),
onde o jogador não pode se ver, apenas as armas, e a ação é mais
imediata porque cria uma sensação de estar presente no mundo;
e terceira pessoa (third-person shooter), onde o jogador vê seu
próprio personagem.
Corrida: também usam a perspectiva de primeira ou ter-
ceira pessoa. O jogador tenta dirigir na maior velocidade possível
sem perder o controle do veículo.
Luta: normalmente para duas pessoas, onde cada jogador
controla uma personagem e usa uma combinação de movimentos
para atacar o adversário e defender-se dos ataques. São frequen-
temente em uma perspectiva lateral e cada sessão dura, em média,
90 segundos.
Aventura: as características incluem exploração, coleta de
itens, solução de quebra-cabeças, orientação em labirintos e de-
codificação de mensagens. Normalmente são baseados em turnos,
proporcionando ao jogador tempo para refletir.
Ação / Aventura: único gênero híbrido que se consolidou
como distinto por seus próprios méritos. Da ação, ficaram os re-
flexos rápidos nos movimentos da personagem para se desviar
dos inimigos e combatê-los, da aventura, destacam-se os quebra-
-cabeças conceituais e elementos de narrativa.
Musical / Rítmico: tendo a música ou a dança como ele-
mento principal, seus comandos podem ser executados através
de controles comuns ou com dispositivos específicos simulando
instrumentos musicais. Atualmente permite conectar instrumen-
tos reais através de adaptadores.
Cassino: versões eletrônicas de jogos populares como ro-
leta, dados, vinte-e-um e máquinas caça-níqueis, tendo a compul-
são como motivação e uma relação direta com os jogos de azar.
Quebra-cabeça: o jogador deve resolver uma série de
problemas sem controlar uma personagem. Normalmente a nar-
rativa é mínima ou inexistente e são raros os que envolvem mais
de um jogador ou um adversário não jogador.
Representação de papéis (role-playing game ou RPG):
originado na década de 1970 pela série de jogos Dungeous &
Dragons que eram jogados utilizando papel e lápis. Destaque
para a importância da narrativa e pelas personagens que evoluem
ao longo do jogo. Geralmente são variações do tema “salvar o
mundo” e gera um forte envolvimento emocional.
Simulação: tenta reproduzir sistemas, máquinas e experi-
ências usando regras do mundo real. Geralmente é utilizado para
treinamentos e recrutamentos por instituições militares e gover-
namentais, mas também são criadas para fins de entretenimento.
Destacam-se:
• Veículo: o jogador geralmente opera máquinas compli-
cadas. O jogo Flight Simulator foi o primeiro simulador de veícu-
lo a obter ampla aceitação popular. Em geral, é altamente preciso
em todos os aspectos, desde os controles do equipamento até o
manual do usuário, que é normalmente volumoso e descreve os
mínimos detalhes da máquina.
• Processo: abrange sistemas ou processos do mundo real.
Também é conhecido como simulação de construção e de admi-
nistração. O objetivo é regular um sistema que pode ser social ou
econômico, não sendo necessário derrotar um inimigo ou adver-
sário, mas construir algo dentro do processo. É um jogo constru-
tivo ao invés de destrutivo.
• Esportivas e participativas: o jogador participa de for-
ma fictícia de seu esporte favorito, frequentemente como treina-
dor. O sucesso do gênero pode estar ligado ao poder de realizar
o desejo do jogador de tornar-se um atleta extraordinário e fazer
coisas que estariam além de suas possibilidades na vida real.
• Estratégia: originado dos jogos clássicos de tabuleiro,
como o xadrez, onde os jogadores devem administrar um con-
junto limitado de recursos para atingir uma meta específica. As
personagens não são importantes, porém seus recursos tornam-se
fundamentais para a experiência do jogo. A estratégia é baseada
na avaliação comparativa dos recursos e decisões dos oponentes
além da gestão e acionamento dos elementos do jogo. Os jogos de
estratégia podem ser:
Baseado em turnos (turn-based strategy ou TBS): mui-
to comum até o início de 1990, estimula o jogador a gas-
tar tempo raciocinando estrategicamente antes de tomar
decisões. A gestão de recursos envolve decisões específi-
cas sobre os tipos de recursos, os locais onde serão colo-
cados e a maneira vantajosa de usá-los. A possibilidade
de dispor de todo o tempo necessário para tomar essas
decisões é o grande apelo do jogo.
Tempo real (real-time strategy ou RTS): pressiona os
jogadores para rapidamente avaliar com detalhes seus
movimentos. Por ser em tempo real, um conjunto de re-
cursos pode prosperar enquanto outros fracassam, pois
não é possível ao jogador se dedicar a todos ao mesmo
tempo.

4. DESIGNER DE JOGOS
Inicialmente, é importante entender que designer de jogos
(a pessoa) é quem exerce a prática de design de jogos (a ativi-
dade). O design de jogos pode ser considerado como a espinha
dorsal do projeto e do desenvolvimento de um determinado jogo.
Ele é responsável por dirigir a criação do jogo seguindo uma sé-
rie de restrições, sejam elas técnicas, de produção, de mercado,
de orçamento, de público etc. De maneira mais ampla, o design
de jogos pode ser considerado como a atividade responsável por
decidir o que um jogo deve ser (SCHELL, 2011). De modo a
tornar isto possível, o designer de jogos exerce diversas tarefas,
atuando como um pensador criativo, comunicador, escritor, advo-
gado defensor, técnico, oráculo, fonte de novas ideias, testador,
entre outras responsabilidades, além de participar do processo de
desenvolvimento da ideia até o desenvolvimento do jogo final
(SCHUYTEMA, 2011).
Entre as diversas responsabilidades do designer de jogos,
está o seu papel de ser um grande advogado de defesa das boas
ideias, conceitos e tecnologias que farão com que seu jogo seja uma
experiência melhor. Para isto, será necessário estar preparado para
defender determinados argumentos e responder variadas perguntas
para toda a equipe. O seu papel é ser o defensor da futura experiên-
cia do jogador, e é sua responsabilidade levantar essa bandeira ao
longo de toda a duração do projeto (SCHUYTEMA, 2011).
Como se não bastasse, também cabe ao designer, motivar
e dar objetivos à equipe de desenvolvimento, unificar a visão do
jogo para toda a equipe, flexibilizar a introdução e remoção de no-
vas características, e também, o grande responsável em despertar o
interesse de compra para algum fabricante e/ou editor (publisher).
Em meio a tantas responsabilidades, talvez não tenha fi-
cado claro o verdadeiro papel do designer de jogos. Apesar de,
inicialmente, a resposta parecer óbvia: afinal, o objetivo de um
designer de jogos é criar jogos! Infelizmente esta não é a respos-
ta mais correta, pois os jogos são apenas um meio para um fim.
“Quando as pessoas jogam, têm uma experiência. É com essa ex-
periência que o designer se preocupa. Sem a experiência, o jogo
é inútil” (SCHELL, 2011, p. 10). E vale lembrar que o jogo não é
a experiência, pois mesmo sendo o jogo o responsável por possi-
bilitar a experiência, isto não o torna a experiência, ele é apenas o
meio para se obtê-la.
Outra confusão em relação à atividade do designer de jo-
gos está relacionada ao campo das ideias. Não é raro quando a
epifania atinge determinados jogadores, surgindo diversas ideias
para a criação de seus próprios jogos, corrigindo supostas falhas
ou gerando experiências mais ricas e interessantes em outros já
existentes. E por ter essas ideias, a pessoa acredita que já possui
tudo o que é preciso para ser um designer de jogos. Entretanto,
uma ideia, mesmo que maravilhosa, representa apenas metade do
caminho da criação de um jogo, e é na parte restante que entra o
trabalho árduo. Entre as diversas responsabilidades, cabe ao de-
signer de jogos redigir o documento de design adequadamente
e trabalhar com afinco com uma equipe de desenvolvimento para
ver suas ideias serem concretizadas (SCHUYTEMA, 2011).
E por falar em criação de ideias, os designers não podem
simplesmente tirar algo do nada ou esperar indeterminadamente
até que surjam grandes e incríveis inspirações. Os designers tra-
balham com prazos e muitas ideias são originadas pelo contexto
do jogo, das próprias experiências (seja como jogador ou mes-
mo experiências de vida) e também das limitações da tecnologia.
Importante destacar que, mesmo sendo considerados os donos
das ideias, os designers de jogos devem ser sempre capazes de
estar abertos a novas sugestões da equipe de desenvolvimento e
entender como pode impactar de forma positiva ou negativa à
experiência e ao processo de desenvolvimento de um jogo. Ainda
é preciso identificar e selecionar as ideias boas e, até mesmo, ve-
rificar se as algumas delas estão sendo aplicadas fora de contexto
e encontrar uma forma de encaixá-las.
Pela necessidade de gerar muitas ideias, as pessoas aca-
bam acreditando que a habilidade mais importante para um de-
signer de jogos é a criatividade. Outras sugerem que é o pensa-
mento crítico ou a lógica, devido ao trabalho do designer de jogos
envolver tomada de decisões. Entretanto, segundo Schell (2011),
a habilidade mais importante para um designer de jogos é ouvir.
É preciso ouvir as pessoas que jogarão o seu jogo, afinal, são
elas que devem estar satisfeitas. E para conhecer o resultado da ex-
periência de um jogo é preciso ouvir atentamente a opinião de cada
uma delas. Em muitos casos, será preciso ouvir também o cliente,
afinal é ele quem financia o jogo. E nestas horas, aparece outro fator
que também precisa ser ouvido: o próprio ego. E se o designer conse-
guir dominar o próprio ego, este autocontrole torna-se uma das mais
poderosas ferramentas de criatividade (SCHELL, 2011).
Por último, mas não menos importante, é preciso ser ca-
paz de ouvir e aprender com os membros qualificados da equipe.
O designer de jogos não precisa saber executar todas as etapas
da criação de um jogo, entretanto é importante conhecer todos
os passos necessários e, mais importante, conhecer os limites, as
oportunidades e o papel de cada uma destas etapas para o suces-
so do projeto. É primordial manter o diálogo com toda a equipe
de desenvolvimento. O trabalho do designer é refinar e polir as
ideias e transformá-las em momentos de excelente gameplay (ter-
mo que se refere à experiência do jogo) (SCHUYTEMA, 2011).
Em meio a tantas tarefas e responsabilidades, é muito di-
fícil afirmar qual é o aspecto mais importante do trabalho do de-
signer de jogos. Certamente, uma das principais tarefas é o ato de
visualizar o gameplay. O trabalho do designer envolve visualizar
a experiência do jogo, com o objetivo de obter um conhecimento
de como acontece e comporta-se a sua jogabilidade. Nesse ponto
do processo, os números específicos não importam - trata-se mais
do clima e do fluxo do jogo. Para que esta análise seja possível
antes da conclusão do projeto, cabe ao designer criar protótipos.
Um protótipo é uma aproximação funcional de como o
produto final pode ser. O designer criará diversos protótipos para
testar a dinâmica de seu jogo antes de inseri-la no documento de
design. Apesar de existir muitas maneiras de se criar um protóti-
po, a mais comum é usar uma abordagem que permite que o pró-
prio designer crie o gameplay, de modo a testá-lo ou experimen-
tá-lo com outros membros da equipe de desenvolvimento. Um
dos pontos fundamentais é saber separar o seu papel de jogador e
o de designer ao visualizar a experiência de jogo e ao documentar
essa experiência no papel.
Em relação à documentação, após a aprovação do concei-
to, inicia-se o documento de design do jogo (Game Design Do-
cument, GDD) que é a descrição formal de todos os sistemas e
interações e, apesar de contar com figuras, tabelas e gráficos, a
maior parte é representado de forma escrita. Como parte do tra-
balho, cabe ao designer a responsabilidade de visualizar e depois
descrever o jogo de forma a criar um guia de orientação e consul-
ta, através de uma série de documentos, para os demais desenvol-
vedores da equipe.
A partir do GDD, o próprio designer de jogos, ou o pro-
dutor, pode listar as tarefas de cada área, o que facilita muito o
processo de desenvolvimento (ADAMS, 2010). Em muitas em-
presas, é comum os artistas e os programadores ajudarem o de-
signer de jogos a desenvolver o início do documento de design,
principalmente ao apontar as limitações técnicas da ideia antes ou
durante o desenvolvimento dos protótipos.
Apesar do GDD se tratar de algo muito importante e to-
mar bastante tempo durante o processo de criação de um jogo, as
responsabilidades do designer não terminam ao concluir o docu-
mento. Na verdade, o documento de design nunca está comple-
to. Ele deve ser constantemente atualizado, à medida que surgem
novas ideias, mudanças em relação a limitações do cronograma,
corte de recursos, limitações tecnológicas, novas oportunidades
reveladas, entre outros motivos. O objetivo do GDD não é criar
uma espécie de bíblia que fique encostada na prateleira, mas um
documento dinâmico e de fácil acesso, compartilhado com todos
envolvidos no desenvolvimento do jogo. Mesmo com o docu-
mento todo redigido e atualizado, cabe ao designer acompanhar
o progresso de desenvolvimento do jogo em suas diversas áreas,
para detectar quaisquer problemas à medida que surgem. Quanto
mais cedo identificar um obstáculo em seu desenvolvimento, me-
lhor a solução para o projeto e toda a sua equipe.
Além disso, possivelmente, os designers trabalham em
equipes, e cada uma é responsável por determinados aspectos do
jogo, dividindo as tarefas. Então, mesmo que cada membro da
equipe não seja o único responsável pelo design, é preciso manter
uma visão do todo para acompanhar o progresso e regularmente
se comunicar com os outros designers para ver quaisquer altera-
ções em cada uma das áreas e como elas afetarão as próprias par-
tes do jogo. Sempre quando surgirem mudanças, o designer deve
revisar, editar ou atualizar o GDD para refletir a nova realidade,
mas, ao mesmo tempo, manter atenção especial na continuidade
para garantir que quaisquer mudanças façam sentido no fluxo do
jogo em geral (SCHUYTEMA, 2011).

5. EXPERIÊNCIA
Atualmente vivemos na retórica da experiência, onde o
objetivo principal do designer de jogos é gerar uma experiência
no jogador. Porém, as experiências são subjetivas, individuais e
impossíveis de se transferir (pelo menos com a tecnologia atual)
para os demais. Você já tentou explicar uma de suas experiências
para outra pessoa? Por mais que se explique, a linguagem nunca
será capaz de descrevê-la em sua plenitude.
Sendo assim, o designer de jogos tem a árdua tarefa de
criar uma situação (jogo) onde seja possível para o jogador ter
uma determinada experiência. Mas como podemos garantir que
uma determinada experiência ocorra? Não podemos. O que um
designer pode fazer é buscar o máximo possível de elementos
que possam sugerir a experiência almejada, porém apenas com os
testes é que será possível observar se o objetivo foi alcançado.
Uma boa prática para o designer de jogos é observar suas
próprias experiências. Quais os momentos de nossas vidas que con-
sideramos marcantes e únicos? Será que poderíamos pensar em um
jogo onde essa experiência poderia ser vivenciada? Adquirir o há-
bito de observar nossas próprias experiências é bastante importante
para um designer de jogos. Com esse propósito, Schell (2010) su-
gere alguns conselhos para auxiliar esse processo:
• Comece analisando sua memória;
• Para as novas experiências busque passar pela experiên-
cia duas vezes, na primeira permita-se viver a experiência sem
observa-la e na segunda utiliza a memória da primeira para obser-
var melhor a segunda;
• Durante a experiência dê um olhar de relance em como
está se sentindo, mas nada muito rebuscado para não prejudicar
a experiência; e
• Observe silenciosamente e exercite a auto-observação.
• O principal objetivo do designer é buscar qual experiên-
cia essencial seu jogo irá provocar nos jogadores, e fazer de tudo
para reforçar esse objetivo.

7. MECÂNICAS
Maranhão (2015), fez um levantamento de vários autores
que conceituaram o que é mecânica e, baseado em seu trabalho,
apresentaremos algumas definições e classificações de mecâni-
cas. Mecânicas de jogos são sistemas ou simulações baseadas em
regras que facilitam e encorajam o usuário a explorar e aprender
as propriedades de seu espaço de possibilidades através do uso de
mecanismos de retorno (COOK, 2006).
Para Cook (2006) o jogo deve, através das mecânicas, en-
corajar a descoberta, direcionando o jogador para tomar decisões;
encorajar a exploração, ou seja, perceber os efeitos de suas ações;
e fornecer informações de utilidade futura.

Mecânicas de jogo são uma característica funcio-


nal de jogo que descreve um possível, preferível,
ou encorajado meio através do qual o jogador pode
interagir com elementos do jogo enquanto tenta in-
fluenciar seu estado para atingir uma meta (JÄRVI-
NEN, 2008).

Järvinen (2008), classifica as mecânicas em primá-


rias, que estão disponíveis no jogo como um todo,
submecânicas, que servem de suporte para as me-
cânicas principais, e modificadoras, que aparecem
em situações específicas e determinadas condições.
As mecânicas são os procedimentos e regras de um
jogo. Elas descrevem o objetivo do jogo, como os
jogadores podem ou não tentar alcançá-lo, e o que
ocorre quando tentam (SCHELL, 2010).
Schell (2010), considera de maneira abstrata as mecâni-
cas e classifica-as em seis categorias: espaço; objetos, atributos e
estados; ações; regras; habilidade; e probabilidade. Espaço rela-
ciona os espaços lógicos onde o jogo ocorre, sem considerar os
elementos visuais dos mesmos. Objetos, atributos e estados defi-
nem os elementos que compõem os jogos, quais seus atributos e
quais os estados onde o objeto se encontra em um determinado
momento, para isso recomenda o uso de Diagramas de Estados
Finitos (Figura 07). Ações define as atividades que serão realiza-
dos pelos objetos do jogo, incluindo o próprio jogador.
Figura 07: Diagrama de Estados Finitos dos fantasmas do Pac Man

Pac Mac come


Hora de sair da pastilha de energia
Azul:
jaula Perseguindo Fugindo do
Na jaula
Pac Mac Pac Mac

Devorado pelo Pac


Mac
Olhos chegam à
Medidor de Medidor de
pastilha cheio pastilha quase
jaula
cheio

Olhos: Piscando:
Rolando até a Fugindo do
jaula Devorado pelo Pac Mac
Pac Mac

Fonte: Schell (2010)


Regras falam das regras fundamentais, operacio-
nais, comportamentais, objetivos e etc. Habilidade discute
os elementos do jogo que testam a habilidade mental ou físi-
ca do jogador. Probabilidade trabalha com os elementos ale-
atórios que geralmente inserem drama aos jogos. As mecâ-
nicas são as várias ações, comportamentos e mecanismos
de controle oferecidos ao jogador dentro de um contexto de
jogo. (HUNICKE et al.,2004)
Hunicke et al. (2004) definem um framework para desen-
volvimento de jogos chamado MDA (Mechanics, Dynamics, and
Aesthetics) que tem três camadas principais: Estética, Dinâmica
e Mecânica. A Mecânica descreve os componentes particulares
do jogo como dados e algoritmos. A Dinâmica define o compor-
tamento das mecânicas agindo sobre as entradas do jogador e da
saída de outras mecânicas ao longo do tempo. Por sua vez, a Es-
tética apresenta as respostas emocionais desejáveis evocadas no
jogador quando ele interage com o sistema.
Sob a perspectiva do designer, as mecânicas dão ori-
gem ao comportamento dinâmico do sistema, que
por sua vez leva a experiências estéticas particula-
res. Pela perspectiva do jogador, a estética define o
tom, que é gerado a partir de dinâmicas observáveis
e, eventualmente, de mecânicas operacionais (MA-
RANHÃO, 2015, p. 39).

Bjork e Holopainen (2004), definiram um conjunto de pa-


drões de projeto que especificam as principais mecânicas encon-
tradas em jogos. Inicialmente definiram quatro grandes categorias
de padrões, e seus grupos associados:
• Holísticos: descrevem as atividades do ato de jogar.
• Instância de Jogo: todos os componentes, ações e
eventos do jogo;
• Sessão de Jogo: atividades de um jogador;
• Sessão do Jogar: momento ininterrupto de jogo;
• Atividades Extrajogo: outras atividades relevantes que
não tem impacto direto no jogo.
• Limitantes: limitam as ações possíveis do jogador.
• Regras: governam a interação dos componentes e quais
ações são permitidas;
• Objetivos: motivam o ato de jogar
• Modos de jogo: definem maneiras diferentes de jogar.
• Temporais: descrevem o fluxo do jogo.
• Ações: maneiras que o jogador pode modificar o esta-
do do jogo;
• Eventos: modificações no estado do jogo percebidas
pelo jogador;
• Fechamentos: modificações no estado do jogo significa-
tivas e quantificáveis relacionadas ao progresso;
• Condições de final: finalização de uma sessão de jogo;
• Funções de avaliação: resultado.
• Estruturais: compõem os elementos lógicos e físicos
necessários.
• Interface: apresenta o tema e dá informações;
• Elementos de Jogo: componentes físicos e lógicos utili-
zados pelo jogador;
• Jogadores: representação do(s) jogador(es);
• Facilitador de Jogo: responsável por controlar as mudan-
ças no jogo;
• Tempo de Jogo: controle da ordem das ações do jogo
Para os jogos analógicos (de tabuleiro, de cartas, etc.)
existe uma classificação de mecânicas popularmente aceita que
foi desenvolvida pela comunidade de jogos analógicos no site
BoardGameGeek5 e que conta com 51 mecânicas comumente en-
contrada em jogos.

8. PROCESSOS DE DESENVOLVIMENTO DE JOGOS


Não existe uma especificação de processo de desenvolvi-
mento de jogos padronizado. Cada designer, através da sua expe-
riência pessoal, desenvolve sua metodologia. Apesar de alguns
elementos repetirem-se, cada processo possui características di-
ferentes e desenvolve-se de forma diferente.
Schell (2010) começa pelo desenvolvimento de ideias
através de brainstorming, depois escolhe as melhores ideias para
desenvolver. Essas ideias devem reforçar um tema que é o princi-
pal objetivo do jogo. Após escolher a ideia, ele sugere desenvol-
5
https://boardgamegeek.com/browse/boardgamemechanic
ver uma série de ciclos de desenvolvimento para testar possíveis
soluções e riscos das ideias escolhidas, em um processo incre-
mental e iterativo. As soluções são testadas através do desenvol-
vimento de protótipos. A ideia deve ser desenvolvida ressaltando
a tétrade elementar composta de: narrativa, mecânica, estética e
tecnologia, com cada elemento reforçando os demais em busca de
uma união dos quatro elementos. Depois disso, ele aborda outros
elementos importantes que o designer deve ter em mente durante
o desenvolvimento do jogo: Quem é o jogador? Quais mecânicas
ele utilizará? Essas mecânicas estão balanceadas? Como é sua
interface? E os personagens? Entre outros. Seu livro recomenda
100 lentes que podem ser utilizadas para se observar o desenvol-
vimento do jogo sob diferentes óticas, de forma a deixa o jogo o
mais coerente e completo possível. Em cada lente o autor apre-
senta algumas perguntas que devem ser feitas ao jogo.
Fullerton (2008) considera o playtest (teste do jogo com
o público alvo) como elemento fundamental e desenvolveu uma
metodologia baseada fortemente nessa prática. O objetivo é co-
meçar pelas mecânicas mais básicas do jogo e, a medida que os
testes forem realizados e os possíveis problemas sanados, outras
mecânicas mais elaboradas são adicionadas ao projeto.
Para Rogers (2012), tudo começa de uma ideia, passando
pelo desenvolvimento da história e a especificação dos três Cs:
Character (personagem), Câmera e Controles. Depois se desenvol-
ve a interface do jogo, o design de níveis, ou seja, toda a elaboração
dos níveis do jogo, inimigos e mecânicas necessárias ao jogo. Vale
ressaltar que ele trabalha principalmente jogos de plataforma.
CONCLUSÃO
Apresentada essa breve introdução, esperamos que os inte-
ressados possam pesquisar mais os trabalhos da área e desenvolver
um estudo mais direcionado. A área de design de jogos é bastante
ampla e envolve várias áreas de conhecimento como psicologia,
antropologia, sociologia, filosofia, artes, computação, entre outras.
O importante é saber que todo o conhecimento adquirido será de
bastante utilidade para o designer de jogos, e que suas experiências
de vida e de desenvolvimento de jogos sempre o aproximarão de
jogos mais elaborados e com maiores chances de sucesso.

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ESTRUTURA
GENÉRICA
DE UM JOGO
DIGITAL
Estrutura Genérica de um Jogo Digital
Jefferson T. Freitas, João R. S. Filho, Artur O. R. Franco,

José G. R. Maia

1.INTRODUÇÃO
Os jogos digitais têm usado as tecnologias mais avançadas
para efeitos audiovisuais e interação em tempo real, tipicamen-
te exigindo grande poder de processamento. De fato, a indústria
de jogos encontra-se frequentemente na vanguarda da Ciência
da Computação por lidar com diversos problemas (LENGYEL,
2016). Jogos são obras de cunho tanto computacional quanto ar-
tístico e de design, que apresentam certos elementos comuns a
esses produtos e que podem estruturados de uma forma genérica.
Este capítulo propõe-se a apresentar os elementos de um
jogo digital sob a perspectiva do desenvolvedor, buscando esta-
belecer um panorama da implementação de jogos sob uma pers-
pectiva isenta de ferramentas. Serão abordadas tanto as represen-
tações bidimensionais, geralmente mais simples, quanto as suas
sofisticadas contrapartidas tridimensionais. Espera-se que a partir
desse capítulo o leitor compreenda os elementos mínimos neces-
sários ao desenvolvimento de um jogo eletrônico.
2. VISÃO GERAL DOS JOGOS 2D E 3D
Os jogos eletrônicos, independentemente da representação
que utilizam, apresentam certos aspectos fundamentais, comuns a
praticamente todos os jogos. Tratemos primeiramente da apresen-
tação através de telas e modos de jogo, assim como os módulos do
jogo enquanto artefato de software. Essa discussão motivará a intro-
dução de conceitos básicos sobre Programação Orientada a Objetos.

2.1. Telas e Modos de Jogo


Um jogo típico inicia com o carregamento de elementos mí-
nimos, processo que exibe os créditos do produto ao mesmo pas-
so que utiliza desse intervalo de tempo para acessar e preparar o
conteúdo da interação sem que o usuário perceba o que ocorre nos
bastidores do software (RABIN, 2010). Nesse processo, podem ser
exibidas as logomarcas do console, dos estúdios envolvidos na pro-
dução, da distribuidora e de eventuais patrocinadores do jogo.
Após isso, a interação depende do gênero de jogo. Jogos
arcade costumam exibir uma ligeira demonstração do jogo para
que o público crie uma expectativa sobre como aquele jogo é jo-
gado (gameplay), que é geralmente seguida por um placar regis-
trando os jogadores com melhor desempenho. Jogos com histórias
mais densas, por sua vez, costumam exibir um vídeo que introduz
o jogador ao enredo, promovendo estímulo para que o jogo seja
experimentado (RABIN, 2010). Um componente de reprodução
de vídeo atende a ambos os casos, pois uma demonstração real
exige vários cuidados com a inicialização do jogo e a simulação
de entradas do usuário para cada situação de jogo demonstrada.
Essa etapa é sucedida por uma tela de apresentação do
jogo, a qual dá acesso ao menu principal. Nele, é possível ver
créditos, configurar algumas opções, tais como controles e nível
de dificuldade, para então iniciar algum dos modos de jogo. No-
te-se esse menu requer o uso de fontes para exibição de texto e
de elementos de interação com o usuário. Diversos jogos usam
fontes customizadas para reafirmar sua identidade visual, o que
abre espaço para a atuação de artistas (SCHELL, 2014).
Vários jogos incluem não apenas um modo de jogo solo,
mas também modos multijogador local ou em rede. Certos gêneros
mais competitivos, tais como os jogos de luta, oferecem desafios
e opções de treino para que o jogador adquira estratégias úteis nas
batalhas. Contudo, o código do jogo precisa ser bem estruturado
para permitir flexibilidade na forma como são jogados. Certos mo-
dos de um mesmo jogo podem ser radicalmente diferentes, ao pon-
to de se tornarem praticamente jogos distintos que são acessados
pelo mesmo menu (SCHELL, 2014) (LENGYEL, 2016).

2.2. Módulos
A representação computacional de um jogo, como de quase
todo sistema complexo, costuma partir do princípio da subdivisão
em múltiplos módulos. Cada módulo é pensado para lidar com
aspectos específicos do jogo, permitindo que o desenvolvimento
ocorra de forma organizada e mais previsível. Tais módulos serão
responsáveis por: desenhar os elementos do jogo na tela; efetuar
interações com o jogador; emitir áudio; e controlar inteligência
artificial, dentre outras tarefas. Uma forma de representar tais mó-
dulos é considerar as classes do jogo, será discutido mais sobre
isso na subseção abaixo, sobre programação orientada a objetos.
A estrutura de execução do jogo é semelhante à de qual-
quer aplicação. Ao iniciar, o jogo deve instanciar e carregar seus
elementos visuais e lógicos. Depois disso, o jogo usa uma estru-
tura de repetição para se manter em um estado chamado “laço de
jogo” (do Inglês, game loop). Com isso, um conjunto de coman-
dos será executado constantemente para coordenar os módulos do
jogo a fim de produzir som, imagens e comportamentos para os
elementos no jogo. Também é possível criar estados intermediá-
rios como carregar e descarregar mapas ou fases do jogo no game
loop. Por fim, muitos títulos permitem que o jogo seja pausado a
critério do jogador.

2.3.Programação Orientada a Objetos


Programação Orientada a Objetos (POO) é um paradigma
de programação que facilita a produção de softwares modernos.
Seu princípio parte da ideia de que o computador não deve pro-
cessar apenas tipos numéricos, texto e endereços de memória,
mas permitir a criação de outras abstrações mais sofisticadas para
simplificar o trabalho dos desenvolvedores, denominadas classes.
As classes funcionam como um molde geral e padronizado usado
na construção de objetos representando entidades específicas, de-
nominados de instâncias.
Um sistema hipotético de jogo pode se beneficiar ao regis-
trar não um conjunto de nomes, identificadores e placares por pes-
soa, mas criar um tipo abstrato que contenha todos estes dados na
forma de variáveis. Essas variáveis são denominadas de atributos.
Assim, é possível conceber uma classe que funcione como “ficha
do jogador”. Por exemplo, podemos criar uma classe “criatura”,
que possua os seguintes atributos: “velocidade”; “vitalidade”; “ha-
bilidade”; nome da criatura; imagem representando aquela criatura;
animações; sons, dentre outros atributos possíveis.
Além dos atributos, a classe também pode conter métodos,
que são conjuntos de instruções a serem executadas pela instân-
cia. No caso de uma instância de “criatura”, os métodos poderiam
ser funcionais em termos de jogo: “atacar”, “defender” e “morrer”.
Outros métodos poderiam ter outras funções, como, por exemplo,
desenhar a própria criatura na tela, atualizar sua posição, etc.
Essa estrutura formada por atributos e métodos pode
ser reaproveitada por outras classes. Por exemplo, a nossa clas-
se “criatura” poderia ter reusado definições de “entidade”, uma
classe hipotética contendo configurações básicas para desenhar
e emitir sons de “coisas” no jogo. Logo, dizemos que a classe
“criatura” herda definições da classe “entidade”. Por esse motivo,
também possui os métodos e atributos responsáveis por exibição
gráfica e reprodução de áudio. Através desse exemplo, percebe-se
que a programação orientada a objetos sugere que programadores
definam classes relacionadas entre si para promover maior reuso
de código, o que torna a programação mais lógica e rápida.
O uso de POO na programação de jogos pode facilitar o de-
senvolvimento, mas pode exigir conhecimento de padrões de projeto
(RABIN, 2010) e do sistema de jogo. Apresentaremos a estrutura
genérica dos jogos para que o leitor se familiarize com os conceitos
envolvidos nas principais classes utilizadas na construção de jogos.

3. ELEMENTOS DE JOGOS 2D
Ao longo desta seção, abordaremos os principais elemen-
tos de programação que constituem um jogo 2D, com enfoque na
apresentação audiovisual e na construção das mecânicas do jogo.
Note-se que as representações vetoriais utilizam conceitos seme-
lhantes, porém não são apresentadas aqui por questões de espaço.

3.1. Paletas de Cores


Uma paleta é um conjunto de cores que é referenciado pe-
los elementos gráficos do jogo. O limite de cores por paleta ge-
ralmente é uma potência de dois: 4, 8, 16 e assim por diante. Essa
convenção permite que as cores sejam identificadas sem que haja
o desperdício de um bit sequer. Vários sistemas gráficos definem
as paletas como sendo parte de uma “paleta maior”, visando man-
ter uma representação compacta e eficiente.
Cada sistema gráfico suporta um número diferente de pa-
letas simultâneas, além de usar uma memória especialmente pro-
jetada para armazenar as cores. Desse modo, o uso racional das
paletas requer que as cores sejam atribuídas cuidadosamente aos
elementos gráficos do jogo. Essas limitações devem ser abraçadas
pelos projetistas do jogo, pois, apesar da limitação, isso ajuda a
manter uma noção estética mais clara e marcante quando cada
(preciosa) cor da paleta é definida pelos artistas.

3.2. Ladrilhos (Tiles)


Os jogos bidimensionais são comumente representados
usando uma grade regular formada por padrões visuais WOLF,
2012), que é exibida de forma simplificada, dando origem a for-
mas compostas como um mosaico de ladrilhos quadrados (do
Inglês, tiles). Esse foi paradigma visual dominou dos até a 4ª ge-
ração de console, pois ajudam a economizar memória e processa-
mento uma vez que cada tile é definido em termos da paleta e que
a cena, por sua vez, é composta de tiles (Figura 1).

Figura 1. Ladrilhos para criar mapas através de “mosaicos”

Fonte: Os exemplos utilizados são imagens disponibilizadas gratuitamente na internet6.

6
http://www.gameart2d.com/free-desert-platformer-tileset.html
Agora listaremos algumas observações importantes sobre
o uso de tiles em jogos. Cada ocorrência de um tile na cena é pin-
tada usando apenas uma paleta. Assim, quaisquer mudanças das
cores naquela paleta alteram a percepção das figuras. Por exem-
plo, a camisa de um personagem pode ser removida substituindo
as cores usadas na camisa por tons de pele
Cada posição da grade regular pode estar associada a uma
paleta e a um modo de exibição do tile. Com isso, o mesmo tile pode
ser reusado com diferentes paletas, ou mesmo ser refletido e rota-
cionado para se obter maior diversidade visual. Essa característica é
importante em consoles antigos, pois possuem pouca memória.
Animações podem ser obtidas pela simples variação dos
tiles exibidos em uma determinada região da grade ao longo do
tempo. Efeitos de transição de telas, por sua vez, podem ser ob-
tidos manipulando-se as paletas antes de se alternarem os tiles
exibidos na tela inteira. Além disso, os motores gráficos 2D ge-
ralmente adotam tiles especiais, sendo um de “limpeza”, que pre-
enche a imagem antes que um quadro seja pintado. Outros tiles
estão associados a uma fonte e são reservados para as cenas con-
tendo texto.
Por fim, é preciso observar que, como a unidade visual mí-
nima é o tile, é preciso manipular seus pixels para obter efeitos mais
detalhados. Ou seja, mover suavemente objetos na tela não é tão
simples quando o sistema gráfico é puramente baseado em tiles:
essa função fica a cargo dos sprites, que veremos mais adiante.
3.3. Mapas de Ladrilhos (Tilemaps)
Tilemaps são imagens que contêm vários tiles que são
reutilizados no decorrer do jogo, pois consumo de memória é
uma preocupação constante principalmente em consoles (WOLF,
2012). Os tilemaps podem ser vistos como “paletas de tiles” usa-
das para povoar uma cena bidimensional (vide Figura 1).
Tilemaps consomem aproximadamente 64 vezes menos
memória do que imagens convencionais, economizando memória
para armazenar dados das imagens dos mapas e dos personagens,
por exemplo. Assim, cenas são formadas por uma matriz de índi-
ces identificando qual tile deve ser exibido na posição correspon-
dente da tela. Devido à facilidade de uso, tilemaps são frequente-
mente usados em editores de jogos como o RPG Maker7.

3.4. Sprites
Sprites são figuras que podem ser animadas e manipula-
das de forma independente no contexto de uma cena 2D. Essa
representação é semelhante aos tiles e tornou-se um paradigma
de trabalho desde que os jogos se estabeleceram como forma de
entretenimento (WOLF, 2012). Jogos modernos usam sprites na
representação de imagens, apesar de que tendem a ser substituí-
dos por modelos 3D nas produções mais recentes. Elementos da
interface gráfica do jogo, por exemplo, geralmente são implemen-
tados usando sprites.

7
http://www.rpgmakerweb.com/
Sprites podem ser formados por aglomerados de tiles, como
no caso dos consoles clássicos, permitindo economizar memória.
Diferente dos tiles, que são fixos à grade, os sprites podem ser posi-
cionados em posições arbitrárias da tela para obter uma movimen-
tação mais granular. Por outro lado, geralmente o número máximo
de sprites exibidos na tela é limitado por questões de desempenho.
A animação funciona de maneira análoga às técnicas analó-
gicas usadas em desenhos animados, na qual as figuras dos sprites
são substituídas em sequência ou ciclo, produzindo a ilusão de movi-
mento. Essas figuras são formadas por blocos de pixels trabalhados
cuidadosamente pelos artistas, de modo que a aplicação dos princí-
pios clássicos de animação pode melhorar a percepção e fluidez dos
movimentos (THOMAS and JOHNSON and JOHNSON, 1995).
Sprites compõem uma cena maior, logo é comum um jogo
ter centenas de sprites. Folhas de sprites (do Inglês spritesheets)
foram introduzidas para aliviar o consumo de memória e de pro-
cessamento. Spritesheets contém os frames de uma animação es-
pecífica como uma única imagem (Figura 2). É importante per-
ceber que todas as figuras precisam ter o mesmo tamanho. Em
consequência disso o sprite deve ter de possuir uma área suficien-
te para acomodar todos os movimentos do personagem, por mais
que surjam regiões vazias nas imagens.
Figura 2: Spritesheet com os 6 quadros de uma
animação, na qual são usados princípios de animação
clássica para ressaltar a velocidade do movimento

Fonte: Sprites criados por Alysson da Paz a pedido dos autores.

3.5. Entidades
Entidades são as abstrações que representam os elementos
interativos básicos de um jogo (WOLF, 2012). As entidades são
uma pedra fundamental no projeto de jogos (RABIN, 2010), que
geralmente possuem representações audiovisuais e que definem
regiões geométricas, denominadas de colisores, que são usadas
para ativar a interação com outras entidades. A entidade é uma
classe básica para definição de personagens e objetos do jogo
através do reuso.
Em um jogo de futebol, por exemplo, entidades especia-
lizadas seriam usadas para jogadores de linha, o goleiro e a bola.
Todos se preocupam com imagens e com colisão, mas a bola pos-
sui implementações de física própria e os personagens possuem
ações pré-programadas. Já em um jogo de tiro, entidades, podem
ser personagens, projéteis e objetos quebráveis. As entidades
variam bastante muito de jogo para jogo, porém essa estrutura
genérica é útil para manipular e identificar instâncias que se ma-
nifestam no gameplay, sejam os avatares sob controle direto do
jogador ou os elementos controlados artificialmente pelo jogo.

3.6. Camadas (Layers)


A correta exibição dos gráficos em um jogo requer o es-
tabelecimento de uma ordem de prioridade entre cada elemento
visual. As camadas (do Inglês layers) são usadas para agrupar
tiles e sprites não apenas para produzir cada quadro do jogo, mas
também para produzir noções de profundidade e de movimen-
to (WOLF, 2012). Uma das principais funções das camadas dos
jogos 2D é fornecer facilidades para a rolagem de tela, o que ge-
ralmente é feito combinando várias camadas para produzir uma
sensação de movimento (Figura 3). Esse mecanismo é conhecido
como “paralaxe” (RABIN, 2010).
As camadas são pintadas de trás para frente, uma estraté-
gia conhecida como o “Algoritmo do Pintor”. Todavia, também
é possível mudar a prioridade de tiles e sprites individuais para
produzir efeitos de profundidade, como quando um personagem
caminha entre árvores, por exemplo. Geralmente os sprites e
HUD (do Inglês Head-up Display) são agrupados nas últimas ca-
madas, de modo a terem prioridade na cena. Dá-se o nome de
HUD aos elementos não-interativos que se sobrepõem ao jogo
para exibir o status do jogo continuamente através de barras e
gráficos para auxiliar os jogadores na tomada de decisões.
Figura 3: Cena composta por quatro camadas, omitindo
sprites e HUD. O jogo gerencia rolagens independentes
para as nuvens, as colinas mais distantes e o cenário mais
próximo, conferindo movimento e profundidade à cena.

Fonte: Editado pelos autores a partir de imagens gratuitas8.

Camadas adicionais podem ser usadas para fins de de-


puração. Com isso, os desenvolvedores podem visualizar como
colisores e demais objetos ocultos aos jogadores afetam o fun-
cionamento do jogo.

3.7. Colisores
Colisores são essenciais em praticamente todos os jogos,
pois é preciso saber quando os elementos do jogo entram em con-
tato para disparar ações e reações variadas (MAIA et al. 2008).
Eventos geralmente são disparados quando dois colisores se in-
terceptam. Os colisores mais comuns são os contornos envoltó-
rios, ou seja, simplificações aproximadas de formas usando pri-
mitivas geométricas simples como retângulo e círculo. Também
são muito usados na definição de fronteiras nos cenários.

8 http://www.gameart2d.com/free-desert-platformer-tileset.html
Esses contornos ocupam uma área maior do que os ele-
mentos visuais correspondentes (Figura 4). Por esse motivo, são
muito úteis para evitar que colisores mais sofisticados sejam acio-
nados, reduzindo assim a quantidade de cálculos necessários a
cada quadro para um melhor desempenho do jogo. Recomenda-se
que o desenvolvedor utilize o colisor mais simples que apresen-
te o resultado mais aceitável, caso contrário os cálculos podem
comprometer o desempenho do jogo ou a quantidade de elemen-
tos possíveis em uma partida (MAIA et al. 2008).
Figura 4: Um retângulo maior do que o personagem
é usado como o colisor. Colisões indesejadas podem
ser evitadas usando colisores internos.

Fonte: Editado pelos autores a partir de sprite por Alysson da Paz.

3.8. Câmera
A câmera é um elemento fundamental mesmo em jogos
2D, pois é responsável por delimitar uma porção da cena que é
visível para o jogador e também por fornecer parâmetros para a
rolagem da tela (RABIN, 2010). Os controles mais básicos de
uma câmera envolvem o seu deslocamento horizontal e o enqua-
dramento de objetos que é obtido manipulando sua distância até
os objetos enquadrados. Esses controles são conhecidos como
panning e zoom, respectivamente.
Contudo, algumas tecnologias 2D não permitem redimen-
sionar as imagens da cena, de modo que o zoom pode ser simulado
usando faixas negras que bloqueiem parte da tela ou sobrepondo
imagens maiores, produzidas de antemão, representando os obje-
tos enquadrados. Como o foco da atenção do jogo é controlado
pela câmera, esse é um aspecto que não deve ser negligenciado
pelo desenvolvedor, principalmente com respeito à construção de
cenários para que esses possam ser percebido e navegados de for-
ma confortável pelos jogadores.

3.9. Eventos
Eventos são uma espécie de “gatilhos” que disparam as
ações programadas em um jogo quando determinadas condições
ocorrem (RABIN, 2010). Por exemplo, um evento de audição pode
ser disparado quando um personagem pisa em estilhaços de vidro,
de modo que todas as entidades do jogo capazes de “escutar” aquele
som devem ser informadas para que reajam de acordo. Usando essa
metáfora, os elementos do jogo podem optar por “escutar” eventos,
para que tratem cada situação do gameplay. Dependendo da conve-
niência, um mecanismo geral do próprio jogo também pode tratar
os eventos, a exemplo de quando o jogador finaliza uma fase.
Há inúmeros tipos de eventos, tais como o uso de um item, a
morte de um personagem, chegada em um marco do jogo (do Inglês
checkpoint), puxar uma alavanca, diálogos, contagem regressiva de
tempo, etc. Em suma, cada fase de jogo é construída posicionan-
do entidades em um cenário e configurando gatilhos que disparam
eventos que são tratados pelo código do jogo e das entidades.

3.10. Áudio
O áudio é um elemento capaz de produzir um grande en-
volvimento com os jogos, principalmente por ajudar a transmitir
emoções (FRANCO et al. 2016). Recomenda-se que o áudio seja
inserido como na etapa de acabamento do produto, visto que a
repetição contínua dos mesmos sons rapidamente se torna bastan-
te desagradável. Além disso, áudio binaural pode ser usado para
assistir o jogador na localização de entidades, pois a noção de
posicionamento pode ser reforçada pelo som.
Efeitos sofisticados são possíveis, tais como diferença de
tempo e de volume entre os dois ouvidos e o efeito Doppler, que
é a distorção da frequência aparente devido à velocidade relati-
va das fontes sonoras. As APIs modernas permitem especificar
amostras de áudio, além de posicionar fontes sonoras direcioná-
veis e um ouvinte virtual, que geralmente de move junto com a
câmera. Algumas APIs também permitem especificar as caracte-
rísticas acústicas do ambiente, aplicar filtros genéricos sobre os
sons e ainda controlar a velocidade de reprodução dos mesmos.
Há dois tipos principais de sons nos jogos: música de fun-
do (BGM, do Inglês background music) e efeitos sonoros (SFX,
do Inglês sound effects). A experiência de cada fase do jogo é
ambientada pela BGM através de instrumentos, tons, ritmos e os
arranjos reflitam o gameplay. Já para SFX, sons são reproduzidos
em sincronia com eventos do jogo para denotar explosões, im-
pactos, passos, gritos, etc. Melodias podem ser usadas como SFX
para enfatizar a glória das conquistas e a amargura das derrotas.

3.11. Mecânicas
As mecânicas separam os jogos das demais formas de en-
tretenimento (SCHELL, 2014). Apesar de não haver uma defi-
nição consensual para mecânicas, Maranhão et al. (2016) apre-
sentam uma definição abrangente que pode se aplicar aos jogos
eletrônicos: mecânicas são conjuntos de regras que compõem o
funcionamento lógico do jogo, que se tornam perceptíveis quan-
do um conjunto de regras possui uma interação única e significa-
tiva. Seguindo esse raciocínio, é importante que o jogo utilize os
dispositivos de entrada em mecânicas efetivas, que dependam do
jogador, conferindo a sensação de agência ao jogador, ou seja,
que influencie o desenrolar da partida (RABIN, 2010).
4. ELEMENTOS DE JOGOS 3D
Com a introdução de uma terceira dimensão nos jogos,
os elementos de jogos 2D já mencionados também são válidos,
porém novas possibilidades surgem dessa representação. Por
exemplo, é possível sobrepor o conteúdo 3D com elementos 2D
ou mesmo simular elementos 2D com conteúdo 3D mais sofisti-
cado. A vantagem dos jogos 3D é um maior realismo das ima-
gens e mais configurações espaciais que podem ser exploradas
nas fases de um jogo. Além disso, há também efeitos de ilumi-
nação que operam sobre os modelos, conferindo maior riqueza e
dramaticidade às cenas.

4.1. Câmeras 3D
As câmeras que “captam” as cenas 3D são representa-
das por um tronco de pirâmide denominado volume de visão ou
frustum (AKENINE-MOLLER et al. 2008). Apenas as primiti-
vas contidas total ou parcialmente por este volume são exibidas
na imagem final. Assim, como cada jogo apresenta necessidades
diferentes de visualização, o desenvolvedor deve configurar a câ-
mera de modo a obter um equilíbrio entre complexidade da cena
e percepção do jogador.
É importante ressaltar que grande parte do esforço de de-
senvolvimento se destina ao controle de câmera, principalmente
porque os jogos mais modernos tendem a conter sequências mais
complexas e empolgantes (RABIN, 2010). Todavia, um controle
preciso do volume de visão requer conhecimentos de fotografia e
computação gráfica.

4.2. Modelos 3D
Enquanto não se estabelecer uma tecnologia padronizada
para modelos genuinamente tridimensionais e volumétricos, o har-
dware gráfico segue adotando representações aproximativas, ba-
seadas no contorno dos objetos. Assim, o volume complexo dos
objetos é representado como sua “casca”, que para efeitos de pin-
tura, é composta por formas primitivas, geralmente triângulos que
formam uma “malha” (MAIA et al. 2008). Pontos e segmentos de
reta também são primitivas viáveis, apesar de menos comuns.
Os contornos possuem várias restrições de representação.
Por exemplo, a obtenção de efeitos como quebra ou criação de ra-
chaduras requer algoritmos sofisticados para subdividir o modelo,
o que justifica a abordagem clássica de fazê-lo usando técnicas de
modelagem e animação. Apesar disso, os modelos 3D são mais
econômicos em termos de memória e de processamento para pro-
dução de imagens.
Os modelos podem ser divididos em: (a) geometria, que
é a posição de cada um dos vértices que formam as primitivas;
(b) topologia, indicando com as primitivas são formadas a partir
dos vértices; (c) material, que indica de qual material o modelo é
feito, determinando a aparência da malha descrita pelos itens (a) e
(b). A transparência, por exemplo, é uma propriedade do material
aplicado a uma instância do modelo. Além disso, o mapeamento
de texturas confere maior riqueza de detalhes, pois permite que
imagens sejam “coladas” nas primitivas para fornecer cores e ru-
gosidade, por exemplo.
O posicionamento de uma instância do modelo na cena
utiliza três parâmetros básicos: posição, orientação e escala. Vá-
rias combinações de material e posicionamento podem ser usadas
sobre diferentes instâncias de um mesmo modelo para criar uma
sensação de diversidade. Essa técnica continua sendo usada nos
títulos mais recentes.

4.3. Animação de Modelos 3D


As técnicas de animação de sprites continuam válidas em
3D, sendo úteis para animação facial de personagens simplifica-
dos e também para elementos bidimensionais. Além disso, também
é possível produzir transições entre diferentes malhas distintas ou
mesmo entre diferentes quadros-chaves de uma malha com base
nas primitivas e nas posições dos vértices utilizando uma técnica
é conhecida como morphing (AKENINE-MOLLER et al. 2008).
Outras técnicas mais sofisticadas utilizam um esqueleto
simplificado para deformar a malha do modelo, produzindo anima-
ções mais suaves, pois as “juntas” ligando os “ossos” do modelo
são interpolados com mais qualidade, produzindo animações mais
adequadas para os corpos dos personagens enquanto derivações de
morphing geralmente são aplicadas na animação de expressões fa-
ciais e da fala (AKENINE-MOLLER et al. 2008). Esses esqueletos
podem ainda ser manipulados para obter animações via cinemática
direta e inversa, além de possibilitar cálculos de colisão.

4.4. Billboards e Sistemas de Partículas


Billboards são retângulos que funcionam como placas de
aviso, pois sempre estão voltados para o observador (RABIN,
2010). Esse tipo de primitivas é muito útil nos jogos para exibir
textos, menus, instruções e também destacar a trajetória de obje-
tos como naves e espadas. Além disso, billboards são usados para
simular detalhes através de imagens, tais como os ramos e folhas
das árvores.
Sistemas de partículas, por sua vez, são coleções de bill-
boards usados para representar objetos complexos, tais como
água, fumaça e chamas (AKENINE-MOLLER et al. 2008). As
partículas são criadas por objetos especiais, chamados emisso-
res, de modo que vão perdendo sua “vida” à medida que se tor-
nam transparentes e “morrem”, tornando-se inativas. Enquanto
ativas, as partículas estão sob o efeito de atuadores que alteram
sua velocidade, posição, tamanho, orientação, coloração, etc. As
partículas inativas geralmente são reusadas pelos emissores para
aumentar o desempenho.
4.5. Luzes
As luzes são fundamentais em cenas 3D, afinal uma das
principais vantagens desse paradigma é obter tons variados a
partir de um mesmo modelo (AKENINE-MOLLER et al. 2008).
Luzes também podem ser usadas em jogos 2D, apesar de serem
menos comuns e geralmente simplificadas. Eis os tipos de luzes
mais comuns:
Direcional, caracterizada por um vetor direção. Comporta-se
como a luz do sol, pois ilumina o cenário inteiro e não enfraquece
com a distância. Como tal, é geralmente usada em cenários abertos;
Puntiforme (do Inglês point light), definida por um vetor
posição. Emite luz em todas as direções, podendo ser atenuada
com a distância. É útil para criar explosões e também na ilumina-
ção de interiores; e
Holofote (do Inglês spotlight), que é uma variação da luz
puntiforme na qual a luz se propaga em uma direção preferencial,
definindo um cone de luz. A luz pode ser atenuada tanto com a
distância quanto com o ângulo ao eixo central do cone. Bastante
utilizada em iluminação de interiores e também como lanternas
em jogos de exploração.
O desenvolvedor deve ter em mente que há dois tipos de
iluminação agindo sobre seus modelos: a iluminação local, que
dá conta da simples interação entre um ponto na superfície do ob-
jeto e a fonte luminosa, desconsiderando o resto da cena; e ilumi-
nação global, que se valendo de simulações complexas, computa
a iluminação considerando cena a partir da energia emitida pelas
fontes de luz. Efeitos como refração, reflexão, propagação das
cores de um objeto sobre outro e sombras são obtidos através de
técnicas de iluminação global.

4.6. Sombras
As sombras são elementos essenciais para a percepção de
profundidade e do posicionamento dos objetos em um jogo tri-
dimensional. Além disso, podem ser usadas como indicativo da
aproximação de objetos dentro de uma fase, para alertar ou mes-
mo aterrorizar o jogador. É recomendável que os jogos de plata-
forma mantenham uma sombra artificial dos avatares, que con-
temple a distância até o solo quando um personagem pula, para
que o jogador tenha uma noção mais precisa do posicionamento.
Há diversas técnicas para simular sombras em tempo real,
das quais o mapeamento de sombras (do Inglês, shadow ma-
pping) tem se destacado pelo uso nos principais títulos (AKE-
NINE-MOLLER et al. 2008). Essa técnica primeiro produz uma
textura com a silhueta dos modelos tais como são vistos a partir
de uma fonte de luz, de modo que durante a pintura da cena a tex-
tura contendo as sombras é projetada sobre os objetos. Uma téc-
nica semelhante, conhecida como “baking”, mapeia as sombras
sobre os objetos da cena em larga escala. Como estas texturas são
calculadas de antemão, o desempenho gráfico do jogo é melhora-
do significativamente.
5. ELEMENTOS ESPECIALIZADOS
Os elementos de jogos vistos nas seções anteriores são
amplamente utilizados em títulos 2D e 3D. O desenvolvedor deve
observar que os recursos típicos de jogos 3D também estão sendo
usados para títulos 2D, usados como fator criativo para produ-
zir uma experiência única. Trataremos agora de elementos ainda
mais especializados e que não se encaixam em muitos jogos, mas
em mecânicas específicas (RABIN, 2010).

5.1. Inteligência Artificial


Apesar de variar bastante nos jogos (RABIN, 2013) pode-
-se dizer que a Inteligência Artificial é fundamental para agregar
valor aos jogos, pois produzem mundos dotados de personagens
autônomos controlados através de mecanismos do próprio jogo
(NPCs, do Inglês Non-Player Characters). Bons NPCs dão pro-
fundidade ao enredo do jogo à medida que são amados e odiados
pelos jogadores (FRANCO et al. 2016).
As Máquinas de Estados Finitos (FSM, do Inglês Finite
State Machines) são populares para simular diferentes compor-
tamentos dos personagens, que são representados por estados. A
FSM possui um estado inicial, de modo que a transição para ou-
tros estados ocorre desde que determinadas pré-condições sejam
satisfeitas, desde que os estados estejam conectados, ocasionan-
do novos comportamentos. Infelizmente esse modelo geralmente
apresenta resultados limitados e previsíveis, principalmente de-
vido à dificuldade mapear comportamentos complexos em FSM,
de modo que jogos mais modernos utilizam uma abordagem mais
sofisticada e formal, baseada em Planejamento Automático e
aprendizagem de máquina (FRANCO et al. 2016).
Apesar dos avanços nessa área, a tarefa de balancear a
dificuldade da IA nos jogos se mantém desafiadora, pois é preciso
evitar tanto que (a) os NPCs sejam injustos por acesso a informa-
ções privilegiadas e algoritmos “inteligentes demais”, quanto que
(b) os NPCs sejam dotados de “estupidez artificial” que torne o
jogo enfadonho.

5.2. Simulação de Física


Certos gêneros de jogos requerem que os objetos se com-
portem de forma plausível, imitando o comportamento físico dos
objetos do mundo reais, o que reforça no usuário a sensação de
que o mundo do jogo é crível (SCHELL, 2014). Alguns títulos
destacam-se pelo uso de sistema físico próprio, permitindo me-
cânicas novas e convidativas. Um exemplo disso é o inovador
sistema de gravidade usado em Super Mario® Galaxy9.
A física mais comum nos jogos se limita a separar objetos
quando estes se encontram em situação de interpenetração detec-
tadas através de algoritmos de interseção que operam sobre os co-
lisores dos objetos. Alguns objetos visíveis, principalmente ade-
reços da cena, são completamente ignorados para fins físicos. Por
outro lado, diversos objetos invisíveis são usados nesse cálculo,
a exemplo de barreiras delimitando a área de atuação do jogador,
os limites dos cenários e coisas misteriosas que se manifestam em
função dos poderes especiais dos personagens.
9
http://supermariogalaxy.com/
O desenvolvedor deve ter em mente que o colisor utili-
zado em jogos 3D não corresponde exatamente ao modelo que
representa. Cápsulas são muito úteis para simular a movimenta-
ção de avatares em jogos que envolvem a exploração, tais como
os jogos de tiro em primeira pessoa (MAIA et al. 2008). Essa
forma geométrica usa cálculos mais simples do que aqueles en-
volvendo malhas de triângulos, o que, além de apresentar me-
lhor desempenho também resulta em uma movimentação mais
previsível dos personagens, o que reforça a sensação de controle
do jogador.
É importante entender que os objetos de uma cena 3D
possuem seis graus de liberdade, dos quais três correspondem aos
eixos de deslocamento e três aos eixos de rotação. Cada grau de
liberdade confere ao objeto a capacidade de se mover ao longo
de um eixo ou rotacionar em torno de um eixo. Os colisores po-
dem ser conectados usando juntas para restringir alguns graus de
liberdade. A roda de um trem que se desloca no plano XY, por
exemplo, possui apenas um grau de liberdade, é capaz rotacionar
somente em torno do eixo Z. Com isso, a roda se desloca apenas
quando o vagão inteiro se move.
Para efeitos de colisão física, os modelos deformáveis dos
personagens são representados por hierarquias de volumes envol-
tórios ligados por juntas e englobam as primitivas que formam o
personagem. Resultados realistas são obtidos pela escolha ade-
quada de quais graus de liberdade devem ser removidos e quais
são os ângulos que limitam a rotação em cada eixo de rotação.
Simuladores de corrida precisam lidar com aspectos como
tração, desempenho de motores, suspensão e também mudança de
massa à medida que o combustível é consumido. Além disso, tam-
bém é necessário estabilizar os veículos para permitir um mínimo
de controle por parte dos jogadores. Muitos carros nesses jogos po-
deriam capotar facilmente sem tal ajuste. Por fim, o desenvolvedor
deve estar atento a quais recursos de física estão disponíveis nas
ferramentas que adote ou deseje desenvolver, principalmente em se
tratando de tecidos, modelos deformáveis e fluidos.

5.3. Jogo em Rede


Os jogos digitais podem se tornar mais divertidos quando ex-
perimentados por várias pessoas ao mesmo tempo. Assim, tornou-se
mais comuns que as partidas sejam compartilhadas entre diferentes
máquinas, o que geralmente é feito usando servidores externos (MU-
LHOLLAND and HAKALA, 2004). Basicamente, um vislumbre
do estado global da partida é representado para cada cliente através
de uma cópia local do mundo do jogo, que modo que atualizações
são recebidas e enviadas por outros jogadores.
Inúmeros problemas surgem desse compartilhamento, pois
os computadores ainda são incapazes de transmitir mensagens de
forma suficientemente veloz e confiável. São exemplos desses pro-
blemas: latência nas interações devido à troca de mensagens na
rede; situações divergentes sendo exibidas nas cópias dos vários
jogadores; concorrência pelo mesmo item; e rage quits, que são
desconexões voluntárias dos jogadores durante as partidas.
A implementação de jogos em redes requer conhecimen-
tos sobre protocolos de transmissão, aspectos de segurança, ar-
mazenamento de informações em banco de dados e tolerância a
possíveis falhas. O jogo em rede carece, portanto, de algoritmos
robustos que lidem com esses desafios. Por esse motivo, geral-
mente os desenvolvedores licenciam componentes de terceiros
para essa finalidade (LENGYEL, 2016).

6. CONCLUSÕES
Ao longo deste Capítulo, o leitor foi introduzido aos elemen-
tos utilizados tipicamente de jogos 3D e 2D. Esse panorama permite
ao desenvolvedor que construa os componentes adequados aos jogos
que deseja produzir e também identifique, nas ferramentas de desen-
volvimento que adotar, as respectivas classes e interfaces que imple-
mentes os elementos da estrutura genérica de um jogo.
Além de sua descrição, a utilização desses elementos tam-
bém foi discutida, buscando apresentar observações e boas práti-
cas pertinentes ao trabalho do desenvolvedor, tanto sob uma pers-
pectiva da programação quanto da arte na criação dos conteúdos
utilizados e exibidos dentro de um jogo.
REFERÊNCIAS
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FRANCO, A. O. R., MAIA, J. G. R., and GOMES , F. A. C. “A
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Lengyel, A. K. Peters,
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LENGYEL, E. Game Engine Gems 3, A K Peters, 2016.
MAIA, J. G. R., VIDAL, C. A., and NETO, J. B. C. “Efficient
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WOLF, M. J. P. , Before the crash: early video game history,
Wayne State University Press, 2012.
CIBERCULTURA:
ASPECTOS TEÓRICOS
E PRÁTICOS
Cibercultura: Aspectos Teóricos e Práticos
Fernando Lincoln Mattos, Eduardo S. Junqueira

1.INTRODUÇÃO
Este capítulo, intitulado Cibercultura: Aspectos Teóricos e
Práticos, tem o objetivo de introduzir alunos de cursos de gradua-
ção e demais interessados nos fenômenos e vivências experimen-
tadas hoje por todos nós ao nos lançarmos no universo conver-
gente das tecnologias digitais e das redes virtuais. A cibercultura,
segundo Lévy (1999), expressa a maneira de o computador se
distanciar de uma condição meramente instrumental, aproximan-
do-se e alimentando um terreno cultural, onde as trocas comu-
nicacionais acontecem no espaço cibernético. Castells (2003), a
analisa como prática social emergente pelo uso dos computadores
e outros dispositivos ligados à Internet, destacando-se a colabora-
ção e a aprendizagem em rede.
O fenômeno possui caráter interdisciplinar e emergente e
abrange diversos campos temáticos substanciados por teorias e
práticas. Dentre eles, destacam-se na cibercultura, segundo Ama-
ral e Montardo (2011): Linguagem (arquitetura de informação,
hipertexto, links, buscadores, hipermídia e narrativas de jogos di-
gitais), Subjetividade (novas formas ou crítica a novas formas de
subjetivação em função das tecnologias), Apropriação tecnológi-
ca (a reconfiguração de práticas sociais e culturais), Ciberativis-
mo (a potencialização da ação do indivíduo/coletividade em ter-
mos de ação política via Internet), Sociabilidade On-line (práticas
e processos de comunicação em redes virtuais e diversos espaços
web) e Entretenimento Digital (estéticas, formatos, gêneros, ca-
racterísticas e produtos e práticas culturais).
A seguir, alguns desses conceitos serão apresentados ao lei-
tor, sem que haja a pretensão, pelos autores do capítulo, de esgotar
o rico e dinâmico campo conceitual ensejado pela cibercultura.

2. TECNOLOGIAS E SOCIEDADE
O ciberespaço aliado à disseminação em larga escala dos
dispositivos computacionais, ocorrida após a invenção do com-
putador pessoal, marcou o surgimento do fenômeno da cibercul-
tura no século passado. O termo “ciberespaço” foi cunhado por
William Gibson, em seu romance de ficção científica cyberpunk
Neuromancer, lançado em 1984. Originalmente, significa um lu-
gar para onde se vai com a mente, mas não com o corpo, graças
à tecnologia, constituindo um universo abstrato da “informação”.
Ao sair de objetos materiais para objetos mentais, a referência da
discussão muda da objetividade para a atualidade. O espaço do
olhar não seria mais o espaço newtoniano, mas um espaço rela-
tivo. Portanto, o ciberespaço possui características que represen-
tam, sob vários aspectos, possibilidades de formação de lugares
determinados (MATTOS, 2008).
Dessa forma, entende-se o ciberespaço, “como um espa-
ço social constituído simultaneamente pelas redes sociais que es-
tabelecem culturas locais em seu interior e pelas redes técnicas
que possibilitam essas conexões. É um lócus conveniente para
a reflexão sobre a relação entre cultura e tecnologia. Essas re-
des técnicas, por sua vez, são o resultado do desenvolvimento e
configuração de inúmeras diferentes tecnologias, processo que,
naturalmente, é intensamente social em sua própria natureza”
(GUIMARÃES JR, 2010, p. 47).
Isso significa que a emergência da ubiquidade tecnológica
(conceito que será detalhada no tópico 4) que caracterizou parte
do século XX e se estabelece nos primórdios do século XXI não
se resume a um fenômeno racional de caráter modernizador. Pos-
sui extrema complexidade e interfere em nossos modos de ser e
de viver, caracterizando-se como um fenômeno global que possui
desdobramentos nas áreas do comportamento, da economia, da
política, das sociabilidades, da cultura e da comunicação.
Alguns aspectos mais sensíveis desse fenômeno aparecem
na transformação do modo como vivemos, hoje, as noções de
tempo e de espaço em diversas esferas de nossas vidas. Desta-
cam-se também a noção de espaço mágico e o processo de “Des-
pesa Improdutiva” associados ao ciberespaço e os mecanismos de
inteligência coletiva e trabalho imaterial em rede.
Na era da modernidade, o tempo era vivenciado como li-
near (no processo histórico, os fatos progrediam um após o outro)
e o espaço como um lugar das coisas (a distância física entre duas
cidades era tangível). Hoje, vivencia-se o tempo e o espaço de
forma comprimida, ou seja, o tempo aniquila o espaço, pois esta-
mos conectados com todo o planeta em uma fração de segundos.
Vivemos no tempo das conexões [Lemos, 2004]. Além disso, a
capacidade de processamento das máquinas e das redes potencia-
liza nossas capacidades cognitivas, permitindo-nos realizar diver-
sas tarefas, algumas complexas, de maneira simultânea e em um
curto espaço de tempo, ampliando-o para além da tradicional no-
ção do tempo decorrido da sucessão das horas. Essas novas práti-
cas podem ser ilustradas pelas diversas abas do navegador web ou
pelas diversas janelas do sistema operacional do computador em
funcionamento simultâneo. A conexão com essas novas dinâmi-
cas e espaços é vivenciada como uma experiência mágica, pois o
que se faz na pequena tela brilhante pode ser visto em tempo real
por alguém ou por milhares de pessoas do outro lado do planeta.
Os fluxos comunicativos através dos quais habitamos o ciberes-
paço passam a operar de forma cada vez mais significativa entre
pessoas desterritorializadas a partir dessas vivências emergentes.
A despeito de estar associado à racionalidade tecnológica
das máquinas, o ciberespaço congrega significativos aspectos de
não-racionalidade, pois abriga processos de “Despesa Improduti-
va” (conceito desenvolvido por por George Bataille), caracterizan-
do ocorrências de um excedente de energia dos sistemas que não
pode ser utilizado para o seu crescimento, opondo-se ao princípio
clássico de utilidade. “Viajar por vínculos banais e efêmeros do ci-
berespaço, produzir vírus, penetrar sistemas de computador, trocar
informações frívolas em bate-papos e grupos temáticos, etc., refle-
tem essa orgia de signos que preenchem nossa realidade cotidiana”
(LEMOS, 2004, p. 243) e garantem a vitalidade do ciberespaço
para além da lógica tradicional acumulativa e cerceadora.
Lévy cunhou o termo “Inteligência Coletiva” para desig-
nar processos semi-automatizados que ocorrem no ciberespaço
na interação dos humanos com as máquinas em rede para aces-
sar e manipular o excesso informacional que caracteriza a nossa
era. Segundo o autor, trata-se de “uma inteligência distribuída por
toda parte, incessantemente valorizada, coordenada em tempo
real, que resulta em uma mobilização efetiva das competências”
(LÉVY, 1994, p.28) visando o conhecimento e enriquecimento
mútuo das pessoas. Esses processos se configuram, por exemplo,
nas “Comunidades Virtuais” (RHEINGOLD, 1993), onde os fó-
runs virtuais se tornam ambientes para a troca de conhecimentos
e para a aprendizagem, constituindo novos espaços comuns e fo-
mentando novas lógicas de trabalho.
Uma experiência central no âmbito da cibercultura são as
comunidades de desenvolvedores do sistema operacional em códi-
go aberto GNU/Linux. Eric S. Raymond ilustrou esse agrupamento
com a imagem de um bazar grande e efervescente onde diversas
visões e interesses se conectam. Em todo o mundo, profissionais
da área de informática de formação diversa se afiliam a esses es-
paços constituídos no ciberespaço para trocar informações, apren-
der e aprimorar o sistema, estabelecendo novos vínculos sociais
e também de trabalho imaterial, muitas vezes sem a mediação de
encontros presenciais face a face e sem a remuneração financeira
para as ações ali realizadas. Vivenciam, dessa forma, a experiência
de usuários-desenvolvedores do produto intangível. Constituem-
-se, dessa forma, novas formas de habitar o ciberespaço, buscando
estabelecer novas relações e novas vivências que se beneficiam das
tecnologias comunicativas e conectivas, da abundância de informa-
ções disponibilizadas nas redes e das iniciativas dos internautas em
experimentar novos arranjos associativos e produtivos. Alguns as-
pectos dessas experiências transbordam das redes on-line para ou-
tras experiências off-line, permitindo revisitar agregações sociais e
práticas profissionais ditas tradicionais.

3. REDES SOCIAIS VIRTUAIS


Dentre as novas formas de relações estabelecidas no cibe-
respaço, a mais destacada delas são as redes sociais virtuais. Para
entender o significado destas redes, é preciso entender a própria
internet e seu modo de funcionamento. A internet funciona por
meio de “pacotes” de dados, que são enviados de maneira frag-
mentada numa ponta e reagrupados segundo o conteúdo, na outra
ponta. Cada emissor ou destinatário de dados denomina-se “nó”.
Estes nós podem assumir diversas configurações, conforme a ma-
neira como se conectam.
As redes sociais virtuais – a partir daqui chamadas pelo seu
nome mais conhecido, de “redes sociais” – funcionam na mesma
lógica. Cada perfil ou página na rede constrói uma “persona”,
que assim é reconhecida pelos demais. Por serem construções,
as personas não precisam corresponder a pessoas físicas. Podem
ser qualquer coisa, de empresas a “robôs virtuais” diversos. Cada
persona das redes sociais conecta-se a várias personas, formando
uma rede complexa, na qual uma persona encontra-se a poucas
ligações de qualquer outra. As personas constituem espaços de
interação, cada uma com sua identidade narrativa. E assim são
reconhecidas: como representações de atores sociais.
Os sites de redes sociais valem-se desta lógica para pro-
piciar diversas maneiras de conexão e de modelos de negócios
nelas baseados. Mas estes sites de redes sociais não podem ge-
neralizar-se às redes sociais em si: tratam-se de ambientes sub-
metidos às regras gerais do site, tendo várias características das
redes sociais mais ou menos destacadas, conforme o interesse do
modelo de negócios aplicado (RECUERO, 2009).
A partir da lógica de funcionamento das redes digitais em
geral, as redes sociais também apresentam alguns fenômenos
análogos, acompanhados de termos idênticos. Por exemplo, um
elevado número de conexões recíprocas entre os atores, geran-
do grande densidade, denomina-se “cluster”. Um “hub” é um in-
fluenciador nas redes, com grande quantidade de conexões a ele
dirigidas, formando uma rede em formato de Estrela em torno de
si. Um ator distinguido pela qualidade das informações que emite
é denominado de “autoridade” na rede (RECUERO, 2009).
As conexões entre os atores da rede social geram intera-
ções reativas ou mútuas, das quais emergem elementos dinâmicos
de cooperação, competição e conflito. A intensidade destas inte-
rações pode gerar, de um lado, ruptura dos laços sociais (“deixar
de seguir”, “bloquear” etc) ou, ao contrário, de agregação (“se-
guir”, “adicionar aos amigos”, “curtir”, “compartilhar” etc). De
qualquer maneira, as redes sociais estão em constante adaptação
e auto-organização. A tensão dinâmica, observada através do tem-
po, acaba por levar à estabilidade (“caixa-preta”), que gera nova
dinâmica instável, as “controvérsias” (LATOUR, 2000).
Esta dinâmica gera várias formas de associações em rede,
em diferentes estruturas nas conversações. Temos as “multidões
polarizadas”, onde diferentes grupos de usuários discutem tópi-
cos opostos. Sempre consultam fontes de informações diferen-
tes e normalmente não interagem com grupos discordantes. As
“multidões próximas” capturam comunidades próximas, como
conferências, tópicos profissionais e grupos de hobby, onde os
participantes conectam-se para compartilhar informações, ideias
e opiniões específicas uns com os outros. Já os “clusters de no-
vidades” são formados em torno de produtos e celebridades. São
tópicos muito populares, atraindo largas porções de populações
nas redes sociais, gerando interesse em massa, mas baixa conecti-
vidade interna. As “comunidades em clusters” são criadas em tor-
no de eventos do noticiário e tópicos populares. São comunidades
formadas em torno de múltiplas fontes de notícias. Na maioria
das vezes são desconectadas umas das outras, porém muito co-
nectadas internamente. A “rede broadcast” é sempre desencade-
ada por sites de notícias e colunistas (inclusive de blogs), que
possuem grupos de usuários que compartilham seus conteúdos.
Estas redes geralmente são do tipo Estrela, com raios de fora para
dentro, uma vez que existem poucas interações entre os usuários.
Há ainda as “redes de suporte”, criadas em torno de corporações,
empresas governamentais ou organizações da sociedade civil,
destinadas à comunicação com seus usuários/consumidores, para
reclamações e pedidos de esclarecimentos. A empresa responde
a vários usuários desconectados, criando uma rede tipo Estrela,
porém com raios de dentro para fora (SMITH; RAINIER; HI-
MELNOIM; SCHENEIDERMAN, 2014).
Todo este processo complexo de conexões entre atores da
rede social gera um poderoso “capital social”, o conjunto de re-
cursos que é continuamente trocado e modificado a cada intera-
ção. É deste “capital social” que a rede se alimenta, nos processos
adaptação e auto-organização.
Pensando mais amplamente, uma sociologia das associa-
ções constitui uma rede de todas as coisas passíveis de conexão em
rede, uma rede das coisas, uma Internet das Coisas (no inglês, Inter-
net of Things, IoT). Na IoT, tudo está conectado, tudo se relaciona.
As redes sociais passam a constituir esta internet ampliada, comu-
nicando-se também com ela (LEMOS, 2013; LATOUR, 2012). Ao
contrário das redes sociais, a IoT define-se não pelo seu conteúdo,
mas pelos movimentos que realiza. Desta maneira, humanos e não-
-humanos estão em uma mesma posição, não há hierarquia. Tudo
define-se na associação, decorrente das ações tomadas.

4. MOBILIDADE E UBIQUIDADE
A conexão de computadores em rede possibilitou diversos
fenômenos que impactam enormemente na vida humana. O mais
notório deles é o surgimento de culturas do espaço em múltiplas
camadas. Além disso, o tempo assume novas dimensões, novas
compreensões, novas possibilidades de compreensão da existên-
cia, uma existência ubíqua.
Para compreender a ubiquidade computacional, é importan-
te diferenciá-la da computação pervasiva e da computação móvel.
Esta última evidencia-se pela possibilidade de levarem-se serviços
computacionais para qualquer lugar. A computação pervasiva ca-
racteriza-se por computadores embarcados de forma invisível aos
usuários, elaborando modelos computacionais através da troca e
adaptação dinâmica dos dados disponíveis com o ambiente. Assim,
mobilidade e pervasividade são componentes da ubiquidade, que
surge de sua integração. O computador, portanto, torna-se ubíquo,
ou seja, onipresente, na vida das pessoas, influenciando em suas
vidas em qualquer tempo e lugar (SANTAELLA, 2013).
Os conceitos de “espaço”, “lugar” e “tempo”, referidos an-
teriormente, tornam-se então cruciais para a discussão da mobili-
dade e ubiquidade propiciadas pelas tecnologias digitais. Por este
motivo seu significado será discutido em seguida.
O espaço, assim como o lugar, é sobretudo uma constru-
ção. O espaço envolve basicamente dois elementos: o objeto e a
ação. Santos (1997), descreve o espaço como uma relação dinâ-
mica, composta pelos sistemas de objetos e os sistemas de ação.
Os sistemas de objetos constituem o que chama de “fixos”; os
sistemas de ação seriam os “fluxos”. Os fixos são elementos aos
quais se atribui uma característica (como computadores, disposi-
tivos digitais vestíveis, etc); os fluxos consistem nas informações
que circulam com base nos fixos, que lhes servem de referência e
catalisação (como os dados de uma rede).
Fixos e fluxos tornam o espaço um elemento que remete
ao lugar. São eles que, a cada momento, redefinem e recriam as
condições ambientais e sociais de cada lugar. Cada espaço tem,
portanto, a sua lógica, que determina de que forma os objetos
serão destacados e se organizarão.
O lugar é um espaço carregado de significação. Nele, fixos
e fluxos estão impregnados culturalmente de signos e valores de
pessoas e grupos. A cultura é o elemento-chave a ser refletido nos
objetos e ações do espaço (DUARTE, 2002).
O espaço caracteriza-se pela percepção inicial, ou me-
lhor, pelo “impacto polissensorial”, enquanto o lugar se constrói
a partir da consciência desta percepção, na qual objetos e ações
adquirem qualidade, adquirem valor. O espaço transforma-se em
lugar quando qualquer representação imagética, sonora ou verbal
do espaço implicar na seleção e organização peculiar de objetos
e ações. Esta transformação ocorre fundamentalmente através do
uso (FERRARA, 1993).
O lugar distingue-se por estar impregnado de cultura. Não é,
pois, um fenômeno necessariamente material, mas, sobretudo, uma
experiência. Por isto, o lugar caracteriza-se por ser uma parte do
espaço que contém elementos cujos significados e ordenação são
atribuídos conforme a cultura e as expectativas de quem o conside-
ra como seu lugar. É no lugar que fixos (objetos) e fluxos (ações) ao
adquirirem valor, fazem a história de quem os experimenta e lhes
atribuiu este valor. Portanto, se retirados dos seus lugares, produtos
ou populações serão meras abstrações (SANTOS, 1997).
Juntamente com as noções de espaço e lugar, a noção de
tempo é fundamental na reflexão sobre a ubiquidade. O tempo pode
ser compreendido como o tempo externo, o tempo interno e o tem-
po social. O tempo externo é tradicionalmente percebido como o
tempo que independe de nossa vontade. Ele simplesmente “passa”
e nós atuamos em sua lógica. No entanto, esta pode ser apenas uma
percepção subjetiva do ser humano, e é nela que reside o tempo
interno. A subjetividade do tempo interno tem outra lógica, uma
lógica baseada na consciência de cada um. Apesar da relatividade
do tempo interno, há uma percepção coletiva do tempo, o tempo
social. Este conduz fatos e situações diversas, nem sempre em har-
monia com os tempos externo e interno (SANTAELLA, 2013).
A ubiquidade, ou a ocupação de dois lugares ao mesmo
tempo no espaço, torna-se possível no ciberespaço. A cibercultura
gerada no ciberespaço cria e recria percepções, atitudes influindo,
sobretudo, na própria consciência humana.

5. CIBERATIVISMO, LIBERDADE E PRIVACIDADE


Ao longo da história, os movimentos sociais se constituíram
como importantes mobilizadores de mudanças sociais. Impulsiona-
dos por uma crise relacionada à forma como os governantes con-
duzem e assumem os interesses de ordem pública, os cidadãos bus-
cam autonomamente defender as suas demandas. A internet favo-
rece “certos tipos de organização, formas de articular ações e de se
fazer política que não existiam antes” (MACHADO, 2007, p. 277).
Dessa forma, as redes horizontais de comunicação multidirecional
e interativa na internet - principalmente as atuais redes de comuni-
cação sem fio - se tornaram o novo contexto em que os movimentos
sociais do século XXI se constituem (CASTELLS, 2013).
O ciberativismo se manifesta através de diferentes movi-
mentos marcados pela difusão de informações nas redes com o
objetivo, por exemplo, de boicotar o consumo de determinados
produtos e também de realizar ocupações (DI FELICE, 2013).
Esse tipo de ativismo midiático encontrou nas tecnologias de co-
municação uma aliada valiosa para o fortalecimento das organi-
zações de maneira local e global, na coordenação de campanhas
e protestos e na difusão de informações, denúncias e petições. Na
atuação ciberativista “o uso das redes de comunicação da internet
e dos telefones celulares é essencial, mas a forma de conectar-se
em rede é multimodal. Inclui redes sociais on-line e off-line, as-
sim como redes preexistentes e outras formadas durante as ações
do movimento” (CASTELLS, 2013, s/p).
A cultura hacker, própria da cibercultura, caracteriza esses
movimentos sociais do século XXI. Entre as características da
cultura hacker, destacam-se a liberdade de navegar nas redes, a
criatividade e a autoria, permitindo a todos se comunicar (HIMA-
NEN, 2001; CASTELLS, 2013). Os hackers fazem da rede “um
dispositivo de conversação e relações sociais comunitárias, onde
cada um tem sua própria voz sem precisar passar pela intermedia-
ção de instituições e discursos oficiais ou comerciais” (MALINI
e ANTOUN, 2013, p.18). Assim, podem se constituir como su-
jeitos e autores do seu processo de construção de conhecimento,
criando, de forma relativamente autônoma, novas narrativas para
atingir objetivos desejados. Este novo modo de fazer política está
intimamente relacionado às práticas comunicacionais na ciber-
cultura, que proporcionaram mudanças significativas nas relações
sociais através dos renovados processos de comunicação que dei-
xam de funcionar num fluxo unidirecional e passam a se organi-
zar no modo todos-todos (LEMOS, 2004).
A cultura hacker também anima práticas cada vez mais
significativas de cidadãos e organizações que buscam iluminar a
problemática da privacidade e da segurança no ciberespaço, bem
como permitir o livre acesso a bens culturais historicamente sub-
metidos à lógica restritiva da comercialização de produtos (LES-
SIG, 2005). Arquiteturas de rede para a transmissão otimizada
de arquivos, como a Peer-to-Peer (P2P) popularizada pelo então
inovador serviço do Napster, e a melhoria da qualidade da cone-
xão à rede têm democratizado o acesso de cada vez mais pessoas
a conteúdos diversos, dentre eles músicas, vídeos, livros e games.
Conteúdos disponibilizados através de servidores espalhados
pelo planeta (como o Pirate Bay) e que podem ser reconfigura-
dos e compartilhados em rede, permitindo novos e importantes
processos criativos que podem resultar no seu aprimoramento,
ultrapassando as práticas tradicionais de sua simples fruição com
fins de entretenimento pessoal privado ou comercialização.
Os diversos usos do ciberespaço têm implicado também
em experiências onde a questão da privacidade ocupa o centro das
atenções dos cidadãos, reavivando o arquétipo do Big Brother de
George Orwell (sistemas ocultos de vigilância onisciente e onipre-
sente). Em sua face mais sombria, as redes têm se tornando lócus
de espionagem e monitoramento de pessoas e instituições em ní-
vel global, a partir de motivações geopolíticas e também comer-
ciais. O serviço de transporte Uber, por exemplo, desenvolvido no
polo tecnológico da Califórnia, nos EUA, monitora e se utiliza das
informações sobre os hábitos de deslocamento dos usuários para
obter ganhos financeiros para além do simples serviço de trans-
porte de pessoas. Grandes corporações privadas, como o Google
e Facebook, desenvolvem novas modalidades de negócios a partir
do desenvolvimento e de uso de recursos de inteligência artificial
para filtrar, analisar e vender informações de usuários de seus ser-
viços em nível global. A atitude hacker, porém, tem buscado con-
trapor essas iniciativas de apropriação das redes e seus usos expon-
do essas práticas e disseminando procedimentos de criptografia de
conteúdos e expondo informações tidas como confidenciais, mas
que são de notório interesse público, caso das ações do WikiLeaks,
idealizado por Julian Assange, e do analista de sistemas Edward
Snowden, ex-integrante da agência de segurança nacional, setor
responsável pela espionagem nos EUA.
Ações também têm sido desenvolvidas para buscar impedir
manobras dos governos e grupos econômicos que buscam regular
o uso e os fluxos das redes do ciberespaço ensejando inclusive
práticas de censura. No Brasil, a promulgação do Marco Civil da
Internet (Lei n.º 12.965) em 2014 estabeleceu a neutralidade de
rede, o tratamento isonômico de quaisquer pacotes de dados, sem
distinção por conteúdo. Na prática, foi instituído um tratamento
idêntico para todos os conteúdos que trafegam na internet, impe-
dindo a criação de pacotes de serviços como aqueles das TVs por
assinatura. A lei busca impedir a criação de hierarquias e privilé-
gios nos fluxos que se processam na rede e garante a liberdade e a
privacidade dos usuários, princípios que se encontram na gênese
do fenômeno da cibercultura.

6. ENTRETENIMENTO E NOVAS MÍDIAS NA


CIBERCULTURA
Segundo Lemos, “[a] passagem da sociedade do espetácu-
lo para a sociedade de simulação corresponde à passagem gradual
de tecnologias de representação analógicas – os media clássicos,
para os novos media digitais. Se a sociedade do espetáculo ma-
nipulou as representações massivas do real (a televisão, o cine-
ma, o rádio), a cibercultura parece crescer sob a manipulação dos
ícones da sociedade do espetáculo (samplings, colagens digitais,
hacking, apropriações, etc.)” (2004, p. 258).
Os jogos (games) digitais, em particular, adentram a esfera
da cibercultura ao se utilizarem de recursos tecnológicos, narra-
tivos, sonoros e imagéticos para criar simulações, interatividade,
conexões e uma inédita experiência de imersão para o usuário co-
nectado em rede, agora também através dos dispositivos móveis.
Muitos games mantêm os elementos clássicos de regras, desafios
e interação, podendo ter temáticas diversas e um design mais co-
mercial – buscando por vezes se aproximar de estilos dos quadri-
nhos, animes e filmes comerciais – ou apresentam uma proposta
mais artística e autoral, explorando novas estéticas e linguagens.
A maioria dos jogos digitais permite que o jogador possa viven-
ciar um fragmento de espaço e tempo característicos da vida real
em um contexto ficcional e controlado (COLLANTES, 2013). A
atração provocada pelos jogos ocorre diante de algumas situa-
ções típicas, ou seja, quando o jogador está competindo e busca
obter uma vitória, quando está imerso na exploração de um uni-
verso, quando o jogo interfere/desafia a sensorialidade do joga-
dor e quando envolve com diversos jogadores (ZICHERMANN e
CUNNINGHAM, 2011).
Os games on-line abrangem múltiplas plataformas (con-
soles, PCs e dispositivos móveis) e se dividem em vários gêneros
(de estratégia, de simulação e, mais recentemente, os massivos,
que envolvem múltiplos jogadores com localização remota). Os
jogos digitais, que movimentam uma indústria bilionária, não
têm se configurado apenas como uma atividade de lazer, mas sua
presença na cultura influencia comportamentos em várias áreas
(educação, trabalho, indústria, cinema tendo dado origem ao ter-
mo Gamificação). Novas relações têm sido estabelecidas entre os
fabricantes de games e os usuários, seja para tentar coibir a pirata-
ria (desenvolvendo novas tecnologias de vigilância e de bloqueio
de jogadores não autorizados) ou para desenvolver games mais
afinados com interesses do público. Nesse caso, a indústria tem
utilizado estratégias diversas, como a distribuição antecipada de
versões demo para a avaliação por usuários frequentes, monitora-
mento de fóruns de discussão de jogadores para capturar críticas
aos produtos e tendências futuras, etc. Os usuários, por sua vez,
motivados pela cultura hacker, atuam a partir de conhecimentos
fomentados em ativas comunidades virtuais para quebrar arqui-
teturas fechadas de equipamentos e softwares, bem como para
interferir no design e na narrativa originais dos jogos a fim de
aprimorar a experiência de jogabilidade.
Meyrowitz (1985) busca entender o impacto destas no-
vas mídias no comportamento e nas relações sociais das pessoas.
Concordando com McLuhan (1975), Meyrowitz continua a de-
monstrar a validade da ideia de que o meio é a mensagem. Seu
exemplo clássico é a Bíblia, que passou do meio manuscrito para
o meio impresso; o conteúdo era idêntico, mas os meios diversos
provocaram transformações diferentes nas sociedades.
Porém, Meyrowitz vai além de McLuhan, percebendo a
mídia como composta de três elementos: canal, linguagem e am-
biente. Como um canal, a mídia é vista apenas como um instru-
mento que leva mensagens de um ponto a outro. Mas a mídia não
é só um canal, pois, dependendo de cada canal o conteúdo precisa
ser adaptado às suas características. Por isto ela também é uma
linguagem. Isto significa que cada canal, em suas especificidades,
elabora uma gramática própria, cada um no contexto de seu modo
próprio de dizer os conteúdos. Conversar em comunicadores ins-
tantâneos (como o WhatsApp), postar em um blog, um vídeo num
canal do YouTube... A cada canal destes corresponde uma lin-
guagem específica, na maioria das vezes determinado pelas ca-
racterísticas da tecnologia e da maneira como é utilizada. Esta
linguagem própria também cria um ambiente midiático próprio,
pleno de significados singulares, onde ocorre a comunicação.
Uma mensagem SMS enviada por celular é completamente dife-
rente de telefonar para alguém: quando o canal muda a linguagem
também muda, criando um ambiente particular, conforme a mídia
utilizada (MARTINO, 2014).
O avanço das tecnologias digitais impacta também nas
formas de relacionamento social, que tendem a reduzir o contato
físico e assumirem formas fugazes de interação. Turkle (2011),
aponta esta nova perspectiva, identificada como uma dificuldade
das pessoas em lidar com os medos cotidianos e as decorrências
da criação de vínculos próximos. Segundo a autora, busca-se a
proximidade sem intimidade. Ser “próximo”, nas novas mídias,
é ter fácil acesso aos outros; ser “íntimo”, nas novas mídias, é
poder controlar a intensidade dos relacionamentos, conforme as
conveniências objetivas e subjetivas, coisa difícil de fazer no re-
lacionamento direto. Criam-se as condições ideais para uma “ci-
bersolidão”, uma solidão de tipo diferente daquela não-mediada
pela cibercultura, uma solidão conectada.
Os media clássicos, entendidos de forma estrita, já não ca-
bem nestas novas configurações das mídias digitais, disseminadas
de forma crescente. Do ponto de vista do mercado, a convergên-
cia digital colocou empresas de mercados distintos disputando os
mesmos clientes e serviços. A própria internet experimenta modi-
ficações tecnológicas que aprofundam esta mudança. É o caso das
tecnologias OTT (Over The Top, como o Netflix e WhatsApp),
que se valem da infraestrutura física mantida por outras empresas
para criarem modelos de negócio muito lucrativos e impactantes
na cibercultura.
Por outro lado, o código brasileiro de comunicações, de
1962 e ainda em vigor, está totalmente desatualizado. Experimen-
ta-se, aqui, uma transição entre tecnologias e modelos de negó-
cios que se estabelecem rapidamente e outras que representam
outra época, outra cultura de massa. A mudança efetiva ocorrerá
na medida em que o poder econômico tornar-se indiscutivelmente
majoritário às mídias digitais, o que deve acontecer em breve.

CONCLUSÃO
Discutir a Cibercultura é navegar em águas revoltas. Tra-
ta-se de um campo de conhecimento ainda bastante recente, onde
navega-se fortemente determinado pelas tecnologias digitais e pe-
los esforços de apropriação comercial que limitam-se por vezes a
velhos modelos. É fato que as tecnologias digitais impactam pro-
fundamente em nossas vidas, constituindo uma revolução da qual
ainda não sabemos com segurança que rumo futuro se desvelará.
As dimensões e conceitos da Cibercultura aqui delineados não es-
tão separados do mundo físico. “O virtual não se opõe ao real, mas
sim ao atual” (LÉVY, 1996, p. 16). Tudo é real, tudo faz parte de
nossas vidas e representam apenas maneiras de ser diferentes.
A forte presença das tecnologias digitais potencializa e
acelera a revolução, ela mesma uma revolução nas percepções
de tempo, espaço e lugar. É inútil, portanto, apegar-se a esta ou
aquela tecnologia digital, embora algumas atuais tenham sido ci-
tadas. Elas próprias vêm e vão em grande velocidade. Neste mo-
mento, por exemplo, fala-se muito no advento da IoT, do retorno
a formas mais avançadas de Realidade Virtual (RV), de Redes
Semânticas, dentre outros conceitos e tecnologias que impacta-
rão na Cibercultura. Porém isto não é o essencial. O núcleo da
discussão deve analisar sobre que ser humano e que sociedade a
Cibercultura está contribuindo para formar. Não há resposta clara,
embora alguns enfatizem uma discussão do “pós-humano” (LA-
TOUR, 1994; SANTAELLA, 2003), o paradigma do “ciborgue”
(HARAWAY, 2000), onde as transformações tecnológicas e so-
cio-culturais impactarão não apenas o nosso modo de ser, mas o
próprio corpo físico, e o próprio ser.

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GESTÃO
DE NEGÓCIOS
E PROJETOS
MULTIMÍDIA
Gestão de Negócios
e Projetos Multimídia
Edgar Marçal, Henrique Silva

1.INTRODUÇÃO
A gerência ou gestão de projetos é um termo utilizado am-
plamente em diversas áreas, não exclusivamente na administra-
ção. De acordo como dicionário Michaelis, projeto é o plano para
realização de um ato. Assim, se pensarmos de uma forma bem
ampla, todos nós diariamente gerenciamos projetos para realizar
as ações que objetivamos, como por exemplo, deslocar-se ao tra-
balho. Pensando de uma forma mais específica e profissional, um
projeto pode ser visto como um conjunto de partes inter-relacio-
nadas que devem ser executadas dentro de um período específico
para a consecução de um objetivo e dentro de certas restrições,
como financeiras ou técnicas10.
No caso específico da produção de material multimídia,
torna-se necessária a execução de uma série de tarefas específicas
e o envolvimento de profissionais com características variadas e
particulares. As variações de produtos e serviços multimídia am-
pliam a complexidade para se estabelecer um modelo único de
gestão para esse tipo de projeto.

10
Definição adaptada de http://www.businessdictionary.com/definition/project.html.
Entretanto, não se pode pensar considerando os projetos
de forma individualizada. É importante que o gestor compreenda
o negócio da empresa como um todo para ter um entendimento
melhor sobre como os projetos se complementam entre si. Nesse
sentido, destaca-se o papel do consumidor, que é o motivo prin-
cipal da existência da organização e alvo dos produtos e serviços
multimídia que serão criados e disponibilizados pela empresa.
Esse capítulo apresenta uma visão geral sobre a Gestão de
Negócios, a Gestão de Projetos, de uma forma genérica, e a Ges-
tão de Projetos específicos na área multimídia. À medida que os
assuntos são introduzidos, conceitos e exemplos são apresentados
para facilitar a compreensão dos temas abordados.

2.GESTÃO DE NEGÓCIOS
Nesta seção são apresentados os principais conceitos so-
bre gestão de negócios e a importância da disciplina para a for-
mação empreendedora dos profissionais de Sistemas e Mídias
Digitais (SMD). Apesar das especificidades dos trabalhos e ocu-
pações assumidas pelos nossos alunos, consideramos de extrema
relevância a complementação da sua formação com elementos
próprios da Administração de Empresas. Conhecer as melhores
práticas da administração contemporânea permitirá ao egresso do
curso identificar e avaliar oportunidades, escolher o melhor mo-
mento para entrar no mercado, formar e gerenciar equipes, oti-
mizar recursos e ainda, registrar tudo em um Plano de Negócio,
que certamente abrirá novos caminhos para esse profissional, que
procura pelo seu espaço, em um cenário cada vez mais competiti-
vo e profissionalizado.

2.1. Apresentando o Conceito de Administração


Um dos mais tradicionais e renomados autores da Admi-
nistração, Idalberto Chiavenato, define Administração como “o
ato de Planejar, Organizar, Dirigir e Controlar a aplicação das
competências e o uso dos recursos organizacionais para alcançar
determinados objetivos, de maneira eficiente e eficaz.” (CHIA-
VENATO, 2008, p. 12). Se analisarmos esse conceito, cada pala-
vra utilizada poderia desencadear um capítulo a mais nesse livro.
No entanto, para não nos alongarmos, nos concentraremos apenas
nos verbos diretamente vinculados à ação de administrar.
Podemos começar com o Planejar, que define inicialmen-
te o que a empresa deseja alcançar no longo prazo e o que pre-
cisa fazer para atingir seus objetivos. Em uma segunda etapa, o
administrador deve concentrar-se na organização dos recursos
necessários e disponíveis para fazer acontecer aquilo que foi pla-
nejado. Passa-se então a etapa de direção, quando o administrador
deve demonstrar toda a sua competência para ativar e motivar as
pessoas, assegurando a implantação daquilo que foi planejado e
organizado. Por fim, o administrador é também cobrado pelo con-
trole dos resultados, o que o obriga a manter o acompanhamento,
a monitoração e a avaliação do desempenho de cada uma das par-
tes envolvidas no processo.
Só o conhecimento das técnicas e conceitos básicos da admi-
nistração não garante o sucesso de nossos alunos. Pela característica
do curso e o perfil dos profissionais lançados no mercado, outro con-
ceito é de extrema relevância para o curso: Empreendedorismo.
César Simões Salim cita o filósofo Joseph Schumpeter,
que apesar de ter vivido entre os anos de 1883 e 1950 já tinha um
conceito sobre empreendedores, como “Aquele que destrói a or-
dem econômica existente introduzindo novos produtos e serviços,
criando novas formas de organização e explorando novos mate-
riais.” (SALIM, 2010, p.08). Nada que se adeque mais ao perfil
dos nossos egressos, que desde a sua chegada ao curso são esti-
mulados a desenvolver projetos inovadores, que de alguma forma
resultem em novos produtos ou serviços para a comunidade.
Assim como Joseph Schumpeter, filósofo, economista,
nascido em 1883 e um dos pioneiros no ensino do empreendedo-
rismo nos Estados Unidos, mais precisamente em Harvard, au-
tores brasileiros e de outros países, perceberam que o empreen-
dedorismo seria uma alternativa para o cenário que se imaginava
para um futuro não tão distante. Os novos profissionais precisa-
vam desenvolver novos comportamentos, atitudes, hábitos e ha-
bilidades que os tornassem aptos ao que estava por vir. Para Sa-
lim (2010), a compreensão do Empreendedorismo está ligada ao
ambiente em que ele se processa e está diretamente relacionado
com atividades como: Inovação, Comunicação, Informação, Dis-
tribuição, Tecnologia, Globalização e por fim, Novos Conceitos,
como Responsabilidade Social, Time to Market e Ética.
2.2. Identificando o Negócio de Sua Empresa
Nem sempre é fácil identificar uma oportunidade de ne-
gócio dentre os inúmeros estímulos recebidos diariamente. Jogar
vídeo games, assistir filmes e seriados, gostar de música, não sig-
nifica necessariamente que você será um excelente profissional
ou empresário nesses ramos. Mais do que simplesmente gostar
de alguma coisa, o potencial empreendedor deve identificar qual
o negócio da sua empresa e quais as habilidades e competências
precisa desenvolver para alcançar o seu objetivo.
Um negócio é mais do que a entrega de um simples pro-
duto ou serviço, “ um negócio é definido pela vontade de satisfa-
zer o consumidor com seus produtos ou serviços.”. O verdadeiro
negócio da empresa é definido a partir daquilo que o consumi-
dor percebe, pensa, acredita e quer, em determinado momento
(CHIAVENATO, 2008, p. 29).
Para uma clara definição do negócio de sua empresa,
Chiavenato recomenda avaliar para que servem os produtos ou
serviços ofertados por sua empresa, descobrir qual a finalidade
dos produtos ou serviços para o cliente que os adquire, qual o va-
lor agregado ao produto, que realmente importa ao seu cliente, e
por fim, garantir que os benefícios percebidos pelo cliente, sejam
sempre maiores do que os custos envolvidos.
Os Sistemas de Gerenciamento do Relacionamento com o
Cliente, também conhecidos como Sistemas CRM, provenientes
do inglês Customer Relationship Management, ajudam os gestores,
com o apoio da tecnologia da informação, a acompanhar os diversos
processos que resultam da relação entre a empresa e seus clientes.
2.3. Administrando Recursos e Competências
Quando conceituamos Administração, no início desse capí-
tulo, comentamos rapidamente sobre o ato de organizar, ou ainda
sobre a preocupação do administrador na articulação dos recursos
e competências necessários para implementação daquilo que foi
planejado. Agora, temos a oportunidade de falarmos um pouco
mais sobre esse tema. Administrar recursos e competências é uma
atribuição do administrador que impactará diretamente na qualida-
de do produto ou serviço ofertado, na satisfação do cliente e conse-
quentemente na construção de uma empresa de excelência.
Normalmente, empresas bem estruturadas contam com
uma área exclusiva para administrar e gerir os recursos necessá-
rios à produção e operação. O estudo da Administração da Produ-
ção e Operações permite aperfeiçoar a utilização dos recursos fí-
sicos, materiais e tecnológicos, para que todos os ativos tangíveis
possam ser integrados em uma atividade conjunta e coordenados
para produzir bens e serviços (CHIAVENATO, 2008, p. 72).
A definição dos fornecedores, especificações técnicas e
quantidade de recursos adquiridos deve manter equilíbrio com os re-
cursos financeiros da empresa. Dentre os recursos organizacionais
mais comuns podemos listar os equipamentos, ferramentas, móveis,
utensílios, matéria prima, embalagens, mercadores e serviços.
Apesar da possibilidade de duas empresas adotarem os mes-
mos recursos materiais, Chiavenato defende que cada organização
é uma entidade. Cada organização tem a sua individualidade garan-
tida. Não existem duas organizações iguais. A afirmação se funda-
menta não só pelas características da organização, mas também pela
personalidade, cultura e valores praticados por cada organização.
As pessoas que fazem a empresa tem papel fundamental
na construção dessa individualidade organizacional. Por muitos
anos, as empresas entenderam que as pessoas que ali trabalha-
vam eram simplesmente mais um dos recursos da organização.
No entanto, a cada desligamento, as empresas começaram a per-
ceberam que também perdiam parte do conhecimento acumulado.
Com isso o conceito de Recursos Humanos foi gradativamente
sendo substituído por Competências. Os recursos passaram a ser
visto como a retaguarda, a base, ou ainda, a plataforma sobre a
qual atuam as competências.
Para Chiavenato, a excelência na administração começa
com as pessoas. Portanto, o gestor deve indiscutivelmente cercar-
-se de pessoas competentes, utilizando-se de processos de seleção
bem planejados, desenvolvendo políticas para a retenção das pes-
soas certas, de modo a aproveitar adequadamente as competên-
cias e habilidades de cada pessoa. O Administrador deve ainda
pensar em treinamento contínuo e recompensas proporcionais aos
resultados alcançados.

2.4. Como Elaborar um Plano de Negócios


Após a explanação sobre os principais conceitos de ges-
tão, nossos alunos são orientados a desenvolver um plano de ne-
gócio, de forma a exercitar o conhecimento adquirido na primeira
parte da disciplina. Para auxiliar nessa tarefa, utilizamos como
bibliografia o Manual Como Elaborar um Plano de Negócios, de-
senvolvido pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas
Empresas – SEBRAE (ROSA, 2007), e o livro do Marcos Hashi-
moto e Cândido Borges, Empreendedorismo – Plano de negócios
em 40 lições (HASHIMOTO, 2013).
O manual do SEBRAE, Rosa (2007) e o livro de Hashi-
moto (2013), começam com a conceituação do Plano de Negócio
e justificando porque os empreendedores devem dedicar seu tem-
po escrevendo um, pois,

Um plano de negócio é um documento que descreve


por escrito os objetivos de um negócio e quais pas-
sos devem ser dados para que esses objetivos sejam
alcançados, diminuindo os riscos e as incertezas.
Um plano de negócio permite identificar e restringir
seus erros no papel, ao invés de cometê-los no mer-
cado. (Rosa, 2007, p. 08)

Após a conceituação do Plano de Negócio, os autores se-


guem apresentando a estrutura a ser adotada e o conteúdo a ser
inserido no plano de negócio. A Tabela 1 foi construída a partir
da combinação das recomendações dos dois livros de referência.
Apesar de pequenas variações de agrupamento e forma-
tação das informações apresentadas nos dois livros, é possível
identificar que as estruturas propostas apresentam muitos pontos
de interseção e em alguns casos chegam a ser complementares.
Tabela 1. Estrutura Mínima para a Construção de um Plano de Negócio.
Estrutura do Detalhamento
Plano de Ne-
gócio
Sumário Exe- Pontos principais do plano, empreendedores, experiência profissional e
cutivo atribuições, estratégia, diferencial, produto, investimento e retorno, fonte de
recursos.
Descrição da Descrição do negócio, setor de atividade, forma jurídica, enquadramento
empresa tributário, estratégia de entrada e de crescimento, modelo de negócio,
parcerias, objetivos, visão, missão
Produto Descrição do produto ou serviço, preço, funcionalidades, aplicabilidade,
características físicas, estágio de desenvolvimento, certificações e proteções
Marketing Análise do setor e do mercado (clientes, fornecedores, concorrentes),
estratégia de comunicação e distribuição, a identidade, o posicionamento, a
proposta de valor e os fatores ambientais, localização do negócio.
Organização Estrutura organizacional, estrutura legal, impostos, tributos, organograma,
equipe de gestão, conselho consultivo, políticas de contratação, remuneração
e retenção
Operacional Etapas dos processos de implantação, estudo de capacidade, fluxos
operacionais, gestão de estoque, sistemas de qualidade, pós-venda e
infraestrutura, layout ou arranjo físico, necessidade de pessoal
Financeiro Pressupostos financeiros, modelos de custeio, análise de fluxo de caixa,
demonstrativo de resultados, projeções de balanço, análise do ponto de
equilíbrio e os indicadores.
Investimento Necessidade de capital, origem dos recursos, composição acionária,
estratégia de saída, payback, taxa interna de retorno, prazo de retorno do
investimento, ponto de equilíbrio, lucratividade, rentabilidade, o valor
presente líquido e a análise do investimento.
Construção de Simulação de valores e situações diversas para a empresa.
Cenários
Avaliação Análise da Matriz F.O.F.A (Pontos Fortes, Oportunidades, Pontos Fracos e
Estratégica Ameaças)

Fonte: Construída a partir da compilação de ideias de Rosa (2007) e Hashimoto (2013)


3. GESTÃO DE PROJETOS
A definição de projeto apresentada por Maximiano (2009),
baseia-se em um empreendimento temporário, ou ainda uma se-
quência de atividades com começo, meio e fim bem definidos,
que tem por objetivo a produção de um bem ou serviço singular,
dentro de prazos e orçamentos previamente estabelecidos. Entre-
gar esse produto ou serviço, cumprindo as especificações, prazos
e custos estimados, exige dos gestores uma constante busca pela
ferramenta ou metodologia de gestão que mais se adeque às ca-
racterísticas e complexidades do projeto.
A constante evolução tecnológica, a demanda pela inova-
ção de processos e o surgimento de cada vez mais produtos e ser-
viços personalizados exigiu dos gestores uma modernização dos
seus modelos de gestão. Percebendo a dificuldade dos gestores e a
carência de práticas administrativas voltadas à gestão de projetos,
o Project Management Institute – PMI11 deu início ao movimento
de pesquisa e registro das melhores práticas adotadas na gestão de
projeto. Esse trabalho, iniciado na década de 60, culminou com
a apresentação do Guia dos Conhecimentos sobre Administração
de Projeto, mais conhecido como PMBOK, sigla resultante de
Project Management Body of Knowledge12.
Em sua quinta edição, lançada em 2013, o Guia PMBOK é
o resultado da colaboração e do conhecimento de gestores de pro-
jetos e apresenta os fundamentos da atividade de gerenciamento de
projetos. Mantendo o formato das edições anteriores a nova edição
do Guia apresenta 47 processos que devem ser observados pelos
11
Project Management Institute - http://www.pmi.org/
12
PMBOK® Guide and Standards - http://www.ppmi.org/pmbok-guide-standards
gestores de projetos, desde a etapa de iniciação até o encerramento
do mesmo. As recomendações estão agrupadas de acordo com as
características e necessidades de cada uma das etapas percebidas na
execução de um projeto: Iniciação, Planejamento, Execução, Mo-
nitoramento e Controle, e por último, Encerramento.
Apesar das constantes atualizações, as recomendações do
Guia PMBOK não conseguem agradar ou atender às necessidades
de todos os gestores, principalmente daqueles que trabalham com
projetos que resultam em produtos mais inovadores, marcados
principalmente pelo alto nível de incerteza e complexidade.
Para esses gestores, existe a possibilidade da metodologia de
Gerenciamento Ágil de Projetos, discutido inicialmente pela comuni-
dade internacional de desenvolvimento de sistemas de informações,
que buscava uma metodologia baseada na agilidade, flexibilidade,
nas habilidades de comunicação e na capacidade de oferecer novos
produtos e serviços de valor ao mercado em curtos períodos. O mo-
vimento resultou na publicação do Manifesto para Desenvolvimento
Ágil de Software, que apresentou novas recomendações como uma
alternativa às recomendações do Guia PMBOK. Mais do que uma
simples alternativa aos modelos tradicionais, o Gerenciamento Ágil
foi defendido pelos seus autores, como um conjunto de métodos e
práticas que deveriam se somar ao corpo de conhecimento tradicio-
nal de gerenciamento de projetos. (AMARAL, 2011)
4. GESTÃO DE PROJETOS MULTIMÍDIA
Esta seção apresenta as características dos projetos mul-
timídia, conceitos importantes relacionados, os perfis dos profis-
sionais que trabalham nesse tipo de projeto e dois modelos de
execução de projetos multimídia. Antes de apresentar as carac-
terísticas dos projetos multimídia, é importante introduzir alguns
conceitos básicos relacionados.
Multimídia é a integração transparente de textos, sons e
imagens através de um software de controle, formando um ele-
mento digital único (ENGLAND; FINNEY, 2002). Destaca-se
que essa definição está relacionada a conteúdos digitais, que po-
dem ser interativos ou não. Desta forma, sites Web, filmes Blu-
-Ray e vídeos do You Tube são exemplos de materiais multimídia.
Por outro lado, as mídias físicas (como um pendrive ou um disco
Blu-Ray) onde ficam armazenados os conteúdos não são.
Os componentes digitais essenciais que quando combina-
dos formam materiais multimídia são: textos, imagens e sons. A
partir deles, são originadas outras mídias digitais, como as ani-
mações e os vídeos. Independentemente dos elementos utiliza-
dos, a multimídia tem sido utilizado para enriquecer conteúdos
em diferentes áreas, citando-se como exemplos: os cursos online
interativos (ensino) e os videogames (entretenimento).
4.1. Características dos Projetos Multimídia
Os projetos multimídia envolvem o desenvolvimento de
produtos e serviços que utilizam as mídias digitais (e.g. textos, ima-
gens, sons, vídeos, animações) de forma combinada. Eles são com-
postos a partir da combinação de mídias digitais variadas e podem
ser aplicados para fins distintos, implicando em diferentes clientes.
Desta forma, dois projetos multimídia podem apresentar inúmeras
diferenças em termos de equipe e processo de desenvolvimento.
England e Finney (2002) agrupam os projetos multimídia
em seis categorias:

i. Marketing, como as propagandas e as campanhas pu-


blicitárias via mídias digitais, que mostram produtos
ou serviços aos consumidores finais;
ii. Sites Web, que consistem em informações estruturadas
disponíveis na Internet, são acessíveis através de brow-
sers web e disponibilizam conteúdos e serviços;
iii. Vídeos Digitais, que se tratam de produções audiovi-
suais normalmente não interativas, apesar de existi-
rem exemplos que possibilitam a interação do usuário,
como em Hughes et al. (2014);
iv. Softwares, como jogos digitais e sistemas multimídia,
que compreendem os programas de computador que
fazem uso das mídias digitais para fornecer recursos
melhorados e proporcionar benefícios aos usuários;
v. Edição Eletrônica, como revistas e jornais na internet,
que envolvem a produção e disponibilização de con-
teúdos específicos por área, seguindo determinadas re-
gras como controle de edição e de volume/número.
vi. Educação Interativa, como treinamentos e cursos com re-
cursos digitais, que abrangem os projetos voltados para
proporcionar formações educacionais, podendo inclusive
utilizar produtos e serviços de projetos multimídias de ou-
tras categorias, como vídeos digitais ou sites Web.

4.2. Os Profissionais envolvidos em Projetos Multimídia


Os projetos classificados em cada uma das categorias ci-
tadas apresentam similaridades em termos de objetivos, perfis de
clientes e recursos utilizados. Da mesma forma, as equipes que
os executam podem ser compostas por perfis técnicos com ati-
vidades semelhantes, que irão variar de acordo com a categoria
do projeto. Utilizando-se a classificação apresentada na seção an-
terior, a Tabela 2 apresenta os profissionais que são necessários
para executar os diferentes tipos de projetos multimídia.
É importante destacar que a Tabela 2 não contém todos
os possíveis profissionais que podem participar de projetos
multimídia. Dependendo de fatores como a política da empresa
ou a metodologia de execução do projeto, outros membros podem
ser adicionados à equipe ou o nome da função pode ser diferente.
Por exemplo, Vijayasarathy e Butler (2015) apresentam um estu-
do sobre a composição de equipes de projetos de software e citam
profissionais não previstos na Tabela 1, como gerente de qualida-
de e testador de software. Da mesma forma, os editores de som e
de vídeo não estão nessa tabela e são necessários para projetos de
vídeos digitais, conforme Tsolakidis e Tsattalios (2014).
Entretanto, a Tabela 2 pode ser vista como instrumento
relevante para fornecer uma visão geral dos profissionais envol-
vidos em projetos multimídia. Pode-se observar que uma caracte-
rística presente em todas as equipes é a multidisciplinaridade dos
membros de um mesmo tipo de projeto. Ao se considerar as dife-
rentes categorias, a variação existente entre os profissionais que
podem trabalhar nesses projetos fica mais evidente. Além disso,
alguns perfis se destacam como funções necessárias presentes em
mais de uma categoria. Por exemplo, o artista gráfico, que cuida
da parte visual e ilustrativa, está presente em todos os tipos de
projetos. Vale lembrar também que existem projetos que com-
binam características de tipos diferentes e, portanto, envolvem
profissionais das modalidades combinadas, como cursos online
que contém videoaulas.
Tabela 2. Principais profissionais envolvidos
em projetos multimídia.
Marketing Site Web Vídeo Digital
Gerente Web Produtor Executivo
Arquiteto de Informação Produtor
Diretor de Criação
Arquiteto Técnico Diretor
Designer Senior
Editor Web Cinegrafista
Artista gráfico
Programador Web Assistente de produção
Designer Web Roteirista
Artista Gráfico Artista gráfico
Softwares/Jogos Di-
Editora Eletrônica Educação Interativa
gitais
Gerente de Projeto Editor de Comissionamento Analista de Treinamento
Analista Editor Senior Designer Instrucional
Programador Editor Designer de Interação
Artista gráfico Autor Artista Gráfico
Artista Gráfico

Fonte: England e Finney (2002).

4.3. Ciclo de Vida de Projetos Multimídia Centrado no


Cliente
Apesar de poderem ser agrupados de forma diferente, os
tipos de projetos multimídia apresentam características similares
e isso possibilita a utilização de um processo único para sua exe-
cução. England e Finney (2002) propõem um modelo de ciclo de
vida de projetos multimídia centrado no cliente (Figura 1), o qual
é dividido em oito níveis que vão desde a assinatura de contratos
(no Nível 1 - Administrativo) até as conclusões Externa e Interna
(Nível 7 e Nível 8).
Primeiramente, deve-se destacar que um projeto só ini-
cia após a assinatura do contrato pelo cliente. Antes disse, a
proposta deve ser preparada, a partir de um esboço do projeto.
Todo o esforço realizado antes da assinatura do contrato pode
ser perdido caso o cliente não aceite a proposta. Por isso, é im-
portante dosar a dedicação nessa etapa com a disponibilidade de
tempo e pessoal, para que todo esse trabalho não seja em vão.

Figura 1. Ciclo de vida de projetos multimídia centrado no cliente.


Fonte: England e Finney (2002)
Existem diferentes formas e elementos que compõem uma
proposta, mas os seguintes são essenciais: objetivos e metas, que
descrevem o que o projeto deverá realizar e entregar; plano de
trabalho e cronograma, que mostram as etapas que serão seguidas
para que os objetivos e metas sejam alcançados; e os valores e
custos, que demonstram quanto custará para se desenvolver aque-
le projeto. Além desses requisitos básicos que uma proposta deve
conter, é indispensável que ela demonstre ao cliente os benefícios
que ele obterá com aquele projeto.
Com a aceitação da proposta e após a assinatura do con-
trato, o projeto tem seu início formalizado. Essa fase da assina-
tura pode levar algum tempo, que dependerá do tipo de contrato.
Alguns fatores que devem ser levados em consideração na assi-
natura do contrato são: as obrigações de cada uma das partes, os
direitos autorais e os prazos das entregas.
Depois do contrato assinado, o projeto deve ser especifi-
cado detalhadamente. Nesse momento, deve haver uma interação
grande entre membros da equipe que está executando o Projeto e
os stakeholders13 (como usuários finais, gerentes e especialistas). É
importante que todos os detalhes sejam pormenorizados para que
nenhum requisito previsto no contrato seja deixado de fora. Além
dos aspectos relativos aos objetivos e metas, nessa fase devem ser
identificados os aspectos técnicos como as ferramentas, técnicas
e os recursos que serão utilizados ao longo do projeto.

13
Stakeholders são as pessoas (ou grupo de pessoas) que afetam ou serão afetadas pelo sistema
(DENNIS; WIXOM; TEGARDEN, 2015).
Sob o aspecto administrativo, o modelo centrado no clien-
te prevê dois níveis. O primeiro (Nível 3) aborda as questões re-
lativas ao pessoal que irá participar do projeto. Conforme men-
cionado anteriormente na seção sobre o PMBoK, a gestão dos
recursos humanos envolvidos na execução de um projeto é fun-
damental para o sucesso do mesmo. Também relativo ao aspecto
administrativo, o Nível 5, Suporte, corresponde a uma fase que
ocorre em paralelo as outras e tem como objetivo principal apoiá-
-las, principalmente a fase de produção.
O Nível 4, Produção, corresponde à fase onde são realiza-
das as atividades do projeto que geram seus resultados principais.
Por exemplo, em projeto de vídeo aulas, nessa fase ocorrem as
atividades de gravação e edição, que produzirão o vídeo digital
em condições de ser avaliado pelo cliente. Porém, antes disso, são
necessários testes do produto/serviço elaborado (Nível 6 – Tes-
tes). Inclusive, essa fase de verificação deve prever a participação
do cliente para obter a sua aprovação.
Por fim, o ciclo de vida centrado no cliente prevê a conclu-
são do projeto subdividida em dois níveis. O primeiro é a Conclu-
são Externa (Nível 7), que consiste na entrega do produto final e
aceitação pelo cliente. O segundo nível corresponde à conclusão
realizada internamente na empresa executora do projeto, que in-
clui atividades como registro das experiências obtidas, avaliação
das ações realizadas e análise dos ganhos e prejuízos com o pro-
jeto, tangíveis ou não.
É importante destacar que o Ciclo de Vida Centrado
no Cliente é uma abordagem genérica que pode ser usada para
gerenciar a execução de diferentes tipos de projetos multimídia,
e, inclusive, de outros não multimídia. Entretanto, vale ressaltar
que existem outros modelos de gestão que podem ser adotados.
Por exemplo, em Finn e England (2002), são listados os ciclos de
vida específicos para cada uma das categorias de projetos mul-
timídia citadas na Tabela 2 Citando Finn e England, projetos de
vídeos digitais podem ser executados seguindo essas fases: Acor-
do administrativo e financeiro; Elaboração do roteiro do vídeo;
Gravação das imagens e áudios que irão compor o vídeo final;
Edição e montagem da obra final; Distribuição e disponibilização
do vídeo produzido.
Marçal et al. (2010) apresentam um modelo para constru-
ção de aplicativos educativos multimídia composto pelas seguin-
tes fases: definição do sistema operacional no qual o aplicativo
será executado; estabelecimento da forma como o conteúdo será
disponibilizado (online ou offline); escolha da metodologia peda-
gógica a ser utilizada (e.g. construtivista, behaviorista) ; elabo-
ração do roteiro dos conteúdos e tarefas; criação dos elementos
multimídia (imagens, vídeos e áudios); desenvolvimento do apli-
cativo; validação e disponibilização para os usuários.
Além desses processos alternativos para execução de pro-
jetos multimídia, deve-se considerar que documentos distintos
são necessários para auxiliar o gestor de projeto, de acordo com o
tipo de produto ou serviço que está sendo desenvolvido. Em pro-
jetos de jogos digitais, por exemplo, é fundamental a elaboração
do Game Design Document (GDD), um documento que descreve
detalhadamente os elementos que irão compor o jogo.

4.4. O Design Thinking em Projetos Multimídia


De acordo com Ambrose e Harris (2009), o design é um
processo iterativo que parte do briefing14 com o cliente e segue até
a conclusão do trabalho. Assim, o design não se trata de uma coi-
sa ou algo que se possa tocar, e sim um método para se obter uma
solução finalizada. Os projetos multimídias podem ser executa-
dos utilizando-se a filosofia do design como um processo, que
compreende os seguintes estágios: Definir, Pesquisar, Idealizar,
Prototipar, Selecionar, Implementar e Aprender.
Pensando dessa forma, qual seria a diferença do processo
de design para outros modelos de execução projetos? O principal
diferencial está no engajamento de um alto grau de criatividade
que é aplicado em todas as fases do processo. Isso caracteriza o
termo conhecido como Design Thinking, que consiste no pensa-
mento de se buscar soluções criativas durante todo o design do
projeto. A Figura 2 representa as fases do processo de design e a
aplicação do design thinking em todas elas.

14
Briefing pode ser definido como um documento que contém um conjunto de informações que
serão utilizadas para o desenvolvimento de um trabalho solicitado pelo cliente.
O processo de design do projeto começa com a fase De-
finir, onde as necessidades do público alvo e o problema são es-
tabelecidos. Uma compreensão precisa sobre o que se está de-
senvolvendo, suas características e restrições é essencial para a
produção de melhores soluções. Este estágio determina o que é
necessário para o sucesso do projeto.
Posteriormente, passa-se para a fase de pesquisa, que tem
como principal objetivo coletar informações, a partir do esco-
po definido no passo anterior, para auxiliar a geração de ideias
e soluções para o projeto. Isso inclui o perfil dos consumidores,
pesquisas quantitativas e qualitativas, interesses do publico alvo
e experiências com projetos anteriores similares. Recomenda-se
uma dedicação de tempo suficiente para que se possa realizar uma
pesquisa completa sobre todas as especificações definidas na eta-
pa anterior. As qualidades da pesquisa e do conhecimento obtido
com ela facilitarão a geração de soluções de design viáveis.
Figura 2. Visão geral das fases do processo de
Design baseado no Design Thinking.

Fonte: Os próprios autores.

Na fase seguinte, Idealizar, a equipe do projeto gera ideias


de soluções potenciais para o projeto, levando em consideração as
especificações definidas e as informações obtidas com a pesquisa.
Os métodos para geração das ideias envolvem diferentes níveis
de criatividade e a escolha do método adequado depende de fa-
tores como tempo e dinheiro disponível no projeto e o grau de
originalidade que a solução precisa apresentar. Alguns exemplos
de métodos são: brainstorming, mapa mental, esboços das ideias
e adaptação de uma solução similar testada e aprovada. À medida
que essa fase de avança, tornar-se-á mais evidente se ocorreram
erros ou deficiências nas especificações definidas anteriormente.
Após a geração de potenciais soluções e antes da escolha
de qual será adotada no projeto, torna-se necessário aprimorar as
soluções propostas através da elaboração de protótipos. Isso per-
mitirá que aspectos particulares sejam identificados e fornecerá
uma base de comparação melhor entre as alternativas possíveis.
A fase de prototipação permite a realização de verificações nas
ideias geradas no estágio anterior, de aspectos como a viabilidade
técnica e a interface visual, que em alguns casos pode ser feita
através de prototipação em três dimensões (3D).
A fase de seleção é o momento no qual uma das soluções
proposta é escolhida para o desenvolvimento do projeto. A pro-
posta selecionada deve ser aquela que mais se aproxima das es-
pecificações definidas do projeto, levando em consideração todo
o conhecimento adquirido com as fases anteriores. Outros pontos
importantes que devem ser considerados para escolha da solução
são os prazos e custos disponíveis no projeto. No fim dessa fase,
o cliente deve assinar concordando com a escolha.
Após a aprovação do cliente, o processo avança para a fase
de implementação, quando a equipe desenvolve a arte ou produto
final do projeto. Além da produção, esta fase inclui a entrega ao
cliente do que ele solicitou, conforme definido no início do projeto.
A implementação tem como objetivo final garantir a satisfação do
cliente, através da execução de todos os detalhes acertados com ele.
Assim, essa fase é vista como o momento que se coloca em prática
tudo que foi especificado e projetado anteriormente.
Depois do desenvolvimento e entrega da solução, parte-se
para última fase do projeto, Aprender, que envolve o aprendizado
adquirido ao longo do projeto. É nesse estágio que o cliente e o
fornecedor devem identificar e registrar as ações que funciona-
ram bem e as lacunas encontradas. O feedback gerado nessa fase
torna-se um importante referencial para projetos futuros seme-
lhantes. Embora a fase Aprender apareça como último estágio, ela
envolve ações que ocorrem ao longo de todo o projeto.
Projetos multimídia podem ser executados utilizando-se
o processo de design com a abordagem design thinking. Seme-
lhantemente ao ciclo de vida centrado no cliente, trata-se de outra
metodologia aplicável tanto em projetos multimídia quanto em
outros tipos de projetos. Além disso, é importante destacar que
esses dois modelos de processos apresentam fases equivalentes,
por exemplo: Especificação Detalhada e Definir; Produção e Im-
plementar; e, Conclusão Interna e Aprender. Mesmo com seme-
lhanças, essas abordagens apresentam alguns pontos distintos e
caberá ao gerente definir o modelo de processo mais adequado às
necessidades do projeto.
5. CONCLUSÃO
Este capítulo apresentou conceitos importantes quando
relacionados à administração de negócios e gestão de projetos na
área de sistemas e mídias digitais. Destacando-se o aspecto do
empreendedorismo, tanto na visão do gerenciamento da empresa
inovadora quanto na condução de projetos multimídia.
Do ponto de vista do negócio, foi apontado que o gestor
deve definir qual o escopo de atuação da sua empresa e quais as
habilidades e competências ele precisa desenvolver para alcançar
o seu objetivo. Além disso, é fundamental que o empreendedor
consiga articular e gerir os recursos necessários ao funcionamen-
to da empresa e cercar-se de pessoas competentes, de modo a
aproveitar adequadamente as competências e habilidades de cada
colaborador. Considerando-se os instrumentos que podem ser
utilizados para apoiar a administração do empreendimento, apre-
sentamos o Plano de Negócios, que descreve os detalhes de um
negócio e quais passos devem ser seguidos para que os objetivos
sejam alcançados.
De maneira mais específica, apresentamos as característi-
cas dos projetos multimídia, conceitos importantes relacionados
à gestão desses projetos, perfis de profissionais que atuam nessa
área e modelos de processos de execução de projetos multimídia.
A partir do que foi exposto na terceira seção, pudemos observar
que a gestão de projetos multimídia apresenta muitas similarida-
des com a gerência de outros tipos de projetos. Pôde-se observar
que as principais diferenças estão nas particularidades dos proje-
tos multimídia, que demandam equipes multidisciplinares e en-
volvem aspectos artísticos e alto grau de criatividade e inovação.
Conforme mencionado ao longo desse capítulo, a gestão
de negócios e projetos multimídia é um assunto muito amplo e
compreende diversos conteúdos e definições, que poderiam por si
só comporem um livro exclusivo. Assim, pretendemos com esse
capítulo introduzir o tema, estimular nos leitores o interesse pela
área e motivá-los a continuar estudando o assunto.

REFERÊNCIAS
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jetos: aplicação em produtos inovadores. São Paulo: Saraiva, 2011.
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São Paulo, SP: Saraiva, 2008. 272 p. ISBN 9788502067820.
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VIJAYASARATHY, Leo; BUTLER, Charles. Choice of software
development methodologies-do project, team and organizational
characteristics matter? IEEE Software, no. 1, pp. 1, 2015.
O DESENHO: ENSINO,
APRENDIZADO E
SUA RELEVÂNCIA NA
UNIVERSIDADE
O desenho: Ensino, Aprendizado e sua
Relevância na Universidade
Liandro Roger Memória Machado, Natal Anacleto Chicca Jr.

1.INTRODUÇÃO
O desenho tem uma grande contribuição, muitas vezes não
reconhecida, ao sistema educacional. É fato que, quando aprende-
mos a ler e a escrever, por exemplo, não temos como objetivo nos
tornarmos leitores ou escritores profissionais, poetas ou roman-
cistas, e sim assimilarmos um código para nos comunicarmos por
meio dele. Da mesma forma, aprender a desenhar deveria ter como
objetivo não apenas a expressão artística, mas uma maior consciên-
cia e melhor domínio sobre o uso das formas e o funcionamento da
linguagem visual, na qual deveríamos todos ser melhor instruídos,
tamanha a sua relevância em nosso cotidiano midiático. Além de
ser uma manifestação de arte, o desenho é também o meio ideal
para o planejamento, o registro e a organização de pensamentos e
percepções visuais. Seu estudo e experimentação se fazem funda-
mentais em todos os meios acadêmicos e profissionais, sobretudo
aqueles que envolvem a criação e a produção de mensagens em
forma de imagens ou produtos, uma vez que o desenho é a base de
qualquer trabalho de natureza visual (HALLAWEL, 2006).
Entretanto, o desenho ainda é considerado, por muitas
pessoas, como uma atividade dependente de algum tipo de talen-
to artístico inato. Essa crença contribui para que haja uma névoa
de mistificação em torno da habilidade de desenhar, na qual as
pessoas estariam supostamente divididas em dois grupos: em um
deles, seres agraciados com o dom de desenhar, adquirido desde
o nascimento, e, no outro, pessoas que nunca desenham por não
possuir esse tipo de talento, por não terem nascido com esse dom.
As pessoas que não desenham têm dificuldade em com-
preender como o processo do desenho acontece, e o ensino, por
vezes, traz instruções confusas e um tanto quanto vagas: “comece
com uma linha, depois vá definindo a forma, e, por último, acres-
cente detalhes”. Nessa dinâmica, muito se confunde e pouco se
esclarece sobre como, de fato, o ato de desenhar acontece. Ou-
tro agravante é que as pessoas que desenham não sabem explicar
muito bem como aprenderam, tampouco têm consciência de tudo
o que o ato de desenhar envolve - pois em certo nível, o desenhar
é intuitivo, pouco racionalizado.
Apesar das dificuldades, crenças e mitos criados em torno
da atividade, desenhar é, acima de tudo, uma habilidade técnica
como qualquer outra. Essa habilidade apenas requer outro tipo
de pensamento e processamento de informações visuais, diferen-
tes do modo no qual somos educados tradicionalmente. Aprender
a desenhar exige, assim, outro modo de compreender o mundo
visual: reaprender a ver, ou melhor, aprender uma nova forma
de pensar sobre aquilo que se vê. Em vez de enxergar as coisas
através do conceito pelo qual as definimos (“aqueles são óculos”,
“isso é uma cadeira”), é preciso vê-las, antes de qualquer coisa,
como formas visuais: linhas retas e curvas, espaços cheios e va-
zios, relações de tamanho e proporção, claros e escuros. Para ver
dessa maneira é preciso, em certa medida, “esquecer” o que se
sabe: não nomear ou conceituar o que se desenha. Adotar essa
atitude leva a uma mudança de percepção, ativa esse novo modo
de ver as coisas (EDWARDS, 2005).

2.APRENDER A DESENHAR
A linguagem visual vem acompanhando constantemente a
evolução humana (GOMBRICH, 2012). Um dos desafios no ensino
da linguagem visual está ligado não apenas ao seu aprendizado, mas
também acompanhar a sua evolução. E não basta apenas refletir ou
orientar o gosto de seu tempo, mas também representar os valores
estéticos e funcionais de uma determinada criação (WONG, 1998).
Independentemente dos novos avanços tecnológicos e
constantes atualizações das ferramentas de representação, o ato
de desenhar tem mantido sua essência como uma importante lin-
guagem de expressão de ideias, diretamente ligada ao processo
criativo. Mesmo que, pelo uso crescente dos meios digitais, dimi-
nua-se a importância das habilidades manuais, as capacidades hu-
manas de percepção e seleção crítica das informações continuam
sendo fundamentais no processo de representação (VIZOLI et al.
2014). Ao permitir a expressão de imagens mentais, o desenho
possibilita a ampliação do potencial criativo. E, para além dis-
so, seu potencial vai além da simples atividade de materializar
algo em uma forma visual: o desenho ajuda a descobrir diferentes
formas de observar e compreender o mundo. Não está, portanto,
limitado a uma atividade meramente motora, e sim à expansão
das fronteiras da capacidade visual-intelectual.
O ato de desenhar, como qualquer outra habilidade, exige
disposição e treino. Consequentemente, certas pessoas dominam
mais rapidamente, enquanto outras experimentam uma curva de
aprendizado um pouco maior. É importante desmistificar a ativi-
dade de desenho como uma habilidade inata, um dom, e entender
como algo possível de ser aprendido. A compreensão de que ape-
nas poucas pessoas são dotadas de um talento natural de desenhar
é equivocada. Em alguns casos, frustração e angústia surgem da
mera busca por resultados rápidos e fáceis, Radfahrer (2000), e não
necessariamente da inabilidade, como muitos acreditam. Certas
posturas adotadas pelos sistemas de ensino, que valorizam predo-
minantemente a linguagem escrita ou falada, tendem a criar um
ambiente desfavorável ao estímulo de outras formas de expressão e
comunicação, dentre elas, o desenho. Muitas vezes, a desistência é
resultado de bloqueios criativos originados em algum momento na
fase de aprendizado e reforçados ao longo dos anos.
Diferentemente da concepção de um dom inato para o
desenho, existe a tendência em aprender e se destacar em uma
determinada atividade quando há um interesse pessoal, sobretudo
quando somos estimulados e recompensados a fazer algo. Os psi-
cólogos da cognição explicam que as pessoas são interessadas em
determinadas tarefas que identificam como “boas” e, por este mo-
tivo, acabam praticando mais. “Assim, a combinação de talento
e interesse conduz a um conhecimento especializado, e conheci-
mento produz expertise” (HUNT, 2006, p. 34). Por consequência,
o indivíduo mostra uma maior disposição para desenvolver uma
determinada atividade e, estimulado por recompensas, gera um
maior interesse e envolvimento naquilo que gosta. Consequen-
temente, acaba se envolvendo e exercendo cada vez mais uma
determinada atividade e, portanto, uma chance muito maior de
executá-la bem (FLORIO, 2011).
Entretanto, diferentemente da linguagem verbal, a lin-
guagem visual não possui nenhuma regra amplamente conven-
cionada, de modo que cada estudioso do desenho aborda e adota
interpretações e teorias diferentes (Wong, 1998). De toda forma,
o mais importante é considerar que, com boa vontade, dedicação
e um ambiente de aprendizagem adequado, qualquer pessoa pode
aprender a desenhar.

3.A PERCEPÇÃO E O DESENHO


A prática constante do desenho é, por si mesma, um pro-
cesso de aprendizado: desenhistas profissionais costumam afir-
mar que nunca param de estudar. E, como todo fruto da cons-
ciência humana, o ato de desenhar é bastante subjetivo. Dentre
diversas abordagens e particularidades, observa-se, destacada-
mente, que algumas pessoas têm preferência por desenhar mime-
tizando - “copiando” - elementos observáveis: as chamadas refe-
rências visuais (objetos, pessoas, cenas, fotografias, ilustrações
etc.);, enquanto outras sentem-se mais à vontade com desenhos
de criação, nos quais têm liberdade para modificar as qualidades
do que observam ou, até mesmo, inventar a partir da memória e
da imaginação.
Independentemente das idiossincrasias e estilos pessoais,
a atividade de desenhar envolve, de modo geral, tanto a habi-
lidade de observação quanto as de memória e imaginação. Um
desenho completo é o ponto de convergência desses três vetores,
sendo, portanto, um produto subjetivo, fruto da interpretação do
desenhista. Por mais que se intente uma representação fotográfi-
ca em um desenho, a imaginação intervém em certa medida; por
outro lado, mesmo em representações surrealistas e até abstratas,
as experiências prévias de observação e a memória sobre o mun-
do visual que se conhece exercem participação nos processos de
significação que terão o desenho como resultado. Nessa dinâmica
tríade, compreende-se o desenho de observação como a base mais
fundamental e ponto de partida no árduo e longo, porém gratifi-
cante processo de aprendizado do desenho.
Na década de 1970, a professora Betty Edwards (2005),
da University of California, elaborou um método de ensino do
desenho que se baseou em pesquisas então existentes sobre o fun-
cionamento do cérebro humano e os diversos modos pelos quais
pensamos, percebemos e compreendemos as coisas. O embasa-
mento e pormenores do método foram relatados no livro “Dese-
nhando com o lado direito do cérebro”. Segundo a autora (ibid
2005), para se aprender a “ver para o desenho”, é importante uma
mudança de percepção, uma alteração no estado da consciência.
Em outras palavras, desenhar por observação envolve compreen-
der aquilo que vemos por meio da percepção de cinco aspectos:
Arestas - Os limites ou bordas que definem a forma das
coisas. Desenvolver a capacidade de ver e representar as formas
visuais por meio de linhas é, segundo Edwards (2005), a primeira
habilidade fundamental do desenhista.
Espaços negativos - A segunda habilidade envolve a per-
cepção atenta do “espaço vazio” em volta das coisas. O treino
desta habilidade tem uma dupla vantagem: a) espaços negativos
são mais fáceis de desenhar porque são formas abstratas sobre
as quais não temos informações pré-concebidas, o que significa
menor interferência da memória no processo de observação (o
que conduz a um aguçamento da capacidade de desenhar o que se
vê); e b) as linhas usadas para representar espaços negativos são
compartilhadas com a silhueta externa do objeto contido nesse
espaço, de modo que desenhar o espaço vazio implica desenhar,
simultaneamente, os contornos do próprio objeto.
Relações espaciais - A terceira habilidade abrange a afe-
rição de proporções e ângulos. Proporções são os tamanhos rela-
tivos entre as coisas, e, em geral, são expressas como razões ma-
temáticas, em que se toma uma medida como unidade básica para
referência e comparação com outras medidas no espaço da cena
observada (por exemplo, 1:2 - 1 unidade de largura por 2 unidades
de altura). Ângulos, no desenho, podem ser compreendidos como
as relações de posição dos elementos visuais no plano da imagem,
em geral, comparativamente às constantes vertical e horizontal.
Valores - Em termos simples, valores são tons de cinza:
variações de luminosidade que descrevem claros e escuros. No
desenho de observação, a quarta habilidade envolve discriminar
entre áreas de luz e áreas de sombra a partir da observação e esco-
lher gamas tonais adequadas para representar graficamente essas
qualidades. Sombras costumam ter valoração mais baixa (tons
mais escuros), enquanto que áreas iluminadas geralmente são re-
presentadas com alta valoração (tons mais claros). Porém, isso
não é uma regra rígida, uma vez que o uso dos valores no desenho
também está relacionado às opções de composição artística e de-
pende, essencialmente, do material usado para desenhar. Alguns
materiais, como carvão e nanquim aguado, permitem uma maior
gama de valores baixos; já o grafite tem melhores resultados com
valores altos e médios.
“Gestalt” - A percepção do “todo”. A noção de conjunto
e de harmonia entre os elementos que compõem o desenho é uma
habilidade que, segundo Edwards (2005), não é necessariamente
ensinada, mas surge como resultado do aprendizado das outras
quatro habilidades e da prática.
Em menos tempo do que se espera, uma prática dedicada
dessas habilidades pode conduzir a resultados surpreendentes. Na
Universidade Federal do Ceará, por exemplo, os alunos do cur-
so de Sistemas e Mídias Digitais têm a oportunidade de cursar
uma disciplina introdutória de desenho logo no primeiro semes-
tre. Como parte das atividades dessa disciplina, os alunos devem
produzir dois autorretratos: o primeiro, no início da disciplina, e o
segundo, ao final do semestre. Ao comparar-se o “antes” e o “de-
pois”, é possível observar, na maior parte dos casos, distinções
marcantes que sinalizam grandes progressos nas habilidades de
observação e de representação gráfica (vide Figuras 1 e 2).
Figura 1. Desenhos de Renata Faria, aluna de graduação
em Sistemas e Mídias Digitais da UFC, antes e após a
disciplina de Desenho I (Março-junho, 2015)

Fonte: Arquivo pessoal dos autores


Figura 2. Desenhos de Igor Sousa, aluno de graduação
em Sistemas e Mídias Digitais da UFC, antes e após a
disciplina de Desenho I (Março-Junho, 2015)

Fonte: Arquivo pessoal dos autores.

4.O ENSINO DO DESENHO NA UNIVERSIDADE


O desenho vem, infelizmente, perdendo a sua importância
nas universidades de arte, design e arquitetura. A teoria e o pen-
samento verbal possuem mais valor por causa da predominância
de uma determinada abordagem científica adotada pelas universi-
dades. Isso não se apresenta como grande surpresa, uma vez que
a educação se baseia, há séculos, na importância da expressão
verbal em todos os domínios da educação e, dificilmente, espe-
ra-se que os alunos adotem um processo de concepção artístico e
criativo (AYIRAN, 2008).
O incentivo à ampliação do repertório visual do indivíd-
uo acontece apenas enquanto se é criança. O ato de desenhar é
desencorajado pela sociedade muito antes do indivíduo entrar na
faculdade, pois, até mesmo nos ensinos fundamental e médio, os
alunos são estimulados a pensar de forma cartesiana e linear, ra-
ramente utilizando o desenho ou outras linguagens não-verbais
como expressões do pensamento (ZHU, 2010). Por esse motivo,
muitas pessoas associam o desenho a uma atividade infantil. Os
contratempos surgem quando se chega à universidade, sobretudo
em cursos onde se trabalha com imagens e formas (Arquitetura,
Design, Sistemas e Mídias Digitais etc.) e os alunos, por falta
de incentivo e prática, já esqueceram completamente como de-
senhar. O problema se agrava quando não há oferta de discipli-
nas de desenho, adequadamente planejadas e contextualizadas,
na grade curricular, limitando e bloqueando o desenvolvimento
desse aspecto na formação do aluno.
Este cenário se deve, possivelmente, ao fato de que muitas
pessoas envolvidas com os direcionamentos da educação, pos-
sivelmente por escassez de uso de outras formas de expressão,
acreditam que o verbo e a aritmética são suficientes para que o
indivíduo se desenvolva plenamente. Por desconhecimento, falta
de abertura e, muitas vezes, medo ou frustração, desconhecem
e desvalorizam o potencial que o desenho oferece para que as
pessoas participem diretamente dos processos de transformação,
aprimoramento e mudanças culturais (GOMES, 1996).
Tudo isso se confirma quando se identifica que nosso en-
sino é baseado na premissa de que pensar significa seguir a linha
escrita: na escola, aprendemos a ler, interpretar e pensar de forma
textual e linearmente. Porém, existe outra forma de leitura, iden-
tificada por Flusser (2007), como pensamento em superfície, que
implica em diferentes possibilidades de raciocínio. A vantagem
da linguagem dita superficial (não no sentido de ser rasa, mas
bidimensional) está na sua flexibilidade: quando lemos um texto
linear, seguimos uma estrutura culturalmente pré-definida, mas
quando lemos uma imagem, movemo-nos, de certo modo, livre-
mente dentro de uma estrutura que nos foi apresentada (FLUS-
SER, 2007).
Apesar da linguagem verbal predominar em nossas uni-
versidades, o raciocínio visual não limita o pensamento científico.
Leonardo da Vinci, um dos pensadores mais importantes do Alto
Renascimento, foi um polímata, atuando como cientista, matemá-
tico, engenheiro, inventor, anatomista, pintor, escultor, arquiteto,
botânico, poeta, músico além de suas contribuições entre outras
áreas. Em seus cadernos e anotações é nítida a importância do
desenho para o seu raciocínio intelectual (BÜRDEK, 2006].
O desenho, como forma de pensamento e expressão, não
precisa ser uma representação fiel da realidade. Nos desenhos de
anatomia feitos por Leonardo da Vinci, eram subtraídas ou reve-
ladas partes do corpo, dependendo do objetivo do artista. “[...] a
imagem realista de uma dissecação não apenas provocaria a aver-
são, como também, provavelmente, não conseguiria mostrar as-
pectos que devem ser visualizados” (GOMBRICH, 2012, p. 51).
Neste caso, os desenhos de Leonardo da Vinci são exemplos de
representações artísticas da realidade beneficiando uma clareza
maior do conceito. Os seus esboços não são retratos fiéis do que
é visto pelos olhos humanos, mas expressões visuais funcionais,
cortes em vistas, e ilustrações que o artista fez sobre a estrutura do
corpo humano, a fim de visualizar melhor suas partes, músculos,
ossos e componentes (FERNANDES; SILVA, 2013).
O pensamento visual, realizado através do uso de ferra-
mentas e técnicas de projeto, é defendido por vários autores, tais
como Baxter (2000), Löbach (2001) e Brown (2010). O mapa
mental, por exemplo, ao contrário dos sistemas tradicionais de
anotação, como os textos lineares, adota um esquema de ramifi-
cações utilizando ilustrações e figuras, que se irradiam em torno
de uma ideia principal, para melhor expressá-las. Este método é
destinado a armazenar, organizar e priorizar informações, traba-
lhando a representação visual das relações existentes e oferece
um senso mais intuitivo do todo sem impor estruturas fixas para
interpretação (BROWN, 2010).
O desenho é a linguagem que tem, na representação grá-
fica, um mediador, um veículo que materializa e faz possível o
conhecimento projetual, da mesma forma que a linguagem ver-
bal. E se o ato de desenhar consiste em recorrer a um conjunto
de convenções gráficas, desenvolvidas através da história, para
ajudar a comunicar ideias, ele deve ser tratado, assim como a es-
crita, como uma forma de linguagem. Com um trabalho gradual,
esperamos que essa perspectiva seja cada vez mais valorizada pe-
las universidades.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O texto buscou apresentar o ato de desenhar como uma
atividade mais ampla do que simplesmente uma forma de expres-
são artística. Além da importância da atividade físico-motora em
criar representações visuais, o ensino do desenho também permite
explorar diferentes formas de observar e compreender o mundo,
expandindo as fronteiras da capacidade visual-intelectual.
A habilidade de desenhar é algo que não depende, neces-
sariamente, de algum tipo de dom natural ou talento inato, mas é
algo que pode ser aprendido, desde que haja interesse, dedicação
e um ambiente de aprendizagem favorável. Obviamente, a curva
de aprendizado pode variar entre diferentes sujeitos, de modo que
não existe uma prescrição exata sobre o tempo necessário de ser
dedicado ao estudo. Porém, bons resultados podem surgir antes
do que se espera se houver dedicação, paciência e perseverança.
A aplicação do desenho como ferramenta de criação vi-
sual é bastante ampla e permite atuar em diferentes áreas e de
diferentes formas. O desenvolvimento das quatro habilidades de
percepção visual descritas por Betty Edwards (2005) são, em ge-
ral, o primeiro passo no aprendizado do desenho, pois permitem
uma exploração intuitiva e eficaz do desenho a partir da obser-
vação em um espaço de tempo relativamente curto. Outros fun-
damentos e técnicas podem, posteriormente, ser somados a isso.
Apesar de não ser obrigatório, um maior conhecimento acerca
dos fundamentos e técnicas do desenho acadêmico, certamente,
auxiliará o desenhista a ter um maior domínio de suas habilida-
des, ampliando sua capacidade técnica e criativa, bem como o
escopo do seu campo de atuação.
Apesar das diversas vantagens que oferece à formação do
indivíduo, o desenho só é estimulado pelas instituições educa-
cionais, em geral, durante o período do ensino infantil, permane-
cendo restrito às crianças mais novas. Ao longo do ensino fun-
damental e do ensino médio, as atividades que têm relação com
desenho, arte e outras formas de expressão vão sendo substituídas
massivamente pelo estudo da linguagem verbal e da aritmética.
Como consequência, ao serem exigidos em retomar a prática do
desenho na universidade, os alunos podem demonstrar dificulda-
des e bloqueios.
Portanto, cabe às instituições de ensino prover condições
adequadas a esse tipo de ensino e aprendizagem. O que se espe-
ra é que haja espaço nas universidades para uma formação mais
ampla, calcada não apenas no pensamento linear e nas formas
lógico-verbais de expressão, mas contemplando também outras
diferentes formas de linguagem, entre elas, o desenho.
REFERÊNCIAS
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design education And the effects of a scientific ideal, IN: ITU
Journal of Faculty of Architecture, Istanbul, p. 52-66, Abril, 2008.
BAXTER, Mike. Projeto de produto: guia prático para o design
de novos Produtos . São Paulo: Blucher, 2000.
BROWN, Tim. Design thinking: uma metodologia poderosa para
decretar o fim das velhas ideias. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.
BÜRDEK, Bernhard E. História, teoria e prática do design de
produtos. São Paulo: Edgard Blucher, 2006.
EDWARDS, Betty. Desenhando com o lado direito do cérebro,
Rio de Janeiro: Ediouro, 2005.
FERNANDES, Stefan von der Heyde; SILVA, Tânia Luisa Kol-
termann da. A Prática do desenho e seu papel no desenvolvimento
de projeto de produto. IN: Graphica ’13,Florianópolis, 2013.
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FLUSSER, Vilém. O mundo codificado: por uma filosofia da co-
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GOMBRICH, Ernst Hans. Gombrich Essencial: textos seleciona-
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GOMES, Luiz Vidal Negreiros. Desenhismo. 2a ed., Santa Maria:
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HALLAWELL, Philip. À mão livre: a linguagem e as técnicas do
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VIZIOLI, Simone; CASTRAL, Paulo; LANCHA, Joubert; ME-
DEIROS, Givaldo. Desenho digital: workshop de projeto para
um sistema expositivo móvel. IN: SIGRADI
2014 - XVIII Congresso da Sociedade Ibero-americana de Gráfi-
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WONG, Wucius. Princípios de forma e desenho. São Paulo: Mar-
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ZHU, Feng. A importância do desenho, IN: The Concept Art Blog.
Disponível em: http://www.theconceptartblog.com/2010/05/05/a-
-importancia-do-desenho-por-feng-zhu/, Maio. Acesso em: 21
Jun. 2017.
A CRIAÇÃO
PELO TRAÇO:
FUNDAMENTOS E
APLICAÇÕES DO
DESENHO NAS MÍDIAS
DIGITAIS
A criação pelo Traço: Fundamentos e
Aplicações do Desenho nas Mídias Digitais
Liandro Roger Memória Machado, Natal Anacleto Chicca Jr.

1.INTRODUÇÃO

O desenho é, antes de qualquer coisa, uma forma de lin-


guagem, expressão e comunicação. O verbo desenhar provém do
italiano disegnare, originado do latim designare, que significa de-
signar, indicar, ordenar, dispor e marcar distintivamente. Assim,
desenhar pressupõe um propósito, uma intenção. E, tal quais ou-
tras formas de linguagem, o desenho tem acompanhado o percur-
so histórico da humanidade (Gombrich 2012), modificando-se,
expandindo-se e diversificando-se constantemente.

Muitos ainda, acreditam que a capacidade de desenhar é


um talento inato. No entanto, hoje já se sabe que ela pode ser ensi-
nada e aprendida, da mesma forma que qualquer outra habilidade
intelectual humana. O desenho a partir da observação - “copiar” no
papel aquilo que se vê - é o primeiro passo nessa jornada. Em um
segundo nível, interpretar referências visuais e desenhar a partir da
memória e da imaginação também vêm a se tornar competências
essenciais. O domínio do desenho criativo envolve o aprendizado
de fundamentos como expressão gestual, perspectiva linear, técni-
cas de representação da luz e conhecimentos sobre construção da
forma, incluindo anatomia humana. Mas o desenho não se limita
apenas à representação figurativa e pode se estender a todas as ma-
nifestações possíveis do pensamento visual (DERDYK, 2007).

O desenho é a base de qualquer trabalho de natureza vi-


sual (HALLAWELL, 2006), e seu uso como meio para a criação,
no campo das mídias digitais, é muito amplo, não apenas como
opção estética ou recurso de estilo gráfico em ilustração, mas
principalmente, como uma poderosa ferramenta de planejamento
e geração de ideias em todas as atividades nas quais se exige uma
carga significativa de pensamento visual e organização visual da
informação. Neste texto, buscaremos apresentar brevemente os
fundamentos necessários para o uso do desenho como ferramenta
de criação, bem como um panorama de sua aplicação no design
de novos produtos e em nichos profissionais diversos relaciona-
dos à mídia digital, como projetos de interfaces gráficas, direção
de arte, concept art (arte de conceito na produção de vídeo e de
jogos, incluindo o design de personagens e cenários), modelagem
tridimensional, storyboarding, e animação.

2. O DESENHO COMO FERRAMENTA DA


CRIAÇÃO: FUNDAMENTOS
Quando falamos em desenho criativo ou de imaginação,
não estamos nos referindo à capacidade de pensar diferente e ge-
rar ideias inovadoras; essa aptidão, que também pode ser treinada
e desenvolvida, é outra questão. Em oposição à mimese a par-
tir de observação (a representação de uma referência visual de
modo análogo, realístico), o desenho de imaginação ao qual nos
referimos aqui é a capacidade de usar a linguagem visual para
projetar algo novo, produzir imagens e produtos que não sejam
pré-existentes. O desenho de imaginação acontece a partir de uma
interação entre a memória visual e a interpretação criativa de re-
ferências visuais: desenha-se “de cabeça” e/ou modificando-se,
intencionalmente, as qualidades visuais de algo observável, de
modo a gerar-se uma representação gráfica original.

Algumas pessoas conseguem desenhar a partir da imagi-


nação em um estilo próprio, em geral mais simbólico e bidimen-
sional. Muitas vezes, esses desenhos não dependem de estudo
formal tão aprofundado de desenho. Ilustrações estilizadas po-
dem ter tanto valor estético e prático quanto o desenho realista,
pois, para desenhar não existe receita ou resposta certa: há muitas
maneiras, expressões, estilos, modos de fazer, e todos têm seu
valor (BROOKES, 1996).

No entanto, em determinadas aplicações, como o projeto


de produtos industriais ou a concepção de mídias audiovisuais e/
ou interativas (filmes, jogos etc.), a representação realística pode
ser um fator importante, e o aprendizado do desenho de observa-
ção não parece ser suficiente para suprir essa necessidade, pois,
mesmo quando treinadas nesse tipo de desenho, muitas pessoas
sentem grande dificuldade ao tentarem desenhar a partir da me-
mória ou da imaginação.
Assim, utilizar o desenho como ferramenta de criação en-
volve desenvolver outras habilidades para além da observação.
Se o desenho de observação, segundo Edwards (2005), pode ser
aprendido em um nível relativamente intuitivo, o desenho de me-
mória e imaginação envolve o aprendizado de fundamentos que
requerem muita racionalização, prática constante, treinos de re-
petição e memorização de esquemas e informações técnicas. Os
principais fundamentos são apresentados a seguir.

• Expressão gestual - Essa maneira peculiar de aborda-


gem do esboço está diretamente ligada à conexão do cor-
po do artista com o instrumento de representação usado,
seja lápis, caneta, pincel ou outro: é “atuar sobre o papel”
(STANCHFIELD, 2009, p. 6). Além do treino da natu-
ralidade e da soltura do traço, o desenho gestual envolve
também a síntese de padrões visíveis: interpretar formas
complexas e convertê-las em linhas simplificadas, dese-
nhadas de forma fluida e expressiva. O domínio satisfa-
tório da expressão gestual requer treinos de repetição e
prática constante ao longo de toda a vida profissional.

• Perspectiva linear - Os efeitos de espaço tridimensional


que o desenho permite simular implicam no aprendizado
de alguns princípios de perspectiva linear, um sistema de
representação desenvolvido por artistas renascentistas e
aperfeiçoado ao longo da Idade Moderna. Os principais
conceitos da perspectiva linear são: o horizonte - um plano
imaginário situado na altura do olhar do observador, que
orienta a configuração das formas visuais conforme seu
ponto de vista - e os pontos de fuga - pontos de encontro
das arestas convergentes que diminuem de tamanho pro-
gressivamente conforme se distanciam do ponto de vista
do observador (METZGER, 2008). Outras técnicas asso-
ciadas à representação da perspectiva são: a sobreposição,
a dinâmica de nitidez e contraste (que variam em função
da distância das coisas observadas em relação ao olhar do
observador) e a organização do espaço em planos (fore-
ground, middleground, background). Os fundamentos da
perspectiva linear exigem uma curva de aprendizado rela-
tivamente alta e envolvem um amplo desenvolvimento da
imaginação espacial, porém, uma vez aprendidos, permi-
tem ao desenhista um progresso vertiginoso na interpre-
tação criativa das formas observáveis e na habilidade de
desenhar realisticamente a partir da memória.

• Anatomia humana - Quando a natureza do trabalho no


qual o desenho será aplicado envolve a representação grá-
fica da figura humana de maneira realística ou estilizada, a
compreensão das formas anatômicas é essencial (FEHÉR,
2013). É o caso, por exemplo, do designer de moda ou do
artista responsável pela concepção de personagens para
animações e jogos. Obviamente, bastante diferente do en-
sino voltado aos estudantes de áreas ligadas à saúde, o
foco no estudo da anatomia para o desenhista reside na
compreensão da sua forma, função e movimento. A par-
tir disso, é possível interpretar, com muito mais clareza e
consistência, o desenho da figura humana a partir da ob-
servação, bem como, a partir da memória, desenhar pes-
soas com proporções e formas verossímeis e até mesmo
criar variações de esquemas padrão a partir da imaginação
e da manipulação de formas básicas, possibilitando a cria-
ção de personagens imaginários e caricaturais.

• Composição visual - A composição é a sintaxe visual: diz


respeito às diversas maneiras particulares de se disporem
elementos gráficos em um espaço, seja este uma página,
uma interface digital ou qualquer outro tipo de superfície
material ou virtual. Quando se criam imagens com pro-
pósitos comunicativos, imbuem-se discursos e mensagens
na sua construção. Os modos de organizar os elementos
visuais no espaço estão diretamente ligados a esses dis-
cursos, e a consciência no uso desse espaço por parte do
desenhista é fundamental para a intenção e o propósito
subjacentes ao desenho. Alguns dos aspectos fundamen-
tais nas técnicas de composição visual são o estudo da
distribuição dos elementos visuais (tamanho, posição, di-
reção etc.) e o uso dos espaços vazios e dos contrastes. O
exercício cuidadoso da composição visual pode levar a
um aprimoramento da percepção visual, do senso estético
e da leitura crítica de imagens por parte do desenhista.

• Rendering - Por rendering, entende-se todos os aspectos


que envolvem a representação fidedigna das qualidades
visuais de uma superfície, incluindo os aspectos de luz,
sombra, textura, material e reflexividade. O estudo de luz
e sombra envolve a compreensão de alguns princípios
que se inferem sobre os aspectos visíveis dos fenômenos
ópticos, como as qualidades de diferentes tipos de luz,
ângulos de incidência da luz sobre os objetos, dinâmicas
de projetação de sombras e rebatimento de luzes etc. Os
estudos de textura e material envolvem a análise e a inter-
pretação das qualidades visuais de uma superfície, bem
como a prática extensiva das diversas formas de represen-
tação dessas qualidades (que são determinadas pela natu-
reza do instrumento de desenho que se utiliza, portanto do
domínio que o desenhista detém sobre esse instrumento).
Muito do estudo de textura e superfície está ligado a exer-
cícios de observação, porém direciona-se o foco para a
interpretação criativa e a representação de padrões.

• Construção da forma e Shape Design - A manipulação


das formas é, possivelmente, um dos fundamentos mais
característicos do desenho criativo: envolve dar às coisas
que se representam graficamente uma nova forma, mo-
dificada e reinterpretada conforme a visão do artista, os
intuitos de comunicação da imagem, o público-alvo, as
tendências de estilo e os paradigmas da linguagem que
se adota; em outras palavras, construir a forma de modo
a representá-la da maneira mais adequada ao contexto e
às necessidades de um projeto específico. A maneira pela
qual o desenhista interpreta e configura as formas é análo-
ga à escolha das palavras usadas na construção de um tex-
to: é ela que, condicionada pelo propósito comunicativo
da representação, determina o estilo e o resultado final. A
manipulação intencional da forma é a essência do design
e está presente no ofício de todo profissional que lida com
a criação visual, do artista plástico ao designer de automó-
veis, do tipógrafo ao escultor.

É importante ressaltar que o desenvolvimento das habi-


lidades de desenho está ligado à experiência de ofício, à maturi-
dade técnica e à profundidade de compreensão dos fundamentos.
Assim como em qualquer outra área do conhecimento, o domínio
do desenho requer treino e depende menos de uma pré-disposição
inata, e mais de um aprendizado de base sólida e de uma prática
extensiva.

3. O DESENHO DE NOVOS PRODUTOS

O desenho é a ferramenta que está presente em todos os


níveis do processo de desenvolvimento de produtos. A atividade
de desenhar contribui com o desenvolvimento de novos produ-
tos e se faz presente tanto na produção, quanto na idealização,
bem como na comunicação dos objetos (FERNANDES; SIL-
VA, 2013). O desenho é um meio para registrar graficamente o
que tentamos consolidar mentalmente, Tversky et al. (2003); é,
portanto, o vínculo entre aquilo que será produzido e a imagem
mental orientadora que, inicialmente, ainda não está totalmente
formulada (POEIRAS, 2009).

O termo sketch, que pode ser traduzido como rascunho


rápido, demonstra as ideias, ajuda a conceber as formas e o di-
recionamento do objeto a ser desenvolvido. Por ser um desenho
rápido (e sem acabamentos), permite uma mudança de forma e
inclusão de novas ideias de maneira mais rápida e prática. A am-
biguidade nos sketches pode desempenhar um importante papel
para a criatividade ao permitir novas possibilidades de exploração
e interpretação na resolução de problemas (SILVA et al., 2014).

Assim, o desenho é parte integrante do processo criativo


no desenvolvimento de produtos e possui diferentes funções e fi-
nalidades: (GOMES et al., 2011; SILVA et al., 2014).

• Desenho de expressão (conceptual sketching) - A pri-


meira etapa, considerada a mais criativa do processo. O
desenho é feito com materiais simples (lápis, canetas hi-
drocores e papel comum) para expressar as ideias criati-
vas de forma rápida e espontânea. Esse tipo de desenho
é utilizado para representar diversas ideias em desenhos
rápidos, livres e soltos, sendo que as imagens executadas
não precisam seguir nenhum padrão de distribuição na fo-
lha do papel.

• Desenho operacional (sketch rendering) - A segunda fase


do processo consiste em desenhar as ideias geradas na eta-
pa anterior, porém de forma mais detalhada. O processo
inclui seleção, discussão e possível junção de conceitos
com o objetivo de se desenvolverem as melhores ideias.
Aplicam-se cores, tons, texturas e detalhes para facilitar a
compreensão do que se busca representar.

• Desenho de convenção (conventional rendering) - A ter-


ceira etapa, também inserida dentro do desenho operacio-
nal, elabora a proposta final. Após chegar em uma única
proposta, determinada pelo briefing estabelecido para o
projeto, o conceito é representado através de desenhos
com o maior detalhamento possível. Trata-se da represen-
tação gráfica que se tornará pública por meios de catálo-
gos, livros, fotografias etc. O desenho de convenção pode,
inclusive, ser essencial quando se exige maior impacto de
visualização, por exemplo, na apresentação de um projeto
a outros setores da empresa, a parceiros, a patrocinadores
etc.

Desta forma, reafirma-se que é possível identificar o de-


senho como algo presente em todas as etapas criativas de um
projeto, desde a geração de alternativas até a apresentação visual
final do produto (GOMES et al., 2011). Grande parte do que é
desenvolvido na indústria possui uma forma visual, portanto, é
crucial aos profissionais que atuam nessa indústria dominarem
a linguagem do desenho, de modo a serem capazes de utilizá-la
com maestria e comunicar de maneira eficaz e marcante, contri-
buindo para a geração de resultados (ZHU, 2010). O desenho é a
melhor forma de explorar ao máximo o potencial do design.
4. PANORAMA PROFISSIONAL: APLICAÇÕES DO
DESENHO NA MÍDIA DIGITAL
O mercado das mídias digitais é novo, está em crescimento
e tem exigido profissionais com os mais diversos perfis, forma-
ções e qualificações. De modo geral, a habilidade de desenhar é
útil a todos aqueles que lidam com design, planejamento visual e
produção de imagens no campo das mídias digitais. Em algumas
áreas de atuação mais específicas, o desenho figurativo e o dese-
nho de projeto são aplicados de maneira mais direta, de modo que
a habilidade de desenhar é parte essencial do processo de traba-
lho. Algumas dessas áreas serão comentadas a seguir.

• Ilustração digital - O ofício do ilustrador sempre foi, em


essência, o desenho e a pintura. Algumas vezes, outras téc-
nicas artísticas, como fotografia, colagem e escultura, são
também incorporadas. A isso, vieram-se somar os softwares
e equipamentos digitais, que já são, há um bom tempo, parte
essencial do cotidiano dos artistas que lidam com imagens
reproduzíveis. As aplicações contemporâneas da ilustração,
antes mais associadas aos meios impressos (livros ilustra-
dos, histórias em quadrinhos, cartazes de cinema, revistas
e anúncios publicitários), expandiram-se largamente para
o universo digital da web e dos jogos. Ser ilustrador hoje,
envolve visualizar um escopo mais amplo de aplicações das
imagens que se produz, bem como o domínio não apenas do
desenho e das técnicas artísticas tradicionais, mas também
dos softwares e equipamentos digitais, que, muitas vezes,
reúnem em si ferramentas que permitem maior rapidez e
agilidade, conforme as exigências do mercado (ZEEGEN,
2009).

• Concept art - É a área que lida com a criação artística des-


tinada a produtos digitais audiovisuais e interativos. A prin-
cipal tarefa de um concept artist (ou artista de conceito) é
imaginar e dar uma forma visual a personagens e mundos
por meio de desenhos, pinturas, colagens, montagens digi-
tais e outras técnicas de geração e manipulação de imagens.
Seu trabalho é muito semelhante ao de um ilustrador, com
a diferença de que este último tem a ilustração como pro-
duto final, enquanto que, para o concept artist, as imagens
são parte integrante de um projeto maior que tem outra mí-
dia como resultado: filmes, animações, jogos, histórias em
quadrinhos digitais etc. As imagens criadas (concepts) são
concebidas conforme um briefing, segundo a supervisão de
um diretor de arte ou diretor de projeto, e servem para guiar
a equipe de produção em relação ao visual que se preten-
de obter no produto final. A concept art é, portanto, a fun-
damentação visual que orienta todo o projeto (PARDEW,
2005). Em geral, artes conceituais são produzidas não por
um único profissional, mas por uma equipe, dentro da qual
pode haver divisões específicas de tarefas, como character
design (design de personagens), prop design (design de itens
e objetos), environment design (design de cenários) etc.
• Storyboarding - O storyboard é uma sequência visual nar-
rativa que precede um produto audiovisual, como um filme,
animação ou jogo digital. É como uma história em quadri-
nhos, porém não tem por finalidade ser lido por um público,
e, sim, ajudar a planejar como a história será contada visual-
mente no produto final. Elaborar um storyboard envolve,
diretamente, a habilidade de desenhar e de comunicar atra-
vés de imagens, bem como exige domínio da linguagem au-
diovisual e de técnicas de layout e narrativa para definição
de enquadramentos, composições de cena, movimentos de
câmera, sequências, expressões faciais, gestos, movimento,
efeitos visuais etc.

• Animação - No passado, tudo o que era possível realizar-se


através de animação dependia do desenho para ser imple-
mentado: qualquer animação, para ser produzida, precisava
ser desenhada. Hoje, o mercado ocidental de animação, so-
bretudo nas áreas de cinema e jogos, está bastante consoli-
dado com técnicas de modelagem e animação digital, que
permitem criar imagens 3D de alta qualidade com maior
agilidade e menor custo operacional relativo (CÀMARA,
2006). No contexto de uma grande produção, o desenho é
mais aplicado em etapas anteriores à de animação, como
concept art e storyboard. Mas em outros nichos, como a TV
(sobretudo, em desenhos animados), técnicas tradicionais
de animação ainda são bastante utilizadas, exigindo-se dos
animadores um maior domínio das habilidades de desenho.
Nas produções orientais, o uso do desenho e das técnicas
tradicionais de animação também ainda é bastante forte.

• Modelagem 3D - O desenho é parte importante no reper-


tório de um artista de modelagem. O trabalho de produzir
esculturas digitais e modelos tridimensionais em softwares
é, em geral, precedido de etapas de esboço e planejamento
que lidam diretamente com a linguagem e as técnicas do
desenho, além de envolver habilidades como imaginação
espacial e construção da forma. Assim como, tradicional-
mente, os artistas plásticos dominavam o desenho, a pintura
e a escultura como formas de expressão complementares, o
profissional contemporâneo que lida com modelagem digi-
tal está em constante diálogo com o desenho e os meios de
representação gráfica.

• Design de Interfaces Gráficas - Apesar de não ser conside-


rada por muitos um requisito essencial na formação do de-
signer gráfico, a habilidade de desenhar tem muito a contri-
buir para o trabalho do profissional que projeta interfaces. O
simples ato de rabiscar uma ideia é uma forma de estímulo
do pensamento visual durante o processo criativo (PIPES,
2010). Além disso, no âmbito da mídia digital, as fronteiras
entre o design gráfico e o design de produto são mais tê-
nues: projetar a interface de um jogo digital, por exemplo,
envolve criar ambientes imersivos que vão além de gráficos
bidimensionais, abrangendo personagens, cenários e obje-
tos que, muitas vezes, são animados, possuem uma forma
3D e uma orientação espacial, simulam a materialidade
do mundo físico (muitas vezes, até mesmo menus, ícones
e tipografias também funcionam assim). Nesse sentido, o
desenho tradicional pode ser uma ferramenta poderosa e en-
riquecedora para o designer de interfaces digitais.

• Direção de arte - Em geral, o diretor de arte deve ser um


profissional multidisciplinar, que possui uma visão abran-
gente acerca de áreas diversas e noções amplas de diferen-
tes técnicas, de modo a realizar uma supervisão eficaz dos
outros profissionais envolvidos em uma equipe. Muitas ve-
zes, o diretor de arte também concebe e elabora imagens,
de modo que a habilidade de desenhar, em conjunto com o
domínio de outras técnicas de representação, deve ser parte
essencial do repertório desse profissional.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O desenho se apresenta como uma ferramenta de grande


contribuição em todos os meios profissionais que envolvem a cria-
ção e a produção de mensagens em forma de imagens, interfaces ou
produtos. A prática do desenho permite maior consciência e melhor
domínio sobre o uso das formas e o funcionamento da linguagem
visual. Para além da expressão artística, o desenho permite tam-
bém a organização e representação de pensamentos e percepções
visuais, funcionando também como uma prática ferramenta para
formular e trabalhar diversas questões de representação gráfica.
Em um mundo cada vez mais repleto de informação e
apelo visual, aprender a lidar com essa linguagem e a pensar por
meio dela é essencial, e o desenho é um dos caminhos que pos-
sibilita essa alfabetização visual. Ao possibilitar a expressão de
imagens mentais, o desenho pode ampliar o potencial criativo,
funcionando como um diálogo entre o projetista e sua ideia, esti-
mulando o pensamento em via de mão dupla e permitindo novas
interpretações e relações que talvez não fossem possíveis sem
uma materialidade visual. A todos os profissionais que lidam com
a visualidade nas mídias digitais, o aprendizado, o estudo, a ex-
ploração e o experimento do desenho podem ter grande valor.

REFERÊNCIAS

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adult beginners, too. Nova York: Tarcher Penguin, 1996.

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METZGER, Phil. La perspectiva a su alcance. Köln: Evergreen,


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PIPES, Alan. Desenho para designers”. São Paulo: Blucher,


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Disponível em: http://www.theconceptartblog.com/2010/05/05/a-
-importancia-do-desenho-por-feng-zhu/. Acesso em: 21 Jun.
2017.
ENGENHARIA
DE SOFTWARE
E APLICAÇÕES
MULTIMÍDIA
Engenharia de Software e Aplicações
Multimídia
Emanuel F. Coutinho, Edgar Marçal, Ma. de Fátima C. de Souza

1. INTRODUÇÃO
Atualmente, praticamente todos os setores da sociedade são
dependentes de software, como saúde, entretenimento e transporte.
Cada vez mais sistemas manuais são controlados por software, ou
portados para ambientes computacionais sob a forma de software.
O termo Engenharia, de uma maneira geral, pode ser consi-
derado como a aplicação da Ciência e Matemática através da qual
as propriedades da matéria e as fontes de energia são tornadas úteis
às pessoas. Se considerarmos o software como a matéria, temos a
Engenharia de Software, que se dedica às teorias, métodos e ferra-
mentas para desenvolvimento de software profissional.
Segundo Sommerville (2011), Engenharia de Software é
uma disciplina da engenharia que se preocupa com todos os as-
pectos de produção do software. De maneira geral, a Engenharia
de Software possui atividades de especificação, desenvolvimento,
validação e evolução.
Multimídia pode ser definida como os programas e siste-
mas entre que a comunicação entre homem e computador se dá
através de múltiplos meios de representação da informação, tais
como som e imagem animada, além da imagem estática normal-
mente utilizada em aplicativos gráficos (FILHO, 2011). Conside-
raremos então como aplicações multimídia, aplicações ou siste-
mas que se encaixam nessa definição. Se considerarmos aplica-
ções ou sistemas multimídia como software que podem auxiliar a
sociedade, podemos tratá-los na Engenharia de Software, com as
devidas adaptações.
O objetivo deste capítulo é dar uma breve descrição de
algumas etapas da Engenharia de Software: requisitos, análise,
projeto, implementação, testes, homologação e implantação. Res-
salta-se que ainda existem outras etapas e atividades, tais como
as atividades de manutenção e evolução do software. Além disso,
também faz parte da Engenharia de Software atividades relacio-
nadas ao gerenciamento de projetos, de qualidade e da configura-
ção do software e de projetos de desenvolvimento.

2. ENGENHARIA DE SOFTWARE E APLICAÇÕES


MULTIMÍDIA
Multimídia pode ser definida como os programas e sis-
temas os quais a comunicação entre homem e computador se dá
através de múltiplos meios de representação da informação, tais
como som e imagem animada, além da imagem estática normal-
mente utilizada em aplicativos gráficos (FILHO, 2011). Em am-
bientes multimídia temos em geral emprego de imagem, podendo
ser estático ou animações, e som.
A multimídia necessita de um dispositivo (normalmen-
te um computador), para ser apresentada (FILHO, 2011). Esse
dispositivo deve possuir as seguintes características: acesso não
linear, interatividade e integração com programas aplicativos.
Tais características são plenamente possíveis de serem
desenvolvidas e aprimoradas durante as fases da Engenharia de
Software. Uma diferença entre o desenvolvimento tradicional de
software (comerciais ou empresariais), é que normalmente o de-
senvolvimento foca mais no objetivo do sistema, como cadastros,
acesso a bases de dados e geração de relatórios. Em uma aplicação
com características multimídia, as mesmas etapas podem ser em-
pregadas, sendo que o foco maior será na interação, no visual, no
tipo de mídia a ser utilizado (pode ser hardware ou software, pode
ser um vídeo ou imagem). Sendo assim, elementos de diversas tec-
nologias e estratégias de desenvolvimento e criação devem ser ade-
quados às necessidades e capacidades do projeto e da equipe.
Filho (2011), ainda comenta que existe uma diversidade
de produtos multimídia. Em sua categorização, ele considerou o
grau de interação, chegando a: títulos, aplicativos e sítios.
São exemplos de títulos lineares: apresentações, demons-
trações de produtos e tutoriais não interativos. São exemplos de tí-
tulos hipermídia: títulos de referência (dicionários), ajudas on-line,
quiosques de informação e catálogos ou infográficos interativos.
Exemplos de aplicativos com interface multimídia são:
jogos, aplicativos educacionais básicos, e aplicativos de controle
pessoal. São exemplos de aplicativos multimídia: ferramentas de
multimídia, sistemas de visualização técnica e científica, simula-
dores em tempo real, sistemas de informação geográfica, sistemas
avançados de computação musical e sistemas de entretenimento.
Os sítios são páginas na maioria das vezes escritos na lin-
guagem HTML e acessados por navegadores. Nelas é possível
navegar, acessar informações e aplicações e conteúdo multimídia.

3. ETAPAS DA ENGENHARIA DE SOFTWARE


A Engenharia de Software em geral possui atividades de
especificação, desenvolvimento, validação e evolução (SOM-
MERVILLE, 2011). Nesta seção será destacado macroatividades
(etapas) relacionadas principalmente ao processo de desenvolvi-
mento em si, desde sua concepção até sua fase final de implanta-
ção para utilização pelo usuário final. Além dessas macroativida-
des, existem de maneira transversal ao processo de desenvolvi-
mento atividades relacionadas ao gerenciamento de projetos, da
qualidade, e da configuração do software e ambientes.
A Figura 1 exibe um fluxo de atividades comum no de-
senvolvimento de aplicações, comumente descrito em livros de
Engenharia de Software. Suas atividades vão desde a concepção
da aplicação/sistema, especificação de requisitos e projeto, imple-
mentação e testes. Além disso, existem atividades que ocorrem
após esse ciclo de desenvolvimento, relacionadas à manutenção e
evolução dos sistemas.
Figura 1. Visão geral das atividades de um
modelo de desenvolvimento de software

Fonte: Os próprios autores.

O desenvolvimento de sistemas de informação é um proces-


so que se inicia com a compreensão sobre como ele pode auxiliar
as necessidades do negócio, passa pela construção dele e vai até
a entrega aos usuários finais (DENNIS; WIXOM; TEGARDEN,
2015). Nesse processo, destaca-se o papel do analista de sistemas,
que estuda o negócio do cliente, identifica oportunidades de melho-
rias e projeta modelos que serão usados para implementar o siste-
ma. É importante ficar claro que o objetivo principal do analista de
sistemas não é criar um sistema maravilhoso tecnicamente e visu-
almente. O software é apenas um meio para se chegar à verdadeira
meta, que é possibilitar que o cliente execute mais eficientemente
suas atividades, agregando valor ao seu negócio.
3.1. Requisitos e Análise
Na fase de Análise, as seguintes perguntas devem ser res-
pondidas sobre o sistema: Quem irá utilizá-lo? O que ele fará?
Quando e onde ele será utilizado? É importante buscar compre-
ender as necessidades dos usuários, analisar os dados de entrada
e saída e todos os processos relacionados. Com isso, busca-se en-
contrar e solucionar problemas e melhorar processos.
A tentativa de implantação de um sistema de informação
sem uma correta análise leva à rejeição pelo usuário e o conse-
quente desuso (KENDALL; KENDALL, 2010). Além disso, er-
ros na fase de análise, se não percebidos, serão propagados por
todo o desenvolvimento do sistema, sendo detectados apenas no
momento do uso. Para se diminuir as chances de erro durante
a análise, recomenda-se a máxima interação do analista com os
stakeholders15 (como usuários finais, gerentes e especialistas).
A análise de um sistema pode ser vista como um processo
em duas etapas:
1. Levantamento de requisitos. Onde serão realizadas
entrevistas, aplicados questionários e outras técnicas
para se compreender como funciona o negócio do
cliente atualmente e como deverá funcionar após a
implantação do novo sistema.
2. Estudo das informações levantadas na etapa anterior
e elaboração de um documento com uma análise de-
15
Stakeholders são as pessoas (ou grupo de pessoas) que afetam ou serão afetadas pelo sistema
(DENNIS; WIXOM; TEGARDEN; 2015).
talhada dos requisitos do sistema. Este documento
deve ser apresentado aos responsáveis pela execução
do projeto que deverão validá-lo ou não. O desen-
volvimento do sistema só deve ser continuado com a
concordância de todos os interessados com relação ao
conteúdo desse documento.
O levantamento dos requisitos é um passo tão importante
no desenvolvimento de um sistema que alguns autores, como Som-
merville (1997) e Macaulay (2012), adotam o termo Engenharia de
Requisitos para descrever todas as ações relacionadas à obtenção
dos requisitos relevantes de um sistema. A Engenharia de Requi-
sitos é o processo de descobrir, analisar, documentar e verificar os
serviços e restrições de um sistema (SOMMERVILLE, 2010).
Os requisitos são as descrições dos serviços prestados
pelo sistema e suas restrições operacionais. Eles refletem as ne-
cessidades do usuário para ajudá-lo a executar suas tarefas e re-
solver problemas. É importante destacar que as formas como os
requisitos são escritos podem variar, apresentando mais ou me-
nos detalhes. Para distinguir os tipos de descrições dos requisitos,
Sommerville (2010) agrupa-os da seguinte forma: Requisitos de
usuários, quando são descritos em linguagem natural com alto
nível de abstração; e Requisitos de sistema, quando são detalha-
das as funções, serviços e restrições operacionais. O analista de
sistema precisa ter condições de escrever os requisitos com ní-
veis diferentes de detalhamento, tendo em vista que serão lidos
por diferentes tipos de profissionais, por exemplo: aqueles com
perfil mais administrativo, como os diretores e os usuários finais;
e aqueles mais relacionados às tecnologias de informação, como
outros analistas de sistema, o pessoal do suporte técnico do clien-
te e os programadores que vão desenvolver o sistema.
A seguir é apresentada uma classificação importante mui-
to utilizada para categorizar os tipos de requisitos de sistemas:
1. Requisitos Funcionais. São os requisitos mais rela-
cionados ao funcionamento do sistema em si. Descre-
vem os serviços que ele deve fornecer, como ele deve
reagir às entradas específicas e como se comportar em
determinadas situações. São exemplos de requisitos
funcionais:
a. O usuário deve poder realizar matrícula a par-
tir da seleção de turmas disponíveis.
b. O sistema deve fornecer uma listagem com os
itens adicionados ao pedido de compra.
c. O sistema deve avisar ao usuário emissor que o
usuário receptor leu a mensagem enviada.
2. Requisitos Não Funcionais. São as restrições ou fun-
ções oferecidas pelo sistema como um todo. Incluem
restrições de configuração e adoção de padrões. Requi-
sitos não funcionais muitas vezes se aplicam ao sistema
por completo e não são tão específicos quantos os fun-
cionais. São exemplos de requisitos não funcionais:
a. O sistema deve ser desenvolvido em HTML 5,
CSS e JavaScript.
b. Os relatórios e consultas do sistema devem atender
o padrão de layout específico da empresa XYZ.
c. Todas as informações do sistema devem ser
apresentadas em Português ou Inglês.
Tanto os requisitos funcionais quanto os não funcionais
são importantes para o sistema e ambos devem ser identificados
no momento do levantamento. É importante distingui-los, em
funcionais e não funcionais, porque eles terão impactos diferen-
tes na etapa de implementação.
A fase de análise transcorre à medida que os requisitos são
levantados e estudados, a partir da interação do analista de sistema
com os stakeholders, e encerra-se com a elaboração do Documento
de Requisitos do Sistema (DRS). Esse documento consiste no artefa-
to oficial que descreverá todos os requisitos que o sistema deve aten-
der. O DRS deve ser elaborado para proporcionar um alcance amplo
entre os stakeholders, desde o financiador do projeto até o usuário
que irá operar o sistema. Existem diferentes modelos de documentos
de requisitos, inclusive um padrão da IEEE16. Independentemente do
formato do documento, o desenvolvimento do sistema só deve ser
continuado com a aprovação do DRS por ambas as partes: a contra-
tante e a desenvolvedora do sistema.

IEEE/ANSI 830-1998 - IEEE Recommended Practice for Software Requirements Specifications.


<?>

Disponível em: http://standards.ieee.org/findstds/standard/830-1998.html.


3.2. Projeto
A fase de projeto do sistema vem logo após a conclusão da
análise e é onde são tomadas decisões importantes sobre o funcio-
namento do sistema que está sendo desenvolvido. Por exemplo,
na fase de projeto, o analista deve especificar soluções para os
problemas encontrados durante a análise do sistema. Para isso,
ele deverá elaborar modelos que contemplem todos os requisitos
descritos no DRS. Esta fase é concluída com a entrega da Espe-
cificação do Projeto do Sistema, que é composta por um conjunto
de documentos que variam de acordo com as organizações.
Nesse sentido, a UML (Unified Modeling Language) se
apresenta como uma das principais opções para especificação de
sistemas de informação. A UML surgiu a partir da união de dife-
rentes soluções de modelagem existentes com o foco principal
em sistemas orientados a objetos17 apesar de seus diagramas não
serem exclusivamente voltados para esse paradigma. O principal
objetivo da UML é fornecer um vocabulário comum e um conjun-
to de diagramas que podem ser utilizados para representar várias
partes do sistema.
A versão atual da UML (2.5) é composta por quatorze mo-
delos de diagramação, que podem ser divididos em dois grupos
principais (ver Figura 2), descritos a seguir.
1. Diagramas Estruturais. São aqueles responsáveis por
possibilitar a representação dos dados e das relações
estáticas no sistema. São eles: Diagrama de Classes,
17
Orientação a objetos é uma metodologia de desenvolvimento de sistemas baseada na composi-
ção e interação entre diversas unidades de software chamadas de objetos.
Diagrama de Objetos, Diagrama de Componentes,
Diagrama de Implantação, Diagrama de Pacotes, Dia-
grama de Estrutura Composta e Diagrama de perfil.
2. Diagramas Comportamentais. São aqueles que repre-
sentam as relações dinâmicas entre os elementos (e.g.
objetos, classes, atores) do sistema. São eles: Diagra-
ma de Caso de Uso, Diagrama de Estados, Diagrama
de Atividades, Diagrama de Sequência, Diagrama de
Visão Geral de Interação, Diagrama de colaboração e
Diagrama de tempo.
Figura 2. Diagramas da UML

Fonte: (OMG, 2015)


Para ilustrar a modelagem de sistemas através de diagra-
mas UML, a Figura 3 mostra um Diagrama de Casos de Uso e
um Diagrama de Classes relacionados a um sistema de controle
acadêmico. A partir da figura, podem-se identificar os seguintes
elementos: os atores Professor e Aluno; os casos de uso Realizar
Matrícula e Lançar Notas; e as classes Pessoa, Aluno e Professor.

Figura 3. Exemplos de diagramas UML de


um sistema de controle acadêmico

Diagrama de Casos de Uso Diagrama de Classes

Fonte: Os próprios autores.

É importante ressaltar que, mesmo apresentando um con-


junto amplo de modelos, a UML não contempla todas as especi-
ficações necessárias para um sistema. Por exemplo, a UML não
conta com diagramas para representar o projeto do banco de da-
dos nem o estilo visual das interfaces com o usuário. Assim, o uso
dos diagramas da UML é muito importante porque possibilita a
representação de diversas partes do sistema, entretanto, as vezes
é necessária a inclusão de outros modelos na Especificação do
Projeto do Sistema para torná-la mais completa.

3.3. Implementação
Na engenharia de software, a etapa de desenvolvimento/
implementação, conforme apresentada na Figura 1, é considerada
a fase de concretização do projeto no qual um sistema de software
passa a ser executável.
A implementação e o projeto são etapas que estão intima-
mente ligadas, tanto que ao elaborar um projeto, deve-se levar em
consideração os possíveis problemas de implementação.
Nessa perspectiva, uma das decisões de implementação
mais importantes que precisa ser tomada logo no estágio inicial de
um projeto de software é a viabilidade ou não de comprar ou cons-
truir o software de aplicação, também conhecido como software de
prateleira. Atualmente, é possível comprar sistemas de prateleira
(COTS, do Inglês commercial off-the-shelf) em uma ampla varie-
dade de domínios. Os sistemas podem ser adaptados e ajustados
aos requisitos dos usuários. Por exemplo, se você quiser implemen-
tar um sistema para o controle de estoque de uma determinada loja,
você pode comprar um pacote que já foi implementado e utilizado
em lojas de mesmo segmento e reutilizá-lo no novo sistema. Essa
abordagem acaba por viabilizar a redução dos custos e otimizar o
desenvolvimento do sistema (MAFRA e TRAVASSOS, 2005).
A adoção dos COTS visa fomentar subsídios para produ-
zir softwares reutilizáveis com qualidade e de fácil manutenção.
Nessa perspectiva, cabe a equipe de desenvolvimento definir qual
linguagem de programação adotar para dar prosseguimento ao
processo de implementação do sistema. É importante ressaltar,
que existem diversas linguagens de programação que seguem di-
ferentes paradigmas. No contexto de reutilização, este artigo, terá
como foco o Paradigma Orientado a Objetos (POO) para o desen-
volvimento de produto de software. POO é um padrão de desen-
volvimento que é seguido por muitas linguagens de programação,
como por exemplo Java, C# e C++ e tem por objetivo possibilitar
a reutilização do código e trazer a representação do sistema para
mais perto do que veríamos no mundo real. Além dessas vanta-
gens, é possível citar o agrupamento e encapsulamento de todas
as peças de um objeto dentro de um pacote limpo, o aumento da
ocultação de informações com o uso de um objeto, fazendo com
que ele não saiba o que ocorre dentro de si (Caixa Preta) e dimi-
nuição dos custos e do tempo de desenvolvimento, associada a
facilidade de manutenção, tanto corretiva quanto evolutiva (MA-
FRA e TRAVASSOS, 2005).
Vale ressaltar que existe um grande numero de linguagens
de programação bem como uma vasta diversidade de paradigmas
para desenvolver um software, como por exemplo, paradigma
orientado a objeto, procedural, procedimental, aspectos, dentre
outros. No entanto, pelas vantagens já citadas, foi dado destaque
a POO por ser o mais difundido e por este auxiliar no desenvolvi-
mento de software de qualidade.
Uma vez implementado o produto/sistema, busca-se dar
início a etapa de testes. Essa etapa prima por detectar o maior
número de erros possíveis e essa detecção pode acontecer de di-
versas formas, conforme descrito na subseção 3.4

3.4. Testes
Uma vez implementado, agora é preciso testar o software.
Mas, para que servem os testes? Os testes, nada mais são que uma
das fases do processo de desenvolvimento que possibilita averi-
guar se o que foi implementado está em conformidade com o que
foi especificado.
Segundo Sommerville (2011), existem 3 categorias de teste
(caixa branca, caixa preta e caixa cinza) e cada uma delas, com
seus tipos de testes bem definidos. Vejamos o que cada uma dessas
categorias e os tipos de testes associados a elas permitem fazer:
O teste de caixa branca (ou teste de caixa de vidro), está
relacionado a estrutura do código. Procura garantir que todos os
caminhos independentes de um módulo, tenham sido exercita-
dos pelo menos uma vez. Exercita todas as decisões lógicas do
lado verdadeiro e falso, além de exercitar as estruturas de dados
internas para garantir sua validade. Como exemplo desse tipo de
teste, é possível citar o teste de unidade e o teste de integração,
conforme tabela 1.
Tabela 1: Testes Caixa Branca
Realizado em uma unidade ou componente para verificar sua
Teste de Unidade corretude.
Realizado pelo desenvolvedor que codificou o componente
Verifica se ao juntar vários componentes do sistema, se eles se
comunicam corretamente.
Teste de Integração A interface entre as unidades é testada
Realizado pelos desenvolvedores ou analistas de sistema para
testar um módulo do sistema.

Fonte: Os próprios autores

O teste caixa preta, também conhecido como teste com-


portamental, foca nos requisitos funcionais do software. Serve
como abordagem complementar aos testes caixa branca e tenta
encontrar erros de funções incorretas, interface, erros de compor-
tamento ou desempenho, além de erros relacionados a iniciação e
término da aplicação. Como exemplo desse tipo de teste, é possí-
vel citar os, testes de sistema, testes funcionais, testes de aceita-
ção e testes exploratórios, como apresentado na tabela 2.
Tabela 2 – Testes Caixa Preta
verificar se o sistema está em conformidade com a especificação
de requisitos
Realizado pelo testador, o qual tem acesso apenas a interface do
Testes de Sistema
sistema.
Os testes geralmente são baseados em roteiros de teste criados a
partir da especificação.
verificar se o sistema está em conformidade com os requisitos
esperados pelo cliente
Realizado pelo cliente ou pelo testador, desde que este possua um
Teste de Aceitação checklist feito pelo cliente do que é esperado que haja no sistema
Realizado no ambiente de homologação
O sistema é utilizado para capacitação dos usuários de forma que
eles validem todos os requisitos do sistema
Quando não há muita documentação sobre o sistema
Teste Exploratório Realizado por testadores com experiência
Os defeitos encontrados são reportados à medida que eles ocorrem

Fonte : Os próprios autores


Por fim, o teste de caixa cinza, que nada mais é que a
combinação do teste de caixa branca com o teste de caixa preta
ou seja, é possível avaliar as saídas (externas), tendo como con-
trapartida os processos internos que foram usados para ocasioná-
-las. Dessa forma, caso o programa apresente um erro durante o
processo de teste da interface (caixa preta), é possível encontrar a
causa do problema na parte interna (caixa branca). Como exem-
plo é possível citar o teste de regressão e o teste de cobertura,
conforme tabela 3.

Tabela 3: Testes Caixa Cinza


Realizar novamente testes em um sistema já testado
Teste de Regressão
Realizado pelo testador
Pode ser do tipo funcional ou estrutural
Estrutural: Tem a finalidade de identificar se os testes realizados
no sistema abrangem pelo menos 95% do código produzido
Teste de Cobertura
Funcional: Os roteiros de teste abrangem 100% das funciona-
lidades do sistema, ou seja, possui pelo menos 1 caso de teste
para cada regra de negócio.

Fonte: Os próprios autores.

Vale ressaltar, que os testes de software servem para aferir


a confiabilidade de um produto ou sistema, pois a medida que
poucos defeitos vão sendo encontrados em um determinado tem-
po, eles são considerados mais confiáveis. Portanto, lembrem-se
que os testes são realizados com a intenção de descobrir erros e
defeitos em um sistema, mas nunca a ausência deles.
3.5. Homologação e Implantação
A etapa de homologação pode ser considerada como uma
fase onde o cliente fará os testes sobre a aplicação contratada.
Para isso, necessita-se de uma infraestrutura que possibilite a exe-
cução dos testes pelo cliente.
Esse ambiente pode ser local (uma máquina com a apli-
cação) ou remota (disponibilização de uma URL (Uniform Re-
source Locator - Localizador Padrão de Recursos) a ser utilizada
para o acesso à aplicação). Entretanto, esse ambiente pode variar
muito conforme a plataforma da aplicação. Pode ser aplicativo
para desktops, para sistemas embarcados, para aplicações móveis
(tablets ou smartphones).
Após o teste pelo cliente, este deve relatar o que foi iden-
tificado de problema, e o que pode ser melhoria da aplicação. Só
após uma discussão ou negociação entre cliente e fornecedor é
que ocorrerá um possível aceite do cliente.
A etapa de implantação é responsável por descrever as ati-
vidades que garantem que o produto de software será disponibili-
zado a seus usuários finais.
Existem diversas maneiras de se implantar um produto,
tais como: uma instalação personalizada, entrega do produto de
forma compacta e acesso ao software por meio da Internet.
A implantação exige um planejamento, pois muitas vezes
os recursos computacionais necessários para o pleno funciona-
mento da aplicação são diferentes dos recursos utilizados nos am-
bientes de desenvolvimento e testes.
Além disso, muitas vezes é necessário um esforço de mi-
gração de dados, caso estes existam previamente, de sistemas
antigos ou de portabilidade entre tecnologias. Nesse caso deve
haver uma atenção especial para sistemas legados (sistemas onde
não há mais suporte, onde não há documentação, onde muitas
vezes foram desenvolvidos em plataformas e linguagens de pro-
gramação não mais existentes comercialmente).
Por fim, às vezes se faz necessário treinamento na aplica-
ção instalada e configurada, com a disponibilização de material
de instalação, configuração e operação.

4. RELACIONAMENTO DA ENGENHARIA DE
SOFTWARE COM OUTRAS ÁREAS
O desenvolvimento de aplicações ou sistemas, indepen-
dente da plataforma, é uma atividade que permeia diversas áreas.
Muitas dessas áreas são comuns a processos de desenvolvimento
de aplicações e sistemas, sendo muito importante a integração e
comunicação com profissionais diversos. Um exemplo são profis-
sionais de programação trabalhando em conjunto com profissio-
nais da área de design digital. Outras são diretamente relacionadas
à gestão, seja esta de projetos, de qualidade, ou de infraestruturas.
Considere a seguinte situação: um empresário que deseja
automatizar a operação da sua empresa, que atualmente ocorrem
manualmente (com papel, documentos impressos e muita depen-
dência de contato e transferência de material físico).
Para isso, ele entra em contato com uma startup que desen-
volve sistemas de automação empresarial. Após reuniões iniciais,
onde normalmente são discutidos aspectos contratuais e do escopo
do projeto e do produto, pode-se iniciar o desenvolvimento do pro-
jeto. Essa fase inicial envolve profissionais com perfil de analista
de sistema para elicitar e identificar requisitos da aplicação da em-
presa. Muitas vezes é necessário conhecer o funcionamento da em-
presa, e transcrever para o meio digital. Durante essa etapa, seja ela
realizada de uma vez só, ou em pequenas fases, se discute muitas
vezes como a interface gráfica do usuário. Esta atividade, muitas
vezes envolve profissionais com conhecimento em web design e
usabilidade. Nesse momento programação já está envolvida, pois
componentes e plataformas influenciam em como a interface gráfi-
ca será projetada. Muitas vezes diversas tecnologias são aplicadas
nesta camada de interface, como linguagens de programação (e.g.
HTML e JavaScript) e Cascading Style Sheets (CSS)).
Do lado do servidor, aspectos de redes de computadores
e sistemas distribuídos devem ser considerados. Imagine que a
aplicação da empresa seja acessada por vários usuários remo-
tos de maneira simultânea e por meio de diferentes dispositivos,
como telefones celulares, tablets e notebooks. Diversos aspectos
devem ser considerados, como segurança, tempo de resposta,
qualidade do serviço, influenciam diretamente no desempenho do
ambiente e consequentemente da aplicação. É fundamental que o
projeto e a programação web seja realizada com cuidado no lado
servidor, pois essa camada da aplicação não é vista pelo usuário,
mas ela é responsável pela ligação entre a interface do usuário e
o acesso aos dados. Por fim, o acesso aos dados muitas vezes é
realizado por meio de banco de dados, que normalmente estão
armazenados em servidores sem o acesso direto do usuário, mas
por meio da aplicação e seu projeto arquitetural, o que possibilita
um acesso de maneira transparente.

5. CONCLUSÃO
A Engenharia de Software surgiu com a perspectiva de
atender a necessidade de desenvolver, de modo rigoroso e sis-
temático, softwares ou sistemas de qualidade. Essa necessidade
surgiu por que a abordagem informal adotada antes do surgimen-
to da engenharia de softwares, além de apresentar custos maiores
que os previstos inicialmente, forneciam produtos/sistemas de
baixa confiabilidade, difícil manutenção e desempenho inferior
ao esperado.
Dessa forma, com o surgimento da Engenharia de Softwa-
re, todo o rigor da engenharia foi herdado e adotado para a produ-
ção de softwares ou sistemas. Com isso, passou-se a compreender
melhor as etapas envolvidas no desenvolvimento do mesmo. As
etapas foram dividias em 3 grandes fases, sendo elas a de espe-
cificação, desenvolvimento (projeto) somado a implementação e
por fim, a validação ou testes.
Ao mesmo tempo em que se adotava uma nova sistemá-
tica de desenvolvimento, a demanda na produção crescia vertigi-
nosamente, a ponto de se pensar em novos mecanismos que pre-
servassem o rigor da engenharia. Com isso, surge a UML como
forma de representação, através de seus gráficos, do produto ou
sistema a ser desenvolvido. Com ela, passou-se a contar com uma
série de diagramas que serviam para modelar o comportamento
do que se estava projetando.
Essa modelagem, servia também para que o desenvolve-
dor pudesse ter uma visão mais clara do que ele iria desenvolver,
prevenindo possíveis erros de implementação. Nessa perspectiva,
é possível entender melhor qual a importância da Engenharia de
Software e em especial para o curso de graduação Sistemas e Mí-
dias Digitais. Isto porque não seria possível desenvolver sistemas
multimídia com a qualidade que temos hoje se não tivéssemos o
conhecimento adquirido da Engenharia de Software no que con-
cerne a especificar, projetar, implementar, testar e homologar os
sistemas e mídias desenvolvidas.

REFERÊNCIAS
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Systems analysis and design: An object-oriented approach with
UML. John Wiley & Sons, 2015.
FILHO, Wilson de Pádua Paula. Multimídia - Conceitos e Apli-
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SOMMERVILLE, Ian; SAWYER, Pete. Requirements enginee-
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SOMMERVILLE, Ian. Software Engineering. Pearson, 2010.
SOMMERVILLE, Ian. Engenharia de Software. Pearson, 9a.
Edição. ISBN 9788579361081. 2011.
MITOLOGIA E
PSICOLOGIA COMO
FONTE DE INSPIRAÇÃO E
CRIATIVIDADE
Mitologia e Psicologia como Fonte de
Inspiração e Criatividade
Levi Bayde, Giancarlo S. T. Júnior

1. INTRODUÇÃO
A principal característica do curso de Sistemas e Mídias
Digitais é a interdisciplinaridade. Esse objetivo pedagógico,
nem um pouco simples de entender e alcançar, é o que media
toda a formação do aluno. Alguns tópicos de estudo, entretanto,
podem ser bem adaptados a essa forma de ensinar e aprender.
Por exemplo, a mitologia.
Ao falar de mitologia, a concepção natural seria a de um
conjunto de histórias antigas, contadas de geração a geração para
explicar o que a Ciência não conseguiria. Essa concepção, en-
tretanto, não poderia estar mais longe de sua real utilização para
estas civilizações. Eram usadas para tratar de muitos assuntos, do
que hoje chamaríamos histórico, pedagógico, psicológico, mate-
mático, dentre outros [Campbell 2005, Taboada 2001].
Assim, a mitologia sempre foi interdisciplinar. Dentro das
vertentes científicas que temos hoje, ela também pode ser aplica-
da e “aproveitada”. Como isso será possível? Como esses conhe-
cimentos dos antigos seriam possivelmente somados, de forma
prática, frente a toda a nossa ciência?
2. MITOLOGIA
Esta antiga tradição de todas as civilizações tem intrigado
e fascinado estudiosos pelo mundo inteiro. O que seria tão atraen-
te a ponto de levar um estudioso ao meio de desertos inóspitos,
florestas tropicais amedrontadoras ou até o fundo do mar para
descobrir mais uma estátua, símbolo ou artefato perdido?

2.1. O que é o mito e sua origem


Mitologia vem do grego, mythos + logos, ou seja, o co-
nhecimento ou saber dos mitos. O próprio mythos tem origem em
mutus, ou seja, silencioso. Assim, o mito fala através do que não
pode ser dito [Campbell 2005, Taboada 2001]. Por meio de uma
linguagem simbólica, eles transmitiram sua mensagem ao homem.
As civilizações antigas foram recheadas das chamadas
Escolas Esotéricas. Dentro do mundo grego, temos diversas delas
regidas pelos chamados Pré-Socráticos, como Demócrito, Anaxí-
menes, Anaximandro, dentre outros. Além disso, havia a Escola
Pitagórica, os Mistérios de Elêusis e os de Dionísio, além da Es-
cola Órfica. No Egito, havia os kaps, espécies de Universidades
de onde saíam os altos funcionários do governo, além das chama-
das Casas da Vida, onde os conhecimentos antigos eram resguar-
dados para serem vividos.
Qual sua característica mais marcante? O segredo que ha-
via em torno de seus ensinamentos. De todas as citadas, conhe-
cemos apenas seus restos, e a metade exotérica de seus conheci-
mentos. De todo o processo de iniciação dos Mistérios de Elêusis
[Brandão 2008], conhece-se somente alguns de seus passos, mas
quase nada do conteúdo que tinham dentro da Escola. Da Escola
Pitagórica ficou muito da base de nossa matemática trigonométrica,
mas quase nada da forma simbólica com que tratavam os números,
dada a destruição de seus documentos. Na organização druídica
[César 50 a.C.] acontecia o mesmo, e muito pouco restou de toda a
tradição celta, depois de sua sistemática destruição.
O que resta após a queda desses movimentos? O pouco que
era permitido sair dessas Escolas. Muito da tradição egípcia é um
mistério, assim como o método de construção das pirâmides ou sua
técnica exata de mumificação, mas o funcionamento de suas festas
e comemorações religiosas é conhecido. Além disto, as paredes de
seus templos estão cobertas das histórias dos Deuses, sua criação,
casamentos, filhos e aventuras. Da mesma forma, o que o povo
grego conheceu de seus mitos e Deuses, e passou à frente para as
gerações futuras, foi o que ficou escrito, seja por Homero, Hesíodo,
Ésquilo, ou qualquer outro romancista ou dramaturgo.
Assim, resta a parte dos ensinamentos que, por algum mo-
tivo, saíam de dentro dessas Escolas. No Egito, a parte celebrada
pelo povo, mas não o que acontecia dentro dos templos, com o
Faraó e seus mais altos funcionários. Na Grécia, como um exem-
plo, há o mito do minotauro, vindo da ilha de Creta, cujo desen-
volvimento fora muito anterior à Grécia Clássica, e cuja arte mais
se assemelha à Egípcia e do Oriente Médio que à grega em si.
Outro exemplo seria o mito de Orfeu, restante da Escola Órfica,
com a base de toda a tradição posterior.
Como somente resta pouca informação sobre estas tradi-
ções, é difícil traçar seus objetivos ou origens exatas. Ainda assim,
em muitas das maiores civilizações do mundo, os mitos fizeram
parte integrante do quotidiano, assim como da arte, ciência, política
e educação dos povos, tendo nos sacerdotes seus divulgadores.

2.2. O Símbolo
Tudo aparenta ter uma linguagem própria de expressão.
Se dividirmos o cérebro humano em 3 grandes áreas de entendi-
mento, filosofia, ciência e arte, cada uma delas tem uma lingua-
gem e formas específicas [Deleuze 1991]. Inclusive, cada uma
não é capaz de descrever a outra.
Os seres humanos comunicam-se através de linguagens.
A matemática é uma linguagem para entender o Universo e suas
leis. A física utiliza-se dela para isto. Já a química utiliza toda
uma linguagem própria para falar dos elementos. A arte difere-
-se em tantas linhas diferentes quanto as capacidades humanas de
expressão, com objetivos distintos. Da indicação de uma alma da
arte renascentista e clássica à descarada mostra moderna da reali-
dade, até a vertente abstrata com suas representações de ideias. A
filosofia não poderia ser diferente [Realle 2009], dada sua ampla
história e pensadores.
Os exemplos são incontáveis. Desenvolvemos linguagens
para falar dos aspectos humanos, e dos que vão para além do hu-
mano. Para dentro dele, ou para fora, para o Universo, desenvol-
vemos linguagens que permitam o entendimento e comunicação.
Hoje temos as necessidades próprias de nossa sociedade,
e os antigos tinham as deles. Para um espartano, havia a neces-
sidade de formar guerreiros para combater nas inumeráveis bata-
lhas. Assim, acaba por formar-se um padrão de vida. Os samurais
com sua honra, pela qual viviam e morriam, são um outro exem-
plo [Yamashiro 1913].
Como, então, os antigos ensinariam estes valores próprios
de sua civilização às gerações futuras? Que tipo de linguagem
seria apropriada para ensinar isso? Ou ainda, com suas mitologias
recheadas de Deuses, que muitas vezes entram em contato com
homens em suas histórias e contações, qual a linguagem pertinen-
te para tratar deste assunto?
Ao estudar os livros sagrados das religiões, pode-se ver
uma série de parábolas. Elas são histórias com um significado
oculto, algo a ser ensinado que não está necessariamente descrito
nas palavras. Fazemos o mesmo ao fazer uma analogia, ou seja,
an-logos, negação da palavra, traduzido literalmente. Isso signifi-
ca que algo é passado por trás, para além, das palavras.
Este é um tipo de linguagem ao qual não estamos acostu-
mados, simplesmente por ser incomum. É uma linguagem simbó-
lica, a qual os antigos utilizaram extensivamente em seus mitos.
Apesar disso, não nos é tão incomum na arte, por exemplo, cujo
objetivo é revelar mais do que simples pinceladas em uma tela.
2.3. O Mito
O mito, para a tradição das antigas civilizações, seria
simplesmente uma construção simbólica, em forma de narrativa.
Qual sua origem? As Escolas já citadas. Por exemplo, o que res-
tou hoje da mitologia do Antigo Egito são as gravações em estelas
de pedra, nas paredes dos templos e nos papiros em tumbas. Estas
gravações eram tradições antiquíssimas destas Escolas, passadas
de geração a geração, para formar Faraós e dar exemplo a todo o
povo. Para os gregos, havia a Paideia, formação dos jovens, que
utilizava os mitos heroicos como base [Jaeger 2013].
Assim, pode-se ver que eles possuem uma origem, uma
função e um objetivo específicos. Ao menos na tradição destas
civilizações, não eram somente “invenções de desocupados”, mas
uma construção consciente e com uma finalidade prática.
Além disso, era sua forma, sua linguagem, para tratar do
Universo. Por meio de uma visão positivista da evolução do ho-
mem e da sociedade, acabamos nos deparando com uma deprecia-
ção do aspecto mítico e das civilizações antigas como um todo. Se
realmente a sociedade evoluísse em uma linha contínua, o que ex-
plicaria a evidente decadência artística, social e política, filosófica e
científica experimentada durante a Idade Média [Huberman 2010]?
Com uma visão um pouco mais direta da história, na ver-
dade, como Cícero diria, ela evolui em uma espiral, e não como
uma forma direta. Cada civilização contribui para as próximas, se
bem aproveitada, mas há períodos de decadência, em que se per-
de conhecimento. Na Idade Média, perdeu-se o conhecimento da
esfericidade da Terra, de construção, higiene básica, astronomia,
matemática, dentre outros, todos presentes em Roma e resguarda-
dos entre os árabes, resgatados com as Cruzadas. Durante os pró-
prios grandes e longos impérios, como Roma ou Egito, existiram
épocas de declínio e ascensão internos, antes de sua queda final.
Tendo-se em vista esta possibilidade, o conhecimento
simbólico do mito seria uma prova de ignorância dos antigos,
em meio à arte grega, civilização romana, pirâmides e mumifi-
cação egípcias, dentre outras tantas significantes contribuições
ou mistérios destas civilizações? Ou seria uma evidência de uma
linguagem que hoje desconhecemos, como a língua pictográfica
das sociedades meso-americanas? De forma analógica, se hoje a
civilização acabasse, e sobrasse somente fórmulas químicas para
futuros arqueólogos, sem livros ou pessoas que as entendessem,
como iriam decifrá-las, sem entender sua linguagem oculta?

3. MITOS E A CRIATIVIDADE DENTRO DO SMD


De acordo com a etimologia das palavras, o termo criati-
vidade deriva do latim creare, que significa criar, inventar, fazer
algo novo. Pode ser o ato de descobrir ou pensar de uma forma
diferente do casual. Essa sempre foi uma característica importan-
te para diversos profissionais, independente se trabalham direta-
mente com criação ou não, por exemplo um programador quando
tem que buscar uma solução para um problema complexo ou o
mais comum, um designer quando precisa projetar para um clien-
te. Criatividade é intrinsecamente multidisciplinar, assim como o
nosso curso e assim como a mitologia.
3.1. Roteiro e Monomito
A roteirização talvez seja uma das áreas mais diretamente
influenciadas por estes aspectos. No Herói de Mil Faces [Cam-
pbell 2005] há alguns passos que seriam comuns nos mitos heroi-
cos, o chamado “Monomito”.
Posteriormente, Christopher Vogler (2006) montou a Jorna-
da do Herói (Figura 1). Baseado no Monomito, ele montou passos
comuns, seguindo uma sequência, para todos os heróis em suas
jornadas. Saindo da pessoa comum, passando por suas provas, vi-
tória e retorno com o elixir, este esquema pode ser visto em todo
mito heroico, e funciona tão bem que foi repetido à exaustão em
todo tipo de mídia. Apesar de ser um roteirista de cinema, o autor
expande este conceito para toda possibilidade de roteirização.
Assim, seja fazendo roteiros para filmes, livros, jogos ou
qualquer outra mídia, a mitologia terá uma grande influência.
Sendo esta uma das áreas do curso de Sistemas e Midias Digitais,
os mitos podem ser um aliado poderoso ao futuro roteirista.
Figura 01. Jornada do herói

3.2. Psicologia e criação do “novo”


É importante notar que a prática e o exercício do
pensamento são de fundamental importância para a criação e ino-
vação. Desenvolver e alimentar estes costumes nada mais é do
que exercitar a criatividade. Jung considerava a criatividade um
instinto humano, ou seja, ao trabalhar com criação, expõe-se o
que há dentro de si, retratando a sua psique de forma simbólica.
Resumindo, o processo de geração é a externalização do nosso
interior. É necessário, entretanto, um mínimo de conhecimento
sobre um assunto para poder criar e imaginar recursos.
O inconsciente coletivo, conceituado por Carl Gustav
Jung como a camada mais profunda da psique, contém os arquéti-
pos e imagens virtuais herdadas de nossos antepassados, comuns
a todos os seres humanos.
Tudo o que conhecemos a respeito do inconsciente
foi-nos transmitido pelo próprio consciente. A psi-
que inconsciente, cuja natureza é completamente
desconhecida, sempre se exprime através de ele-
mentos conscientes e em termos de consciência,
sendo esse o único elemento fornecedor de dados
para a nossa ação. [JUNG, 2008].

Isso pode explicar como povos sem contato algum teriam


gerado mitos diferentes, mas com significações simbólicas seme-
lhantes. Esse conceito, embasado pela Psicologia, pode sugerir que
o ser humano, ao tentar criar algo “novo”, pode obter resultados se-
melhantes ao de outras pessoas, mesmo sem nunca as ter conhecido.
Seguindo a abordagem da Psicologia, o behaviorismo cen-
tra na predição do comportamento humano e os processos criativos
tornam-se combinações mentais armazenadas por meio da expe-
riência vivida. Na Gestalt, a criatividade é uma busca por situações
que precisam de soluções. Sob o aspecto cognitivo, a criatividade
está relacionada à inteligência e à solução de problemas.
Relacionando novamente ao curso de Sistemas e Mídias
Digitais, é possível ver a clara aplicação deste conhecimento.
Como muitas áreas de aplicação tem necessidade da criativida-
de, os mitos podem ser uma excelência fonte para desenvolvê-la,
dando base para a criação do “novo”.

3.3. Semiótica e criatividade


Tratando do estudo dos símbolos, é importante ter conhe-
cimento da Semiótica, a ciência do estudo dos signos, e a semio-
se. Peirce (1992-1998 vol 2 página 13) define signo como “uma
coisa que serve para veicular conhecimento de uma outra coisa (o
objeto do signo), que ele representa. A ideia na mente que o signo
motiva, e que é um signo mental do mesmo objeto, é chamada
de interpretante do signo”. Em outras palavras, o signo é algo
que representa alguma coisa para alguém. São signos: “toda ima-
gem, diagrama, apontar de dedo, piscar de olhos, nó no lenço de
alguém, memória, sonho, desejo, conceito, indicação, token, sin-
toma, letra, número, palavra, sentença, capítulo, livro, biblioteca,
[...]” [Peirce 1992-1998 vol 2 página 326].
Assim, este é um conhecimento muito antigo que estuda
a forma como o homem percebe o mundo ao seu redor. Mais pro-
fundamente, é a ciência que estuda como o ser humano interpreta
a linguagem utilizando seus sentidos e quais reações são provo-
cadas [Eco 1976].
A semiologia evoluiu tanto que atualmente caminha lado
a lado com a linguística. Os campos de pesquisa atuais da Semió-
tica são variados e dentre eles estão os mitos. Assim, a mitologia
mostra-se presente mesmo em estudos atuais.
Um grande paralelo da Semiótica com a mitologia é a
necessidade própria do ser humano de conhecer o mundo a sua
volta. Sempre estamos querendo conhecer o que nos rodeia, bus-
cando explicações e soluções para problemas. Assim, as antigas
civilizações montavam seus mitos para tentar decifrar os aconte-
cimentos naturais, de forma simbólica.
Além disso, ao fazer uso de metáforas, podemos entender
o processo da tentativa da resolução de problemas. Os Oráculos,
metaforicamente, funcionavam como consultores criativos, pois
pessoas vinham de muito longe em busca de respostas para pro-
blemas e para saber do futuro.
Por fim, dada essa abordagem simbólica corroborada pela
Semiótica, é possível ver a mitologia como base em muitas cria-
ções de nossa sociedade. Seja nas lendas urbanas, na literatura
fantástica, nas histórias em quadrinhos ou nos jogos, entendê-la é
de fundamental importância para o aluno do curso de Sistemas e
Mídias Digitais.

3.4. Arquétipos e usabilidade


A usabilidade está relacionada com a facilidade de apren-
dizado e uso da interface, bem como a satisfação do usuário em
decorrência desse uso [Nielsen 1993].
Tradicionalmente, a usabilidade enfoca a maneira como o
uso de um sistema interativo no ambiente de trabalho é afetado por
características do usuário (sua cognição, além de suas capacidades
de agir sobre a interface e de perceber as respostas do sistema).
Com a disseminação dos sistemas computacionais interativos em
ambientes diferentes do trabalho, a usabilidade passou a englobar
também as emoções e os sentimentos dos usuários. Por vezes essa
qualidade relacionada com os sentimentos e emoções dos usuários
é denominada de experiência do usuário [Sharp 2007].
Para buscar essa qualidade na utilização é importante dar
atenção necessária ao público-alvo, muitas vezes idealizando-o.
Um método para tal é a criação de personas.
Personas são arquétipos, personagens fictícios concebidos
a partir de uma síntese do comportamento observado entre os con-
sumidores. Eles representam motivações, desejos, expectativas e
necessidades, reunindo as funcionalidades mais significativas de
um grupo abrangente [Vianna 2012].
Arquétipo é um termo que está presente tanto na Psicologia
quanto na mitologia. Jung usou o termo para referir-se a estruturas
constituintes da psique humana. Ele constatou que, além de elemen-
tos tipicamente ligados à psique, como os sonhos, os arquétipos do
inconsciente coletivo também se expressam através de narrativas,
destacando e estudando especialmente o mito e o conto de fada.
O mitólogo Joseph Campbell também levava em consi-
deração as definições junguianas, e para ele os arquétipos estão
presentes nos seres humanos assim como os órgãos em um corpo,
constituindo-o e trabalhando entre si.
Podemos assim sugerir a importância do estudo dos mitos,
assim como do estudo da Psicologia como base para conhecimen-
tos importantes em design, como design de experiência, e interação
humano-computador. Essas áreas são muito importantes para em-
basar o uso da criatividade na produção de recursos ou produtos.

4. CONCLUSÃO
A capacidade da mitologia e de suas aplicações diversas,
principalmente na Psicologia, de ser interdisciplinar, e de dar base
ao conhecimento, é notória. Dados todos os exemplos e análises
colocadas, é possível ver isto.
Assim, é possível notar a importância deste conhecimen-
to dentro do curso de Sistemas e Mídias Digitais. Além de ser
intrinsecamente interdisciplinar, dentro da proposta pedagógica
do curso, ainda está intimamente relacionada com diversos dos
conhecimentos adquiridos durante o decorrer das disciplinas.

REFERÊNCIAS
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JAEGER, W. (2013) Paideia, Martins Fontes, 6ª Edição
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Edições Nova Acrópole, 1ª Edição
VIANNA, M., VIANNA, Y., ADLER, I., LUCENA, B. E RUS-
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Edição
VOGLER, C. (2006) A Jornada do Escritor, Nova Fronteira, 2ª
Edição
YAMASHIRO, J. (1993) História dos Samurais, Ibrasa, 3ª Edição
NARRATIVAS
MULTIMÍDIA: ALGUNS
CONCEITOS
Narrativas Multimídia: Alguns Conceitos
Glaudiney Moreira Mendonça Junior, Georgia da Cruz Pereira
Sistemas e Mídias Digitais, Universidade Federal do Ceará

1. INTRODUÇÃO
A narrativa está presente em todos os tempos, em to-
dos os lugares, em todas as sociedades; a narrativa
começa com a própria história da humanidade; não
há em parte alguma, povo algum sem narrativa; todas
as classes, todos os grupos humanos têm suas narrati-
vas, e frequentemente estas narrativas são apreciadas
em comum por homens de culturas diferentes, e mes-
mo opostas [BARTHES et al., 2011; p.19].

Reconhecemos o mundo através de narrativas e a nossa


própria história de vida é uma narrativa em desenvolvimento. As
narrativas mitológicas são um exemplo de como o ser humano es-
trutura o sentido das coisas através das histórias. “O ser humano é
por natureza, ou por cultura, um contador de histórias. Contando
histórias, inventando tradições, ficcionalizando a vida, ele tenciona
dar sentido à sua passagem sobre a terra” (WINCK, 2007, p.15).
2. DEFINIÇÕES DE NARRATIVA
Definir narrativa parece algo sem sentido uma vez que a
maioria das pessoas reconhece-a instintivamente, porém, se ques-
tionada, não sabe responder de imediato o que significa. Podería-
mos definir narrativa como: “[...] um objeto real que o utilizador
ingênuo reconhece seguramente e não confunde nunca com aqui-
lo que não é” (METZ, 1968 p. 25-35). Porém, precisamos de algo
mais palpável para uma definição mais segura.
O dicionário define a narrativa como “exposição de um
acontecimento ou de uma série de acontecimentos mais ou
menos encadeados, reais ou imaginários, por meio de palavras
ou de imagens”.
Gaudreault e Jost (2009), enumeram um conjunto de carac-
terísticas utilizadas por Metz (1968) para reconhecer uma narrativa:
1. Tem um começo e um fim: nesse sentido a narrativa é
“fechada”, ou seja, algo é apresentado, desenvolve-se e finaliza,
mesmo que essa finalização não seja definitiva ou completa. A
narrativa sempre supõe um ponto inicial, obedece a uma ordem
de fatos e culmina em um desfecho.
2. É uma sequência com duas temporalidades: que são “o
tempo da coisa narrada” e “o tempo da narração propriamente
dita”. Deve-se distinguir o tempo cronológico onde os fatos da
narrativa ocorrem, do tempo que o observador utiliza (tempo de
leitura em um texto, tempo da visão para uma imagem).
3. É um discurso: “uma sequência de enunciados que
remete necessariamente a um sujeito da enunciação” (JAKOB-
SON, 1963). Esta noção permite contrapor a narrativa ao mundo
real, ou seja, enquanto o mundo existe por si, a narrativa supõe a
existência de um sujeito.
4. “Desrealiza” a coisa contada: toda narrativa não é real,
mesmo que se baseie em fatos reais. Assume a natureza irreal
uma vez que é percebida e contada por um sujeito que se influen-
cia pelo real, mas que não pode eximir-se de sua subjetividade.
5. É um conjunto de acontecimentos: sendo o aconteci-
mento sua unidade fundamental, a narrativa é composta de um
conjunto de acontecimentos, normalmente encadeados, que asse-
melham a narrativa a um enunciado, e que possibilita uma análise
estrutural.
Utilizando-se dessas características como base, Metz
(1968) define então narrativa como sendo “um discurso fechado
que desrealiza uma sequência temporal de acontecimentos”.
Block (2010), classifica a narrativa como um elemento
que compõe toda imagem, juntamente com os elementos visuais
e, algumas vezes, com os sons. Para ele, a narrativa é composta
de “partes fundamentais de trama, personagens e diálogos”.
Na área do audiovisual, Field (2009), define roteiro, mas
que podemos facilmente abstrair para narrativa, como sendo “uma
história contada por meio de imagens, diálogos e descrições, sem-
pre localizada no âmbito de uma estrutura dramática”.
Para Comparato (1995), o roteiro (que podemos gener-
alizar para a narrativa) deve possuir três aspectos fundamentais:
1. Logos: a palavra, o discurso. Uma narrativa é um dis-
curso e, por isso, possui uma estrutura verbal, normalmente retra-
tada através de palavras.
2. Pathos: o drama. A narrativa afeta as pessoas, ou seja,
traz questionamentos, coloca-as em situações que não seriam
possíveis no cotidiano, desperta emoções, dentre outros.
3. Ethos: a ética, a moral, o significado. Possui implica-
ções sociais, políticas, existenciais e anímicas. “[...] É aquilo que
se quer dizer, a razão pela qual se escreve”.
Barthes et al. (2011) falam da multiplicidade de formas,
temas e modos de narrativa com que temos contato:
Inumeráveis são as narrativas do mundo. Há, em
primeiro lugar, uma variedade prodigiosa de gêne-
ros, distribuídos entre substâncias diferentes, como
se toda matéria fosse boa para que o homem lhe con-
fiasse suas narrativas: a narrativa pode ser sustenta-
da pela linguagem articulada, oral ou escrita, pela
imagem, fixa ou móvel, pelo gesto ou pela mistura
ordenada de todas estas substâncias; está presente
no mito, na lenda, na fábula, no conto, na novela,
na epopeia, na história, na tragédia, no drama, na
comédia, na pantomima, na pintura (Recorde-se a
Santa Úrsula de Carpaccio), no vitral, no cinema,
nas histórias em quadrinhos, no fait divers, na con-
versação (BARTHES et al. 2011, p. 19).
Fazendo uma observação em todas essas definições, po-
demos apontar alguns elementos que definem comumente uma
narrativa:
1. É fechada (começo, meio e fim);
2.Tem personagens;
3. É uma sequência de acontecimentos;
4. Possui uma estrutura; e
5. Afeta as pessoas.
Talvez não seja suficiente para uma definição, mas pelo
menos caracteriza alguns elementos que observaremos durante
nosso capítulo.

3. ELEMENTOS DA NARRATIVA
Para o desenvolvimento de uma narrativa, alguns elemen-
tos são importantes destacar. Não existe uma ordem específica de
como trabalhar com esses elementos, cabendo a cada pessoa es-
colher a forma que melhor funciona. Na verdade, em toda a área
de narrativas não existem verdades universais. Todas as teorias
apresentadas aqui são tentativas de auxiliar o processo de criação
de uma narrativa.
3.1. Fio da história
Campos (2007) cita que, desde Aristóteles, era importante
que fosse ela real ou imaginada, a narrativa deveria primeiro ter
suas ideias básicas traçadas e define fio da história como “o per-
curso que um incidente ou uma sucessão de incidentes trança
dentro de uma massa da estória”, onde massa da estória é o mes-
mo que a história em si.
Para Field (2009, p.56), o fio da história é uma “progres-
são linear de incidentes ou episódios relacionados que culminam
em uma resolução dramática”. Pode-se então entender o fio da
história como os principais acontecimentos de uma narrativa, dis-
postos em uma linha temporal ou causal.
Alfred Hitchcock comenta:
Gosto de imaginar uma garota chegando em casa
satisfeita como o filme que acabou de ver, sua mãe
perguntando: ‘Sobre o que era o filme?’ e a garota
respondendo: ‘Era sobre uma mulher que etc. etc.
etc.’ Antes de filmar, você tem de ser capaz de narrar
a estória inteira de maneira clara e resumida, come-
ço, meio e fim. (CAMPOS, 2007, p. 95).

McKee (2013) define como jornada o que podemos consi-


derar o fio da história:
Para pior ou para melhor, um evento tira o equilíbrio
da vida de uma personagem, despertando nele o de-
sejo consciente e/ou inconsciente por aquilo que ele
sente que vai restaurar o equilíbrio, lançando-o em
uma Jornada por seu Objeto de Desejo contra força
do antagonismo (interna, pessoal, extrapessoal). Ele
pode ou não consegui-lo. Essa é a estória em uma
casca de noz. (MCKEE, 2013, p. 189)

Desde Aristóteles, a estrutura mais elementar de organizar


uma narrativa, e consequentemente o seu fio da história, é dividida
em três atos: apresentação, confrontação e resolução (Figura 01).
Figura 01: Divisão da narrativa em três atos.

Fonte: Field (2009, p. 55)

O primeiro ato: apresentação traz todos os elementos


necessários para apresentar a história e as personagens. É nesse
momento que é apresentada a premissa dramática, ou seja, so-
bre o que é a história. Devem-se elucidar todas as circunstân-
cias importantes que o público precisa conhecer para entender os
acontecimentos que virão. A mudança de um ato para outro ocorre
normalmente através de um ponto de virada, que é “qualquer in-
cidente, episódio ou evento que é introduzido na ação e que acaba
por mudar seu curso”. Ou seja, a mudança de ato também indica
a mudança de direção da história.
É no primeiro ato que ocorre o incidente instigante. Esse
é o primeiro grande evento da narrativa que desequilibra a vida do
protagonista da história. Esse evento deve instigar a curiosidade
do público e deve ocorrer o mais breve possível, desde que já
esteja bem desenvolvido. Segundo Field (2009), é a segunda cena
mais difícil de fazer em uma narrativa.
O segundo ato: confrontação é onde a história impedirá
o protagonista de satisfazer a sua necessidade dramática, ou
seja, “aquilo que ele quer ganhar, conseguir, alcançar, ou realizar
ao longo da história” (FIELD, 2009, p. 15). As personagens en-
frentarão obstáculos, farão inimigos, mas também obterão itens e
conquistarão aliados.
Próximo do ponto de virada deste ato é comum que ocor-
ra o evento de maior tensão da história, comumente chamado de
crise. Momento de decisão suprema e que revela o valor mais im-
portante da história e, na maioria das vezes, coloca o protagonista
em uma situação de vida ou morte.
Esse dilema confronta o protagonista, que, quan-
do face a face com as forças do antagonismo mais
poderosas e focadas de sua vida, deve tomar uma
decisão de fazer uma ou outra ação, em uma últi-
ma tentativa para alcançar seu Objeto de Desejo
(McKEE,2013 p. 289).
Logo após a crise, encontramos comumente o clímax: mo-
mento repleto de significado. Deve ser “puro”, claro e autoevidente:
Uma revolução nos valores, indo do positivo ao ne-
gativo ou do negativo ao positivo com ou sem ironia
– um valor mudado em sua carga máxima que é ab-
soluto e irreversível. O significado dessa mudança
mexe com o coração do público (McKEE 2013 p.
293).

Crise e clímax ocorrem normalmente próximos do ponto


de virada, nos minutos finais e na mesma cena.
O terceiro e último ato: resolução apresenta as consequ-
ências das ações das personagens. Normalmente é utilizado para
resolver subtramas e para o público respirar após todos os aconte-
cimentos da crise e do clímax.

3.2. Tema e Premissa


Quando pensamos numa narrativa, é importante pensar
sobre o que é aquela história. Dois aspectos que são norteadores
para tal são o tema e a premissa da narrativa. Definir qual o tema
da narrativa permite a quem a concebe pré-configurar estruturas,
elementos e cenas, características de seus personagens e desdo-
bramentos. Assim, o tema está relacionado com a ideia central da
narrativa. Para Robert McKee (2013), o tema tem a ver direta-
mente com o controle que se estabelece sobre os fatos da história.
Assim, é possível pensar no tema como uma espécie de invólucro
da narrativa, algo que abarca os elementos a partir de uma de-
terminada perspectiva. A premissa, por sua vez, está relacionada
para alguns autores com o problema sobre o qual trata a história
e como as situações dramáticas se arranjam para sua resolução.
Syd Field (2009) vai falar da premissa como sendo o elemento
de motiva e impulsiona a ação dramática, movendo a narrativa
para um desfecho. McKee (2013) enxerga a premissa como um
questionamento que permite que os fatos sejam apresentados e
que guiará a ações dentro da história. Qual seria o impacto para
a história se houvesse uma explosão nuclear? Como os persona-
gens de um romance reagem a uma traição?

3.2. Personagem
A personagem é a alma, o coração e o sistema nervoso da
história, ou seja, é a base essencial da narrativa. Muitos autores
começam a desenvolver uma narrativa por suas personagens, mas
isso não é uma regra. Porém, é importante que as personagens de
uma história sejam marcantes e que propiciem emoções no públi-
co e, para isso, é necessário que exista um reconhecimento e uma
identificação do público com as mesmas.
Field (2009) elenca quatro qualidades essenciais para uma
personagem:
• Necessidade dramática: objetivo, missão ou motivação;
• Ponto de vista: como a personagem vê ou olha para o
mundo, ou seja, no que acredita. Normalmente esse ponto de vista
é definido pelas experiências pessoais da personagem;
• Comportamento: a forma de agir e sentir que expressa
sua opinião. É uma decisão intelectual que pode ser passível de
julgamento.
• Mudança ou transformação: embora não seja necessária,
é sempre interessante observar as modificações, psicológicas ou
não, que a personagem passa durante a trama.
Segundo Field (2009), podemos dividir a especificação de
uma personagem em dois momentos: vida interior e vida exteri-
or. A vida interior define as experiências da personagem, desde o
nascimento até o presente, ou seja, até o início da narrativa. É na
vida interior que definimos a biografia da personagem e as quatro
qualidades essenciais.
A vida exterior representa os relacionamentos da vida da
personagem durante a narrativa. É dividida em três partes: vida
profissional, social e pessoal. A vida profissional diz respeito a
como a personagem interage com seu ambiente de trabalho. A
vida social define como a personagem interage com os amigos e a
família. E a vida pessoal diz respeito às características da person-
agem que ela guarda para si mesma e não revela ao mundo.
É recomendada a técnica de livre associação para elaborar
a ficha biográfica das personagens, ou seja, começar por um as-
pecto da personagem e deixar a mente criar novas perguntas livre-
mente, explorando vários aspectos da personagem sem pretensão
e englobar tudo. Quanto mais elaborar sua personagem, mais ela
ganhará vida própria na hora de escrever a narrativa, chegando ao
ponto de discordar do próprio autor.
4. GÊNEROS
Quando falamos sobre gêneros da narrativa, estamos fa-
lando em formas de categorizar a multiplicidade de histórias que
existem pelo mundo. Os gêneros não são unanimidades, uma vez
que são modelos de organização e indexação. Dessa forma, os gê-
neros variam de acordo com a percepção de quem cria o sistema
de categorias utilizado. Essas categorias podem ser atribuídas pelos
produtores da história ou por analistas que percebem determinadas
categorias comuns a diversas histórias. Como categorias ou mode-
los de classificação que são, os gêneros podem agrupar histórias
pelo seu modo de contar, pelo seu formato, pelo tipo de assunto de
que tratam. Acerca do tema, McKee (1997) aponta que:
Vários sistemas foram concebidos para classificar histórias
de acordo com seus elementos comuns, classificando-as por gêne-
ro. Não existem dois sistemas, no entanto, que tenham concorda-
do com quais elementos das histórias usar na classificação, e, por
conseguinte, não há dois tipos de classificação que concordem com
quantos são e quais são os tipos de gênero (McKEE, 1997, p. 79).
Ao longo da História, diversos autores dedicaram-se
à questão dos gêneros e sugeriram maneiras de compreender o
tema. Em A República, Platão (1965) trabalhava com a poesia e
trazia uma divisão dos gêneros entre miméticos, não-miméticos
e misto. Assim, tinha-se a comédia ou a tragédia como miméti-
cos, ou seja, representativos; a lírica como não-mimético e ba-
seada no verso e na narração; e a épica como um misto entre
comédia/tragédia e lírica.
Outro autor fundamental para a concepção que temos de
gêneros hoje é Aristóteles (2008), cuja classificação parte do tex-
to poético e trabalha com duas macro-categorias: o narrativo e o
dramático. Para ele, essa divisão levava em consideração a na-
tureza da apresentação da história para o público. Se essa história
fosse performada para a plateia ou mesmo contada em primei-
ra pessoa, com o narrador assumindo o lugar da ação, a história
era de cunho dramático. Se o narrador contasse a história como
um observador, essa história tinha um cunho narrativo. A partir
dessa divisão, são apresentadas ainda subcategorias como drama,
comédia, farsa, epopeia etc., cuja designação dependerá do modo
como as histórias são contadas e do tom, que varia entre positivo
e negativo, para um determinado tema.
Os conceitos de Platão e Aristóteles, com algumas alter-
ações e adaptações, tem norteado o modo como os gêneros da
narrativa são entendidos e trabalhados. Além disso, é importante
ressaltarmos as temáticas das histórias e suas estruturas como car-
acterizantes de gêneros da narrativa. Murray (2003), destaca a
similaridade entre diversas narrativas ao redor do mundo e como
isso tem sido pensado como um fator de analogia e uma categori-
zação temática.
Carl Jung levantou a hipótese de que essas similaridades
constituíam uma prova da existência de um inconsciente coletivo,
um conjunto de histórias - a jornada, a busca, o renascimento - e
de figuras arquetípicas - o herói, o malandro, a mãe terra - que,
juntas, definem o que é ser humano (MURRAY, 2003, p. 179).
Além desses “enredos mestres”, Murray (2003), é inter-
essante observar que ainda hoje os conceitos relativos à ação
dramática são bastante utilizados como caracterizadores do gêne-
ro, principalmente se pensarmos em produtos multimidiáticos
tais como filmes, novelas, livros, seriados televisivos, jogos etc.
McKee (1997), compila 25 gêneros tradicionalmente utilizados
pela indústria cinematográfica e suas variações, que se dão por
pequenas alterações de enredo ou mesclas. Para ele, os gêner-
os tem uma importância fundamental para informar à audiência
quais expectativas nutrir em torno daquele produto. Dessa forma,
na concepção do autor, o gênero não funciona apenas como um
indexador, mas como um norteador narrativo, cuja descrição in-
fluencia diretamente na fruição do produto.

5. ESTRUTURAS DA NARRATIVA
Diversos pesquisadores buscaram encontrar estruturas co-
muns para as narrativas. É bem verdade que as histórias possuem
um arcabouço de elementos que se repetem, independente do gê-
nero, tema ou premissa da narrativa.

5.1. MORFOLOGIA DO CONTO MARAVILHOSO


Um dos autores que buscou uma estrutura nos contos de fa-
das foi Vladimir Propp. Estruturalista russo, e um dos grandes nomes
da narratologia, Propp (2010) observou uma série de funções das
personagens que se repetem em todos os contos que analisou, com-
pondo 31 momentos comuns nos contos maravilhosos (Tabela 01).
Tabela 01: Funções das personagens

# Função Descrição
01 Afastamento Um dos membros da família sai de casa.
02 Proibição Impõe-se ao herói uma proibição.
03 Transgressão A proibição é transgredida.
04 Interrogatório O antagonista procura obter uma informação.
05 Informação O antagonista recebe informações sobre a vítima.
O antagonista tenta ludibriar sua vítima para apoderar-
06 Ardil
-se dela ou de seus bens.
A vítima se deixa enganar, ajudando assim, involunta-
07 Cumplicidade
riamente seu inimigo.
A antagonista causa dano ou prejuízo a um dos mem-
08 Dano
bros da família.
É divulgada a notícia do dano ou da carência, faz-se
09 Mediação um pedido ao herói ou lhe é dada uma ordem, man-
dam-no embora ou deixa-o ir.
10 Início da reação O herói-buscador aceita ou decide reagir.
11 Partida O herói deixa a casa.
O herói é submetido a uma prova que o prepara para
12 1ª Função do Doador
receber um meio ou um auxiliar mágico.
13 Reação do herói O herói reage diante das ações do futuro doador.
14 Fornecimento O meio mágico passa às mãos do herói.
Deslocamento entre dois O herói é levado ao lugar onde se encontra o objeto
15
reinos que procura.
O herói e seu antagonista de defrontam em combate
16 Combate
direto.
17 Marca O herói é marcado.
18 Vitória O antagonista é vencido.
19 Reparação de dano O dano inicial ou carência são reparados.
20 Regresso Regresso do herói.
21 Perseguição O herói sofre perseguição.
22 Salvamento O herói é salvo da perseguição.
23 Chegada incógnito O herói chega incógnito à sua casa ou a outro país.
24 Pretensões infundadas Um falso herói apresenta pretensões infundadas.
25 Tarefa difícil É proposta ao herói uma tarefa difícil.
26 Realização A tarefa é realizada.
27 Reconhecimento O herói é reconhecido.
28 Desmascaramento O falso herói ou antagonista é desmascarado.
29 Transfiguração O herói recebe nova aparência.
30 Castigo O inimigo é castigado.
31 Casamento O herói se casa e sobe ao trono.

Fonte: Propp (2010)


Além disso, especificou alguns papéis que as personagens
desempenham nas histórias (Tabela 02):
Tabela 02: Papéis das personagens

Papéis Descrição
Causa o dano;
Antagonista Enfrenta o herói em combate; e
Persegue o herói.

Submete o herói a provas; e


Doador
Transmite objeto mágico ao herói.

Transporta o herói para onde ele precisa ir;


Repara o dano ou carência;
Auxiliar Salva o herói quando o antagonista o persegue;
Soluciona as tarefas difíceis impostas ao herói; e
Altera a aparência do herói.

Impõe ao herói tarefas difíceis;


Dá ao herói uma marca ou objeto que servirá para identificá-lo mais
tarde;
Princesa
Desmascara o falso herói;
Reconhece o herói; e
Casa-se com o herói.

Mandante Envia o herói para sua missão.

Parte em viagem para realizar a busca;


Herói É colocado à prova pelo doador; e
Casa-se com a princesa.

Parte em viagem para realizar a busca;


Falso herói É colocado à prova pelo doador, mas falha: sua reação é negativa; e
Apresenta-se para receber o prêmio que caberia ao herói.

Fonte: Propp (2010)


5.2. Jornada do Herói
Inspirado no trabalho de Joseph Campbell, Vogler (2011),
apresenta uma estrutura comum nos mitos, sonhos e histórias de
todos os tempos. Chamada de Jornada do Herói, elenca um con-
junto de etapas que são basilares de todas as histórias. Camp-
bell analisou mitos de diversas culturas e sonhos de pacientes
psiquiátricos, e observou alguns elementos simbólicos comuns a
todas essas histórias.
Vogler (2011), afirma que essa estrutura não é para criar
clichês ou estereótipos, e que não é uma fórmula mágica de criar
sucessos. A Jornada do Herói apresenta uma estrutura arquetípica
que sintetiza as principais etapas de uma história. É uma estrutura
que o público espera por ela, mesmo que inconscientemente.
Figura 02: Estágios da Jornada do Herói

Fonte: Vogler (2011)


Sua utilização deve ser feita para auxiliar e analisar o pro-
cesso criativo e não interferir nele. Essa estrutura também utiliza
a divisão em três atos, dividindo cada ato em estágios, no total de
doze (Tabela 03).
Tabela 03: Os doze estágios da jornada do herói

Ato # Estágio Características

Apresenta o cotidiano e os problemas


do herói;
01 Mundo Comum
Serve para criar contraste com o mun-
do especial.

Insere um problema, desafio ou aven-


tura a empreender;
02 Chamado à Aventura
Impede o herói de permanecer no
mundo comum;
I
Evidencia a hesitação e o medo do
herói perante a aventura;
03 Recusa do Chamado
Serve para mostrar os perigos da aven-
tura.

Encontro com o Orienta o herói para o caminho cor-


04
Mentor reto.

Insere o herói no mundo especial;


05 Travessia do 1º Limiar Faz o herói partir para a ação e enfrentar o pro-
blema.
Ato # Estágio Características

Apresenta aliados do herói;


Testes, Aliados e
06 Testa a determinação do herói;
Inimigos
Apresenta inimigos.

Realiza todos os preparativos para


Aproximação da Ca-
07 entrar no local mais ameaçador do
verna Oculta
mundo especial.

Confronta o herói com seu maior


II medo;
Coloca o herói em um dilema de vida
08 Provação
e morte;
Determina um momento crítico na
história.

Celebra a vitória do herói;


09 Recompensa Conquista elementos importantes para a conti-
nuação da história.

Apresenta as consequências da Pro-


vação;
10 Caminho de Volta
Determina um momento de fuga ou
perseguição.
III Caracteriza um segundo momento crí-
11 Ressurreição
tico na história.

Permite o regresso do herói com uma


12 Retorno com o Elixir
lição aprendida.

Fonte: Vogler (2011).


Além da estrutura em si, Vogler (2011) apresenta um con-
junto de arquétipos de personagens que comumente aparecem nas
histórias (Tabela 04). Os arquétipos, segundo Jung, são funções
humanas típicas e, na Jornada do Herói, representam funções que
as personagens realizam em determinado momento da história.
O uso desses arquétipos tornam as personagens mais humanas e,
consequentemente, mais críveis.

Tabela 04: Arquétipos da Jornada do Herói

Arquétipo Descrição

Serve para o público identificar-se com ele e com a história;


Herói É passível de um crescimento durante a história; e
É responsável pelo desenvolvimento da ação.

Apresenta a aventura ao herói; e


Arauto
Aparece normalmente no Chamado à Aventura.

Ajuda, treina, protege, motiva e dá itens ao herói; e


Mentor
Aparece normalmente no Encontro com o Mentor.

Bloqueia temporariamente o caminho;


Guardião do Limiar Testa a determinação do herói;
Aparece normalmente (mas não somente) na Passagem do 1º Limiar.

Traz dúvidas e suspense para a história e para o herói; e


Camaleão
Pode induzir o herói ao erro.

Opõe-se e desafia o herói; e


Sombra
Representa geralmente o grande desafio a ser superado na Provação.

Traz alívio cômico para a história;


Pícaro
Traz relaxamento e distração para o herói.

Fonte: Vogler (2011).


5.2. Jornada do Louco
Baseada nos arcanos maiores do tarô, essa estrutura apre-
senta a carta 0, O Louco, como o herói de uma jornada onde, pas-
sando por cada um dos demais arcanos maiores, aprende e desen-
volve-se (SHARMAN-BURKE, 2012). O tarô é um oráculo div-
inatório cujo nascimento não é possível precisar. Alguns autores
supõem que sua origem remonta do Egito, China, Índia ou Grécia.
Possui 78 cartas, sendo 22 cartas chamadas Arcanos Maiores e
as demais divididas em quatro naipes (copas, paus, espadas e ou-
ros) com 14 cartas em cada, dez cartas numeradas e quatro cartas
chamadas “cartas de corte”: pajem, cavaleiro, rainha e rei.
Sharman-Burke (2012), divide os 22 arcanos maiores em
três atos: infância e juventude do Louco; encontro do Louco com
o mundo exterior; e conquista triunfante.
No Ato I, infância e juventude do Louco, o herói tem seu
momento de educação com a carta do Mago, adquire a sabedoria
de seus pais mortais, a Imperatriz e o Imperador, e de seus pais di-
vinos, a Sacerdotisa e o Hierofante, e, no final, enfrenta conflitos
e toma decisões com as cartas do Carro e dos Enamorados.
No Ato II, encontro do Louco com o mundo exteri-
or, aprende as quatro lições morais com as cartas Temperança,
Justiça, Força e Eremita. Depois desse aprendizado no mundo
exterior, volta-se para dentro de si através da Roda da Fortuna e
começa sua descida interior com o Enforcado.
No Ato III, conquista triunfante, passa pelo momento de
morte simbólica do antigo eu, com as cartas Morte, Diabo e Torre;
e a ressurreição do novo eu, com as cartas Estrela, Sol, Lua, Jul-
gamento e Mundo.
É um processo de aprendizado, queda e ascensão, onde cada
carta contribui simbolicamente com o desenvolvimento do herói.

6. Storytelling Transmídia
O ato de contar histórias não é novidade, como vimos até
aqui, mas quando falamos de storytelling, especificamente, esta-
mos nos referindo a técnicas e métodos aos quais se recorre para
que a prática de se contar uma história possa ser utilizada para
finalidades específicas tais como a criação de propagandas, jogos,
palestras, experiências sensoriais em espaços artísticos etc. Com a
internet e todos os avanços em termos de convergência midiática,
é possível observar que há um interesse crescente pelo universo
das narrativas, seus apelos, suas possibilidades. Isso porque, cada
vez mais, existe uma necessidade de envolver o público, gerar
interesses e explorar as particularidades de criação de conteúdo
que cada mídia oferece.
Para Henry Jenkins (2009), aquilo a que chamamos con-
vergência está relacionado
Ao fluxo de conteúdos através de múltiplas plataformas
de mídia, à cooperação entre múltiplos mercados midiáticos e ao
comportamento migratório dos públicos dos meios de comunica-
ção, que vão a quase qualquer parte em busca das experiências
de entretenimento que desejam. Convergência é uma palavra que
consegue definir transformações tecnológicas, mercadológicas,
culturais e sociais, dependendo de quem está falando e do que
imaginam estar falando (JENKINS, 2009, p. 29).
Ao falar de convergência, das possibilidades que as
junções de meios e tecnologias proporcionam, outro fenômeno
vem à tona: a transmidiação. Ela diz respeito a conteúdos e pro-
dutos que são multiplataforma e trabalham de maneira autônoma
e complementar entre si (JENKINS, 2009). Quando se pensa em
conteúdo transmídia, se pensa numa experiência diversificada
para os usuários, que vai sendo ampliada e/ou modificada à me-
dida que ele vai tendo acesso a diferentes produtos relacionados a
um mesmo tema. Importante observar a diferença entre produtos
considerados transmídia e crossmídia (JENKINS, 2009).
Crossmídia: como o próprio nome sugere, tem a ver com
o cruzamento entre mídias e diz respeito a conteúdos que são pro-
duzidos e distribuídos em múltiplas mídias e podem se sobrepor.
Como exemplo podemos citar os anúncios publicitários para tele-
visão cujos áudios são aproveitados para o rádio.
Transmídia: são produtos multimidiáticos que funcionam de
forma autônoma e complementar. O seu consumo pode ser deslin-
earizado, dependendo do modo como o usuário se apropria daquele
conteúdo e se relaciona com aquela mídia. Esse tipo de estratégia
tem sido adotado com muito sucesso por séries televisivas, que uti-
lizam de sites de redes sociais e aplicativos para expandir os uni-
versos narrativos da série e ampliar a experiência das audiências.
Storytelling transmídia ou narrativa transmidiática é, então,
a prática narrativa de conteúdos e estratégias para múltiplas plata-
formas, cujo consumo será determinado mais pelo comportamento
do usuário do que pelos desenvolvedores. Sua organização também
orbita em torno de alguns princípios básicos que permitem um flu-
xo mais dinâmico às narrativas emergentes dessa estratégia.
Como em qualquer narrativa, é preciso que se tenha um
ponto de partida para a construção do material. Aqui, esse ponto
de partida se dá pela construção de um universo que possa ser
explorado por mais de uma plataforma midiática, para uma diver-
sidade de públicos. Construir um universo complexo, rico e pas-
sível de ser narrativamente explorado permite que mais conteúdo
seja desenvolvido, que se mantenha uma coerência entre esses
conteúdos e outras facetas possam ser trabalhadas. Ao se criar um
universo, pensa-se em personagens, tempo e espaço narrativos,
estruturas narrativas, dentre outras características narrativas que
já abordamos aqui.
Mais comumente, histórias transmídia são baseadas não
em um personagem individual ou em plots específicos, mas em
universos ficcionais muito mais complexos que podem susten-
tar múltiplos personagens interrelacionados e suas histórias. Esse
processo de construção de universo encoraja um impulso enciclo-
pédico tanto nos leitores quanto nos escritores. Nós somos leva-
dos a querer dominar tudo que pode ser sabido sobre o universo
que está sempre em expansão além do nosso alcance. Esse é um
prazer bastante distinto daquele que associamos aos fechamentos
comumente encontrados na maioria das narrativas classicamente
construídas, para as quais nós esperamos deixar o teatro sabendo
tudo que é necessário para que uma história específica faça senti-
do (JENKINS, 2007).
Quando trabalhamos com a multiplicidade de um univer-
so narrativo, é possível planejar em quais mídias determinados
conteúdos serão veiculados e quais os propósitos. Essa distribui-
ção deve observar as características de cada uma das mídias a se-
rem exploradas, o diferencial entre elas e suas contribuições para
o todo do universo criado. Quais tipos de conteúdos dentro do
meu universo se adéquam mais a livros? Quais parecem ter mais
potencial para serem trabalhados em vídeos curtíssimos? Quais
os públicos visados?
Essas são apenas algumas perguntas que podem nortear
um planejamento de distribuição de conteúdo multiplataforma.
Um ponto importante a ser ressaltado aqui é que a dispersão de
conteúdos e sua complementaridade não podem afetar a autono-
mia de compreensão de uma mídia isolada, uma vez que é pre-
ciso imaginar um cenário em que usuários só tenham acesso ou
interesse por mídias específicas, o que não deve ser passível de
prejuízo à sua fruição daquela narrativa. Isso se deve ao fato de
que essas construções e associações multimídias em torno de um
universo narrativo permitem um design de experiência, além de
num modelo mais contemporâneo estimularem a retroalimen-
tação do sistema a partir de produções de fãs. Exemplo disso é
o site Pottermore, criado pela própria autora da saga de Harry
Potter, J.K. Rowling, e cujo propósito principal está em conectar
fãs da série, fornecer detalhes não-presentes nas obras originais
e permitir a criação e compartilhamento de fanfictions (narrativas
criadas pelos fãs).

8. NARRATIVAS NÃO-LINEARES
A maioria das mídias possui uma estrutura linear para a
narrativa, porém, atualmente, algumas mídias interativas, como
vídeos interativos, quadrinhos interativos e jogos, necessitam de
narrativas que possuem pontos de bifurcação, onde as escolhas do
espectador interfere em sua direção.
Esses dois elementos, interação e narrativa, parecem ser
difíceis de interagir. Bob Bates diz que “narrativa e jogabilidade
são como azeite e vinagre. Teoricamente, não se misturam, mas,
se você colocá-los em um frasco e agitá-los bastante, são muito
bons em uma salada” (SCHELL, 2010, p. 262).
Embora a narrativa não-linear seja mais desafiadora, pois
é necessário incorporar as possibilidades de intenção do utiliza-
dor, ela não é muito diferente da narrativa tradicional.
Atualmente existem duas maneiras comuns de se inserir
narrativa em elementos interativos. O primeiro é chamado por
Schell (2010), de “colar de pérolas”, onde a narrativa é dividida
em várias partes e o usuário precisa ultrapassar as partes inte-
rativas do objeto em questão para ver a sequência da história.
Este método é criticado por não ser realmente interativo, porém, é
bastante apreciado pelos utilizadores, sendo bastante famoso em
franquias de jogos como God of War e Final Fantasy.
A segunda maneira de inserir narrativa em produtos inte-
rativos é apresentada por Schel (2010) como “máquina de criar
histórias”, onde a interação com os elementos disponíveis pos-
sibilita a criação de histórias por seus utilizadores. As narrativas
não são pensadas previamente, sendo desenvolvidas à medida
que os usuários interagem. Nos jogos, chamamos de Sandbox, ou
seja, uma “caixa de areia” onde o jogador utiliza da maneira que
quiser, criando seu próprio percurso narrativo. Exemplos de jogos
que utiliza esse método: The Sims, Grand Theft Auto e Minecraft.
Esses dois métodos são bastante opostos e parece que
poderia existir algo no meio, ou seja, um produto interativo que
tenha uma narrativa que se adapta às ações dos usuários, possibi-
litando diversidade e uma história bem elaborada. Porém, existem
alguns problemas que precisam ser levados em consideração:
Boas histórias têm unidade. Existe uma conexão entre o
início e o fim de uma história, então, como colocar escolhas sig-
nificativas que levem a finais diferentes que estejam conectados
com o início de maneira significativa? A maioria das ramificações
tende a ser fraca e desconectada.
Explosão combinatória. Muitas decisões significativas na
história criam muitas possibilidades, ocasionando um grande es-
forço para desenvolver todas as partes de forma consistente. A
solução mais utilizada é fundir opções, fazendo com que cami-
nhos diferentes levem ao mesmo final. Porém, muitos usuários
sentem-se enganados quando diferentes decisões culminam no
mesmo resultado.
Múltiplos finais podem decepcionar. Ao chegar a um final
possível da narrativa, muitos usuários se questionam se é o “ver-
dadeiro” final, causando uma sensação de insatisfação. Outra de-
cepção é ter que experimentar o produto inteiro novamente para
poder visualizar outro final.
Número insuficiente de ações. As personagens de filmes
fazem coisas diferentes das que fazem parte de um produto inte-
rativo. Enquanto em uma, as personagens conversam, perguntam,
negociam, convencem, argumentam, entre outros; na outra, as
personagens correm, atiram, pulam, escalam etc.
Abrir mão da inevitabilidade. Muitas das histórias que
emocionam, possuem eventos inevitáveis pelos quais as perso-
nagens passam e que nos conecta com elas. Nos produtos intera-
tivos, não pode existir essa inevitabilidade, ou, quando existe, os
usuários sentem-se culpados por isso, querendo evitar de qual-
quer forma o ocorrido.
No entanto, mesmo com todos esses problemas, é pos-
sível idealizar produtos interativos com narrativas não-lineares.
Seguem algumas dicas que Schell (2010) fornece para se criar
boas histórias:
Desenvolva personagens com um objetivo interessante,
que passará por obstáculos para realizá-lo e que enfrentará con-
flitos grandiosos. O objetivo da personagem será o objetivo do
usuário e a força motriz que manterá o movimento da narrativa.
Se puder encontrar um meio de transformar os desafios
do jogo em obstáculos significativos, dramáticos, para a persona-
gem principal, a história e a estrutura do seu jogo se fundirão, o
que será bem útil para fazer o jogador se sentir parte da história
(SCHELL, 2010, p. 271).
Forneça simplicidade, pois o mundo deve ser mais simples
que o mundo real, porém, com um toque de transcendência, onde
o usuário é mais poderoso.
Considere a jornada do herói. Usar os estágios da jornada
do herói para estabelecer os momentos de decisão significativa é
uma ótima prática. Claro que ele é apenas uma estrutura que pode
ser usada para detectar problemas na história, como comenta Bob
Bates:
A “Jornada do Herói” não é uma caixa de ferramentas que
você pode usar para corrigir todos os problemas da história. Mas
é um pouco semelhante a um testador de circuito. Você pode co-
nectar o fio a uma área problemática na história e verificar se há
uma corrente mítica fluindo. E se não houver corrente elétrica
suficiente, o dispositivo pode ajudar a apontar a origem do pro-
blema. (SCHELL, 2010, p. 274).
Coloque sua história em ação. Não tenha medo de alterar
a história em prol da interatividade, pois mudanças na narrativa
muitas vezes são mais simples e podem torná-la mais poderosa.
Torne seu mundo acessível. Muitas vezes é necessário
inserir elementos que não sejam fisicamente corretos, mas que
sejam mais fáceis de acreditar e mais interessantes. E elementos
que sejam estranhos ao usuário devem receber atenção especial,
apresentando-os de maneira consistente para que o usuário se fa-
miliarize com eles.
Use clichês de maneira prudente, pois já são conhecidos
pelos usuários, porém o que é conhecido é mais compreensível e
acessível. O ideal é combinar elementos familiares com aspectos
originais.
Desenhe. Muitas histórias interessantes surgiram de um
desenho inicial onde nos força a imaginar o que poderia acon-
tecer naquele mundo desenhado ou com aquele personagem que
surge no papel. Os desenhos são uma ótima fonte de inspiração
para boas histórias.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Muito ainda pode ser dito sobre esse vasto campo de atu-
ação e de pesquisa, porém, uma hora temos que parar para assi-
milar o que foi discutido. Esperamos que esta pequena introdução
seja um incentivo para o leitor conhecer mais sobre a elaboração
de narrativas e suas aplicações. O mais importante é deixar a cria-
tividade expressar-se e trabalhar seriamente com o refinamento
das ideias ao ponto de transformar os rabiscos em uma história
poderosa, unificadora e ressonante no coração do público. E, in-
dependente do produto desenvolvido, a narrativa cria um univer-
so que precisa ser consistente, encantador e poderoso suficiente
para levar o público a uma experiência enriquecedora e única.
Agora é só pegar a caneta e criar mundos!

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de Mestrado. Pós-Graduação em Letras. Universidade Federal do
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TECNODOCÊNCIA
E ANIMAÇÃO DIGITAL:
INTERDISCIPLINARIDADE
NA FORMAÇÃO DE
PROFISSIONAIS DE
MÍDIAS DIGITAIS
Tecnodocência e Animação Digital:
Interdisciplinaridade na Formação de
Profissionais de Mídias Digitais
Luciana de Lima, Robson Carlos Loureiro, Neil Rezende

1. INTRODUÇÃO
O objetivo deste capítulo é apresentar conceitos e expe-
riências práticas vinculadas à integração entre Tecnodocência e
Animação Digital na formação de profissionais de Mídias Digi-
tais. A Animação Digital contribui de forma efetiva na difusão do
cinema e dos jogos digitais. Torna-se útil para o estudo interdis-
ciplinar de conceitos teóricos e experiências práticas da docência.
Assim, animações são utilizadas para apresentação de conteúdos
pelo professor, distanciando-os da utilização da tecnologia digi-
tal para produção de conhecimento. A Tecnodocência contribui
para a formação dos profissionais de Mídias Digitais ao propor
a sistematização de conceitos teóricos e práticos da docência na
busca pela integração entre tecnologia digital, animação, ensino,
aprendizagem e avaliação.
Na Universidade Federal do Ceará (UFC), a experiência pi-
loto com docentes do curso de Sistemas e Mídias Digitais (SMD)
e alunos de Ensino Médio de escola pública, no desenvolvimento
de animações em tablets para a compreensão de conceitos mate-
máticos, revelou que a integração entre Tecnodocência e Animação
contribui para o aprofundamento de conceitos e técnicas de ambas
as áreas, gerando engajamento e significado por parte de professo-
res e estudantes. Proporciona também a reflexão sobre a formação
em instâncias superiores e a inserção desses profissionais como
parceiros dos professores no âmbito escolar mediante o desenvol-
vimento de um trabalho docente interdisciplinar.

2. O QUE É ANIMAÇÃO DIGITAL


O conceito de Animação refere-se ao propósito de dar vida
a objetos e coisas inanimadas. Mais do que simplesmente mover
um objeto ou personagem, é fazer crer que ele tenha vida. Várias
técnicas foram desenvolvidas em décadas e décadas de produção
e experimentação para se chegar a este objetivo. Inicialmente, es-
tas animações eram criadas em papel, depois em película, e final-
mente em suportes digitais.
Os dois primeiros processos (papel e película) são con-
siderados efetivamente como processos de animação analógica.
Animação analógica diferencia-se de animação digital pelo fato
de não envolver qualquer meio digital, o que é bastante raro atu-
almente. Criar animações em película, ou seja, por meio de filma-
gem usando câmeras analógicas, torna-se um processo caro e até
mesmo ineficiente em termos de qualidade e velocidade de cons-
trução. Com o advento dos computadores e das câmeras digitais,
praticamente nenhuma animação é criada sem o uso de recursos
digitais (CHONG, 2011).
Animações 2D, por exemplo, podem ser ainda desenhadas
em papel, mas em seguida são digitalizadas e finalizadas em com-
putador. A corrente atual é a de estúdios de animação que utilizam
ferramentas que permitem o desenho direto no computador, com
hardware e software específicos.
Mesas digitalizadoras permitem que o desenhista e o ani-
mador desenhem sobre ela com uma caneta especial, e seu traço é
enviado para a tela. Programas voltados para a animação constro-
em camadas de efeitos e movimentos, organizados digitalmente,
semelhantes aos processos antigos. Neste caso, em que a anima-
ção é construída diretamente no computador, mesmo usando ape-
nas duas dimensões, substituindo o papel, o processo é totalmen-
te digital, embora seja animação 2D. Várias outras ferramentas
foram implementadas até então, como esqueletos de base, que
permitem a interpolação dos movimentos de personagens sem a
necessidade de desenhar muitos quadros entre desenhos-chave,
por exemplo (GRAÇA, 2012).
Na animação 3D, todo o processo é feito diretamente no
computador. Mesmo usando fotografias como base para texturas
digitais, ainda assim, tem-se o uso de fotografias digitais. Costu-
mava-se chamar de animação digital apenas a animação 3D. Mas
o conceito de animação digital hoje é bastante amplo. Mesmo
técnicas de Stop-Motion, onde bonecos de verdade são criados
e movimentados quadro a quadro, prescindem de máquinas di-
gitais e são compostos e editados em ilhas de edição digitais. Na
técnica de Stop-Motion, também conhecida vulgarmente como
“Animação de Massinha”, bonecos são criados a partir de massa
de modelar, com um esqueleto de metal por baixo, para facilitar
a movimentação. Quando o boneco está pronto, o que resta é co-
locá-lo em determinada pose, tirar uma foto, depois reposicionar,
tirar outra foto, e assim por diante. Quando todas as fotos (ou
quadros da animação) estão criadas, é só juntar numa ilha de edi-
ção ou programa especial (PURVES, 2010). Na verdade, a massa
que é utilizada, por questões de eficiência, é bem mais difícil de
encontrar que a massa de modelar convencional.
Em 3D, a construção de cenários, personagens e objetos é
feita a partir de superfícies poligonais em três dimensões. O pro-
cesso tem início na criação do universo em si. Os personagens são
geralmente as construções mais complexas. Cada personagem é
modelado no universo tridimensional digital, usando apenas a
tela do computador (que é bidimensional), para depois ganhar
materiais e texturas. Em seguida, um esqueleto base é construído
com o auxílio de controladores, para não mostrar a complexa es-
trutura por baixo da movimentação 3D. Finalmente, ele é ligado a
essa malha que forma o personagem em si, e os controladores são
usados para dar a movimentação final (GRAÇA, 2012).
Mais do que a construção, a animação em si requer tempo
e dedicação, muitas vezes à pesquisa dos movimentos reais, an-
tes mesmo de se começar a animar. Animação digital é uma arte,
que envolve muita tecnologia e conhecimentos específicos, como
desenho, pintura, modelagem, estudos de movimento, anatomia,
entre outros. Dentro da construção de um filme de animação, são
exigidos muitos profissionais com experiência no assunto.
A grande novidade é que esta nova tecnologia de anima-
ção digital está mais aberta, permite que se possa construir ani-
mações simples e funcionais em menos tempo que antes, muitas
vezes a um custo quase zero. Isso permite que um professor pos-
sa desenvolver com seus alunos animações simples e efetivas
para a compreensão de diversos assuntos, e ainda proporcionar
ludicidade e divertimento. Em um processo de desenvolvimen-
to de animação, o trabalho com a criatividade e a construção
de uma arte, o desenvolvimento de roteiros colaborativos, onde
as ideias são discutidas e trabalhadas em equipe, fazem com
que cada assunto possa ser aprofundado e discutido de forma
divertida, quase em tom de brincadeira, mas onde o resultado
final pode ser visto em vídeo sempre que se desejar e ainda ser
mostrado em outras instâncias.

3. O QUE É TECNODOCÊNCIA
Para se compreender o que significa Tecnodocência, é
importante entender que o docente é um sujeito que amplia, di-
vulga e sistematiza as possibilidades de conhecimentos sobre a
própria sociedade em que ele mesmo e os alunos estão inseridos.
Por isso, o docente é aquele profissional que vai consolidar uma
continuidade do saber, na maior parte das vezes cientificamente
aceito. Contudo, é importante salientar que em razão da peculia-
ridade da profissão de docente, existe grande possibilidade deste
profissional atuar como um reprodutor de relações de dominação,
disciplinamento e controle das mentes em formação.
Assim, o docente que atua por meio de uma instituição de
ensino, de qualquer nível, pode ser considerado como um mode-
lador dos sujeitos, tanto no sentido dos conhecimentos mais ra-
cionais como das subjetividades, o que em geral traduz modelos
fortemente influenciados por políticas de dominação e disciplina-
mento. Essas incumbências e peculiaridades da ação do professor
docente detêm o poder de estimular ou mobilizar para uma for-
mação acrítica ou mesmo crítico-reprodutivista.
Por outro lado, o docente também é aquele profissional,
que tem em seu escopo de trabalho a possibilidade de auxiliar na
construção de resistências, subversões das ideias dominantes e da
possibilidade de estimular a busca por novas formas de saber e de
fazer na sociedade. Tem a possibilidade de estimular a formação
mais crítica e consciente do sujeito, como resistência ao domínio
de tradições políticas defasadas.
Do ponto de vista da tecnologia, compreende-se que se
trata de um campo de saber que tem contribuído para a trans-
formação humana desde os primórdios da civilização. O homem
contemporâneo está imbricado na tecnologia por ele mesmo de-
senvolvida. Essa vinculação das transformações humanas com a
tecnologia não é um evento que se verifica em toda a sociedade
de forma hegemônica, mas essa tendência existe em razão da am-
pliação das dependências dos artefatos tecnológicos. Os atores
que fazem com que a tecnologia não esteja acessível a todos os ci-
dadãos envolvem muito mais condições econômicas, situações de
mercado, perspectivas capitalistas de ganho do que propriamente
da tecnologia em si. O artefato tecnológico concreto oferecido
ao cidadão traduz o final do pensamento tecnológico em relação
àquele produto. A tecnologia nasce muito antes, nas ideias e nos
sistemas que ela propõe, nas formas como será incluída na vida
do cidadão, é gerada muito antes do artefato ter sido concreti-
zado. A tecnologia é muito mais ideia e sistema do que artefato
tecnológico (MUMFORD, 2004).
As perspectivas sobre as tecnologias, mesmo entre pen-
sadores de renome, não têm uma compreensão comum e nem
sempre é associada à evolução do cidadão ou da sociedade. Em
1749, a Academia de Dijon (França) propôs como tema de ensaio
o questionamento se as artes e as ciências melhoravam de verda-
de a vida do cidadão. Rousseau argumentou que não, a tecnologia
não desempenhava papel nessa questão (MITCHAM; MACKEY,
2004). Para Rousseau, a tecnologia não poderia ser um indicador
de melhoria da condição de vida. A amplitude do conceito de tec-
nologia naquela época era muito diferente daquele que estudamos
hoje como um dos pilares da educação contemporânea. Hoje, se
esperaria outro tipo de reflexão por parte de Rousseau, afinal a
tecnologia já estava presente, como por exemplo nos artefatos de
madeira, roupas, habitações e alimentos, deixando pouca margem
para sua negação como campo de saber contribuinte à civilização.
Na contemporaneidade, muitos cidadãos têm estas limi-
tações, sem dúvidas, expressas de formas diferentes do século
XVIII, mas traduzindo ainda a limitação de compreensão sobre a
temática tecnológica. Muitos cidadãos da atualidade associam, de
modo superficial, imediato e leigo a ideia de tecnologia a um de
seus ramos que é a tecnologia digital, a computadores e artefatos
eletrônicos. Uma séria circunscrição de compreensão do conceito
de tecnologia.
Mitcham e Mackey (2004), sugerem 4 aspectos que carac-
terizam os efeitos gerais da tecnologia sobre a contemporaneidade
muito relevantes para o estudo da docência integrada às tecnologias,
principalmente às Tecnologias Digitais da Informação e Comunica-
ção: (1) as alterações que as tecnologias imprimem na relação com
o tempo; (2) a presença cada vez maior de artefatos manufaturados
nos cotidianos; (3) as relações alteradas entre o vivo e o não vivo; (4)
a aplicação de racionalidades sobre a realidade tendendo a diminuir
a presença do inesperado no cotidiano humano.
Com base nesses aspectos, evidencia-se a necessidade de
que os docentes têm uma necessidade ética de se apropriarem da
técnica e das tecnologias para exercerem seus papéis sociais de
docência. O docente está fortemente relacionado com a tecnolo-
gia, na medida em que seu ofício envolve a troca de ensinamentos
e aprendizagens (saberes) com o outro o que, inevitavelmente,
significa a inclusão de técnicas contemporâneas de comunicação,
da não neutralidade das construções de conhecimento, da gover-
namentalidade sobre os sujeitos para citar apenas alguns aspectos
que interferem no conhecimento que está sendo proposto e que
também estão relacionados com a tecnologia. Ao passo que os de-
senvolvedores devem procurar estar mais próximos dos docentes
na consultoria e desenvolvimento de soluções para a ação docente
de integração das TDICs (Tecnologias Digitais da Informação e
Comunicação) com sua prática profissional.
Por outro lado, o docente, como formador de sujeitos den-
tro de uma política que envolve ações de biopoder e governamen-
talidade e, dessa forma, como um agente de disciplinamento e
controle de subjetividades e objetividades dos novos sujeitos está,
perigosamente, próximo de dispositivos de manutenção de um sis-
tema político. Ele pode exercer, dentre outros papeis, o de agente
de reprodução ou de resistência. Logo, este profissional deve ser
mantido sob fortes controles panópticos (controle que possibilita
vigiar sem que o vigiado saiba) por parte das instituições. Sob o
aspecto das relações do docente com a tecnologia, sua vinculação e
diálogo com os desenvolvedores, especialistas em design, tecnólo-
gos e outros, passa a ser uma condição sine qua non para estas duas
categorias de trabalhadores. O docente que, tradicionalmente, está
muito mais próximo de ações que podem ser consideradas como
formas ritualísticas do que das ações tecnológicas e tende a uma di-
ficuldade de aproximação com os artefatos tecnológicos, necessita
da integração com os profissionais da tecnologia e estes da relação
com os docentes para evitar manipulações e atrasos radicais em
suas propostas de softwares, artefatos e sistemas para serem usados
na educação (MUMFORD, 2004).
É nesse espaço que se insere o estudo da Tecnodocência,
como um saber que estabelece uma integração entre a Docência
e as Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação. Essa
integração procura resgatar a ação técnica da prática docente e,
nesse sentido, fundamentar a ação docente como ato técnico e,
por isso, político para além do inspiracional. Compreender a do-
cência como um ato tecnopolítico possibilita o rompimento com
as tendências docentes destituídas de crítica e reprodutivistas não
conscientes. A escola, compreendida como instituição de instân-
cia de ordem que unifica diversas instituições sob mesma égide
governamental, passa a ser entendida também como um espaço
contraditório, um lugar de resistência possível e de contempo-
raneidade. Dessa forma, a Tecnodocência supõe a atualização
constante do docente, sua integração à contemporaneidade social,
política, filosófica e tecnológica.
Esse resgate do homo sapiens em detrimento do homo
faber, que desde o século XIX vem fazendo parte da profissão
docente, impulsiona ao know that proposto por Jarvie (2004) em
um artigo intitulado “La tecnologia y la estructura del conoci-
miento”. Assim, a Tecnodocência se apresenta como um caminho
potencialmente crítico, não reprodutivista de resistência à prática
de manter os docentes como consumidores inconscientes de tec-
nologias implantadas. Busca equalizar o trabalho docente com as
novas relações de tempo e de volume de conhecimentos, criando
outra relação de trabalho e tempo remunerados síncrono e assín-
crono. Procura integrar alguns destes artefatos tecnológicos que
são abundantes na sociedade atual, intitulada de tecnológica, à
profissão docente. Busca possibilitar o estabelecimento de rela-
ções não orgânicas mediadas por mídias digitais e ainda assim
válidas para a formação. Procura equalizar a ação docente à con-
temporaneidade, deixando de ser um ato retrógrado e desalinhado
com a sociedade uma vez que pauta sua desagregação na manu-
tenção de relações de poder e saber já desgastadas e desfocadas
da realidade coletiva percebida pelos discentes.
Por isso, a Tecnodocência pode ser definida como a siste-
matização de conhecimentos e seus princípios que se aplicam ao
planejamento, à construção e à reflexão sobre as Tecnologias da
Informação e Comunicação, vinculadas ao estudo epistemológi-
co da ação integrada de ensinar, aprender e avaliar no contexto
teórico e prático da docência impactando sobre os produtores e
programadores de softwares, sobre o design e sobre as formas de
integração destes na prática docente.

4. INTERDISCIPLINARIDADE ENTRE
TECNODOCÊNCIA E ANIMAÇÃO DIGITAL
Para que haja interdisciplinaridade entre duas áreas do
saber é necessária uma integração das respectivas linguagens uti-
lizadas em cada uma delas. Estabelecer uma temática comum é
fundamental para que se inicie o processo. Com isso, poderão
observar o objeto de estudo e desenvolver produtos, conservando
ainda elementos específicos de cada área. É claro que, para atingir
o objetivo, a cooperação e a colaboração entre os pares são ele-
mentos fundamentais (FAZENDA, 2008).
A interdisciplinaridade se torna um meio privilegiado
para preencher as lacunas entre os diferentes conhecimentos,
geralmente fragmentados pela construção científica dos últimos
séculos, diante da especialização imposta por cada área do saber.
É necessário, nos dias de hoje, romper com essa superespecializa-
ção, eliminando as fronteiras entre elas diante do estabelecimento
de uma comunicação clara e objetiva. A atitude dos participantes
é decisiva nesse processo, uma vez que fazer interdisciplinari-
dade requer o exercício do aprender com o outro e do desapego
para ceder tempos e espaços de forma recíproca e voluntária. As
relações pautam-se, portanto, nas subjetividades e muitas vezes é
a causa principal de insucesso (JAPIASSU, 2006).
Felizmente, as relações interdisciplinares entre Animação
Digital e Tecnodocência têm sido bastante frutíferas desde 2014
quando o Grupo de Estudos em Docência, Animação e Interdis-
ciplinaridade (GEDAI) iniciou seus trabalhos teóricos e práticos
sobre as diferentes formas de pensar a Animação Digital inserida
no contexto da Docência para Educação Básica e Superior. Pô-
de-se construir conceitos a partir dos estudos teóricos sobre Tec-
nologia Digital, Docência e Animação Digital, além de propostas
de aplicações práticas da Tecnodocência e Animação Digital com
alunos de escola pública de Fortaleza, culminando com a criação
da disciplina Tecnodocência e Animação, ofertada pelo curso de
Sistemas e Mídias Digitais como optativa.
Considerando-se que a Tecnodocência se preocupa com
o planejamento, o desenvolvimento e a reflexão sobre as TDICs
integradas no contexto da docência, o campo de atuação se abre
para diversas ações vinculadas ao uso das tecnologias digitais
para ensinar, aprender e avaliar com possibilidades de modifica-
ções mútuas. As TDICs podem ser utilizadas para que o profes-
sor inove em suas aulas expositivas, por meio da apresentação
de vídeos, simulações, tutoriais mais esclarecedores acerca do
conteúdo específico (ALMEIDA; SILVA, 2011). Professores de
Biologia, por exemplo, podem mostrar qual é a estrutura de uma
célula com mais detalhes, de forma mais interativa e esclarecedo-
ra para os alunos. No entanto, o uso das TDICs pode proporcionar
novas ações pedagógicas, ampliando o escopo didático-metodo-
lógico do professor (LIMA, 2014). Captura de imagens com ta-
blets, edição de vídeos, desenvolvimento de sites educativos rea-
lizados a partir da parceria professor-aluno podem ser utilizados
como recursos didáticos para tornar as aulas mais significativas,
gerando um engajamento necessário aos processos de ensino, de
aprendizagem e de avaliação.
Por outro lado, as tecnologias digitais também podem ser
modificadas a partir das necessidades da docência, compreenden-
do o professor também como um aprendiz nesse processo, como
aquele que avalia e é avaliado, como aquele que ensina e aprende
na relação com o aluno e com o objeto de estudo. Muitos recursos
digitais estão prontos e disponíveis na internet, mas nem sempre
são utilizados na escola, nem sempre são escolhidos pelo pro-
fessor como um material didático importante, imprescindível. Os
motivos são bem variados. A falta de equipamento adequado, a
falta de internet, a proibição do uso do celular na escola, a falta de
capacitação do professor para uso dos recursos digitais são exem-
plos do que pode dificultar o acesso às TDICs (UNESCO, 2002).
No entanto, uma causa pouco discutida no âmbito acadêmico está
na qualidade dos produtos ofertados para a docência no sentido
de fazer com que os professores queiram utilizá-los porque con-
tribuem para os processos educativos. Os softwares e aplicativos
vêm prontos e acabados, fazendo com que alunos e professores
tenham que se adaptar ao produto que apresenta pouca interação,
com conteúdos superficializados, vinculados também à simples
apresentação de informações.
É nesse sentido que a parceria entre Tecnodocência e Ani-
mação Digital se concretiza. Considerando-se que a Animação
tem como objetivo dar vida a objetos e a coisas inanimadas, e,
atualmente, é melhor desenvolvida por meio de recursos digitais,
por que não a inserir no contexto da Tecnodocência? É possível
considerar que determinados conteúdos específicos podem ser
melhor compreendidos quando manipulados, dissecados e anali-
sados parte por parte. A Animação executa justamente essas ações
para possibilitar a movimentação de objetos. Com isso, alunos
e professores conseguem, por meio da elaboração da animação,
aprofundar nos conteúdos trabalhados com engajamento e sig-
nificado dos participantes. Contribui-se, assim, para ampliar as
possibilidades didático-metodológicas da docência.
Por outro lado, técnicas e recursos digitais, para Animação
2D e 3D, também podem ser aperfeiçoados diante das necessida-
des de alunos e professores, tornando o processo mais simples para
pessoas leigas no assunto, usufruindo minimamente de recursos
que podem influenciar positivamente para a construção do conheci-
mento. O software Muan (Manipulador Universal de Animações),
por exemplo, é um sistema para animação quadro a quadro com
interface gráfica que permite a criação, edição e visualização de
animações utilizando câmeras de vídeo digitais. Como foi pensa-
do para necessidades educacionais, é fácil de operar, apresentando
funcionalidades que atendem iniciantes e animadores profissionais.
Concebido pelo Anima Mundi, Festival Internacional de Anima-
ção do Brasil e desenvolvido pelo Instituto de Matemática Pura e
Aplicada (IMPA) no Brasil, está disponível para download gratui-
tamente (http://www.muan.org.br/br/muan/).
A Formação de Professores, seja inicial ou continuada,
pode contar com a colaboração de profissionais das Mídias Digi-
tais para a compreensão de técnicas e ações vinculadas à Anima-
ção Digital que atendam às necessidades dos professores, de suas
áreas específicas, proporcionando produção de Material Educa-
cional Digital Autoral (todo e qualquer material educacional de-
senvolvido por um aprendiz utilizando um equipamento digital
conectado ou não à internet com criação, planejamento, execu-
ção, reflexão e avaliação desenvolvidos pelo próprio aprendiz in-
dividualmente ou em grupo) desenvolvido pelo próprio professor
ou deste em parceria com seus alunos. Contribui-se, dessa forma,
para o desenvolvimento de aulas mais significativas com o apro-
fundamento do conteúdo, da relação que o aluno estabelece com
o processo de aprender, com o professor, com os conceitos abor-
dados. Contribui-se, sobretudo, para que o professor se aproprie
das técnicas de ensino, reflita criticamente sobre sua ação em sala
de aula como uma profissão, compartilhada com o aluno e de for-
ma interdisciplinar com profissionais da área de Mídias Digitais.
5. EXPERIÊNCIA PRÁTICA: TECNODOCÊNCIA E
ANIMAÇÃO DIGITAL
Com o objetivo de se desenvolver um estudo exploratório
para verificar de que forma é possível trabalhar Animação Digi-
tal no contexto da Tecnodocência foram planejadas e executadas
duas aulas com alunos da Escola de Ensino Fundamental e Mé-
dio Santo Afonso, Fortaleza, Ceará em que os alunos deveriam
resolver problemas matemáticos de comparação de frações utili-
zando a técnica de Stop-Motion (técnica de animação que utiliza
uma disposição sequencial de fotografias diferentes para simular
movimento) com captura de imagens por tablet e edição pelo sof-
tware Muan. Participaram da aula 20 alunos do 1º ano do Ensino
Médio e duas professoras da Universidade Federal do Ceará, Ins-
tituto Universidade Virtual, curso de Sistemas e Mídias Digitais,
Mara Bonates e Luciana de Lima. Ocorreram nos dias 1 e 11 de
junho de 2015 no Laboratório Interdisciplinar de Formação de
Educadores, no período da manhã.
Por se tratar de uma aula interdisciplinar, a temática uti-
lizada foi sobre Esportes, escolhida a partir de discussões entre
os integrantes do grupo GEDAI como uma temática pertencente
ao universo de jovens e adolescentes. Isso significa que, todos os
problemas matemáticos elaborados versaram sobre esse assunto in-
cluindo basquetebol, futebol, voleibol, natação e ciclismo. Na pri-
meira aula, foram captados os conhecimentos prévios dos alunos
por meio de questionário para verificar quais conceitos os alunos
apresentam sobre fração, animação e quais as dificuldades revelam
ao resolver problemas envolvendo comparação de frações. Além
disso, foram apresentados o conceito, os princípios e as técnicas de
animação, bem como os problemas matemáticos e suas possíveis
soluções no contexto da animação. Na segunda aula, cada grupo
de trabalho recebeu o material necessário para o desenvolvimento
do roteiro, a captura das imagens e a edição do vídeo produzido.
Os Materiais Educacionais Digitais Autorais foram desenvolvidos
pelos grupos e ao final disponibilizados na internet para comparti-
lhamento principalmente com a escola de origem.
Houve grande interesse dos alunos sobre as técnicas de
Animação Digital apresentadas. No momento da aula, muitos fi-
zeram perguntas sobre o tema e se interessaram em realizar al-
guns experimentos simples que permitiram colocar objetos em
movimento facilmente. Em relação ao conceito de fração, os alu-
nos não apresentaram dificuldades quando as situações-problema
eram simples. No entanto, quando se tratava de comparar frações
com denominadores diferentes, os alunos não conseguiam elabo-
rar o pensamento de forma adequada com o intuito de encontrar
soluções viáveis para a resolução dos problemas apresentados.
Cada grupo, contendo quatro alunos, ficou com um pro-
blema matemático que versava sobre comparação de frações
vinculada a um esporte específico. O grupo 1, por exemplo, teve
como objetivo solucionar o seguinte problema: “Em uma compe-
tição de ciclismo, Maria percorreu ¼ da pista e José percorreu 3/5
dessa pista na primeira hora da corrida. Qual deles está na frente
após esse tempo?”. Para isso, elaborou um roteiro se baseando em
modelo prévio, estabelecendo a sequência das personagens para
captura das imagens. Receberam, para esta finalidade, algumas
imagens preparadas previamente. Outras, no entanto, foram dese-
nhadas e preparadas no momento da atividade pelos próprios alu-
nos. Com um tablet e uma caixa de papelão por grupo, os alunos
fizeram a captura das imagens de acordo com a técnica de Stop-
-Motion, quadro a quadro, para imprimir o movimento da forma
mais suave possível, dentro do tempo previsto para execução da
atividade (Figura 1). As fotos foram inseridas no software Muan
e diante da calibração do tempo de passagem de cada imagem, o
vídeo foi gerado e disponibilizado na internet.
Figura 1. Solução gráfica do problema da comparação de
frações no contexto do ciclismo apresentada pelo grupo 1

Fonte: Os próprios autores.

O trabalho desenvolvido pelos alunos demonstrou um pro-


cesso de organização próprio para cada grupo. Em alguns, desen-
volveram atribuições de tarefas para cada integrante que culminava
na ajuda mútua para execução das atividades necessárias de com-
posição das imagens. Em outros, todos realizavam todas as tarefas
conjuntamente, mediante discussões e reflexões sobre a técnica de
animação utilizada e sobre a resolução do problema. Os problemas
matemáticos foram pensados e discutidos principalmente na execu-
ção do roteiro. Muitas dúvidas conceituais surgiram nesse momen-
to e puderam ser esclarecidas pelas professoras. Outras surgiram
na captura das imagens, fazendo com que os alunos retornassem a
discutir o roteiro sem modificá-lo no papel, mas modificando-o na
prática. Os alunos apresentaram grande engajamento na atividade,
com dedicação imersiva no desenvolvimento das propostas. Pou-
cos, no entanto, procuraram realizar outras atividades no momento
da aula, principalmente diante da novidade de uma câmera fotográ-
fica como a disponível nos tablets.
A proposta interdisciplinar pareceu bastante promissora,
uma vez que permitiu o aprofundamento de conceitos e proce-
dimentos de ambas as áreas, Animação Digital e Matemática.
Possibilitou às professoras pesquisar e aprofundar mais sobre os
conceitos de cada área, além de aprender conceitos e procedi-
mentos vinculados à matemática, à docência e à animação digital.
Permitiu, sobretudo, repensar na proposta didático-metodológica
utilizada durante a execução das aulas, no sentido de considerar
o tempo disponível e o realmente utilizado, além do trabalho dis-
pendido na preparação prévia do material.
Considerando-se a docência como um trabalho profissio-
nal que envolve técnicas de planejamento, execução e avaliação,
a técnica de Stop-Motion parece ser bastante lenta, necessitando
de muito tempo para a preparação e para a execução da aula, tem-
po este que não está inserido no contrato de trabalho do docente.
Isso significa que o professor precisa de tempo extra para pla-
nejamento e execução da aula com o intuito de realizar a tarefa
com os alunos da maneira mais adequada possível. Em termos de
Animação Digital há que se pensar em outras técnicas ou no aper-
feiçoamento de recursos digitais que minimizem esses impactos.
Nesse sentido, o profissional de Mídias Digitais pode contribuir
de forma significativa para o desenvolvimento de softwares, de
técnicas, de procedimentos de Animação Digital que tornem mais
simples o planejamento e a execução das aulas para que profes-
sores e alunos construam e aprofundem conhecimentos de forma
mais simples e integrada aos tempos curriculares da escola.
O trabalho em parceria é outro aspecto de bastante rele-
vância diante da experiência vivenciada. O investimento em capa-
citações/formações de professores para o uso da tecnologia digital
na docência tem se mostrado ineficaz e ineficiente em vários as-
pectos. Um deles é o simples fato de o professor raramente inserir
em seu planejamento e em suas aulas atividades que contemplem
o uso de recursos digitais, especialmente o desenvolvimento de
Animações Digitais. Sob o pretexto da falta de equipamento, da
falta de tempo, ou os alunos não realizam atividades desse tipo,
ou o fazem em situações extraescolares, mediante trabalhos não
inseridos na proposta das aulas e sem o devido acompanhamento
técnico sobre o uso adequado das tecnologias digitais. Sendo as-
sim, a parceria do professor de área específica, Matemática, por
exemplo, com o professor ou profissional de Mídias Digitais pode
ser bastante enriquecedora para professores e alunos. A interdisci-
plinaridade, quando vivenciada em sua essência, promove apren-
dizagens mútuas, fazendo com que o professor da área específica
possa aprender, na prática da docência, como utilizar tecnologia
digital diante da troca de conhecimentos com professores e pro-
fissionais de outras áreas. Proporciona-se, dessa forma, uma de-
manda de profissionais da área de Mídias Digitais nas escolas que
sejam formados para atuar conjuntamente com os professores de
áreas tradicionalmente consagradas e consequentemente forma-
ções superiores que preparem os profissionais das Mídias Digitais
para a docência. Surge daí a necessidade de formação superior,
graduação e/ou pós-graduação em Tecnodocência.

REFERÊNCIAS
ALMEIDA, M. E. B. de; SILVA, M. da G. M. da. Currículo, tec-
nologia e cultura digital: espaços e tempos de web currículo. Re-
vista e-curriculum, São Paulo, v.7, n.1, abril, 2011.
CHONG, A. Animação Digital: Animação Básica. Porto Alegre:
Bookman, 2011.
FAZENDA, I. C. A. O que é Interdisciplinaridade. São Paulo:
Cortez, 2008.
GRAÇA, R. Produzindo Animações Com Softwares Livres.
Canadá: RME Comunicação e Idiomas, 2012.
JAPIASSUM H. O Sonho Transdisciplinar e as razões da Filo-
sofia. Rio de Janeiro: Imago, 2016.
LIMA, L. de. Integração das Tecnologias e Currículo: A Apren-
dizagem Significativa de Licenciandos de Ciências na Apropria-
ção e Articulação entre Saberes Científicos, Pedagógicos e das
TDIC. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Edu-
cação Brasileira, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza. Dis-
ponível em: < https://sites.google.com/site/prolulima/>. Acesso
em: 15 mar. 2016.
MITCHAM, C.; MACKEY, R. Filosofía y tecnología. Madrid:
Encuentro, 2014.
MUMFORD, L. La Técnica y la naturaliza del hombre. In:
Mitcham, C.; Mackey, R. (ENDS.).  Filosofía y tecnología. Ma-
drid: Encuentro, 2004.
PURVES, B. Stop-Motion. Porto Alegre: Bookman, 2010.
UNESCO. Information Communication Technology. In: Ed-
ucation: a curriculum for schools and programme of teacher
development. Disponível em:< http://unesdoc.unesco.org/ima-
ges/0012/001295/129538e.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2015.
PRINCÍPIOS BÁSICOS DA
INTERAÇÃO HUMANO-
COMPUTADOR PARA
SISTEMAS E MÍDIAS
DIGITAIS
Princípios Básicos da Interação Humano-
Computador para Sistemas e Mídias Digitais
Ticianne Darin, Cátia Silva, Fátima Souza

1. INTRODUÇÃO
A Interação Humano-Computador (IHC) é uma área mul-
tidisciplinar que tem origem na Computação e visa analisar os
fenômenos que ocorrem quando pessoas e computadores “se
unem” para realizar um objetivo. A IHC estuda as características
e os métodos relacionados à interação entre humanos e sistemas
computacionais em geral, para criar soluções interativas de alta
qualidade, com foco no uso - e não na construção - de um siste-
ma interativo (PREECE et al, 2013). A IHC é capaz de fornecer
explicações e previsões para fenômenos de interação usuário-sis-
tema e resultados práticos para o design da interface de usuário
(ACM SIGCHI, 19921), através de métodos e técnicas adequadas
para o design e a avaliação de produtos interativos.
Os fundamentos da Interação Humano-Computador de-
vem integrar um determinado projeto de sistemas e mídias digitais
desde o seu início. Também, é através dos estudos em IHC que
os designers têm a oportunidade de se familiarizar com melhores
práticas na área e utilizar métodos centrados no usuário, produ-
zindo interfaces que trazem satisfação e prazer aos usuários. Com
o objetivo de oferecer uma visão geral desta área, este capítulo
1
Special Interest Group on Computer-Human Interaction é a sociedade
internacional premier para profissionais, acadêmicos e estudantes que estão
interessados em humano-tecnologia e em interação humano-computador
discute brevemente o conceito de Interação Humano-Computa-
dor; introduz os conceitos de interface, interação, usabilidade e
acessibilidade; discute a importância fatores emocionais para a
experiência do usuário com sistemas interativos; e por fim apre-
senta a abordagem do Design de Interação para o projeto de siste-
mas computacionais interativos.

2. O QUE É INTERAÇÃO HUMANO-COMPUTADOR


Como seria a vida hoje em dia sem a tecnologia? Certa-
mente, se formos parar para refletir, são inúmeros os produtos
tecnológicos interativos com os quais temos contato em nosso
cotidiano. Fica difícil imaginarmos várias esferas de nossas vidas
sem o apoio de tais produtos, seja no lar, no entretenimento, no
governo, na saúde ou na educação. Até em nosso comportamento
observamos influências desse contato com a tecnologia. Entre-
tanto, será que todos os produtos e sistemas tecnológicos são fá-
ceis e agradáveis de usar? Caso não sejam, a causa do problema
pode ser justamente um projeto que não levou em consideração,
em seu planejamento, fatores de interação humano-computador.
Daí a importância de se estudar Interação Humano-Computador
(IHC): otimizar o design de produtos interativos.
A área de IHC estabeleceu-se como importante campo de
estudo e de prática no início da década de 1980, sobretudo com a
expansão da computação pessoal. Inicialmente, era uma área da
Ciência da Computação, porém se expandiu, atraindo profissio-
nais de várias outras disciplinas, incorporando diversos conceitos
e abordagens. IHC é “uma disciplina interessada no projeto, im-
plementação e avaliação de sistemas computacionais interativos
para o uso humano, juntamente com os fenômenos relacionados
a esse uso” (HEWETT et al., 1992). Os objetos de estudo de IHC
são: a natureza da interação humano-computador, o uso de siste-
mas interativos situados em contexto, as características humanas,
a arquitetura de sistemas computacionais e de interface, os pro-
cessos de desenvolvimento preocupados com o uso. IHC é uma
área multidisciplinar, pois congrega, por exemplo, fundamentos
advindos das áreas de Psicologia, Sociologia, Antropologia (para
o estudo de conhecimentos sobre a cultura, comportamento e dis-
curso dos usuários), bem como de Design, Ergonomia, Linguís-
tica, Semiótica. Quando se empreende um projeto de Design de
Interação, geralmente a equipe irá se configurar de forma multi-
disciplinar, sendo que o trabalho deve criar ambiente de respeito
e que favoreça a comunicação.
Há vários benefícios de IHC para o desenvolvimento de
mídias e sistemas interativos, uma vez que esta disciplina contribui
para aumentar a qualidade de uso e, por conseguinte, a experiência
do usuário. Dentre tais benefícios, podemos citar: aumenta a pro-
dutividade dos usuários; reduz a quantidade e a gravidade dos erros
dos usuários; reduz o custo de treinamento; reduz o custo de supor-
te técnico; aumenta as vendas e também a fidelidade do cliente.
3. CONCEITOS BÁSICOS: INTERFACE E INTERAÇÃO
Para que as pessoas possam utilizar sistemas digitais inte-
rativos, é necessário que haja uma forma de contato entre o usu-
ário e a lógica interna de funcionamento do software. A interface
com o usuário é a parte de um sistema interativo que proporciona
este contato, denominado interação. Os conceitos de interface e
interação são diferentes, embora se influenciem diretamente. Para
criar sistemas interativos com boa qualidade de construção e de
uso, o estudo das interfaces com o usuário e o estudo da interação
entre o usuário e a interface são necessários.
Interface pode ser definida como uma superfície de con-
tato que reflete as propriedades físicas das partes que interagem,
as funções a serem executadas e o balanço entre poder e controle
(LAUREL, 1993). Pode ser vista, computacionalmente falando,
como toda a porção do sistema com a qual o usuário mantém con-
tato físico ou conceitual durante a interação (MORAN, 1981). A
Figura 1 ilustra a interação e sua relação com a interface. O conta-
to físico da interação se dá através da ação do usuário sobre a interface
de hardware, enquanto o contato conceitual da interação se dá através
da interpretação da interface de software
Figura 1 – Elementos envolvidos na
interação entre usuário e sistema.

Fonte: As Autoras

O contato físico, que pode ser tanto motor quanto percepti-


vo, envolve os sentidos do usuário, o uso de dispositivos de entra-
da, que permitem a participação ativa do usuário, como teclado,
mouse, telas de toque ou joystick; e o uso de dispositivos de saí-
da, como caixas de som, tela, ou impressora, através dos quais o
software responde à interação realizada pelo usuário. Estes dispo-
sitivos constituem os componentes de hardware da interface, com
os quais os usuários executam atividades motoras e perceptivas.
A interface de software é a parte do sistema que implementa os
processos computacionais necessários para controlar os dispositi-
vos de hardware, para gerar símbolos e mensagens com os quais
o usuário poderá interagir, e para interpretar os comandos e ações
dos usuários. O usuário não tem contato com a lógica do sistema,
que está no código da aplicação. Todo contato do usuário com o
sistema computacional se dá exclusivamente através da interface.
O contato conceitual é a interpretação do usuário daquilo
que ele percebe através do contato físico, relacionado ao planeja-
mento da interação e à compreensão das respostas recebidas pela
interface. Há diversas influências que determinam como o usuá-
rio interpretará a interface, como contexto de uso e objetivos do
usuário, suas características físicas e cognitivas, sua formação,
conhecimento e experiência, dentre outros. Por isso, é necessário
considerar aspectos humanos ao projetar um sistema interativo e
criar suas interfaces e interações, promovendo facilidade de uso
e de aprendizado, está relacionada com a capacidade cognitiva
requerida do usuário para interagir com qualquer interface com-
putacional, especialmente se esta for nova para o usuário (BAR-
BOSA e SILVA, 2010).
Interação, por sua vez, pode ser definida como tudo o
que acontece quando uma pessoa e um sistema computacional se
unem para realizar tarefas, visando um objetivo (HIX e HART-
SON, 1993). Ao interagir com uma interface, o usuário utiliza
seus processos cognitivos para interpretar os elementos presen-
tes na interface e aprender a utilizá-la. Tais processos cognitivos
estão relacionados aos diferentes níveis de pensamento durante
o aprendizado de um novo tópico, como o uso de uma nova in-
terface (ANDERSON e KRATHWOHL, 2001). Os processos
cognitivos incluem atenção, memória, aprendizado, resolução de
problemas, entre outros (PREECE et al., 2013). Além disso, ca-
racterísticas físicas como visão, audição, tato e mobilidade, são
responsáveis pela capacidade de percepção do mundo ao redor
do usuário, i.e., obter informações sobre o artefato com o qual
interage e sua habilidade de atuar sobre ele.
Existem diversos estilos ou paradigmas de interação, que
são formas específicas de pensar o projeto da interação, orientando
o designer sobre os aspectos que devem ser observados nos dife-
rentes contextos de uso do sistema interativo. O estilo de interação
mais tradicional e predominante a partir dos anos 80 é o desktop.
O paradigma do desktop apresenta ao usuário com uma interface
fácil de usar, baseada no uso de janelas, ícones, menu e ponteiro
do mouse. A tendência atual é o uso de estilos de interação que vão
além do desktop e oferecem ao usuário formatos cada vez mais
naturais de interação, a exemplo da computação vestível (como o
AppleWatch) e da realidade aumentada. O Jogo Pokémon Go, por
exemplo, combina câmera, GPS e banda larga de Internet para co-
locar em prática a realidade aumentada e permitir que o usuário
“capture Pokemóns no mundo real” (Figura 2). Em geral, os estilos
além-desktop oferecem interações baseadas em computação tangí-
vel e serviços que estão disponíveis ao usuário, no momento e local
em que precisa, com diferentes níveis de interação, podendo incluir
toque e reconhecimento de gestos e de fala.
Figura 2 - Jogo Pokémon Go

Fonte: (Niantic/Nintendo 2016)

4. QUALIDADE DE USO: USABILIDADE E


ACESSIBILIDADE
Utilizar um sistema interativo significa “interagir com sua
interface para alcançar um certo objetivo, dentro de um contexto
de uso”. Existem características específicas que a interface e a
interação devem ter para serem consideradas adequadas. Essas
características, denominadas critérios de qualidade de uso, são:
usabilidade, acessibilidade, experiência do usuário e comunicabi-
lidade (BARBOSA e SILVA, 2010). Nesta seção discutiremos os
dois primeiros critérios, como uma abordagem inicial à qualidade
de uso de sistemas interativos.
4.1 Usabilidade
Usabilidade é um conceito que descreve a qualidade da
interação de um usuário com uma determinada interface. É “a
medida na qual um produto pode ser usado por usuários específi-
cos para alcançar objetivos específicos com efetividade, eficiên-
cia e satisfação num contexto específico de uso” (ISO 94241-11).
A usabilidade deve estar presente em todas as ações executadas
pelo usuário, que deve ser o foco de interesse. Usabilidade não
é apenas “tornar mais fácil de usar”. Existem vários atributos e
cada sistema enfatiza os que são mais importantes para seus usu-
ários. Nielsen, no que diz respeito à usabilidade, descreveu vários
desses atributos:
Facilidade de aprendizado: é a rapidez com que o usuá-
rio interage com o sistema logo na primeira vez que o utiliza;
Eficiência no uso: grau de produtividade atingido pelo
usuário depois que aprendeu a utilizar o sistema;
Facilidade de recordação: é a retenção, capacidade do
usuário de voltar a utilizar o sistema após certo tempo sem preci-
sar aprendê-lo novamente;
Segurança no uso: medida do quanto o usuário pode ser in-
duzido ao erro pelo sistema e quanto pode se recuperar do mesmo;
Satisfação subjetiva: medida de quanto o usuário se sente
feliz de estar utilizando o sistema.
Problemas com a usabilidade de um determinado sistema
ou produto interativo retardam, prejudicam ou inviabilizam a re-
alização de uma tarefa. O certo é a informação fluir naturalmente
sem deter a atenção do usuário, que deve dedicar-se exclusiva-
mente àquilo que pretende realizar. Quando isso acontece, aumen-
ta-se o rendimento do trabalho executado, poupando o usuário de
ter que recorrer a manuais ou ao suporte técnico, por exemplo.

4.2 Acessibilidade
Acessibilidade é a possibilidade de qualquer pessoa, in-
dependentemente de suas capacidades físico-motoras, percepti-
vas, culturais e sociais, usufruir os benefícios de uma vida em
sociedade, ou seja, de participar de todas as atividades, até as que
incluem o uso de produtos, serviços e informação, com o mínimo
possível de restrições (ABNT, 1994). A acessibilidade é um ter-
mo geral que indica a possibilidade de qualquer pessoa usufruir
todos os benefícios da vida em sociedade, sem barreira alguma.
Para além dos espaços físicos, tal conceito também diz respeito à
fruição da era digital, como o uso da Internet, por exemplo, onde
é denominado e-acessibilidade2.
Tomando-se por base tal definição, entende-se, portanto,
que acessibilidade deve contemplar a todos nós e não somente
pessoas com deficiências. Também, é um conceito diretamente
ligado a outro: o de inclusão social, na medida em que discute de
maneira substancial tal conceito e defende sua inerência a todo
projeto de sistemas e produtos interativos. Isto pressupõe dizer
2
Saiba mais sobre e-acessibilidade em: http://www.w3c.br/pub/Materiais/Pu-
blicacoesW3C/cartilha-w3cbr-acessibilidade-web-fasciculo-I.pdf
que a acessibilidade é parte essencial de tais projetos e rechaça
adaptações posteriores de produtos. Existem diversas abordagens
para garantir a acessibilidade em todos os tipos de produtos, di-
gitais ou não, desde que sejam desenvolvidos para o uso huma-
no. As abordagens principais são o Design Universal - ou Design
para Todos - e o Design Inclusivo (BENYON, 2011). O Design
Universal se baseia em 7 princípios que devem guiar o design de
um produto, seja ele um dispositivo, um aplicativo, um jogo ou
qualquer objeto físico ou digital:
Uso Equitativo: o produto deve ser útil, comercializável,
atraente e seguro para pessoas com diferentes habilidades, sem
segregar qualquer usuário.
Flexibilidade de Uso: o produto precisa englobar uma
ampla variedade de preferências e habilidades pessoais, permi-
tindo a escolha do método de utilização, bem como adaptação ao
ritmo e à precisão do usuário.
Uso Intuitivo: a compreensão do produto deve ser inde-
pendente da experiência prévia do usuário, de seu conhecimento,
competência linguística ou concentração.
Informação Perceptível: o produto deve ser capaz de co-
municar e informar, independentemente da habilidade do usuário
ou do ambiente em que este se encontra.
Tolerância ao Erro: é necessário que o produto atenue os
riscos e consequências adversas de ações acidentais ou involuntá-
rias que o usuário possa realizar.
Baixo Esforço Físico: o produto deve ser eficiente e con-
fortável para ser utilizado com o mínimo de fadiga.
Tamanho e Espaço para Acesso e Uso: o espaço dispo-
nível para aproximação, uso, alcance e manipulação do produto
deve ser apropriado, independentemente do tamanho do corpo do
usuário, postura ou mobilidade.
Segundo o Design Inclusivo, como meio de garantir que
um sistema seja acessível, o designer deverá: incluir pessoas com
necessidades especiais na análise de requisitos e nos testes de sis-
temas existentes; considerar se novas características afetarão os
usuários com necessidades especiais; levar em consideração dire-
trizes específicas para acessibilidade (como o WCAG3, por exem-
plo); e incluir usuários com necessidades especiais nos testes de
usabilidade (BENYON, 2011).
No que diz respeito à acessibilidade digital, foram os
EUA, Canadá e Austrália os que iniciaram os primeiros estudos
nessa área. No final da década de 1990, o W3C (World Wide Web
Consortium) criou o WAI (Web Accesibility Initiative), publican-
do as diretrizes para acessibilidade do conteúdo da Web. No Bra-
sil, a partir do ano 2000 criaram-se leis (tais como as 10.048 e
10.098) e em 2004 estabeleceu-se o prazo para acessibilização de
todos os websites da administração pública. O e-Mag4, Modelo de
Acessibilidade do Governo Eletrônico Brasileiro, oferece reco-

3
Web Content Accessibility Guidelines, disponível em: https://www.w3.org/
Translations/WCAG20-pt-PT/
4
Saiba mais sobre o e-Mag em: http://www.governoeletronico.gov.br/acoes-e-
-projetos/e-MAG
mendações práticas para projetistas de websites e oferece também
um Selo de Certificação.
Pessoas com deficiências tem nas tecnologias assistivas
um importante aliado para o uso de mídias interativas. Tecnolo-
gias assistivas são quaisquer ferramentas ou recursos destinados
a proporcionar habilidades funcionais a pessoas com deficiências
(sejam essas deficiências físicas, auditivas, visuais, mentais ou
múltiplas, de forma parcial ou completa). Há, pelo menos, qua-
tro situações básicas a se contemplar. Primeiramente, no uso do
mouse, ao promover o acesso alternativo ao computador sem o
uso mouse. No uso do teclado, ao propiciar a interação por meio
de periférico especial ou pelo reconhecimento da voz. Na visuali-
zação do monitor, através da utilização de um programa leitor de
tela. E, por fim, na obtenção de som de dispositivo de áudio, ao
propiciar meio um alternativo para emissão da informação.

5. FATORES EMOCIONAIS E A EXPERIÊNCIA DO


USUÁRIO
A experiência que uma pessoa tem ao interagir com um
sistema interativo determina se esta pessoa se sentirá satisfeita
ou não, se voltará a utilizar o sistema interativo em questão e se
o recomendará a outros. Por isso, como descrito na Seção 3, a
usabilidade contempla a satisfação subjetiva do usuário. Porém,
a experiência do usuário vai além e trata dos atributos hedônicos
(relativos ao ou caracterizados pelo prazer), que estão exacerba-
dos em nossa sociedade atual. O emprego de ambos os conceitos
- usabilidade e experiência do usuário - deveriam ser essenciais
na concepção de qualquer projeto. A Experiência do Usuário trata
das percepções e respostas dos usuários resultantes do uso e/ou
antecipação do uso de um produto, sistema ou serviço (ISO 9241-
210). Isto significa que, além da satisfação do usuário, ela inves-
tiga outros aspectos da sua subjetividade, como sentimentos, es-
tados de espírito, sensações e emoções decorrentes da interação
com a interface de um sistema interativo.
A Experiência do Usuário (ou UX, de User eXperience)
pode ser definida como um sentimento momentâneo, que avalia
se a interação com um produto é boa ou má, do ponto de vista
do usuário. Uma boa experiência do usuário é a consequência
do preenchimento de necessidades humanas - como autonomia,
competência e estimulação - através da interação com um produto
ou serviço (Hassenzahl e Tractinsky, 2006). Os fatores emocionais
são estudados na IHC com o objetivo de projetar com foco na ex-
periência agradável para o usuário. Isto significa produzir expres-
sões e reações positivas a um produto, fazer com que os usuários
se sintam confortáveis e aproveitem a experiência de interagir
com um certo produto, seja um simples aplicativo para celular ou
um complexo sistema de controle de tráfego.
A Figura 3 mostra um exemplo simples de como trans-
formar um momento de frustração do usuário em uma experiên-
cia positiva e divertida. No navegador Chrome, uma surpresa é
apresentada ao usuário quando sua conexão com a Internet falha:
enquanto espera reestabelecer a conexão, o usuário pode jogar.
Após a exibição do alerta de erro, o usuário pode pressionar a
barra de espaços, para que o pequeno tiranossauro comece a pular
e correr por uma pista de corrida recheada por cactos. Dessa for-
ma, o sentimento momentâneo do usuário, ao avaliar a interação,
poderá ser transformado e, apesar do erro, a interação pode ser
avaliada como boa.

Figura 3 – Jogo oculto (easter egg) no navegador Chrome

Fonte: As próprias autoras.

A interação emocional está relacionada com a forma como


os usuários se sentem e reagem ao interagir com tecnologias.
Dessa forma, o designer deve considerar aspectos do humor e das
expectativas do usuário - o que os deixa felizes, tristes, irritados,
ansiosos, decepcionados, motivados e assim por diante - e tradu-
zir esse conhecimento em diferentes aspectos da experiência dele,
já que a forma como a pessoa se sente afetará a forma como ela
utilizará a interface (PREECE et al., 2013). As interfaces podem
utilizar formas expressivas - como emoticons, sons, ícones estáti-
cos e dinâmicos, animações, mensagens faladas e avatares - para
transmitir estados emocionais e para provocar determinados tipos
de resposta emocional nos usuários (PREECE et al., 2013).
Isso ocorre, por exemplo, quando a interface apresenta um
aspecto divertido ou uma piada, com o objetivo de fazer o usuário
sorrir e entrar em um estado afetivo positivo (Figura 4), ou ainda
quando faz o usuário crer que uma ação no sistema está associa-
da ao seu próprio bem-estar. Por exemplo, a interface de cadastro
no Yahoo pede uma informação pessoal e explica que o motivo é para
servir melhor ao usuário (“so we can serve you better”). No campo
de data, exibe uma mensagem de erro, de forma sutilmente divertida,
quando o usuário insere uma data de nascimento incorreta: “Are you
really from the future? ” (Você é realmente do futuro?)
Figura 4 – Interface de cadastro no Yahoo

Fonte: Yahoo.com

O estilo visual de uma interface, isto é, como ela utiliza e


combina fontes, cores, espaço em branco e elementos gráficos,
também pode determinar o tipo de impacto emocional da inter-
face sobre o usuário. Há estudos que demonstram que, se o usu-
ário considera uma interface esteticamente agradável, é provável
que ele seja mais tolerante com pequenos problemas no sistema,
como esperar um pouco mais pelo carregamento de uma página,
por exemplo (TRACTINSKY, 1997). Esse fenômeno ocorre em
diferentes culturas e contextos, justamente porque tais interfaces
são mais satisfatórias para o usuário e mais agradáveis de usar,
pois satisfazem o senso de estética humano. Ainda que de forma
sutil ou imperceptível ao próprio usuário, os aspectos emocionais
despertados pelas interfaces e pela dinâmica da interação afetam
a forma que a pessoa utiliza o sistema interativo.
Por outro lado, interfaces também podem ser frustrantes
e provocar respostas emocionais negativas nos usuários, o que
não é desejável. Interações muito complexas ou interfaces cujas
opções são difíceis de encontrar, por exemplo, pode fazer com
que os usuários sintam raiva ou decepção. Interfaces com abor-
dagem muito infantil - quando utilizadas por usuários adultos
- pode causar impaciência. Quando uma interface é confusa e
leva o usuário a executar interações erradas, é provável que ele
se sinta tolo. Há casos ainda em que os usuários podem se sen-
tir ofendidos, ameaçados, tensos. Diversos fatores podem cau-
sar emoções negativas, como: quando a aplicação não funciona
bem, quando não atende às expectativas do usuário, quando as
mensagens de erro são vagas e confusas, quando a interface é
imprevisível, quando a aparência dela é confusa, espalhafatosa
ou trata o usuário como criança, ou simplesmente quando o de-
sign é mal pensado (PREECE et al., 2013).
Enquanto uma interação prazerosa pode conquistar e fi-
delizar os usuários, fazer com que estes se sintam bem e desejem
utilizar novamente um sistema interativo, uma interação proble-
mática pode causar frustração, fazendo com que os usuários aban-
donem o uso da aplicação.

6. DESIGN DE INTERAÇÃO
Na perspectiva de tratar possíveis frustrações do usuá-
rio relacionadas à interação, com vista a criar experiências que
melhorem e estendam a maneira como as pessoas trabalham, se
comunicam e interagem, surge o Design de Interação. Segundo
Preece et al (2013), Design de Interação pode ser definido como
uma atividade multidisciplinar (Figura 4) focada no design de
produtos interativos que forneçam suporte às atividades cotidia-
nas das pessoas, seja no lar ou no trabalho.
A Figura 5 a seguir ilustra como o Design de Interação
é um processo multidisciplinar, envolvendo múltiplas discipli-
nas acadêmicas, sobrepondo vários campos interdisciplinares e
utilizando distintas práticas em design. Por outro lado, para Saf-
fer (2009), em seu livro “Designing For Interaction”, Design de
Interação é a arte de facilitar ou fomentar interações entre hu-
manos ou seus agentes, mediadas por produtos e serviços. Por
interações ele quer dizer comunicação, tanto um-a-um (ex.: uma
ligação telefônica comum), um-a-muitos (ex.: como os Blogs),
quanto muitos-a-muitos (ex.: bolsa de valores).
Figura 5 – Multidisciplinariedade do Design de Interação

Fonte: (adaptada de Preece et. al (2013), Fig. 1.4, pág. 10)


O Processo de Design de Interação tem como objetivo
avaliar o que foi desenvolvido como forma de assegurar que o
produto é usável. Quem certifica se o produto é usável ou não, é o
próprio usuário, isto porque é de suma importância para o desig-
ner compreender como as pessoas desenvolvem suas tarefas. Essa
compreensão irá refletir na naturalidade das interações do usuário
com a interface do produto.
Para Rogers et al (2013), são 4 as atividades básicas que
compõem o Design de Interação, auxiliando a favorecer a naturali-
dade das interações. São elas: identificar as necessidades do usuário
e estabelecer os requisitos da solução; desenvolver designs alterna-
tivos que preencham esses requisitos; construir versões interativas
dos designs (protótipos), de maneira que possam ser avaliados usu-
ários e analisados pela equipe e clientes; e finalmente avaliar o que
está sendo construído durante o processo (Figura 6).
É importante ressaltar que estas atividades são iterativas,
isto é, o designer pode retornar a qualquer uma delas durante o
processo, caso identifique que alterações serão necessárias. Asso-
ciadas às atividades básicas de design citadas anteriormente, exis-
tem ainda três características consideradas chave no processo de
Design de Interação. A primeira é o envolvimento dos usuários no
desenvolvimento do projeto. Já a segunda, foca na usabilidade e
nas metas decorrentes da experiência do usuário. Esta última deve
ser identificada, claramente documentada e acordada desde o iní-
cio do projeto. Por fim, a terceira e última característica chave
enfatiza a importância da iteração em todas as quatro atividades
básicas (ROGERS et al, 2013
Figura 6 – Atividades do Processo de Design de Interação.

Fonte: (adaptada de Preece et. al (2013), Fig. 9.3, pág. 332)


Os artefatos criados por designers de interação podem ser
digitais ou analógicos, físicos ou abstratos, ou ainda uma combi-
nação entre essas características. O Design de Interação se preo-
cupa com o comportamento desses produtos, ou seja, como eles
funcionam. Muito do tempo do designer de interação será usado
na definição desses comportamentos, mas o designer não deve es-
quecer que o objetivo é facilitar a interação entre humanos. Esse
novo profissional, na visão de Saffer (2009), deve possuir sete
atitudes, elencadas na Tabela 1 a seguir, perante o desafio de tra-
balhar com Design de Interação (FILENO, 2009).
Tabela 1 – Atitudes esperadas do designer de
interação frente aos desafios atuais

ATITUDES DESCRIÇÃO

Saber entender o usuário é a chave do sucesso no


Design de Interação, e a melhor forma de entendê-lo
Focar sempre no usuário
é questionando suas escolhas e observando suas
ações.

Desenvolver novos produtos e serviços implica em


Encontrar boas soluções criar as escolhas. Quando se tem duas opções, deve-
-se buscar sempre uma terceira.

Designers encontram suas soluções através da gera-


ção de muitas ideias. Para comparar essas ideias, de-
Gerar muitas ideias e buscar uma
vem procurar montar protótipos rápidos, pois assim
prototipação rápida
as péssimas ideias são descartadas rapidamente após
os primeiros testes.

O design como ciência não está só, ele dialoga com


vários campos do conhecimento humano. E o desig-
Saber trabalhar de forma colabora-
ner, da mesma forma, não deve se isolar. Ele deve
tiva
trabalhar de forma colaborativa e utilizando vários
recursos tecnológicos de comunicação.

O designer deve criar soluções apropriadas para


determinado contexto em que os usuários estão in-
Criar soluções apropriadas seridos. O contexto de uso do objeto ou do serviço
deve estar em conformidade com o contexto históri-
co-social em que o indivíduo está inserido.

A interdisciplinaridade deve fazer parte do dia a dia


Desenvolver com um amplo campo
do designer de interação e com isso ele deve se ins-
de influências
pirar na busca por novas soluções

O aspecto emocional dentro do desenvolvimento de


um produto é o elo entre as pessoas e os aparatos
Saber incorporar a emoção em seus
tecnológicos. Produtos sem o componente emocio-
projetos
nal estão desconectados das pessoas e são produtos
sem vida.

Fonte: adaptada de Saffer (2009)


Além dessas sete atitudes, o designer de interação deve
estar preparado para trabalhar com ideias e projetos já criados,
que estão no mercado, ou que por algum motivo já saíram. Nesse
caso, o papel do designer é dar um novo significado a essas ideias,
procurando fazer surgir algo inovador.

7. CONCLUSÃO
A IHC permite uma melhor compreensão da interação
entre pessoas e sistemas computacionais. Isso redunda em uma
melhor qualidade no projeto e na construção de Sistemas Com-
putacionais Interativos. Projetar produtos interativos com base
nas capacidades e necessidades das pessoas - ao invés de focar
nas tecnologias e nos requisitos computacionais - gera produtos
com maior qualidade de uso e que trazem satisfação aos usu-
ários. Este capítulo discutiu brevemente alguns dos principais
tópicos relacionados à IHC, com o objetivo de familiarizar pes-
soas interessadas no desenvolvimento de sistemas e mídias digi-
tais com estes conceitos. É importante ressaltar que os assuntos
abordados neste capítulo não são discutidos de forma exaustiva.
Existem muitas outras facetas da Interação Humano-Computa-
dor que devem ser exploradas por aqueles que desejem com-
preender, analisar, projetar e avaliar interfaces considerando os
fatores humanos, além dos computacionais.
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PROCESSO DE
DESENVOLVIMENTO E
AVALIAÇÃO DE JOGOS:
UM ESTUDO DE CASO
Processo de Desenvolvimento e Avaliação de
Jogos: Um Estudo de Caso
Sibele Castro, Ticianne Darin

1.INTRODUÇÃO
A tipografia está em toda parte, em interfaces, embala-
gens e impressos e ela tem o poder de contar histórias, expressar
emoções e influenciar comportamentos através de palavras e for-
mas, tornando-se um importante elemento da comunicação visual
(CULLEN, 2012). O universo da tipografia é costumeiramente
relacionado a aspectos como legibilidade, hierarquia e funcionali-
dade, contudo, o estilo e a personalidade de uma fonte tipográfica
podem ser fatores decisivos, influenciando a forma como uma
mensagem é vista e afetando direta ou indiretamente os demais
elementos e a harmonia de uma composição gráfica (SALTZ,
2011). Segundo Schriver (1997), toda fonte tipográfica tem uma
personalidade distinta e a habilidade de provocar diferentes sen-
timentos e emoções, tais como delicadeza, elegância, agitação e
medo. Sendo assim, é notável a importância deste assunto para
formação de estudantes e profissionais da área de comunicação
visual, podendo este ser usado para reforçar o tema e o tom que
pretendem passar em seus produtos através da tipografia.
Comumente lecionada em meio a diversos assuntos da
comunicação social e visual, a tipografia ainda enfrenta certa di-
ficuldade de aprendizagem, principalmente no que se diz respei-
to a prática necessária para o aperfeiçoamento no assunto. Neste
cenário, os jogos aparecem como uma forma lúdica e eficaz de
complementar esta aprendizagem. Analógicos e digitais, os jogos
têm se tornado presentes na vida das pessoas, sejam eles voltados
para o entretenimento ou mesmo como auxílio na aprendizagem,
podendo servir como um poderoso recurso educacional que vem
despertando interesse de educadores e pesquisadores em relação
aos aspectos da motivação encontrada nos jogos em função da
aprendizagem (GRACEY,1992).
Na atualidade, a sociedade, principalmente os jovens, está
cada vez mais conectada às mídias digitais e ao mundo da tecno-
logia, aumentando o número de possíveis interações e abordagens
educacionais a favor do conhecimento. Este crescimento vem im-
pulsionando importantes mudanças, que podem ser associadas ao
processo de ensino e aprendizagem. A utilização de jogos como
auxílio à educação vem como uma forma de adaptação à geração
digital. Segundo Corrêa (2010), os jogos podem funcionar como
um estímulo ao desenvolvimento de habilidades ou como auxílio
na construção de conhecimentos, proporcionando uma experiên-
cia que pode ir além do entretenimento, através de uma imersão
significativa. Além disso, a aprendizagem por meio de jogos tam-
bém pode ensinar os alunos a tomar decisões, descobrir informa-
ções e seguir instruções, permitindo assim a discussão, reflexão e
resolução de problemas.
A produção de jogos voltados para comunicação visual e
que abordem assuntos como tipografia pode ser um grande alia-
do à aprendizagem, através do ensino e treino de conhecimentos
e até mesmo como alternativa de entretenimento à estudantes e
profissionais da área. Contudo, a produção de jogos voltados para
a tipografia ainda é limitada, principalmente por se tratar de um
conhecimento mais especifico. Em uma pesquisa exploratória
para identificação do estado da arte, foi identificado que a maioria
dos jogos existentes nessa temática, como os jogos Shape Type
(2016) e Kern Type (2016), trabalham aspectos técnicos da tipo-
grafia e muitas vezes apresentam um nível de dificuldade muito
elevado para o público-alvo, fazendo com que estes se desinte-
ressassem pelos jogos facilmente, fato que pode ser comprovado
através de entrevistas realizadas com alunos e professores da área
durante esta pesquisa e que serão apontadas posteriormente. Ten-
do como campo de pesquisa o curso Sistemas e Mídias Digitais,
foi possível observar, através de entrevistas descritas no tópico 3
deste trabalho que os alunos não consideravam o conteúdo das
disciplinas suficiente para suprir suas necessidades de aprendi-
zagem. Um dos pontos levantados foi o pouco tempo de prática
acarretado pela quantidade reduzida de disciplinas sobre tipogra-
fia, já que o curso oferta somente algumas disciplinas fundamen-
tais que abordam o assunto, como comunicação visual, design de
interfaces gráficas e experimentos em tipografia digital.
Com o objetivo de oferecer aos estudantes e profissionais
de comunicação uma opção divertida para exercitar a criativida-
de e os conhecimentos sobre personalidades e estilos tipográficos
e funcionar como uma fonte complementar na aprendizagem do
assunto, este trabalho propõe um jogo estilo party game, o qual é
voltado para entretenimento em grupo, com uso de regras simples
e mecânicas dinâmicas, que combina interação analógica e digital
através de uma aplicação para o sistema operacional Android. O
produto em questão poderá ser utilizado como auxílio na fixação
destes conhecimentos, aproveitando-se da socialização já exis-
tente entre alunos de um mesmo curso.
Este artigo está dividido em seis Sessões. Na Sessão 1 é
apresentado a justificativa e a motivação deste trabalho, na Ses-
são 2 são apresentados os trabalhos relacionados, na Sessão 3 é
apresentada a proposta de solução através do jogo Not My Type,
na Sessão 4 é descrito o processo de design, na Sessão 5 é reali-
zada a avaliação do jogo e por fim, na Sessão 6, as considerações
finais.

2.TRABALHOS RELACIONADOS
Com o objetivo de analisar a temática, o conteúdo, a me-
cânica e o design em jogos sobre tipografia, foi realizado um le-
vantamento da produção existente no mercado de jogos através de
uma pesquisa de referência na Web, em sites e em blogs. Foram
selecionados aqueles que se destacaram de alguma forma, seja
pelo conteúdo ou mecânica utilizada. Isso contribuiu com o de-
senvolvimento do produto, servindo como referência para a pro-
dução, além de evitar abordagens pouco eficientes. Foram conta-
bilizados 26 jogos, tanto analógicos como digitais. A seguir são
descritos alguns dos exemplos que contribuíram de forma mais
significativa na concepção do produto, alguns através da forma de
utilização, outros pela interação e alguns até mesmo no conteúdo.
Com base nos jogos elencados, optou-se pelo desenvolvi-
mento de um jogo que trabalhasse aspectos como a personalidade
e o estilo das fontes, para que dessa forma, estudantes e demais
interessados em tipografia pudessem testar seus conhecimentos
sobre aspectos mais práticos e aplicáveis do assunto. Além disso,
foi possível observar as vantagens da utilização tanto de jogos
digitais como de jogos analógicos, optando-se assim por desen-
volver um jogo digital e analógico, utilizando um aplicativo em
combinação com o jogo físico.
O FontSpotting Souza e Witt (2013), (Figura 1), é um jogo
de cartas analógico sobre tipografia que, além do entretenimen-
to, busca colaborar para o desenvolvimento da habilidade de re-
conhecer tipos. Inicialmente são estabelecidos alguns princípios
básicos da tipografia e em seguida o jogo é desenvolvido através
de cartas com diferentes tipos. O objetivo é tentar reconhecer as
fontes mostradas e assim trabalhar esta habilidade. O reconheci-
mento de fontes foi utilizado no Not My Type como uma das for-
mas de adivinhação, porém focando na personalidade das fontes,
não somente em sua forma.
Cartas do jogo FontSpotting.

Fonte: Site Design Taxi

O Fontastic Mewton (2016), (Figura 2), é um jogo digital


para Web que funciona como um quiz. Ele mostra alguma caracte-
rística da fonte através de uma dica e o jogador deve escolher a res-
posta correta. Por ser tratar de um quiz, a interação é simplificada,
porém o conteúdo do jogo é interessante. Foi possível perceber que
a mecânica utilizada do jogo desvalorizava o seu conteúdo, fator
levado em consideração no processo de produção do jogo.
Tela inicial do jogo Fontastic Quiz.

Fonte: Site Medium

O Type Connection Setzer (2016), (Figura 3), é um jogo


para Web que trabalha a habilidade de combinar tipos através da
metáfora de relacionamentos amorosos. O jogador tem acesso às
características de cada fonte e sua missão é conseguir criar pares
de fonte compatíveis através de algumas estratégias. Este jogo le-
vantou a importância da personalização das fontes e de como isso
poderia ser utilizado para facilitar a associação as características
de cada uma.
Tela inicial do jogo Type Connection.

Fonte: Site Turtle Soup

O Type War Eldarion (2010), (Figura 4), é um jogo digital


para Web onde o jogador participa de um duelo de tipos. Inicial-
mente é mostrada uma letra na tela com uma fonte específica e
duas opções de resposta, o objetivo é tentar descobrir qual das
opções é a correta. O jogo é dividido em fases, aumentando a
dificuldade à medida que o jogador alcança o objetivo da fase.
Com esse jogo foi possível perceber a importância da disputa
entre os participantes, principalmente se aplicada a jogos estilo
party game.
Tela inicial do jogo Type War.

Fonte: Site Company Folders

Neste levantamento, também foi possível observar que a


junção de jogos de tabuleiro com jogos digitais tem se tornado
comum no mercado, isso pode ser visto em jogos como Zombi-
cide: Black Plague, Guillotine (2015), 7 Wonders Bauza (2010),
Alchemist, Mortry ( 2014) e Dead of Winter, Guilmour ( 2014),
que possuem aplicativos que ajudam na organização e contabi-
lização dos pontos do jogo, além de fornecer alguns materiais
dentro do próprio aplicativo. Outro exemplo que pode ser citado
é o jogo XCOM, Lang (2015), que além do gerenciamento, passa
as regras do jogo gradualmente, controla o nível de dificuldade e
o tempo dos jogadores. Sua principal função é controlar a ordem
das ações e o tempo para realizá-las, tornando a parte analógica
mais simples de ser entendida, ou seja, a utilização do aplica-
tivo colabora com a experiência do jogo de tabuleiro. Levando
em consideração tais vantagens, o Not My Type traz este modelo
como uma forma de tornar a experiência de jogo mais estimulante
e dinâmica, fazendo com que ele seja mais facilmente compreen-
dido através da utilização do aplicativo como um controlador do
fluxo do jogo e até mesmo como um guia durante a partida.

3.PROPOSTA DE SOLUÇÃO: O JOGO NOT MY TYPE


Os jogos são ambientes atrativos e interativos que ofere-
cem desafios e conseguem capturar a atenção do jogador (MA-
CKAY, 2015). De forma lúdica e aproveitando-se da socialização
existente entre os alunos do curso, o jogo Not My Type surgiu da
necessidade de trabalhar aspectos práticos da tipografia aprendi-
dos em disciplinas do curso Sistemas e Mídias Digitais. A seguir,
apresentamos o processo de identificação de necessidades do pú-
blico, a conceituação do jogo e descrevemos sua proposta.

3.1 Identificação de Necessidades


Para fundamentação do problema, foram realizados dois
conjuntos de entrevistas, ambos com o objetivo de identificar as
principais dificuldades encontradas por alunos e professores no de-
sempenho nas disciplinas relacionadas à tipografia, as preferências
em relação a forma de abordagem e a relação do público com jogos.
3.1.1 Entrevistas com Alunos
O primeiro conjunto de entrevistas ocorreu no dia 26/03/14
nas dependências da Seara da Ciência (UFC). O público-alvo foi
ex-alunos das disciplinas de comunicação visual ou experimen-
tos em tipografia digital que cursaram pelo menos uma das duas
disciplinas mencionadas no último ano. Foram entrevistados 10
alunos, em sessões de duração aproximada de 15 minutos, haven-
do representantes do 5º, 6º, 7º e 8º semestre, todos estudantes do
curso, com idade entre 20 e 24 anos. Em formato de entrevista
semiestruturada, foram feitas um total de 14 perguntas, abrangen-
do tipografia, disciplinas cursadas que envolvessem o assunto e
jogos sobre tipografia.
Os resultados obtidos nesta pesquisa mostraram que 7 en-
tre 10 alunos preferem assuntos e atividades que exijam mais de
sua criatividade. Dentre as principais dificuldades encontradas,
a necessidade de um tempo considerável de prática para conse-
guir chegar a um bom nível de conhecimento na tipografia foi a
mais citada, tanto em seus aspectos analógicos como digitais. Em
relação aos jogos já utilizados sobre tipografia, a opinião geral
é que eles costumam ser muito técnicos, sendo difícil criar um
engajamento com o jogo. Os alunos demonstraram preferência
por jogos que trabalham a interação em grupo, a disputa instigada
pelo jogo foi um fator importante para os participantes. 8 entre
10 alunos entrevistados gostam de jogos de plataforma Mobile e
de jogos de tabuleiro, apesar disso, não são jogadores assíduos.
Os participantes afirmaram que o visual de um jogo é muito im-
portante, pois costumam criar interesse por jogos a partir de sua
estética. Além disso, consideram ruins jogos com grau de dificul-
dade muito elevado ou que exijam conhecimentos específicos em
algum assunto.

3.1.2 Entrevistas com Professores


O segundo conjunto de entrevistas também seguiu o for-
mato semiestruturado e foi realizada na semana de 7 a 12 de se-
tembro de 2015, onde foram entrevistados três professores es-
pecialistas que atuam nas áreas de comunicação visual, design
de interfaces, tipografia ou oficinas de desenvolvimento prático
dentro do curso Sistemas e Mídias Digitais. Os entrevistados pos-
suem em média 8 anos de experiência com Comunicação Visu-
al, Design de Interfaces, ou Tipografia. As entrevistas ocorreram
em sessões de duração aproximada de 20 minutos, contando com
12 perguntas, abrangendo tipografia, desempenho dos alunos nas
disciplinas e jogos sobre tipografia.
Os resultados obtidos nesta pesquisa mostraram que, na
opinião dos professores da área, a tipografia tem igual ou maior
importância quando comparada a outros elementos do design grá-
fico, como imagem, forma ou composição. De acordo com os en-
trevistados, a tipografia carrega o conteúdo e tem que se adaptar
de diversas formas à personalidade do projeto. A personalidade de
uma fonte tipográfica foi considerada um ponto importante que
pode influenciar uma mensagem passada e que, quando utilizada
de maneira inapropriada, pode causar desconforto ao público em
questão, além de perder o sentido de sua utilização.
Os professores entrevistados não conheciam muitos jogos
que trabalhassem com conceitos de tipografia e, dos poucos que
já haviam tido algum contato, geralmente trabalhavam concei-
tos mais técnicos da tipografia. Apesar do número de disciplinas
relacionadas à tipografia no curso ser reduzido, os entrevistados
consideram que a quantidade é suficiente para suprir os conheci-
mentos desta área em um curso de graduação, já que existe muito
conteúdo a ser visto e que é possível fazer disciplinas optativas
ou mesmo fora do curso que trabalhem com a tipografia de forma
mais específica.
Os entrevistados concordaram que a forma com a qual os
alunos lidam com a tipografia em seus projetos dentro do curso
varia bastante, havendo especificidades entre grupos de alunos.
Eles estimam que metade dos alunos de turmas que desenvolvem
projetos conseguem aplicar bem os conceitos da tipografia. No
entanto, um dos entrevistados que atua mais fortemente em disci-
plinas de caráter prático, onde é possível avaliar detalhadamente
o desenvolvimento de projetos, defende que a maioria dos alunos
não aplica o que é aprendido em sala de aula satisfatoriamente. A
maior dificuldade observada pelos professores nos alunos é que
muitos não conseguem trabalhar bem a combinação entre dife-
rentes fontes e também sentem dificuldade em escolher a fonte
mais apropriada para cada tipo de projeto, de acordo com suas
especificações e personalidade, especialmente quando se trabalha
com marcas. Além disso, os professores avaliaram que os alunos
não costumam se preocupar em refletir a personalidade de seus
projetos na tipografia utilizada, optando por tipos versáteis.
3.2 Conceituação do Jogo
Uma vez identificadas as necessidades dos professores e
dos alunos com relação ao ensino e aprendizagem de tipografia
no contexto escolhido, foi criado o conceito de Not My Type, com
o objetivo de ser utilizado como auxílio na fixação de conheci-
mentos, aproveitando-se da socialização já existente entre alunos
de um mesmo curso.
Not My Type busca unir as vantagens da utilização de jogos
digitais e analógicos, e assim atrair os jogadores para um mundo
fictício, despertando neles diversos sentimentos e emoções. Além
disso, o jogo aproveita-se de recursos audiovisuais proporciona-
dos pelo digital, como músicas e vídeos, e do acesso à internet
para buscas, bem como da diversão e envolvimento que o jogo
analógico consegue proporcionar.
Durante o jogo, os participantes terão que usar seus co-
nhecimentos tipográficos para representar diferentes fontes aos
demais jogadores através de recursos midiáticos e analógicos. Ao
utilizar um jogo sobre características e personalidade de fontes,
os jogadores são induzidos a pensar sobre as mesmas, buscando
diferentes formas de representá-las, gerando assim uma reflexão
sobre o tema. Além disso, o jogo traz pequenas pistas sobre as ca-
racterísticas de cada fonte, como uma forma de relembrar aspec-
tos relacionados a ela, facilitando as relações com o conhecimen-
to já existente de cada um. O jogo também tira vantagem da so-
cialização através da utilização do estilo party game, comumente
utilizado em encontros e socializações, onde os participantes dis-
putam entre si, fazendo assim com que os jogadores se envolvam
mais, tanto no jogo como entre si mesmos (KITZINGER, 1994).
A cada rodada, um jogador diferente fará o papel de clien-
te, que vai representar a fonte escolhida, e os outros jogadores
farão o papel de designers, que tentarão descobrir qual fonte é a
correta. O roteiro do jogo é ambientado na relação Cliente-Desig-
ner existente no mercado de trabalho. O cliente que não conhece
bem fontes tipográficas, tenta comunicar para os designers a per-
sonalidade e características da fonte em questão, através de dinâ-
micas como mímica, vídeos, músicas ou imagens. Enquanto isso,
os designers disputam entre si, tentando descobrir qual é a fonte
correta da rodada. O objetivo do jogo é acertar a maior quan-
tidade de fontes e, dessa forma, ganhar mais pontos. O número
de rodadas é igual ao número de jogadores. Ao final, aquele que
somar mais pontos será o vencedor. O público-alvo do jogo são
estudantes ou profissionais da área de comunicação visual que
tenham interesse por tipografia.

3.2.1 Elementos do Jogo


O jogo funciona através de uma aplicação para o sistema
Android que pode ser adquirida gratuitamente pela Play Store¹
e, por se tratar de um jogo analógico e digital, é necessário que,
além da aplicação, também se tenha impresso o conjunto de car-
tas do jogo que podem ser obtidas através de endereço eletrônico
fornecido no jogo². Esse conjunto é composto por 20 cartas de
fontes (Figura 5), 6 cartas com diferentes personagens (Figura
6) e 6 cartas de regras rápidas. Este jogo possuí ainda uma ver-
são independente que funciona totalmente off-line, as dinâmicas,
no entanto, são reduzidas e abordadas de uma forma alternativa,
através da música, mímica e desenho.
Existem 3 tipos diferentes de cartas de fonte, classificadas
de acordo com o nível de similaridade das características de cada
uma, ou seja, quanto mais características em comum, mais difí-
cil será de serem identificadas. As cartas são divididas em: fácil
(Helvetica, Frutiger, Gill Sans, Bodoni, Times New Roman, Gara-
mond); médio (Walkway, Futura, Trajan, Rockwell, Courier, Be-
bas, League Gothic); e difícil (Comic Sans, Jokerman, Rosewood,
Stencil, Old English, Papyrus, Lavanderia). Estas cartas possuem
marcadores de realidade aumentada baseada em imagens que se-
rão lidos pelo aplicativo (Figura 7), o qual utilizou o framework
Vuforia para seu desenvolvimento, permitindo que uma imagem
qualquer possa se tornar um marcador.

¹https://play.google.com/store/apps/developer?id=Hot+Pocket+Lab
² https://www.dropbox.com/sh/vlvq9kk12vkgadv/AADFVQf1Sb9i2sBusXVRBIlqa?dl=0
Cartas de fontes do Not My Type divididas em fáceis, médias e difíceis

Fonte: As autoras
3.2.2 Funcionamento do Jogo
O funcionamento do jogo é dividido em 5 dinâmicas: Es-
colha dos Personagens, Sorteio do Cliente, Puxando a Fonte, Di-
nâmica de Partida e Adivinhando as Fontes. Para jogar é neces-
sário utilizar pelo menos um smartphone ou tablet com conexão
com a Internet.
Para dar início ao jogo é preciso definir o número de par-
ticipantes e escolher os personagens que irão participar da parti-
da. Através do aplicativo é sorteado o jogador que fará o papel
de cliente da rodada (Figura 7), aquele que irá desenvolver as
dinâmicas para que os outros jogadores tentem descobrir. O jo-
gador cliente puxa uma carta do baralho e, sem que os demais
vejam, utiliza o leitor do aplicativo para registrar a carta tirada
(Figura 8). Após esta etapa, o aplicativo irá sortear uma das di-
nâmicas para que o cliente desenvolva. Cada dinâmica tem suas
particularidades e um número diferente de pontos, de acordo com
a dificuldade associada. O jogador poderá procurar a sua forma
de representar a fonte usando o tempo que desejar, mas após en-
contrá-la, terá apenas um minuto para apresentá-la aos demais
jogadores. Durante esse tempo, os jogadores, no papel de desig-
ners, tentarão adivinhar qual a fonte da rodada. Para isso, eles irão
jogar sua carta de personagem definindo a sequência de palpites.
Interação do usuário na tela de sorteio do personagem.

Fonte: as autoras

Interação do usuário na tela de leitura da carta de fonte.

Fonte: as autoras

A última etapa é onde ocorre a tentativa de adivinhar a


fonte. Os jogadores realizam seus palpites, que podem ser tanto
digitando o nome da fonte quanto escolhendo entre um grupo de
opções. Na primeira opção, por ser mais difícil, a pontuação é
maior. Depois que todos os jogadores designers inserirem seus
palpites, o jogo irá apresentar a pontuação de acordo com os cál-
culos especificados no jogo. Todos estes passos repetem-se até
que cada jogador tenha sido “Cliente” pelo menos uma vez. Ao
final de cada rodada é apresentada a pontuação parcial e ao final
do jogo é apresentada a pontuação geral, mostrando assim quem
foi o ganhador da partida.

4. PROCESSO DE DESIGN
O design, muitas vezes visto como uma área puramente
estética, é na verdade uma importante ferramenta de comunica-
ção que busca desenvolver soluções lógicas para um determina-
do problema, sendo esse o objeto de estudo do profissional de
comunicação visual. O processo de design pode variar bastante
dependendo do projeto, da aplicação ou mesmo do profissional
que o está desenvolvendo. Portanto, a utilização de uma meto-
dologia de desenvolvimento é essencial para organizar e dividir
este processo em etapas, servindo assim como um guia de refe-
rência (OSTROWER, 1978). O Design Thinking é um processo
consiste em diversas etapas de desenvolvimento, onde cada uma
delas exige a execução de atividades, sociais ou cognitivas, em
um determinado tempo.
O processo de desenvolvimento do design do jogo, que in-
clui a interface do aplicativo, as cartas e o manual, foi baseado na
metodologia mostrada no livro “Design Thinking” de Ambrose &
Harris (2009), dividido em sete etapas: definição, pesquisa, ide-
ação, prototipação, seleção, produção e validação. A seguir será
mostrado cada uma destas etapas com mais detalhes.

4.1 Definição
A primeira etapa do processo teve como principal objetivo
a identificação do problema e, para isso, foram coletadas infor-
mações e criado um documento de briefing que, além do proble-
ma, também levantou pontos com o público-alvo e o objetivo do
projeto. Com base nisso, foi dado início ao processo de design do
produto a partir da investigação do público e possíveis estilos a
serem abordados.

4.2 Pesquisa
A etapa de pesquisa buscou imergir, analisar e sintetizar
informações sobre o problema, o público alvo e sobre o assunto a
ser trabalhado. Na primeira etapa, foi feita uma busca de informa-
ções sobre tipografia em fontes diversas como Websites, blogs, ar-
tigos, entre outros, utilizando fontes seguras da internet. Esse tipo
de pesquisa é denominado pesquisa Desk (2012), seu objetivo é, a
partir da definição do assunto, criar uma lista de temas relaciona-
dos para dar início à investigação. As referências coletadas são re-
gistradas com um título que resume a informação, uma descrição
e a fonte. Esse levantamento listou informações sobre famílias
tipográficas, hierarquia, legibilidade, espaçamento, estilos, entre
outros, e sua principal função foi identificar o que poderia ser me-
lhor trabalhado em relação ao assunto, abordagem e estilo.
Ainda na etapa de pesquisa foi feito um levantamento re-
ferencial de materiais desenvolvidos que pudessem servir de ins-
piração ao projeto. Nesta etapa, buscou-se analisar o que já havia
sido produzido no mercado, tanto com jogos como com outros
elementos não necessariamente relacionáveis, mas que pudessem
ser úteis para a geração de ideias. A ampliação da visão que esta
etapa propõe colabora para a aprendizagem, para conhecer o que
já foi produzido e assim evitar possíveis erros ou abordagens não
apropriadas.

4.3 Ideação
A partir da pesquisa de referência, foram coletados e se-
lecionados alguns estilos de design que poderiam se adequar ao
projeto. Em uma sessão individual de brainstorming, estes ele-
mentos selecionados foram dispostos aleatoriamente de forma
impressa em uma mesa e depois agrupados por estilo, sentimen-
tos que despertavam ou conceitos em comum. Em seguida, foi
possível identificar de forma mais clara as relações e abordagens
que melhor funcionariam com o público e a partir disso selecio-
nar alguns estilos a serem trabalhados na prototipação do jogo.
4.4 Prototipação
O processo de design foi realizado juntamente com o pro-
cesso de desenvolvimento do jogo. A etapa de prototipação foi
somente iniciada após a produção do roteiro e definição da mecâ-
nica e fluxo do jogo. Com a ideia do projeto fechada e os elemen-
tos a serem desenvolvidos já listados, foi dado início ao desen-
volvimento dos elementos gráficos do jogo como forma de teste.
O primeiro elemento a ser desenvolvido foram as cartas do jogo,
que criaram uma identidade para todos os demais elementos. Foi
dado início aos testes de estilo gráfico, através de desenhos esbo-
çados, que, em seguida, passaram por uma seleção e aprimora-
mento através da utilização de mockups daqueles escolhidos, que
é uma versão não interativa do layout em questão.
A interface do aplicativo seguiu a mesma sequência de
ações, porém sua etapa de prototipação só foi iniciada após a sele-
ção dos elementos analógicos com a identidade visual já definida,
esta seleção foi realizada pela equipe de desenvolvimento do jogo.
Para desenvolvimento da interface do aplicativo, inicialmente foi
produzido um protótipo de baixa fidelidade para definir as informa-
ções e interações exatas que deveriam estar presentes em cada tela,
a fim de pensar elementos da usabilidade e da interação entre as te-
las. Para isso foi feita uma listagem com todas as telas que deviam
estar presentes, o fluxo de atividades e os nomes de cada tela, com
os respectivos elementos que deveriam estar presentes para que a
interação fizesse sentido, como textos e botões.
4.5 Seleção
A partir dos mockups desenvolvidos na etapa anterior, fo-
ram definidos estilo, cores, layout, metáforas e demais elementos
do projeto gráfico, que fundamentou a identidade tanto da parte
digital como analógica do jogo. As formas utilizadas nos elemen-
tos do layout seguiram um padrão geométrico, com predominân-
cia de pentágonos dispostos de forma irregular, representando a
comunicação como algo mutável e dinâmico.
A paleta de cores escolhida buscou representar a dinami-
cidade e a jovialidade de um jogo estilo party game, assim como
transparecer a personalidade comunicativa do público-alvo, utili-
zando para isso combinações de tons alegres como o lilás, o azul e
o amarelo. Assim como as cores, a utilização de personagens com
diferentes características teve o intuito de criar formas de associa-
ção dos jogadores com cada personagem, abrangendo diferentes
estilos e formas de expressão.

4.6 Produção
Após a definição da identidade do jogo, foi iniciada a pro-
dução dos elementos. Os primeiros itens a serem desenvolvidos
foram as cartas analógicas (personagens e fontes), seguida pela
marca do produto, telas do jogo e, por fim, o manual. A interface
digital do jogo foi feita gradativamente, tela por tela, conforme o
projeto ia sendo desenvolvido.
4.7 Validação
Ao fim do processo, todos os elementos passaram por uma
validação de design por profissionais de comunicação visual, focan-
do não somente no visual, mas também nos textos e forma de comu-
nicação da informação. A avaliação completa do jogo foi feita atra-
vés de um teste com o usuário que será descrita na sessão a seguir.

5.AVALIAÇÃO DO JOGO
Antes da finalização e entrega de um produto interativo, é
necessário verificar se ele consegue suprir todas as necessidades
do usuário na realização de tarefas através da interface propos-
ta. Com a validação é possível identificar dificuldades de uso e
barreiras que possam comprometer a interação do usuário com o
produto em questão (FREIRE, 2008). Existem diversos modelos
de avaliação e heurísticas utilizados para análise da interface de
softwares como as propostas por Nielson (1994); Ji et al. (2016),
que apesar de não serem específicos para jogos, podem ser utiliza-
dos para a avaliação da interação. Alguns autores como Federoff
(2002) e Desurvire et al. (2004) têm desenvolvido heurísticas que
cobrem diversas questões de design relacionada a jogos, como a
jogabilidade (como o jogador interage com o jogo), a mecânica
de jogo, a usabilidade e até a diversão.
A avaliação proposta para este jogo busca analisar a inte-
ração do usuário com a interface a fim de validar aspectos como
a qualidade do design da interface, a qualidade da interação pro-
posta, a usabilidade da interface, a jogabilidade e a opinião dos
participantes de forma geral sobre o jogo. Com base nisso, a pes-
quisa foi realizada no dia 20 de janeiro de 2016 com a presença
de dois avaliadores, onde foram observados dois grupos de teste
separadamente (grupo A e grupo B), sendo cada grupo composto
por 3 integrantes, estudantes do curso Sistemas e Mídias Digitais
do 7º e 8º semestre, com idade entre 21 e 24 anos.

5.1 Prototipação
A metodologia utilizada nesta avaliação foi dividida em
três etapas. Inicialmente foi realizada uma entrevista pré-teste
aplicada com o grupo cujo objetivo foi identificar a proximidade
do usuário com a tipografia, além de obter dados gerais sobre
os participantes. Em seguida, foi dada uma pequena orientação
sobre o jogo para familiarização e exploração prévia antes de dar
início ao teste com o usuário. Na segunda etapa, foi realizado o
teste do jogo, como principal objetivo de avaliar a interação dos
usuários com o jogo e entre a equipe participante. Esta avaliação
foi registrada através de observação e anotações dos avaliadores,
pois nem sempre os usuários percebem ou conseguem expressar
a sua experiência de uso com o jogo. A observação do uso do
produto pelo usuário permite ao avaliador ter uma visão dos pro-
blemas sendo vivenciados pelos usuários.
Após o término do jogo, os jogadores responderam ao
questionário de avaliação pós-teste com 51 afirmações com esca-
la likert de 1 a 5, com dois polos, onde o usuário deveria escolher
o número que representasse sua concordância em relação às afir-
mações citadas. Esta avaliação teve como fundamentação as re-
gras de ouro de Shneiderman (2010), no QUIS (Questionnaire for
User Interaction Satisfaction), Kitzinger(1989) e nas heurísticas
para jogabilidade de jogos móveis (KORHONEN, 2016). As afir-
mações buscaram descobrir informações em relação à consistên-
cia, interface, gameplay, usabilidade, feedbacks e erros do jogo.

5.2 Resultados da Avaliação


A avaliação realizada permitiu a validação de diversos as-
pectos do jogo como confiabilidade, utilidade, facilidade, clareza
e sua forma de utilização, além disso, alguns outros problemas
que serão mostrados a seguir também puderam ser avaliados atra-
vés dos resultados.

5.2.1 Entrevista Pré-teste


Nesta entrevista foram coletadas algumas informações
gerais sobre os participantes e seu contato com a tipografia. Am-
bos os grupos passaram por disciplinas básicas do curso que en-
volvessem tipografia de alguma forma, como introdução à mídia
digital, comunicação visual I e design de interfaces. Dentre os 6
participantes, 4 deles também haviam cursado disciplinas com-
plementares como direção de arte para multimídia e experimentos
em tipografia digital.
Em relação ao contato dos participantes com a tipografia
no dia-a-dia, foi possível perceber que o grupo A possuía contato
mais próximo com o assunto em relação ao grupo B. Além do
contato através das disciplinas, o grupo A costuma ter acesso a
conteúdo sobre o tema pela internet, em trabalhos, eventos ou
cursos com uma frequência média ou alta, enquanto o grupo B
apenas casualmente ou nunca. Também foi possível descobrir
que os participantes, apesar de não serem jogadores assíduos, co-
nheciam alguns jogos sobre tipografia, em sua maioria digitais.
Alguns exemplos citados foram os jogos Typedrummer (STETZ,
2016; Type: Rider BULKYPIX, 2014 ; Concept BEAUJANNOT
e RIVOLLET, 2013).

5.2.2 Teste com o Produto


Os dados coletados nesta etapa deram-se através da ob-
servação e anotações dos avaliadores a respeito da interação dos
participantes com o jogo.
Grupo A durante a interação com o produto.

Fonte: as autoras

No grupo A (Figura 9), os usuários saíram com uma sen-


sação positiva ao realizar o teste, o jogo foi entendido facilmente
apenas com as explicações gerais e os jogadores mostraram-se
empolgados com a interação, expressando emoções positivas. A
mesma reação foi observada em relação à identidade do jogo, que
foi considerada consistente.
A primeira rodada do jogo foi a mais problemática, pois os
usuários não estavam entendendo a dinâmica do jogo, mas a partir
da segunda rodada o problema já havia sido superado. Os proble-
mas apresentados foram pontuais e não comprometeram o segui-
mento do jogo e do teste. Apesar de não apresentar grandes proble-
mas, os apontamentos dos usuários e os problemas detectados no
método devem ser analisados de forma cuidadosa visando melho-
rias na experiência do usuário. Alguns pontos levantados foram:
O jogo foi considerado limitado em relação ao número de
partidas, os usuários sentiram que mesmo após as 3 rodadas, o
jogo poderia ter continuado por mais tempo.
O tempo dado para a realização das dinâmicas pareceu ser
mais que o necessário, além de não ser possível avançar o tempo.

Grupo B durante a interação com o produto.

Fonte: as autoras

No grupo B (Figura 10), apesar do jogo ter aparentado


uma boa compreensão através somente das explicações gerais, no
decorrer da interação, os usuários demoraram a entender como
era a dinâmica do jogo e ficaram boa parte do tempo realizando
algumas interações de forma equivocada, como iniciar a ativida-
de que exigia tempo cronometrado sem antes seguir para a tela
que havia o cronômetro. Eles demoraram a recorrer as instruções
do jogo mostradas através da interface, que serviam como um
guia. Além disso, eles tiveram dificuldade em entender alguns
pontos clicáveis, como o dado para sorteio dos participantes ou o
cronômetro. A identidade visual do jogo foi elogiada.
O jogo pareceu exigir um nível de conhecimento maior
dos usuários sobre o assunto neste grupo em específico e os par-
ticipantes não chegaram a pontuar. Neste teste foi possível obser-
var alguns problemas pontuais de affordance da interface, ou seja,
a qualidade que permite a identificação da funcionalidade de um
elemento da interface sem a necessidade de prévia explicação.
Como, por exemplo:
O botão utilizado para sortear o cliente, representado atra-
vés de um dado, não pareceu ser intuitivo nesta aplicação. Pro-
blema causado devido à deficiência estética do elemento, que não
remetia facilmente a nenhum botão.
A tela de leitura do marcador da carta demorou a ser en-
tendida. O problema foi causado porque durante a utilização do
jogo, o dispositivo estava em cima de uma mesa, fazendo com
que quando a aplicação fosse para a câmera o jogador visse so-
mente uma tela preta, pois a lente da câmera estava coberta.

5.2.3 Questionário de Avaliação Pós-teste


Este questionário levantou informações sobre a opinião
dos jogadores após a utilização do produto, focando tanto em as-
pectos gerais do jogo como em aspectos da interface e elementos
visuais. De forma geral, o jogo foi classificado pela maioria dos
participantes como útil, confiável, fácil, estimulante em sua maior
parte e compensador, como mostra a tabela a seguir (Figura 11).
Tabela com resultados do questionário de avaliação.

Fonte: as autoras

O jogo foi considerado consistente, assim como suas termi-


nologias, menus e telas. As cores e as fontes utilizadas na interface
foram trabalhadas harmonicamente e o layout das telas foi consi-
derado eficiente e visualmente agradável. A organização da infor-
mação no jogo e a sequência de telas também foi considerada clara.
Em relação à usabilidade do jogo, os usuários considera-
ram que as explicações em texto dadas através da interface foram
suficientes para prosseguir. Os indicadores do jogo (pontuação,
erro e acerto) estavam visíveis. Em relação ao conhecimento ne-
cessário para o jogo, as opiniões foram divididas, alguns concor-
dam que qualquer pessoa com o mínimo de conhecimento em
tipografia conseguiria utilizar o jogo sem problemas, já outros
não concordaram com a alegação. As terminologias do jogo fo-
ram bem entendidas. A navegação foi considerada consistente e
lógica, assim como os controles do jogo. A ajuda no jogo não foi
facilmente encontrada, porém ela não estava na interface do apli-
cativo, e sim nas cartas.
O jogo foi considerado de fácil entendimento na maioria
dos casos, fornecendo avisos e mensagens claras. Cerca de meta-
de dos jogadores consideraram que, em algum momento, tiveram
a sensação que a interação não havia sido recebida pelo aplicativo,
sendo necessária sua repetição. Apenas metade dos participantes
conseguiram identificar as etapas do jogo de forma distinta (iní-
cio, meio e fim), possivelmente ocasionado pela pouca utilização
das cartas de orientação, uma possível solução seria a integração
destes guias na interface digital de forma mais evidente. Porém,
eles não se sentiram perdidos durante a utilização e conseguiram
realizar as ações planejadas na interação.
Alguns erros foram apontados no jogo, como pequenos
erros na pontuação, mas nada que pudesse comprometer sua uti-
lização. Grande parte dos erros percebidos puderam ser reverti-
dos através da interface e os jogadores não sentiram dificuldade
na tentativa de recuperação de um erro na interação, todavia não
consideraram fácil desfazer ações no jogo. Os usuários sentiram-
-se no controle das ações e durante a utilização tiveram o resul-
tado esperado. A interação do jogo como um todo foi avaliada
como simples, sem se estender demasiadamente ou chegar a ser
cansativa. Os jogadores não precisaram buscar informações em
telas anteriores para realização de uma ação ou memorizar muita
informação desnecessariamente.
Em relação ao gameplay, o jogo foi visto com objetivos
claros, além de dar suporte ao jogador, sendo possível ver o pro-
gresso durante as rodadas e comparar os resultados ao longo do
jogo. As recompensas recebidas foram significantes e motivaram
o jogador. Os desafios, a estratégia e o ritmo do jogo estavam bem
balanceados. A história do jogo foi significativa e adequada ao
gameplay, segundo a maioria, fazendo com que a primeira expe-
riência fosse encorajadora. Não foram observadas tarefas repeti-
tivas ou enfadonhas. As opiniões, porém, divergiram em relação
a considerar que o jogo suporta diferentes estilos de jogadores.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com o objetivo de oferecer uma alternativa lúdica para o
exercício de conhecimentos em tipografia para estudantes e pro-
fissionais da comunicação, este trabalho trouxe como uma pro-
posta de solução através do Not My Type, desde sua concepção
até sua avaliação, onde foi possível acompanhar cada etapa e con-
firmar a importância do processo de desenvolvimento de design
de um jogo, assim como de sua avaliação e validação através da
utilização do produto pelo usuário final.
Foi possível observar que as pesquisas realizadas inicial-
mente, desde de entrevistas a pesquisas de referências, colabora-
ram significativamente com a produção do jogo, fundamentando
o problema abordado e evitando possíveis erros que poderiam
acontecer caso não houvesse esta etapa. É notável a importân-
cia das etapas de desenvolvimento e como cada uma influenciou
nas decisões tomadas na produção deste jogo. A avaliação final
do jogo funcionou como uma validação e mostrou os principais
problemas de utilização. Os resultados obtidos permitiram identi-
ficar alguns erros existentes no produto, indicando assim formas
concretas de como melhorar a interação do jogo.
Por fim, como trabalhos futuros, além dos ajustes no pro-
duto conforme indicado na avaliação, pretendemos fazer a apli-
cação do jogo em turmas de ensino de tipografia como auxílio na
aprendizagem e analisar como isto pode afetar o desempenho dos
alunos. Podemos levantar também a adaptação do processo de
desenvolvimento aqui utilizado para aplicação à diferentes proje-
tos de design, assim como o próprio jogo em si, que possuí gran-
des capacidades de reutilização, podendo ser aplicado e adaptado
para treino e aprendizagem de outros assuntos.
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COMPREENDER O
USUÁRIO: O PAPEL DA
COGNIÇÃO, DA EMOÇÃO
E DAS ATITUDES
Compreender o Usuário:
O papel da cognição, da Emoção
e das Atitudes
Ana Cristina Antunes

1.COGNIÇÃO – CONCEITUALIZAÇÃO E
IMPLICAÇÕES NO CAMPO DA INTERAÇÃO
HUMANO-COMPUTADOR
Por que é que os usuários apresentam, por vezes, dificul-
dades na interação com novas interfaces? O que é que leva os
usuários a utilizar apenas uma parte e não todas as funcionalida-
des disponibilizadas por um sistema? E por que é que os usuários
cometem erros no processo de interação?
A resposta a estas e outras questões é dada através de um
maior conhecimento da cognição humana, entendida como o
conjunto de processos envolvidos na aquisição, armazenamen-
to, transformação e recuperação de informação (MATLIN, 2005;
NEISSER, 1967). A cognição envolve processos cognitivos como
a atenção, a perceção, a memória, a aprendizagem, a linguagem e
o pensamento, que permitem a realização de diversas atividades
cognitivas, como aprender, armazenar, receber e processar infor-
mação, emitir julgamentos e usar a informação (NEISSER, 1967).
Desde a emergência do paradigma cognitivo e do surgi-
mento da metáfora do processamento de informação, com a ideia
que a mente humana poderia ser compreendida de forma análo-
ga a um computador processador de informação, que a cognição
tem estado no epicentro dos estudos relativos à interação huma-
no-computador (IHC) e das questões práticas inerentes ao design
de tecnologia interativa.
Esta centralidade deriva, sobremaneira, do protagonismo
alcançado pela psicologia cognitiva no seio da psicologia nas úl-
timas décadas do século XX, que levou a que os contributos desta
ciência para a compreensão do usuário e do seu comportamento
se focalizassem na natureza e no funcionamento cognitivo deste.
Com efeito, a psicologia cognitiva informou, quase desde o seu
início, a IHC que, a partir dos avanços registados nesta ciência,
foi construindo teorias e modelos (e.g., modelo GOMS, Card,
Moran, & Newell, 1983; Ciclo de avaliação-execução, Norman,
1988), abraçando novos métodos e delineando novos princípios e
guidelines de design. A este propósito, Johnson (2010), destaca a
sua relevância quando afirma que “as regras detalhadas de design
(…) são menos importantes do que o que estas têm em comum: a
sua base e origem. (…) todas as regras de design são baseadas na
psicologia humana: como as pessoas percebem, aprendem, racio-
cinam, recordam e convertem intenções em ações”.
Assim, os conhecimentos obtidos acerca da cognição dos
usuários, dos seus pressupostos e processos que a constituem as-
sumem um papel indubitavelmente relevante no campo da IHC.
Aliás, a psicologia cognitiva do usuário tem registado, nas últi-
mas décadas, uma franca evolução e importantes desenvolvimen-
tos teóricos, como a cognição situada, a cognição distribuída, a
cognição embutida, para além dos seus contributos pertinentes
para as teorias híbridas mais recentes (ROGERS, 2012). Esta
evolução, a par do interesse manifesto por investigadores e pro-
fissionais, sugere que o enquadramento teórico relativo à cogni-
ção humana é robusto e encontra-se num processo de expansão e
adaptação ao conhecimento crescente sobre como as pessoas pen-
sam e interagem com a tecnologia interativa (TURNER, 2009).
Compreender a dimensão cognitiva dos usuários, as suas
caraterísticas, capacidades e limitações permite, segundo Kushni-
ruk e Borycki (2008), perceber as suas expectativas e o que não
pode ser esperado por parte destes, bem como identificar e explicar
a natureza e as causas dos problemas que os usuários encontram e
desenvolver teorias, métodos e ferramentas que favorecem o de-
sign de sistemas interativos mais eficazes. Além disso, os proces-
sos cognitivos estão na origem de parte dos erros cometidos pelos
usuários quando interagem com a tecnologia (JOHNSON, 2010).
Por outro lado, a usabilidade, tida como um objetivo cen-
tral no design de interação e fundamental para a experiência do
usuário (PREECE, SHARP, & ROGERS, 2011), assenta maiori-
tariamente em aspetos cognitivos. De acordo com Nielsen (1993),
a usabilidade envolve cinco fatores distintos: a eficiência, a ca-
pacidade de aprendizagem, a memorabilidade, o tratamento de
erros e a satisfação. Uma análise imediata revela que os quatro
primeiros fatores estão ligados à cognição, o que sugere que para
conceber sistemas usáveis é relevante compreender a natureza e
a atividade cognitiva do usuário. Como Turner (2009, p. 6) afir-
ma “não pode ser negado que a usabilidade e as suas fundações
na cognição permanecem o sine qua non de toda a tecnologia e
media interativos”.
Conhecer o funcionamento cognitivo do usuário deve ser
conseguido com base no enquadramento fornecido pela Psico-
logia Cognitiva, adotando uma perspetiva alargada, integrada e
aplicada à IHC.
Uma perspetiva alargada, na medida em que deve veri-
ficar-se uma tentativa de ir além da compreensão dos processos
cognitivos implicados na aquisição, processamento, representa-
ção, retenção e recuperação de informação acerca da tecnologia
interativa, que constitui usualmente o foco de muitos manuais e
livros sobre o usuário. É também fundamental atender aos pressu-
postos da cognição e às limitações e constrangimentos dos usuá-
rios. Os seres humanos têm uma capacidade limitada de processar
informação e, como Simon (1957) defende, uma racionalidade
limitada, pelo que um dos principais objetivos do processamento
de informação é gerir e preservar estes recursos cognitivos limi-
tados, funcionando num registo de economia cognitiva. Isto sig-
nifica que não conseguimos atender e processar informação rela-
tiva a todos os estímulos da envolvente. E quanto mais complexo
for o estímulo, mais recursos cognitivos exige. A tecnologia tem
evoluído no sentido de uma maior complexidade, o que coloca
problemas aos usuários, que usam os seus mecanismos cognitivos
para os ajudar a selecionar de entre a oferta tecnológica disponí-
vel o que é relevante, necessário ou simplesmente interessante. É,
por isso, fundamental perceber que dotar um determinado sistema
tecnológico de mais funcionalidades não implica imediatamente
que o usuário as use. Neste processo de seleção ele vai ser guiado
pelos processos de atenção e perceção, que são condicionados
pelas caraterísticas do sistema em causa, mas também pelas ex-
petativas e inferências do próprio usuário, pelas suas aprendiza-
gens anteriores e por aquilo que este reteve na memória, fatores
que condicionam o modo como selecionamos uma determinada
interface em detrimento de outra e influenciam todo o processo de
interação com esta. Os modelos mentais do usuário condicionam
também o modo como se percebe e se usa a tecnologia (JOHN-
SON, 2010). Por outro lado, é ainda necessário ter em conside-
ração os enviesamentos e o uso de heurísticas por parte dos in-
divíduos, elementos tidos como essenciais para a compreensão
dos erros e dos processos de julgamento e de tomada de decisão
presentes em qualquer atividade humana, como as inerentes ao
uso de tecnologia (TVERSKY & KAHNEMAN, 1974).
Adicionalmente, a evolução do conhecimento mostra que
é igualmente necessário ter presentes os modelos dualistas do pro-
cessamento de informação, que têm vindo a ser propostos e de-
senvolvidos em áreas tão distintas como as atitudes e a persuasão,
as decisões e inferências, o raciocínio, e a memória, entre outros
(GARCIA-MARQUES, 2003). Estes modelos dualistas pressu-
põem que a mente humana não se trata de um sistema de processa-
mento unitário, mas antes que existem dois modos qualitativamen-
te diferentes de processar a informação, e.g., Bargh (1994); Bargh
& Ferguson (2000); Garcia-Marques (2003); Smith & DeCoster
(2000), opondo usualmente uma componente automática e intuiti-
va a uma outra componente controlada e deliberada. Embora ainda
não tenham sido suficientemente estudados no âmbito da IHC, es-
tes modelos dualistas podem ajudar a explicar e a prever o compor-
tamento dos usuários, dado que muito do que acontece, em termos
de pensamentos, ações e decisões dos indivíduos não é deliberado,
mas sim automático, não intencional e sem controlo consciente
(e.g., HASSIN, ULEMAN, & BARGH, 2005).
Destes últimos argumentos depreende-se a pertinência de
uma abordagem integrada do usuário, que contemple a interdepen-
dência dos processos cognitivos, as limitações e até a natureza e
desenvolvimento da cognição humana. A esta abordagem integrada
não deve ser alheio o fato de os usuários não deverem ser somente
examinados com base na racionalidade ou na lógica. Com efeito,
uma abordagem circunscrita à cognição humana para explicar e
prever a interação com uma qualquer interface seria manifestamen-
te redutora, na medida em que a visão obtida seria atomista, parcial
e incompleta, por não considerar outros processos psicológicos.
Muito do comportamento humano deriva do controlo consciente,
da intuição e de processos automáticos, mas também dos objetivos,
motivações, necessidades, afetos e atitudes, que modelam as cara-
terísticas de processamento, e.g., Damásio (1995); Fiske & Taylor
(1991), atuando como reguladores fundamentais da cognição
(SMITH & SEMIN, 2004), e da ação individual, pelo que devem
ser tidos em consideração em qualquer tentativa de compreensão
da IHC e da experiência do usuário.
2.AS EMOÇÕES E O SEU PAPEL PARA A INTERAÇÃO
HUMANO-COMPUTADOR
Inerentes à natureza humana, as emoções experienciadas
pelo usuário são um dos processos psicológicos que mais contri-
buem para a compreensão do processo de interação entre este e
um qualquer sistema ou interface.
Relegadas, durante décadas, para segundo plano na agen-
da dos investigadores e dos designers, as emoções têm suscitado
um interesse crescente pelo seu impacto em diversos processos
individuais e pelo seu papel na IHC. Mais de 30 anos volvidos de
investigação revelam que as emoções constituem elementos cen-
trais em todas as atividades humanas, e.g., Fredrickson (2003a),
influenciando as atitudes, a motivação, a cognição, as tomadas de
decisão e o comportamento individual (e.g., DAMÁSIO, 1995,
2000; FREDRICKSON, 1998, 2001; ISEN, 1990, 1993; PICARD
& KLEIN, 2002).
Na literatura, a análise dos seus efeitos parte usualmente
de uma distinção em função da valência, distinguindo emoções
positivas de negativas. As emoções negativas têm um valor adap-
tativo (FRIDJA, 1986), ativando o indivíduo e preparando-o para
a ação, favorecendo a mudança e a retificação de uma situação
(e.g., CACIOPPO, BERNTSON, LARSEN, POEHLMANN, &
ITO, 2000; TOTTERDELL & NIVEN, 2014). Por seu turno, as
emoções positivas ampliam, segundo a teoria do alargamento-e-
-construção (broaden-and-built theory) proposta por Fredrickson
(1998, 2001), os repertórios de pensamento-ação do indivíduo,
ajudando-o a construir recursos físicos, sociais e psicológicos
duradouros, como a resiliência (FREDRICKSON, 2004). Os es-
tudos desenvolvidos por Isen, Fredrickson e seus colaboradores
mostram que as emoções positivas originam padrões de pensa-
mento mais flexíveis, integrativos, eficientes e abertos à informa-
ção (e.g., FREDRICKSON, 2003a, 2003b; ISEN & DAUBMAN,
1984; ISEN, ROSENZWEIG, & YOUNG, 1991). Experienciar
emoções positivas aumenta, de acordo com Isen (1990) e Fredri-
ckson e Branigan (2005), a capacidade de integrar diversos tipos
de informação e alarga o foco da atenção do indivíduo, facilitan-
do a tomada de decisão e a resolução criativa de problemas (e.g.,
ISEN, 1993; ISEN & MEANS, 1983).
Esta evidência empírica sugere que as emoções podem
constituir elementos relevantes para o campo da IHC. Com efei-
to, fatores que fomentem a atenção do usuário, o levem a integrar
informação sobre um dado sistema ou media digital e ampliem
os seus repertórios comportamentais, como acontece quando ex-
perienciamos emoções positivas, são certamente importantes na
qualidade da interação e na experiência do usuário, em particular
perante novas interfaces com as quais não está familiarizado. Por
outro lado, as emoções positivas e negativas experienciadas pelo
usuário estão usualmente presentes na interação com a tecnolo-
gia, Brave, Nass & Hutchinson (2005); Picard & Klein (2002) e
estas emoções influenciam direta e indiretamente o seu uso (e.g.,
BEAUDRY & PINSONNEAULT, 2010).
As emoções podem até ser o elemento crucial na avaliação
de um sistema ou media digital. Isto é particularmente evidente
no caso dos videojogos, em que o envolvimento e as emoções es-
poletadas são fatores críticos para o seu sucesso (Calleja, 2011), e
devem ser tidas em consideração na conceção de sistemas usáveis
(e.g., KARAT, 2003). Light (2004), aduz que suscitar emoções
como o prazer e o contentamento constitui um imperativo comer-
cial na conceção de produtos digitais.
Podemos afirmar que os fatores que fomentam a capaci-
dade do usuário se adaptar a novas interfaces e sistemas digitais,
estimulando a sua flexibilidade cognitiva e favorecendo o seu de-
sempenho e satisfação, merecem ser estudados e examinados no
âmbito da interação com o usuário, o que justifica a atenção e o
lugar de destaque que as emoções recentemente têm ocupado nas
teorizações e estudos desenvolvidos nesta área. Como defendem
Lim et al. (2008, p. 117), não é possível “desenhar algo centra-
do no humano sem uma profunda compreensão das experiências
emocionais prevalecentes na natureza humana.”.
Considerar a dimensão afetiva na interação humano-com-
putador amplia a visão sobre o usuário. Se esta for articulada com
as dimensões cognitiva e atitudinal permite alcançar um maior
conhecimento sobre este, sobre o seu comportamento e os fato-
res que o determinam e condicionam. Numa perspetiva orientada
para a prática permite a criação de dispositivos digitais e interati-
vos que favorecem o desempenho, aumentam a satisfação e elici-
tam emoções positivas, como o prazer, a alegria e o divertimento,
que têm impacto na avaliação dessa interface (e.g., BOEHNER,
DePAULA, DOURISH, & SENGERS, 2005; LOPATOVSKA &
ARAPAKIS, 2011).
Ainda assim e não obstante a sua evidente pertinência, só
recentemente as disciplinas que estudam a IHC principiaram a
investigar o seu papel e as causas e efeitos das emoções neste
campo (e.g., PICARD, 1997; NAHL & BILAL, 2007).
Como Lopatovska e Arapakis (2011) e Zhang (2013)
salientam, a literatura nesta área é sobretudo marcada por uma
aparente dissensão, originando problemas conceituais e meto-
dológicos que em certa medida são similares aos verificados no
estudo desta variável psicológica no âmbito de outras ciências e
disciplinas. A própria noção de emoção é marcada pela ausência
de consenso e é frequentemente confundida com outros tipos de
afetos, como os sentimentos e os estados de humor. Os métodos
usados, os modos de operacionalização e mensuração de emoção
são também bastante diversos, abarcando desde métodos neu-
ro-fisiológicos, à observação de expressões faciais ou métodos
de auto-relato, entre outros, naturalmente envolvendo medidas e
formas de operacionalização distintas. Esta pluralidade é igual-
mente visível nas teorias de emoção existentes. As duas princi-
pais abordagens teóricas na área da IHC, a computação afetiva,
Picard (1997) e o design de sistemas afetivos, Norman (2004),
refletem também duas visões distintas do papel dos afetos na ex-
periência do usuário, embora ambas procurem tornar mais natural
e simples a compreensão e uso de sistemas digitais (PICARD,
2002). Com efeito, como Picard (1997) refere, a computação afe-
tiva está orientada para a concepção de sistemas tecnológicos que
reconheçam emoções, modelem os estados afetivos do usuário,
se adaptem aos estados afetivos detetados e expressem emoções,
enquanto o design de sistemas afetivos adota um foco distinto,
perspetivando os estados afetivos como centrais para a experiên-
cia do usuário, a par das questões práticas e lógicas (BOEHNER
et al., 2005; NORMAN, 2004).
Mau grado esta dissensão conceitual e metodológica, con-
sideramos que as emoções devem ocupar um lugar central para a
IHC. Por isso, concordamos com a posição apresentada por Peter
e Beale (2008, p.1), quando estes afirmam que “no que toca à in-
teração, seja com humanos, tecnologia, ou humanos via tecnolo-
gia, tornamo-nos subitamente conscientes da emoção (…) Dado
isto, parece ser sensato um maior envolvimento com os afetos e
as emoções por parte da IHC, investigando os princípios que lhe
estão subjacentes, estudando o papel que desempenham, desen-
volvendo métodos para os quantificar e, finalmente, construindo
aplicações que façam uso destes”.
3.AS ATITUDES: O QUE SÃO E PORQUE SÃO
RELEVANTES PARA A INTERAÇÃO HUMANO-
COMPUTADOR
Por que é que os usuários preferem determinados sistemas
e interfaces digitais e rejeitam outros? A resposta a esta questão
é dada, entre outros fatores, através do conhecimento das suas
atitudes, já que estas se traduzem em preferências pessoais, e.g.,
Riemer, Shavitt, Koo, & Markus (2014), o que, a par do seu papel
como preditores de comportamentos, e.g., Ajzen (2008), torna o
conhecimento das atitudes do usuário um dos fatores a ter em
consideração no campo da IHC.
Todavia, contrariamente ao que se tem verificado em ou-
tras áreas científicas, como a psicologia social ou o comporta-
mento do consumidor, as atitudes não ocupam um papel de relevo
no estudo da interação com o usuário e nos processos de design
de interfaces. Não obstante a sua pertinência, a ser abordada neste
capítulo, são ainda em número reduzido as pesquisas que exami-
nam o seu papel neste âmbito e os resultados obtidos têm sido dís-
pares (e.g., AGARWAL & PRASAD, 1999; JACKSON, CHOW
& LEITCH, 1997; LIMAYEM & HIRT, 2003; MALHOTRA &
GALLETA, 2005). Para melhor compreender a sua importância
neste domínio, é necessário analisar quer a conceitualização das
atitudes quer o modo como estas têm sido enquadradas e exami-
nadas no campo da IHC.
Um aspeto fundamental é a sua definição, pois o termo
atitude é usado quer na linguagem corrente quer no plano científi-
co, mas com conotações distintas. Na linguagem corrente, remete
usualmente para uma ação realizada por um indivíduo ou indiví-
duos. A nível científico as atitudes distinguem-se dos comporta-
mentos. Embora se verifique uma multiplicidade de definições de
atitudes, veja-se Johnson & Boynton (2011) Riemer et al. (2014),
as mais recorrentemente usadas na literatura afirmam que se tra-
tam de “tendências psicológicas que são expressadas através da
avaliação de uma entidade particular com algum grau de agra-
do ou desagrado” Eagly & Chaiken (1993, p.1) ou a “tendência
para responder a um objeto de modo favorável ou desfavorável”
(AJZEN, 2008, p.530). Não devem assim ser entendidas como
ações, mas antes como tendências internas traduzidas através de
respostas avaliativas face a um objeto, objeto esse que pode ser
uma pessoa, uma empresa, um sistema, uma interface, um produ-
to multimédia, etc.
A conceitualização da sua natureza e estrutura é menos
consensual. Com efeito, a atitude tem sido concetualizada quer
como um constructo tridimensional, e.g., Rosenberg & Hovland
(1960), compreendendo componentes cognitivos, afetivos e
comportamentais, quer como um constructo bidimensional, e.g.,
Ajzen & Fishbein, (2005), englobando aspectos instrumentais
(maioritariamente cognitivos) e experienciais (tendencialmente
afetivos), quer ainda circunscrevendo-a a uma única dimensão,
e.g., Fishbein & Ajzen (1975), que traduz a posição do indivíduo,
em termos avaliativos, face a um objeto. Não obstante o deba-
te permanecer em aberto, uma vez que a pesquisa empírica de-
senvolvida até a data não permitiu ainda ter uma visão definitiva
sobre a natureza das atitudes, e.g., Johnson & Boynton (2011),
os autores são, contudo, consensuais no reconhecimento que a
perspetiva tridimensional é a que melhor permite compreender a
complexidade das atitudes (EAGLY & CHAIKEN, 1993; PET-
TY, WEGENER, & FABRIGAR, 1997).
O potencial interesse do estudo das atitudes para a inte-
ração com o usuário reside na relação entre atitude e compor-
tamento, pressupondo-se que as atitudes constituem precursores
dos comportamentos. A verificar-se esta relação, as atitudes in-
fluenciariam o uso inicial e continuado da tecnologia, pelo que
conhecer as atitudes permitiria prever as intenções e as ações dos
usuários perante a tecnologia, emergindo assim enquanto cons-
tructo pertinente na explicação, compreensão e previsão da inte-
ração com uma qualquer interface digital.
A relação atitude-comportamento tem sido, desde há déca-
das, extensivamente estudada no âmbito da psicologia social, tendo
aliás conduzido ao surgimento de diversas teorias e modelos que
foram, entre outras aplicações, usados para compreender a adoção
e o uso de tecnologia, como o Modelo de Aceitação Tecnológica,
e.g., Davis, (1986, 1989), e as suas variantes, a Teoria de Ação Re-
fletida, Ajzen & Fishbein (1980); Fishbein & Ajzen (1975) e a Teo-
ria do Comportamento Planeado (AJZEN, 1985; 1991).
Contudo, esta relação teoricamente preconizada deve ser
encarada com alguma cautela, já que nem sempre tem obtido
suporte empírico, e.g., Ajzen (2008); Eagly & Chaiken (1993).
Aliás, Zhang e Sun (2009), atribuem a flutuação do interesse no
estudo das atitudes aos resultados inconclusivos sobre o efeito da
atitude na aceitação e uso da tecnologia. É nesta inconsistência
de resultados que reside o principal argumento para remover a
variável atitude de versões posteriores ou adaptadas do Modelo
de Aceitação Tecnológica (e,g,, VENKATESH & DAVIS, 2000;
VENKATESH, MORRIS, DAVIS, & DAVIS, 2003).
Para explicar os resultados inconclusivos relativos ao pa-
pel das atitudes no uso da tecnologia, Yang e Yoo (2004), Zhang,
Aikman e Sun (2008) e Zhang e Sun (2009), argumentaram que
estes resultados poderiam dever-se ao modo como as atitudes têm
vindo a ser concetualizadas ou medidas nos diversos estudos em-
píricos realizados. De acordo com estes investigadores, um dos
pilares destas inconsistências reside no uso de atitudes gerais para
prever comportamentos de adoção e uso de tecnologias específi-
cas. Como postulado pela Teoria de Ação Refletida, há dois tipos
de atitudes concetualmente distintos – a atitude geral relativa-
mente ao objeto e a atitude relativamente ao comportamento -
com efeitos diferentes na ação individual, pois enquanto a atitude
específica relativamente ao comportamento é um forte preditor da
ação do indivíduo, a atitude geral exerce apenas um efeito indire-
to sobre o comportamento. Nesse sentido, não é expectável que
atitudes gerais sejam bons preditores de ações específicas; a título
de exemplo, a atitude geral relativamente a dispositivos móveis
não constitui um adequado preditor do uso de um smartphone
específico. Neste caso, é a atitude específica relativamente ao uso
desse smartphone que pode ter poder preditivo e explicativo acer-
ca da utilização do smartphone em causa.
Adicionalmente, com base na revisão de um conjunto sig-
nificativo de estudos (378 medidas) que examinaram a relação
das atitudes com o uso de tecnologias de informação e comunica-
ção (TIC), Kroenung e Bernius (2012) apontam uma combinação
de fatores concetuais e situacionais que afetam a relação entre
a atitude e a intenção comportamental, que estão na origem do
questionamento do poder preditivo e explicativo das atitudes na
adoção e uso de tecnologia. Para além dos já apontados, um fator
relevante é a voluntariedade de uso: se o uso da tecnologia não
é voluntário, mas sim coercivo, as atitudes são pouco pertinentes
para explicar a ação do usuário. O outro fator está relacionado
com o sistema ser hedónico ou utilitário1. Quando são usadas me-
didas afetivas de atitudes, estas últimas revelam ser boas predi-
toras de sistemas hedónicos, como os videojogos, mas denotam
uma baixa capacidade de previsão sobre o uso de sistemas de
cariz utilitário. Se a mensuração das atitudes for cognitiva, estas
revelam uma boa capacidade de previsão de uso de sistemas uti-
litários, mas não de sistemas hedónicos.
Com base no referencial conceitual e empírico apresenta-
do, cremos ser necessário um maior investimento teórico e empí-
rico neste domínio, que fomente uma maior compreensão acerca
1
Van der Heijden (2004) apresenta uma tipologia das TIC, com base na
literatura sobre comportamento do consumidor, que as distingue em sistemas
hedónicos e utilitários. Os sistemas utilitários apresentam um valor instru-
mental para o usuário, apresentando um caráter mais racional e permitindo-
-lhe alcançar os seus objetivos de forma eficaz e eficiente. Por seu turno, os
sistemas hedónicos têm um valor experiencial e hedónico, proporcionando
diversão e prazer ao usuário.
do modo como os usuários formam e mudam as suas atitudes,
mas também as implicações destas na adoção da tecnologia, no
comportamento de interação que o usuário mantém com esta e no
seu uso continuado ou não.
Em síntese, se o primeiro passo para compreender a in-
teração com o usuário reside no próprio usuário, este deve ser
entendido com base na sua complexidade e múltiplos processos
psicológicos que o definem e condicionam. Neste capítulo defen-
demos que o paradigma cognitivista, que tem sido dominante na
tentativa de compreensão do usuário e dos seus comportamentos,
deve ser articulado e complementado com uma abordagem abar-
cante e integrada que contemple outros processos psicológicos,
como sejam as emoções e as atitudes. Adotar esta visão mais alar-
gada sobre o usuário permitirá uma melhor capacidade de previ-
são e explicação dos seus comportamentos e pode estar na origem
da concepção de sistemas e interfaces com maior usabilidade.

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DESIGN
DE INTERFACES
GRÁFICAS
Design de Interfaces Gráficas
Inga Saboia, Carlos Eduardo Brito Novais

1.CONCEITO DE DESIGN
O objeto central deste capítulo é a exploração do conceito
de design gráfico de interfaces, portanto, surge a necessidade de
definir, em primeiro lugar, o que é o design. Para isso, é preciso
termos claro que é um empreendimento complexo que abrange
várias disciplinas, desde design de moda à produção industrial
(NORMAN, 2006).
Independente do campo de atuação observado é necessá-
rio que chegar ao cerne deste conhecimento e pensar de forma
ampla, sobre um campo que reúne tantas práticas díspares sob
um mesmo conceito. Portanto, faz-se fundamental destacar neste
momento as nuances diferenciadoras de cada área de trabalho e
buscar a essência do termo.
O número de obras que procuram conceituar design é
grande. O trabalho de Ralph e Wand (2007)object, environment,
goals, primitives, requirements and con-straints. The design pro-
ject conceptual model is based on the view that projects are tem-
poral trajectories of work systems that include human agents who
work to design systems for stakeholders, and use resources and
tools to accomplish this task. We demonstrate how these two con-
ceptualizations can be useful by showing that 1, propõe uma re-
visão de trinte e três conceitos encontrados e a consequente busca
pela a sistematização de um modelo que englobasse todas estas
definições. Sobre as palavras-chaves encontradas em todas as de-
finições, os autores consideram que, como um nome, substantivo,
o conceito de Design pode ser assim definido:

“a specification of an object, manifested by an


agent, intended to accomplish goals, in a particular
environment, using a set of primitive componentes,
satisfying a set of requeriments, subject to cons-
traints” (Ralph e Wand, 2007, p. 108).

Logo, para os autores, Design é uma atividade em que


um agente, geralmente um ser humano, pratica/manifesta o de-
sign através da especificação de um objeto, que pode ter natureza
material ou não. Este é composto por partes, chamadas de “pri-
mitivas” que seria a menor redução, inclusive podendo ser um
conjunto de ideias que são reunidas e transformadas para criar
um objeto de design. O ambiente é o contexto onde o objeto pre-
tendido existe ou opera. Os objetivos são os impactos que o ob-
jeto deve ter no seu ambiente. Os requisitos são as propriedades
estruturais ou comportamentais que um objeto de design precisa
possuir. As limitações são impostas normalmente durante a defi-
nição do escopo do projeto, seja por limitações financeiras, seja
por acesso a matéria-prima, por exemplo. Entretanto, durante o
desenvolvimento de um produto, outros tipos de limitações po-
dem ser especificadas até a sua entrega.
Por esta definição, vemos que Design é uma atividade liga-
da a projeto, processo, criação, planejamento. Seguindo esta mes-
ma linha de pensamento, Norman (2013, p. 4) acena que todas as
coisas artificiais são frutos de um processo de design, ou, ainda,
como Richard Buchanan (1995) menciona que é a conceituação e
o planejamento do artificial. Entretanto, esta dimensão do pensa-
mento pode se tornar demasiadamente ampla e ter como resultado
desde um objeto físico a uma lei, e como agente desde um artesão
a um legislador. Desta forma, portanto, acaba por não satisfazer a
uma conceituação. Para compreender o Design para além do plane-
jamento de tudo que for artificial, é preciso buscar mais.
O design pode ser visto como uma linguagem que revela o
valor dos objetos para os homens, e dos homens para os homens
e como um ato de comunicação entre o designer e o usuário. Nor-
man (2006) destaca que apesar de não se utilizar necessariamente
de palavras, todo o design é um ato de comunicação, onde se par-
tilha e se troca significados entre o designer e o usuário/receptor.
A comunicação se dá através da interface, para isso é necessário
que haja um profundo conhecimento e compreensão sobre o usu-
ário, para quem é o objeto projetado.
O controle desse processo de comunicação entre o desig-
ner e o usuário através deste objeto não de todo intencional. Boa
parte da prática do design é observar, controlar os diversos re-
cursos disponíveis e evitar ruídos que poderiam prejudicar esta
relação (NORMAN, 2004). Assim, “o design é usado para mol-
dar percepções de como os objetos devem ser compreendidos”
(SUDJIC, 2010, p. 51) promovendo a compreensão do significa-
do através de pistas, indícios, ou como Norman se refere, através
de significantes.
A partir da perspectiva do ato comunicativo de Norman
(2004), Royo visa definir o design a partir da delimitação da es-
fera de desempenho do designer. Afinal, qual o dever do designer
perante o processo de produção? Para o autor, a atividade do de-
signer é de natureza linguística, onde o design é visto como “(...)
modificador da linguagem, que a otimiza e a torna acessível e
imediata para facilitar o uso dos objetos ou dos processos. Que
busca soluções para a compreensão do mundo.” (ROYO, 2008, p.
41). O designer é, desta forma, a pessoa responsável pela comu-
nicação do objeto para o usuário, tornando-o também no processo
de interação, um receptor. É ele que tem que pensar em como tor-
nar óbvio ou mais facilmente percebido um objeto ou o seu uso.
Logo, a linguagem é o seu material de trabalho, pois é através
dela que são construídos os projetos (ROYO, 2008).
Como processo, o design é significação transitória, que trans-
forma objetos em signos que exploram as nossas fantasias sobre nós
mesmos perante o outro ou o grupo social a que pertencemos. Tam-
bém pode ter outra vertente, vivenciado como prazer em si mesmo,
através da qualidade estética da forma de um copo, cadeira ou inter-
face gráfica interagindo com o usuário (SUDJIC, 2010).
Norman (2013) enfatiza que todo bom design deve possuir
pelo menos duas características essenciais: ser compreensível e
ser usável. Assim, a utilidade do produto atua em conjunto com a
comunicação.
“Two of the most important characteristics of good
design are discoverability and understanding. Dis-
coverability: Is it possible to even figure out what
actions are possible and where and how to perform
them? Understanding: What does it all mean? How
is the product supposed to be used? What do all the
different controls and settings mean?” (Norman,
2013, p.03).

Porém, hoje deve também ser cada vez mais prazeroso,


atendendo não só à engenharia, à ergonomia e à produção, mas
também à própria experiência do usuário. Sob este aspecto é pre-
ciso que haja atenção à forma e à qualidade de interação.
Por exemplo, construir sistemas de movimentações finan-
ceiras em um caixa eletrônico, programar um sistema de compras
eletrônicas, finalizar um catálogo de moda são tarefas de enge-
nheiros, programadores e produtores gráficos. Porém, torná-los
agradáveis e usáveis é tarefa do designer, que alia o componen-
te tecnológico ao ser humano, o seu principal foco (NORMAN,
2013; SAFFER, 2010). É o designer que torna os sistemas inteli-
gíveis e prazerosos à descoberta.
Moggridge (2007), apesar de pensar no design como algo
complexo, acredita que o designer não deve ficar apenas no enten-
dível e ir além, trabalhar com a função e o prazer, tendo sempre
como foco o receptor. O design compreende 5 competências: (i)
criar soluções a partir das restrições, compreendendo tudo o que
fará a diferença para o resultado final; (ii) formatar e reformatar
o problema e os objetivos; (iii) criar e imaginar alternativas; (iv)
selecionar dentre essas alternativas, a mais viável e (v) visualizar
e fazer protótipos do que é pretendido. Essas competências fazem
parte de um processo de design, que pode seguir esta ordem, ou
não, sendo um processo por vezes interativo, como tal geralmente
é desestruturado, assumindo diferentes direções.

2. DESIGN DE INTERFACES GRÁFICAS


Como foi visto anteriormente, é através da interface que
acontece a interação entre homem e artefato. A interação é um
processo de comunicação. Uma das condições sine qua non para
considerarmos a existência deste conceito é a participação míni-
ma de dois atores. Crawford (2003) defende a ideia do ator como
um agente com um propósito dentro deste processo, o que confere
intencionalidade à inteiração. Desta forma, podemos distinguir o
conceito de inteiração do de reação. Para o autor a interação varia
em níveis de acordo com o grau de ouvir, de pensar e de falar. O
grau de interação pode, portanto, variar entre elevado, moderado,
pequeno ou nulo, com uma espécie de escalabilidade que varia
conforme as três ações referidas. Estes graus variam de acordo
com a relação momentânea entre no mínimo de dois agentes. As-
sim, quanto melhor for a escuta, o pensamento e/ou a fala, melhor
será a interação. (CRAWFORD, 2003).
Portanto, se tomarmos como objeto e ator deste processo
de comunicação o computador, veremos que ele se revela como
um grande instrumento de interação. Não é o primeiro a ser inte-
rativo, mas é o primeiro a torna-la automática. Segundo Crawford
e Campello (2013; 2003), esta interação automatizada modifica a
nossa forma de conversação e também a forma que estruturamos
nosso pensamento.
Bonsiepe (1999) defende a ideia de interface como uma
área que reúne três dimensões heterogêneas: o corpo, o propósito
e o artefato (ou a informação). Assim, o ser humano (o corpo) lan-
ça-se sobre um objeto (o artefato) com um determinado objetivo
(o propósito) que é fomentado pela necessidade ou pelo desejo.
A junção das três é necessária para que haja a interface. Segundo
Bonsiepe (1999), a interface não deve ser vista apenas como um
objeto, é uma área que torna um artefato em uma ferramenta imbu-
ída de propósito referente a uma tarefa, ligando o objeto ao homem.
É o design da interface que revela o propósito do objeto,
como uma forma de comunicação do designer para o usuário, de
acordo com o que foi dito anteriormente. O designer intermedia
a relação entre máquina e homem ao focar o seu trabalho na in-
terface, otimizando a relação entre os dois. Portanto, a interface
é uma relação ou uma forma de comunicação, entre usuário,
ação e ferramenta.
Os designers de interfaces gráficas (user interfaces) pos-
suem competências semelhantes aos designers gráficos, porém
com uma compreensão mais aprofundada sobre o comportamento
do usuário. Apesar de trabalharem a organização visual de elemen-
tos, eles visam também comunicar os comportamentos possíveis
que a interface poderá ter, mediante a ação dos usuárioes. Desta
maneira, pretendem fazer uma correspondência da estrutura visual
à lógica do modelo mental do usuário, juntamente com o compor-
tamento do programa. Também estão interessados na comunicação
dos estados do sistema e com as questões cognitivas da percepção
humana, como forma de facilitar o entendimento trabalham através
do contraste, da unidade, da hierarquia visual, entre outros atributos
(COOPER; REIMANN; CROININ, 2007; GARRET, 2010).
É importante avaliar o âmbito de atividade do designer no
desenvolvimento da interface gráfica, pois este trabalha os ele-
mentos visuais e seus respectivos posicionamentos na tela, com-
pondo assim, o layout da interface. Portanto, podemos sintetizar
que o designer de interfaces gráficas deve se pautar no design
gráfico, gerando interações viscerais, ou seja, cada vez mais intui-
tivas, naturais e menos percebidas pelo usuário (COOPER; REI-
MANN; CROININ, 2007; NORMAN, 2004).
Assim como lidar com os princípios do design de inte-
ração, fomentando a origem de uma linguagem própria para a
interface, é preciso que tanto os designers de interação quanto os
de interface prevejam o comportamento dos usuárioes com a in-
tenção de melhorar e fomentar a interação entre homem e máqui-
na. Ambos pretendem levá-los a conquistar os seus objetivos, que
devem ser tratados de forma clara e cuidadosa. Segundo Cooper
et al. (2007), o design de interface começa a trabalhar a partir do
momento em que se precisa produzir algo gráfico com base na
articulação do designer de interação.
Cooper et al. (2007), mencionam que o designer de inter-
faces possui duas frentes de trabalho principais. A primeira atra-
vés do desenvolvimento de estudos da linguagem visual, em que
se explora uma variedade de atributos visuais, como cor, tipogra-
fia, layout e materiais. Nesta fase, é preciso descobrir qual o tipo
de comunicação necessária e a versão adequada para os usuárioes
de acordo com as suas experiências prévias, modelos mentais e
objetivos, também pautados nas metas da empresa. Em um se-
gundo momento, com o estilo visual acordado entre a equipe de
trabalho e o cliente, é escolhido e adaptado este visual à estrutura
de navegação arquitetada pelo designer de interface.
É importante termos em mente que somos seres valorativos,
estamos sempre julgando pelas aparências. Destes juízos, originam-
-se afetos que contribuem para a nossa percepção e para a nossa ação
(NORMAN, 2004). Estes afetos são tidos como cargas emocionais
positivas ou negativas que influenciam as atitudes e comportamentos
humanos futuros. Neste sentido, podemos perceber que as aparên-
cias de uma interface e, consequentemente, de um sistema interativo,
têm um papel relevante que não pode ser menosprezado.
Assim, o design de interfaces deve se firmar nos princí-
pios da comunicação visual, que são estratégias decisivas para
a comunicação gráfica do comportamento e da informação, que
podem ser utilizadas em múltiplas aplicações. Estes princípios
devem ser vistos antes de mais nada como diretrizes, que ajudam
a guiar o trabalho sobre o comportamento, a forma e o conteúdo.
Principalmente através de regras que incidem sobre os valores do
designer e da sua experiência, que são aplicados no processo de
design e ajudam a traduzir os objetivos do cliente em estruturas
com formas e comportamentos.
É necessário que os princípios focados na interface redu-
zam o trabalho ao otimizá-la para a utilização (COOPER et al.,
2007). Esta redução se dá através da minimização da carga cogni-
tiva que acontece através do domínio da forma sobre o conteúdo,
ou seja, este último é ajustado de acordo com as estruturas orga-
nizacionais para a sua melhor compreensão. Por isso, um menor
trabalho da memória é conseguido através de uma maior qualida-
de do trabalho visual, gerindo discretamente o caminho do que se
deve olhar ao descodificar o layout. O usuário torna-se receptor
e descobre os objetos e os seus significados e usos, diferencia os
códigos e os elementos da interface.
Logo, trabalhar a forma no design de interface é tão vá-
lido quanto a produto tem que preencher uma função, trabalhar
bem, ser usável e perceptível (NORMAN, 2013). Estas diretrizes
corroboram para o desenvolvimento do produto e têm muito em
comum. Por exemplo, a teoria da Gestalt é normalmente utili-
zada tanto para questões de natureza estética, como de usabili-
dade, visto que ajuda a organizar a apresentação de elementos
funcionalidade, pois as duas influenciam-se mutuamente. Para ser
verdadeiramente bonito e prazeroso, o visuais, ao tornar a compo-
sição mais clara e agradável. Do somatório da relação entre a usa-
bilidade e a estética, temos um efeito na experiência do usuário
com o objeto, que tirará as suas próprias conclusões e terá os seus
próprios sentimentos frente a interface, gerando prazer, atitude e
comportamento (MAHLKE, 2008; MAHLKE; THÜRING, 2007;
TRACTINSKY, 2013)
O designer de interfaces gráficas não só diminui e orga-
niza a carga cognitiva, quanto fomenta julgamentos valorativos,
afetos e pensamentos reflexivos que servirão de alicerce para a
usabilidade e a experiência do usuário. Gera um design mais in-
tuitivo e mais agradável, o que incrementa a interação com o sis-
tema, ao promover afetos que sejam positivos. Todo este aparato
é justificado pelos objetivos do negócio que se propõe a satisfazer
as necessidades e os desejos do usuário, afim de promover o con-
sumo, o uso e a fidelidade de uma determinada marca.

3.PRINCÍPIOS DE DONALD NORMAN


Ao longo de seu trabalho, Donald Norman propõe que o
ser humano seja cada vez mais colocado no centro do design.
Para isso, é preciso conhecer as suas necessidades e as suas ex-
pectativas, assim como o seu modo de pensar e interagir. Preten-
de-se, assim, um design com boa usabilidade que seja facilmente
percebido, eliminando ou reduzindo os erros dos usuárioes, um
design que nasce com o foco e atenção voltado ao usuário e à sua
melhor relação possível com o sistema.
Norman (1988) elabora 5 princípios de um bom design:
visibilidade, affordance (conceito que foi revisto posteriormente
pelo próprio autor), restrições, o mapeamento e o feedback. São
todos de natureza prescritiva, quase normativa e são oriundos da
psicologia cognitiva, da observação quotidiana e da experiência,
servindo como um guia para o designer. Estes princípios origi-
nam-se de uma longa reflexão do autor de que a aparência nos
indica como utilizar o objeto (NORMAN, 1999)
O primeiro princípio é a visibilidade. Ela é expressa atra-
vés dos significantes, que funcionam como uma forma de comu-
nicação para o receptor, dando pistas do que se vê e das intera-
ções sociais que foram incorporadas. Os modelos conceituais são
formados com base nestas pistas dadas, como elementos que o
designer de interface coloca deliberadamente ou acidentalmente,
aos quais o usuário segue para conquistar o seu propósito. Portan-
to, é dever do designer trabalhar por meio dos elementos gráficos
ao pensar em deixar rastros significativos que indiquem o quê,
como fazer e para onde ir.
Os significantes, independentemente de serem intencio-
nais ou acidentais, comunicam da mesma maneira. Estes indícios
não podem ser deixados a esmo para que não existam ruídos de
comunicação ou indícios errados ao usuário. Para que haja uma
boa comunicação é preciso que se pense nos pormenores, pois
qualquer coisa pode ter grande valor significativo.
O princípio da visibilidade não só influencia o uso, assim
como a lembrança deste momento de uso, ou seja, um botão de
controle não só indica uma função, como nos lembra de como
deve ser acionado um botão ou, ainda, qual a função de um botão
em uma interface; torna a interação com o objeto muito mais in-
teligível. Ainda nos fornece sinais naturais, sem que seja necessá-
rias grandes racionalizações sobre a utilização de algo.
A visibilidade é uma propriedade sensível que deve ser
bem equilibrada. A sua falta ou o seu excesso traz receio ao usu-
ário fazendo com que ele evite realizar determinadas tarefas,
como, por exemplo, acertar a hora de um relógio quando mu-
damos de horário ou ficarmos restritos a meia dúzia de funções
extremamente necessárias de uma tecnologia. A visibilidade é o
primeiro e um dos mais importantes princípios levantados por
Norman (1988). Os próximos princípios são todos decorrentes
deste processo de visibilidade do sistema.
Um princípio interessante decorrente da visibilidade é a
affordance. Ela pode ser entendida como a relação que incita a
utilização específica com um objeto. Pode-se entende-la como o
potencial que um artefato tem de ser usado para o que foi proje-
to. Por exemplo, a affordance de uma bola, é ser chutada. Esta
relação poderá ser explorada no design através de propriedades
fundamentais naturais e de fácil compreensão. Ou seja, um objeto
com boa affordance não requer aprendizagem, no máximo uma
interessante exploração. O seu uso é intuitivo.
A affordance incita a uma especificidade de relação entre
o usuário e o objeto. Esta se dá através do toque e não da visão
como acontece com os objetos na tela. A visão aciona o princípio
da visibilidade e os seus significantes. No design industrial a ação
deliberada de um designer é escolher que affordances colocar num
produto físico para incitar a ação. No design de interfaces gráficas
a escolha se dá através dos elementos visuais, que serão transfor-
mados em significantes e darão pistas de qual e onde ocorre a ação.
Os significantes têm uma base de construção social e cultural e as
affordances baseiam-se no toque natural. Norman (2008) nos diz
que no mundo virtual, o usuário está perdido na tela, sem saber o
que fazer, por isso é necessário guiá-lo, ao tornar visíveis certos
artifícios e comunicar de forma inteligível a sua ação.
O termo affordance fez sucesso no campo do design, mas
o seu uso e a sua justificativa a todo e qualquer custo, revelou-se
maléfico, porque na verdade as affordances são relações e não
propriedades, como defende Norman (2008). Como os designers
trabalham com atributos visuais, eles caíram no erro de nomeá-
-los como affordances. Porém, para o autor os designers têm um
problema prático quando trabalham a interface gráfica: como dar
a entender como se pode interagir com a interface? Qual movi-
mento ou qual interação irá o sistema receber e responder? Como
descrever o que deve ser feito? Como não conheciam a palavra
para designar este artifício, passaram a usar a palavra affordance.
Na verdade, eles colocaram artifícios que comunicavam aonde a
ação deveria ser feita e não a affordance. Por isso, Norman, na
revisão de 2013 do livro “The Design of everyday things”, propõe
que usemos o conceito de significante para dar pistas de utiliza-
ção. “Affordances determine what actions are possible. Signifiers
communicate where the action should take place. We need both”
(NORMAN, 2013, p. 14). Assim, pretende dar fim à polémica e
ao mau uso da palavra.
Norman (1988) indica outra propriedade do design, o ma-
peamento, como a relação entre duas entidades diferentes que tem
como resultado o objetivo do usuário. Isto é, o mapeamento é
uma característica relacional, uma ponte entre elementos visuais
da interface. Essa característica vem da consideração que de uma
causa deriva uma consequência, isto é, de um comando, temos
um efeito. Todos os artefatos a incorporam, para indicar como
proceder diante de uma situação.
O mapeamento deve parecer natural, percebido através de
uma analogia física ou um padrão cultural, conduzindo a uma rá-
pida interpretação dos resultados de uma ação. Esta naturalidade
física pode vir de algo simples como deslocar um botão ou de
ícones culturais que se cristalizam com o tempo e com a partilha
entre as pessoas, como os sinais de + ou – para o volume do som.
Uma das soluções propostas por Norman pode ser resumi-
da como “one function, one control” (NORMAN, 1988, p. 25),
tentando ajudar a emergir mais facilmente mapeamentos naturais
que relacionem determinados comandos a determinadas ações.
No entanto, com o aumento da complexidade da tecnologia, os
sistemas têm incorporado inúmeras funcionalidades que acabam
por gerar uma sobrecarga de informação para o usuário. Como
resultado disso, temos controles remotos de televisão repletos de
botões com diversos ícones incompreensíveis, em que o usuário
não consegue fazer uma correlação direta entre a sua intenção, o
botão e o resultado. Neste ponto, o mapeamento é feito de forma
incorreta, induzindo ao erro. Por isso, essas questões têm de ser
melhor analisadas e trabalhadas.
Enquanto o mapeamento é a relação entre uma ação e um
resultado, o feedback é a informação de retorno deste resultado,
onde constatamos se o nosso objetivo foi ou não atingido. O fee-
dback permite-nos mudar os nossos comportamentos, corrigir o
curso das nossas ações e mais “also supports the feeling of acting
directly on the objects themselves. It removes the perception of
the computer as an intermediary by providing continual repre-
sentation of system state” (HUTCHINS; HOLLAN; NORMAN,
1985, p. 334)Ou seja, se um feedback for imediato e óbvio temos
uma ideia de que agimos diretamente sobre um objeto, sem ne-
nhum subterfúgio. Ao usarmos um mouse de computador, os seus
gestos e as suas ações são apresentados de forma imediata na tela,
o que nos dá a impressão de que faz parte do nosso corpo, esque-
cemos que ele é um intermediário dos nossos atos. “O feedback se
refere ao retorno de informações a respeito de que a ação foi feita
e do que foi realizado, permitindo a pessoa continuar a atividade”
(PREECE; ROGERS; SHARP, 2005, p. 43).
Quando um dispositivo não dá o feedback imediato, a nos-
sa primeira reação é repetir a ação até conseguirmos perceber que
a nossa meta foi concretizada. Com o avanço tecnológico esse
retorno tem sido quase instantâneo, reduzindo a tolerância na sua
espera. Portanto, o feedback deve ser uma das principais priorida-
des ao conceber um objeto interativo, pois o usuário precisa ter a
certeza que a sua ação se concretizou.
Laurel (1986) chama-nos atenção para outro princípio, as
restrições. Estas são as limitações, que podem ir desde pequenas
sugestões até rígidas regras impostas. Limitam as nossas ações
para que ajamos corretamente com relação ao sistema. Apesar da
conotação negativa, restrições podem ser benéficas ao orientar da
melhor forma a relação entre Homem e máquina. Servem como
uma espécie de guia que nos orienta para seguirmos o caminho
esperado e conseguirmos os resultados almejados, o que ajuda o
usuário a escolher a opção correta.
As restrições (NORMAN, 1999) podem ser de três tipos:
(i) físicas, (ii) lógicas e (iii) culturais. As restrições físicas (i) di-
zem respeito à forma como os objetos físicos podem restringir o
movimento da interface, por exemplo, o cursor apenas se mover
dentro da tela. O segundo tipo de restrições, as lógicas (ii) rela-
cionam-se com a análise de alternativas disponibilizadas ou sobre
o entendimento que os indivíduos têm de como as coisas funcio-
nam, através da análise de causas e consequências advindas por
vezes do senso comum ou da dedução lógica. Como exemplo,
pode-se pensar em um sistema de compras online que é dividido
em quatro passos. Se o usuário está no segundo passo, compreen-
de-se que faltam mais dois para ser efetuada. Por fim, as cultu-
rais (iii), dependem de um uso contínuo e do reconhecimento de
um grupo. Essa arbitrariedade é a base para termos restrições; o
designer pensa sobre as convenções culturais e as usa para comu-
nicar, incorporadas num significante para que possa ser reconhe-
cido por um grupo de pessoas.
Em relação a objetos de carácter tecnológico pode haver
uma maior preocupação com o usuário, na medida em que se ten-
ta produzir sistemas mais compreensíveis que orientam o seu pró-
prio uso. O feedback também tem-se acelerado, o sistema tem-se
tornado mais interativo, guiando melhor as nossas ações através
da imposição ou não de restrições. Além disso, com a utilização
continuada do computador, percebemos que algumas característi-
cas e costumes estão mais cristalizados, interiorizados de tal for-
ma, que passam a ser naturalizados, ajudando-nos a formar bons
modelos conceptuais.
Por isso, cada vez mais o designer tem a obrigação de
compreender e usar uma larga série de princípios que podem aju-
dar o usuário a interagir melhor com os objetos, facilitando a vida
das pessoas. O importante é manter o foco nos indivíduos, para
que não fiquemos perdidos na selva de funcionalidades e possibi-
lidades, esquecendo-nos do fio condutor que dirige a intenção ao
uso do usuário.
Defendemos que no computador a interface deve deixar de
ser pensada apenas em questões estáticas da forma, para ser tam-
bém pensada em termos da interação. O designer que trabalha a
interface não pode se deter apenas ao que é visual, mas também se
estender a interação, afim de que o sistema seja interativo. Com-
partilhamos da visão de Royo (2008), quando este afirma que o
design não pode focar-se apenas no visual, indo para a usabilidade,
entendemos que além disto deve focar a interação como um todo.
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Human-Computer Interaction. 2a ed. Dinamarca: Aarhus, 2013.
TUDO O QUE VOCÊ
QUERIA SABER SOBRE
INFOGRAFIA
Tudo o que Você Queria
Saber Sobre Infografia
Inga Saboia, Carlos Eduardo Brito Novais

1. O QUE É INFOGRAFIA?
Antes de começarmos a nossa discussão é importante de-
finirmos o que é um infográfico. Alberto Cairo (2011), afirma que
infografia é uma representação diagramática de dados. Por dia-
grama, temos que é uma representação abstrata da realidade, em
que se elimina o desnecessário, para que o necessário ganhe des-
taque. Com isto temos uma simplificação de uma estrutura que
transmite de melhor forma significados. Assim, a abstração é uma
componente essencial na elaboração de um infográfico. Esta pode
variar em níveis de semelhança entre o referente original e o que
é representado. Ou seja, para Cairo (2011), qualquer informação
apresentada em forma de diagrama é uma infografia, desde um
mapa medieval, um mapa do metrô até as instruções visuais de
como proceder em situações de emergência em aviões.

2. A RELAÇÃO DE UM INFOGRAFISTA E UM USUÁRIO


O infografista (designer de informação) e o usuário devem
compartilhar uma série de códigos visuais, para que haja real-
mente comunicação. Por isso, apesar da informação ser abstrata,
através do conhecimento adquirido sobre o receptor, o infogra-
fista ordena uma estrutura que as pessoas possam reconhecer e
perceber como informação. Para isto, o infografista tem que ter
conhecimento de quem é o usuário, qual a sua cultura e suas ex-
periências anteriores (CAIRO, 2011).
O designer de informação manipula o complexo, o oculto,
o caótico e o incompreensível, transformando estes dados (brutos
e sem valor informativo) em informação (dados organizados e
com significado). Através desta informação construída, o receptor
passa a reconhecê-la, compreendê-la, memorizá-la e transformá-
-la em conhecimento que passe a basear os seus futuros compor-
tamentos (CAIRO, 2011).
Assim, os dados que existem no mundo exterior ou em
uma planilha de Excel, são estruturados de forma compreensível
pelo designer como informação, que o receptor a vê/lê, reconhe-
cendo padrões, compreendendo, memorizando e dando sentido,
tornando-se dentro deste em conhecimento.
Defendemos que o designer tem que descobrir, identificar
e simplificar as relações e padrões nos dados, transformando-os
e transferindo para um dado suporte. Assim, acreditamos que o
designer tem que ser um profundo conhecedor de um tema, para
fazer esta relação de forma mais fácil e simplificada ao receptor.
3.O IMPACTO DE UM INFOGRÁFICO PARA UM
USUÁRIO
A psicologia cognitiva defende que o nosso cérebro está
sempre criando significados do que é captado pelos nossos senti-
dos, através do reconhecimento de padrões, relações e símbolos.
As representações visuais devem facilitar a nossa percepção con-
tribuindo para a formação de significado. Portanto, devemos usar
as leis da Gestalt que nos dão pistas de como funcionam os nossos
padrões de reconhecimento (CAIRO, 2011).
Acreditamos, assim, que o infográfico seja importante
para fomentar e acelerar a transformação de informação em co-
nhecimento no usuário.

4.OS TIPOS DE INFOGRAFIAS


Cairo (2011) relata que há dois tipos de infografias, distin-
guidas pela sua forma de utilização, a estetizante e a analítica. A
primeira funciona como um elemento visual, pretendendo torná-la
mais rápida e dinâmica, no intuito de chamar a atenção do usuário
para o tema e entretê-lo. A infografia é vista como algo próximo
ao campo da ilustração. A segunda, a analítica, é tida como uma
facilitadora de compreensão, melhorando a capacidade cognitiva
do receptor, por meio da revelação de uma evidência que estava
oculta na complexidade dos dados. Desta forma, Cairo (2011) as-
sinala que a melhor infografia é a do tipo analítica, em que o papel
do designer é descobrir no montante de dados brutos as constantes,
os padrões, as relações que não são claros em um primeiro olhar e
torna-los facilmente reconhecíveis para o usuário.
5.O PAPEL DA INFOGRAFIA
A visualização da informação deve facilitar a análise, en-
quanto que a dimensão estética deve ficar em um segundo plano,
como apenas uma consequência da qualidade de clareza de um
gráfico e não como um fim. Portanto, a boa infografia deve ser
a do tipo mais analítico, pois ela é uma ferramenta gráfica de in-
formação primária e não apenas complementar, sendo lida antes
mesmo que um texto (MEYER, 1997). Por vezes, as informações
são transmitidas em forma gráfica, de vídeo ou interativa, impos-
síveis de serem feitas através de um texto escrito.
A dimensão analítica não exclui a estética, apenas a sub-
juga a segunda à claridade e à simplicidade propagada pela pri-
meira. Portanto, o recurso gráfico não pode ser um obstáculo para
compreensão da leitura visual, pois a infografia tem como princi-
pal função ser uma ferramenta cognitiva.

6.A FUNÇÃO DE UM INFOGRÁFICO


É difícil determinar o momento da necessidade real de um
infográfico. Muitos o usam, sem realmente serem necessários,
funcionando muitas vezes como uma imagem ilustrativa do tex-
to. No entanto, Meyer (1997) acredita que um infográfico serve
para dar vida ao que é considerado importante, mas cansativo em
um texto. Desta forma, torna a sua compreensão mais rápida e
mais fácil, ajudando a engajar as pessoas. O autor defende ainda
que os infográficos não devem ser feitos apenas de números, mas
de uma história. Ele acredita que infográficos que não contam
uma história, servem somente para distrair. Só devemos utilizar
os números apenas se estes forem o mais importante, ou seja, se
realmente contarem algo. De forma semelhante a Cairo (2011),
ele julga que gráficos são para esclarecer e não para decorar, que
a sua existência tem de ter um claro motivo, não devendo reportar
apenas o óbvio.

7.A RELAÇÃO ENTRE INFOGRÁFICO E UM TEXTO


INFORMATIVO
Os leitores leem o cabeçalho da notícia e logo a seguir
veem os gráficos, afim de descobrir se o texto é interessante o
suficiente para ser lido. Isto é um verdadeiro dilema que devemos
estar atentos, pois infográficos por vezes são criados depois que
os textos que os acompanha são escritos. Portanto, eles têm que
ambientar, desenvolver e finalizar, contando realmente uma his-
tória. É a partir disto, que os leitores decidem se vão ler um texto
(MEYER, 1997).
Também é preciso que saibamos que nem texto e nem gráfico
necessitam contar cada aspecto da história, mas que cada um pode
apresentar o que melhor conta. Assim, eles devem ser complemen-
tares, trabalhando com as suas próprias características (MEYER,
1997). Isto é um ponto positivo, pois o escritor neste caso pode bus-
car escrever outros tipos de narrativas, diferentes da pirâmide in-
vertida, onde o mais importante no primeiro parágrafo e as demais
informações vão sendo dispostas em uma ordem decrescente de im-
portância. Podemos dizer que quem trabalha com os infográficos tem
uma responsabilidade aumentada, pois é preciso cobrir a informação
mais importante de forma eficiente (MEYER, 1997).
Com a sobrecarga de informação em que vivemos, as
pessoas percorrem os olhos em conteúdos para somente depois
decidir se a informação é interessante o suficiente para ser lida.
Um dos primeiros conteúdos a serem vistos são as imagens, os
gráficos, as ilustrações. Portanto, um infográfico pode ser uma
ferramenta essencial para a leitura de um texto mais denso.
Lembre-se de pensar visualmente. A percepção visual
permite um entendimento mais rápido que a leitura de um texto
escrito. Não use imagens demasiadamente abstratas que prejudi-
quem o reconhecimento, a compreensão e a memorização. Tudo o
que for visual, deve ser facilmente entendido. Tenha atenção que
para um infográfico, informar visualmente é mais importante que
decorar visualmente (MEYER, 1997).

8.RELAÇÃO ENTRE IMAGEM E TEXTO DENTRO DE


UM INFOGRÁFICO
Num mundo ideal, um infográfico deve ser entendido, mes-
mo que uma pessoa não fale a língua utilizada. As palavras ser-
viriam apenas para fechar o sentido do conteúdo. Meyer (1997),
quer dizer com isto que a essência do gráfico pode ser bem perce-
bida sem ser lida, graças à boa utilização de artifícios visuais. Um
gráfico deve informar num piscar de olhos. No entanto, observa-
-se uma grande incidência de infográficos ainda muito baseadas
em texto escrito (breakout box). Portanto, sempre que possível,
indica-se desenvolver o infográfico com maior apuro visual. Isto
não quer dizer que apenas colocar um ícone no cabeçalho, por
exemplo, irá resolver o problema. Antes, pense na utilização de
ícones pequenos facilmente reconhecíveis para cada subtópico.
Este deve conter apenas as palavras essenciais (de uma a três)
para ser percebido e estas devem estar devidamente identificadas
por um peso maior ou por uma cor destacada (MEYER, 1997).
Para Cairo (2011), uma infografia pode ser composta por
elementos icônicos e tipográficos, que têm como meta facilitar a
compreensão do usuário. Este infográfico pode acompanhar ou
substituir um texto informativo. Sendo que por vezes, um info-
gráfico pode não ter que incluir palavras, estas só servem se trou-
xerem mais significados.

9.FOCO NAS PESSOAS CERTAS


Temos que refletir sobre a experiência e a cultura do re-
ceptor, levando em consideração o significado do que fazemos.
Para isto, pense que há dois tipos de pessoas: Pessoas realmente
interessadas, quando percebem que este assunto terá muito im-
pacto na vida delas, leitores sistemáticos, verão as informações
com detalhe. Preferem gráficos simples e organizados, portanto o
excesso de elementos visuais não é bem-vindo.
Pessoas que não estão necessariamente interessadas no teu
assunto, quando percebem que o impacto será pequeno, leitores
heurísticos, verão por cima a informação, estarão mais interessa-
das no ponto principal, nos slogans e analogias do que nos factos.
Em geral, vão preferir gráficos que chamem a sua atenção. Assim,
podemos dizer que devemos ter mais adornos para tópicos sem
impacto (MEYER, 1997).
Assim, cabe a reflexão sobre qual o tipo de leitor ou usu-
ário no qual seu infográfico será publicado. A decisão sobre a es-
tratégia de desenvolvimento da comunicação visual do seu traba-
lho poderá acarretar a otimização da mensagem ou ao contrário, a
rejeição de um conteúdo por parte do leitor.

10.PRODUÇÃO DE UM INFOGRÁFICO
Meyer (1997) defende que como o infográfico é o ponto
de entrada, deve logo apresentar as informações principais de um
texto para que funcione como ferramenta decisória para uma lei-
tura mais aprofundada.
Portanto, o infografista deve aproveitar o tempo do leitor,
indo direto ao assunto, apresentando o que é mais importante.
Meyer (1997) defende que este profissional faça uso da pirâmide
invertida como forma de redação dos seus textos. Seguindo este
modelo, começamos com os pontos mais importantes e vamos
continuando a relatá-los numa ordem decrescente de importância.
Isto foi herdado da época do telégrafo, quando não se sabia ao
certo até onde a informação seria transmitida. Hoje não é a co-
nectividade da informação que é posta em questão, mas a atenção
do leitor que não podemos definir até que momento a teremos. “A
ideia é que se você quer chegar num ponto, faça-o rapidamente ”
(MEYER, 1997, p. 47).
Num infográfico, não conseguimos a mesma linearidade
temporal que um texto. O que obtemos são diferentes ordens de
leitura, devido à ênfase e ao contraste visual entre os diversos ele-
mentos que compõe um layout. Pense no ponto principal do seu
infográfico, ele terá de ser o ponto que mais chamará atenção, um
ponto de maior hierarquia visual, sendo lido em primeiro lugar.
Continue pensando nos pontos secundários, cortando o volume
de informações visuais excedentes, e por fim ofereça a última lei-
tura aos detalhes de apoio, reduzindo ainda mais o volume.

11. COMO CRIAR UM INFOGRÁFICO


Nigel Holmes (2012), designer gráfico da revista norte-a-
mericana Time, diz que um infográfico tem que ter um começo,
um meio e um fim, pois conta uma história assim como um texto.
O principal ponto do infográfico torna-se equivalente em impor-
tância ao cabeçalho da notícia. A sua principal missão é ser lido
em um relance, ao mesmo tempo em que fornece informações.
Portanto, Meyer defende que haja 3 momentos ou níveis de leitu-
ra de um infográfico, para isto organiza-os por ordem de impor-
tância, em ponto principal, ponto secundário e detalhe de apoio.
11.1 O ponto principal
É o ponto mais importante no infográfico, ou seja, a sua
razão de existência. Portanto, de acordo com os princípios da pi-
râmide invertida deve estar no primeiro nível de leitura. Para isto,
utilizamos os princípios da gestalt e do design gráfico ao tratar
cabeçalhos, caixas e highlights, por exemplo. Trabalhamos no
contraste destes elementos, no uso pertinente da tipografia, cor,
da escala, do posicionamento, da distribuição, do uso de adornos,
etc. É através destes artifícios que valorizamos a forma visual,
transmitindo informações as quais o texto escrito maior não pre-
cisa abordar.
Um dos artifícios muito utilizados nos infográficos para
demonstrar os pontos principais são as pointer box, que são cai-
xas que apontam e sumarizam o local mais importante do gráfico.
Esta caixa deve adicionar algo à mensagem do cabeçalho do grá-
fico, funcionando como uma espécie de extensão.
Como exercício prático, podemos pensar na elaboração de
um infográfico sobre uma infografia que será publicada junto à
uma matéria sobre o número de aprovados de determinada escola
(doravante chamada de Escola X) que a colocou na liderança do
ranking nacional do Enem. Neste exercício, o cabeçalho do gráfico
poderia ter o sucinto título: Escola X lidera ranking nacional do
Enem. Para o desenvolvimento da pointer box, devemos lembrar
de adicionar algo à mensagem do cabeçalho e, assim, completar a
informação que já foi dada. No exemplo, uma possível mensagem
para a pointer box seria: Foram mais de Y alunos aprovados.
Após falarmos tanto em destacar o que é importante para
a comunicação, devemos também lembrar que cortar o supérfluo
é outro artifício para dar ênfase ao ponto mais importante, tor-
nando-o claro e distinto. Portanto, repense o texto que trata do
ponto principal, corte-o até ficar com no máximo 2 a 4 palavras
essenciais. Depois disto, trabalhe para que a tipografia confira à
informação o status de título. Um dos recursos mais utilizados
neste momento é a simples aplicação de variações mais pesadas
da fonte trabalhada, tais como bold, black ou heavy. Desta forma,
chama-se atenção do leitor para o principal ponto.

11.2 O ponto secundário


Como o próprio nome já indica, o ponto secundário é o
que sustenta um segundo nível de leitura, ou seja, podem ser as
partes importantes que não conseguimos cortar.
Um infográfico deve dar uma visão geral e clara do tema,
por isto, é importante que o ponto secundário não se confunda
com o principal. É por isto que as tabelas são péssimos infográfi-
cos porque mostram muitos detalhes. O que um infografista deve
oferecer não são os números, mas uma avaliação destes. Para isto
é preciso avaliar e organizar, mostrando os padrões que estão por
baixo de uma tendência.
Os pontos secundários podem ser a tendência apresenta-
da do infográfico, mas também podem se apresentar como texto
numa caixinha à parte, logo abaixo do cabeçalho, por exemplo.
Voltando ao exemplo do infográfico que imaginamos
como livre exercício, ao invés de trabalhar com a tabela de dados
brutos com o nome de todas as escolas e seus respectivos núme-
ros de aprovados, poderíamos pensar em uma forma simplificada
de demonstração dos números através da representação de um
pódio com as três escolas com maiores índices ou, ainda, uma
contagem simplificada com uma massa visual criada com ícones
de alunos que ocupariam maior área nas escolas com maiores ín-
dices de aprovação.
Essas são possibilidades que se abrem para demonstrar
dados importantes de uma forma sintética. Entretanto, cabe lem-
brar que as possibilidades são infinitas e cabe ao infografista estar
sempre atento aos principais veículos desenvolvedores de info-
grafias para ter sempre um repertório grande de opções de forma
a escolher a mais adequada a cada caso.

11.3. O detalhe de apoio


É o terceiro e último nível de leitura da pirâmide invertida,
que por vezes podem não aparecer para serem apenas deduzidos.
São os pontos menos significantes que mostram a relação visual
entre os pontos principais e os secundários.
Fazendo um novo exercício prático, podemos pensar no
caso de um infográfico sobre o a mais nova quebra recorde de
velocidade na prova de atletismo dos 100 metros rasos, supondo
que ela a marca venha caindo a cada campeonato.
Como já falamos sobre o ponto principal, deve-se pensar
no mais importante que deve ser informado ao leitor: a nova que-
bra do recorde. Desta forma, o título sugerido poderia ser: O re-
corde de 9,58s. Como pointer box, poderíamos assinalar o tempo
do recorde anterior.
Avançando neste conceito, o ponto secundário pode criar
uma linha do tempo que ao mesmo tempo que demonstra com o
tempo da prova vem caindo do longo do tempo, como também
demonstre que as quebras ocorrem em um ritmo cada mais inten-
so. Por fim, o detalhe de apoio poderia trazer informações sobre
uma determinada marca que perdurou por muitos anos.
Além de distribuir a informação em tópicos diferentes, o
infografista deve desenvolver seu trabalho de forma a tornar estas
áreas visualmente compreensíveis. Para dar estes três níveis lei-
tura, deve-se trabalhar com níveis diferentes de hierarquia visual,
destacando o título como a zona de maior hierarquia visual, o
conteúdo secundário como os dados que precisam ser vistos para
a melhor compreensão do tema e, por fim, o detalhe de apoio viria
visualmente com menor importância.
12.OS PRINCÍPIOS QUE GUIAM A PRODUÇÃO DE UM
INFOGRÁFICO SEGUNDO MEYER (1997)
Há quatro princípios que baseiam a construção de um bom
infográfico:
Vivacidade: grau que atrai a nossa atenção.
Artifício principal: Use imagem grande, sombra ou
fonte bold;
Organização: grau em que o seu ponto principal está cla-
ro em detrimento dos demais, deixe em evidência a hierarquia.
Artifício principal: Use cabeçalhos, enfatize apenas o que for pre-
ciso.
Metáfora de dados: o grau no qual se usa gráfi-
cos e outras imagens para representar a informação chave.
Artifício principal: Use gráficos de barras, faça comparativos.
Simplicidade da metáfora: a simplicidade do que se trata.
Artifício principal: remova o que não é essencial.

Para compreender melhor estes conceitos, podemos pensar


da seguinte forma: a vivacidade atrai o olhar, a metáfora através
da comparação dos dados dá impacto, a organização mostra o
que é importante e a simplicidade diminui a desordem entre os
três níveis de leitura.
Assim, as estratégias a serem usadas dependem do tipo
de leitor a se atingir. Como citamos anteriormente, para leitores
sistemáticos damos mais organização e simplicidade. Por outro
lado, para leitores heurísticos damos mais atenção a vivacidade e
a metáfora de dados.
O que devemos ter claro, é que não há infográficos cer-
tos ou errados, eles dependem de cada público. Analise bem qual
ênfase dar para cada uma destas estratégias. Às vezes, a ideal é
o meio termo, assim temos a certeza que comunicaremos com os
leitores em geral (MEYER, 1997).

13.ARTIFÍCIOS TEXTUAIS PARA USAR NUM


INFOGRÁFICO
Etiquete o seu infográfico, através de uma pointer box
que possua uma frase direta, contando exatamente o que os leito-
res estão vendo. Ao trabalhar com os dois códigos, visual e textu-
al, o entendimento e a memorização se tornam mais fáceis, do que
quando só se usa uma das formas (MEYER, 1997).
Evite usar caixas que contenham explicações das cores
ou dos símbolos utilizados nos gráficos, ou seja, que funcionam
como legendas, pois estas se tornam um obstáculo para uma lei-
tura rápida. Se o gráfico não puder sobreviver sem legenda, apro-
veite o espaço próximo a ele e o etiquete, não faça isto em áreas
distintas (MEYER, 1997).
Se o gráfico tiver inúmeras partes, como muitas barras ou
fatias, junte as categorias menores em uma maior, então coloque
uma lista próxima a ela, dos elementos que a compõem, usando
uma fonte pequena. Assim, esta categoria funcionará como um
detalhe de apoio (MEYER, 1997).

14.AS ETAPAS DE UM INFOGRÁFICO


Por fim, criamos uma listagem com algumas das etapas
para o desenvolvimento de um infográfico. São estes os passos:
• Leia o conteúdo, refletindo sobre do que se trata, qual a
principal razão de existência;
• Escolha o melhor tipo de infográfico para trabalhar em
relação ao conteúdo que deverá ser mostrado (item 4);
• Identifique qual é o seu público, se são leitores heurísti-
cos ou sistemáticos (item 9). Deste esclarecimento, deve-se pen-
sar nos critérios e também na utilização ou não de adornos;
• Pense em que imagens apresentar que sejam claras;
• Identifique os pontos-chaves, os pontos secundários e os
detalhes de apoio (item 11);
• Pense se estes pontos-chaves estão devidamente nomina-
dos, de forma clara e curta, de duas a quatro palavras. Se não for
assim, altere-a para uma melhor;
• Traga para perto do ponto principal a imagem trabalhada;
• Coloque bold, um tamanho maior e/ou cor de destaque nas
palavras que relatam os pontos chaves. Organize espacialmente;
• Passe a representar os pontos secundários, com menos
ênfase que os anteriores. Organize espacialmente;
• Pense se realmente é necessário representar os detalhes
de apoio, como melhor apresentá-lo em relação aos demais. Or-
ganize espacialmente;
• Pense nos quatro princípios do infográfico, se eles foram
devidamente bem utilizados.

15. INFOGRAFIA E BANALIZAÇÃO DE DADOS


A infografia simplifica os dados, mas não quer dizer que os
degrade ou diminua o seu potencial de informação com o objetivo
de fazê-lo mais divertido ou atrativo. Cairo (2011), defende que
ela é uma boa forma de estruturar um todo ordenado, com pa-
drões facilmente reconhecíveis aos nossos olhos, revelando algo
que estava oculto. Portanto, a infografia é uma ferramenta de po-
tencialização de cognição, no sentido de melhorar a compreensão
e a memória do receptor.
Assim, observa-se que as infografias cada vez mais de-
vem ser vistas e consumidas neste mundo repleto de informações.
Compreende-se o quanto o processo de criação e desenvolvi-
mento de uma infografia pode ser complexo. Ao designer, cabe
a tarefa de estar sempre atento, simplificando a informação para
torna-la mais direta e que atinja seu público de forma mais rápi-
da. Entretanto, este mesmo profissional deve estar ciente que este
papel de simplificar a informação, não pode ser deprecia-la sob o
custo de pôr todo o seu trabalho em jogo.
REFERÊNCIAS
CAIRO, Alberto. Infografia 2.0: visualización interactiva de in-
formación em prensa. Madrid: Alamut, 2008.
MEYER, Eric. Designing Infographics. Indianapolis: Hayden
Books, 1997
HOLMES, Nigel, & DE NEVE, Rose. Designing pictorial sym-
bols. New York: Watson-Guptill, 1985.
SOBRE
OS AUTORES
Ana Cristina Antunes
Professora Adjunta da Escola Superior de Comunicação Social
do Instituto Politécnico de Lisboa (ESCS-IPL). Doutorada em
Psicologia (com especialização em Psicologia do Trabalho e das
Organizações), pelo ISCTE-IUL. É Subcoordenadora da licencia-
tura em Publicidade e Marketing e docente nas áreas da Publici-
dade e Marketing, Comportamento do Consumidor e Processos
de Interação com o Utilizador. É autora e co-autora de capítulos
de livros, artigos científicos e comunicações nas áreas do com-
portamento organizacional, comportamento do consumidor e in-
teração com o utilizador.

Andrea Pinheiro Paiva Cavalcante


Professora do Curso Sistemas e Mídias Digitais da Universidade
Federal do Ceará, pesquisadora do Grupo de Pesquisa da Relação
Infância, Juventude e Mídia, GRIM. Concluiu mestrado (2006) e
doutorado (2014) em Educação Brasileira (UFC). É co-autora do
livro Qualidade na Programação Infantil na TV Brasil (Ed.Insular,
2012) e colaborou na organização das coletâneas Mídia de Choco-
late: estudos sobre a relação infância, adolescência e comunicação
(E-papers, 2006) e Polifonias: vozes, olhares e registros na filo-
sofia da Educação (Editora UFC, 2005). Jornalista graduada pela
Universidade Federal do Ceará (1993) e especialista em Teoria da
Comunicação e da Imagem (1995). Trabalhou como repórter do
Jornal O POVO e da Rádio Extra Produções. Integrou por dez anos
a Rede de Comunicadores Solidários (Pastoral da Criança/UCBC).
Atua, principalmente, no campo da Comunicação e Mídias, com
ênfase em estudos de comunicação, infância e juventude, educo-
municação, comunicação popular, comunicação em rede, estudos
em mídia sonora (linguagem radiofônica e publicidade radiofôni-
ca), uso de mídias na educação e multiletramentos.

Andrei Bosco Bezerra Torres


Graduado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal
do Ceará (2011) e mestre em Engenharia de Teleinformática pelo
Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Teleinformática
(PPGETI) pela mesma instituição (2017). Atualmente é Profes-
sor Auxiliar da Universidade Federal do Ceará. Tem experiência
nas seguintes áreas: internet das coisas (IoT), redes de sensores
sem fio, design de interface, modelagem 3d, ambiente virtual de
aprendizagem, mobile-learning e robótica educacional.

Antônio José Melo Leite Júnior


Possui Mestrado (2000) e Graduação (1998) em Ciência da Com-
putação pela Universidade Federal do Ceará. Foi professor assis-
tente da Universidade de Fortaleza e professor titular da Facul-
dade Sete de Setembro. Tem experiência na área de Comunica-
ção em Mídia Digital, com ênfase em Multimídia e Educação a
Distância. Atua no desenvolvimento de produtos de mídia digital
(CD-ROMs, web-sites e vídeo games) e em pesquisas no campo
da Usabilidade de Sistemas e Computação Gráfica. Atualmente é
professor assistente da Universidade Federal do Ceará
Artur de Oliveira da Rocha Franco
Bacharel em Sistemas e Mídias Digitais na Universidade Fede-
ral do Ceará (UFC). Atua na área de modelagem computacional
aplicada, sendo bolsista do Grupo de Pesquisa em Modelagem
Computacional Aplicada (GrPEC) da UFC. Suas principais áreas
de interesse são: desenvolvimento de algoritmo, análise multiva-
riada, análise tensorial e inteligência artificial.

Carlos Eduardo Brito Novais


Possui graduação em Publicidade e Propaganda pela Universi-
dade de Fortaleza (2005) e mestrado em Las Tic en Educación
pela Universidade de Salamanca (2008). Atualmente é professor
da Universidade Federal do Ceará. Tem experiência na área de
Comunicação, com ênfase em Mídias Digitais, atuando princi-
palmente nos seguintes temas: Comunicação Visual, Tipografia e
Design de Interfaces.

Cátia Luzia Oliveira da Silva


Atualmente é professora adjunta da Universidade Federal do Cea-
rá - Instituto UFC-Virtual. Possui doutorado em Learning, Design
and Technology pela University of Georgia, EUA (2011), mes-
trado em Educação pela Universidade Federal do Ceará (2001)
e graduação em Comunicação Social pela Universidade Federal
do Ceará (1994). Durante o período de 2000-2001 foi bolsista
Fulbright na University of Georgia e Turner Learning/CNN na
produção de vídeos educativos. Foi coordenadora do Projeto For-
mação de Tutores em Educação a Distância, em 2005. Participou
no desenvolvimento das interfaces gráficas de cursos online e do
SOLAR (Sistema Online de Aprendizagem). Tem experiência na
área de Tecnologia Educacional, com ênfase em Instructional De-
sign e formação de professores, atuando principalmente nos se-
guintes campos: educomunicação, informática educativa, design
de interação, visual literacy, ambientes virtuais de aprendizagem,
educação a distância e inclusão digital.

Clemilson Costa Santos


Professor Adjunto I do Curso de Sistemas e Mídias Digitais do
Instituto Universidade Virtual da Universidade Federal do Ceará.
Possui doutorado em Engenharia Agrícola (2013), mestrado em
Engenharia Elétrica (2008) e graduação em Física (2004), pela
Universidade Federal do Ceará. Tem experiência na área de En-
genharia, com ênfase em Engenharia da Computação, Engenharia
Elétrica e Engenharia Agrícola, atuando principalmente nos se-
guintes temas: sistemas embarcados, automação e controle, rede
de sensores sem fio, redes de petri coloridas e automação agrícola.
Daniel Marques Maranhão
Possui graduação em Sistemas e Mídias Digitais pela Universida-
de Federal do Ceará (2016). Tem experiência na área de Ciência
da Computação, com ênfase em Jogos Digitais, atuando princi-
palmente nos seguintes temas: Design de Jogos.

Edgar Marçal de Barros Filho


Doutor em Ciência da Computação pela Universidade Federal do
Ceará (UFC), na área de Ubiquitous Learning. Mestre em Ciência
da Computação pela UFC, na área de Mobile Learning. Professor
da Universidade Federal do Ceará, lotado no Instituto UFC Virtu-
al. Tem experiência na área de gestão de projetos em informática
na educação e gestão de projetos comerciais e análise de sistemas.
Tem atuado principalmente nos seguintes temas: Mobile Lear-
ning, Computação Móvel, Gestão de Projetos, Análise de Siste-
mas, Engenharia de Software e E-Learning.

Eduardo Santos Junqueira Rodrigues


Doutor em Educação pela Michigan State University, profes-
sor adjunto do Instituto UFC Virtual e professor credenciado do
Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira da Univer-
sidade Federal do Ceará. Tem experiência nas áreas de Educa-
ção e Comunicação Social, com ênfase em cibercultura, novos
letramentos (new literacies, multiliteracies), pesquisa etnográfi-
ca e educação online. Coordena pesquisas sobre navegação hi-
permodal em contextos de aprendizagem com o uso da técnica
de rastreamento ocular (eye tracking) e sobre novas práticas de
aprendizagem no contexto do ativismo em rede. Possui diversas
publicações no exterior e no Brasil. É líder do grupo de pesquisa
Linguagens e Educação em Rede (LER).

Emanuel Ferreira Coutinho


Professor Adjunto na Universidade Federal do Ceará (UFC), lo-
tado no Instituto Universidade Virtual (UFC-VIRTUAL). Possui
graduação em Ciência da Computação pela Universidade Esta-
dual do Ceará (2000). Mestre em Ciência da Computação pela
Universidade Estadual do Ceará (2003), trabalhando com temas
relacionados a grafos, escalonamento e roteamento de veículos, e
modelagem matemática. Doutor em Ciência da Computação pela
Universidade Federal do Ceará (2014), trabalhando com Compu-
tação em Nuvem, definindo métricas e metodologias para análise
de desempenho da elasticidade. Suas áreas de interesse são Com-
putação em Nuvem, Análise de Desempenho, Sistemas de Infor-
mação e Engenharia de Software. Atuou no desenvolvimento de
sistemas e de processos de software. Também é implementador
do MPS.BR, especialista em Gerenciamento de Projetos (UFRJ)
e Project Management Professional (PMP).
Fernando Lincoln Carneiro Leão Mattos
Possui graduação em Pedagogia pela Universidade de Fortaleza
(1982), mestrado em Educação pela Universidade Federal do Ce-
ará (2002) e doutorado em Educação pela Universidade Federal
do Ceará (2005). Atualmente é professor adjunto da Universidade
Federal do Ceará. Tem experiência na área de Educação e Ciber-
cultura, com ênfase em Didática do Ensino Superior, atuando prin-
cipalmente nos seguintes temas: educação a distância, formação
de professores, cibercultura e ambientes virtuais de aprendizagem.

Gabriel Antoine Louis Paillard


Bacharel em Ciência da Computação se graduou em 1996 pela
Universidade Estadual do Ceará. Em seguida cursou o mestrado
no Programa de Engenharia e Sistemas de Computação na Co-
ppe, defendeu sua dissertação em 1999. Realizou o doutorado
na Universidade Paris Nord e defendeu sua tese em 2005. Desde
2006 é professor da Universidade Federal do Ceará onde coorde-
nou o curso de Engenharia da Computação por 4 anos no campus
de Sobral. Em 2014 efetuou um pós-doutorado na Universidade
Paris Nord. Seus interesses de pesquisa incluem redes de senso-
res, análise de algoritmos distribuídos, computação em nuvens e
computação paralela.
Georgia da Cruz Pereira
Professora do curso de Sistemas e Mídias Digitais da Universida-
de Federal do Ceará. É doutora em Comunicação pela Universida-
de Federal de Pernambuco, na linha de pesquisa Mídia e Estética,
com pesquisa sobre processos de criação na produção audiovisu-
al, com ênfase na produção documentária. É mestre em Comuni-
cação Social, na linha de Fotografia e Audiovisual, pela Universi-
dade Federal do Ceará, com pesquisa sobre dispositivo fílmico e
crítica de processo. Desenvolve estudos na área do documentário
brasileiro contemporâneo. Especialista em Meios Audiovisuais
Eletrônicos pela Universidade Federal do Ceará. Desenvolve es-
tudos no GRIM (Grupo da Relação Infância, Juventude e Mídia)
e no Grupo de Estudos e Pesquisas em Narrativas Multimídia.
Suas áreas de interesses são: Comunicação Social; Produção Au-
diovisual; Cinema e Audiovisual; Processo de Criação; Cinema
Documentário; Narrativa Audiovisual; Análise Fílmica; Análise
de Obras de Arte; Crítica da Arte; Design, dentre outras.

Giancarlo Schaffer Torres Junior


Estudante de graduação em Sistemas e Mídias Digitais pela Uni-
versidade Federal do Ceará.
Glaudiney Moreira Mendonça Junior
Possui graduação em Ciências da Computação pela Universidade
Estadual do Ceará (2002) e mestrado em Ciência da Computação
pela Universidade Federal do Ceará (2005). Atualmente é profes-
sor da Universidade Federal do Ceará, lotado no Instituto UFC
Virtual, e coordenador do curso de Bacharelado em Sistemas e
Mídias Digitais. Tem experiência na área de Jogos, Narrativas e
Mitologia, atuando principalmente nos seguintes temas: Jogos de
Tabuleiro, Gamificação, Narrativas Multimídia, Psicologia Ana-
lítica e Mitologia Grega.

Henrique Barbosa Silva


Graduado em Administração pela Universidade de Fortaleza
- UNIFOR (1991), concluiu o mestrado em Administração de
Empresas pela Memorial University of Newfoundland- Canadá
(2001). Detém experiência na área de Administração, com ênfase
em Organizações Públicas. Ocupou cargos de direção na Secreta-
ria de Planejamento e Gestão, Secretaria de Agricultura Irrigada,
Secretaria do Trabalho e Empreendedorismo e a Secretaria da Cul-
tura do Estado do Ceará, onde adquiriu habilidade e domínio de
práticas em gestão e administração pública, avaliação de políticas
públicas e planejamento e execução orçamentária. Desde 2009,
é Professor Efetivo da Universidade Federal do Ceará, lotado no
Instituto UFC Virtual, onde responde pela disciplina de Gestão
em Negócios Multimídias, Gestão de Projetos, Seminários e co-
ordena a Secretaria Administrativa, onde exerce o papel de gestor
de projetos e promove articulações entre os órgãos financiadores,
sejam estes das esferas federal, estadual ou municipal, as funda-
ções de apoio e a Universidade. Desde julho de 2016, assumiu o
cargo de Coordenador Geral do Comitê Gestor Institucional de
Formação Inicial e Continuada de Profissionais do Magistério da
Educação Básica.

Inga Freire Saboia


Professora de Design Multimídia do Curso de Sistemas e Mídias
Digitais da Universidade Federal do Ceará. Doutoranda em Infor-
mação e Comunicação para Plataformas Digitais pela Universi-
dade de Aveiro. Mestre em Audiovisual e Multimídia pela Escola
Superior de Comunicação Social, Instituto Politécnico de Lisboa.
Interessada na área de Design de Interfaces Gráficas, UX Design,
Design de Interação, Gamification, Realidade Aumentada, Intera-
ção Humano Computador e Comunicação Visual. Tem graduação
em Comunicação Social - Publicidade e Propaganda pela Universi-
dade Federal do Ceará (2005). Atua no mercado há mais de 10 anos
como Brand Manager, Designer gráfico e Assistente de Marketing.
Jefferson Torres de Freitas
Graduando em Bacharelado em Sistemas e Mídias Digitais
(2010). Trabalhou como Bolsista de Monitoria no Grupo de Redes
de Computadores, Engenharia de Software e Sistemas (GREat /
UFC). Tem experiência na área de Ciência da Computação, com
ênfase em desenvolvimento de Softwares, aplicações com Banco
de Dados, Realidade Virtual e programação em jogos digitais.

José Gilvan Rodrigues Maia


Bacharel em Ciências da Computação pela Universidade Federal
do Ceará (2003), mestre em Ciências da Computação pela Uni-
versidade Federal do Ceará (2005) e doutor em Ciência da Com-
putação pela Universidade Federal do Ceará (2010). Tem experi-
ência na área de Ciência da Computação, com ênfase em Visão
Computacional, Jogos Digitais e Computação Gráfica. Atuando
principalmente nos seguintes temas: Visão Computacional, Ma-
chine Learning, Segurança da Informação, Processamento Digital
de Imagens, Realidade Virtual, Game Engines, Detecção de Coli-
sões e Processamento de Cenas Tridimensionais.

Leonardo Oliveira Moreira


É Bacharel em Informática pela Universidade de Fortaleza (UNI-
FOR), Mestre e Doutor em Ciências da Computação pela Univer-
sidade Federal do Ceará (UFC). Atualmente é Professor Adjunto
II em regime de dedicação exclusiva da UFC, lotado no Instituto
Universidade Virtual (UFC Virtual). Leonardo Moreira é docen-
te permanente do Bacharelado em Sistemas e Mídias Digitais da
UFC, onde é responsável pelas disciplinas de Bancos de Dados
e Programação para Web. Foi vice-coordenador do Bacharelado
em Sistemas e Mídias Digitais do período de fevereiro de 2014
a abril de 2015. De maio de 2015 a dezembro de 2015 exerceu
a função de coordenador do Bacharelado em Sistemas e Mídias
Digitais da UFC. Suas principais áreas de pesquisa são Bancos
de Dados e Sistemas Distribuídos, com ênfase em linhas que per-
meiam ambas as áreas, como Computação em Nuvem, Gestão de
Dados Distribuídos, Tecnologias para Web e Desenvolvimento de
Aplicações Distribuídas.

Levi Bayde Ribeiro


Possui graduação em Ciências da Computação pela Universidade
Federal do Ceará (2006) e mestrado em Ciências da Computação
pela Universidade Federal do Ceará (2009). Atualmente é Professor
Assistente da UFC, Universidade Federal do Ceará, locado no Iuvi,
Instituto Universidade Virtual. Desempenha atividades letivas e de
projetos no Toth, Grupo de Mitologia, Simbolismo e Arquétipos.
Liandro Roger Memória Machado
Professor do curso de Sistemas e Mídias Digitais da UFC (Uni-
versidade Federal do Ceará). Atua na área de design multimídia,
com ênfase em ilustração, concept art e design gráfico aplicado
a mídias digitais. Tem interesse por ilustração digital, desenho,
pintura, linguagem visual, design thinking, direção de arte, con-
cepção de personagens e cenários, jogos digitais, animação, car-
tum e quadrinhos. Mestre em Comunicação (2016), Especialista
em Design Gráfico (2009) e graduado em Comunicação Social /
Publicidade e Propaganda (2007).

Lizie Sancho Nascimento


Professora da Universidade de Fortaleza do curso de graduação
em publicidade e pós-graduação em áreas afins do design digital.
Antiga coordenadora do curso técnico em Animação Gráfica para
Jogos Digitais na Escola Porto Iracema das Artes e do Grupo de
Mídia Interativa da UNIFOR. Atualmente é também mestranda
do Curso de Design da Universidade Federal do Pernambuco e
tem como principais áreas de interesse: design de interação e in-
terface, jogos e mídias digitais.
Luciana de Lima
Licenciada em Matemática pela Universidade Federal do Cea-
rá - UFC (1994), Especialista em Psicopedagogia pela Univer-
sidade Estadual Vale do Acaraú - UVA (2003), Especialista em
Tecnologia com ênfase em Telemática pelo Centro Federal Tec-
nológico do Ceará - CEFETCE (2006), Mestre em Educação pela
Universidade Estadual do Ceará - UECE (2008) e Doutora em
Educação, linha Educação, Currículo e Ensino, eixo Ensino de
Ciências, pelo Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Edu-
cação da UFC (2014). Atualmente é professora DE Adjunta da
Universidade Federal do Ceará, com lotação no Instituto Univer-
sidade Virtual (IUVI). Tem experiência na área de Formação de
Professores, trabalhando principalmente com os seguintes temas:
Aprendizagem Significativa, Mapas Conceituais, Tecnologias Di-
gitais da Informação e Comunicação (TDICs), Educação a Dis-
tância, Ambientes Virtuais de Aprendizagem, Educação Matemá-
tica e Ensino de Ciências.

Mara Franklin Bonates


Possui mestrado em Engenharia de Sistemas e Computação (na
área de Computação Gráfica) pela Universidade Federal do Rio
de Janeiro (2003) e graduação em Ciências da Computação pela
Universidade Estadual do Ceará (1998). Áreas de interesse in-
cluem Computação Gráfica e Processamento de Imagens. Atual-
mente é Professora Assistente na Universidade Federal do Ceará.
Maria de Fátima Costa de Souza
Possui graduação em Licenciatura Plena Em Matemática pela
Universidade Estadual do Ceará (2002), mestrado em Ciências da
Computação pela Universidade Federal do Ceará (2006) e douto-
rado em Engenharia de Teleinformática pela Universidade Federal
do Ceará (2012). Atualmente é professora adjunta da Universidade
Federal do Ceará e atua na área de Ciência da Computação, com
ênfase em Informática Educativa, tendo como foco os seguintes
temas: objeto de aprendizagem, engenharia de software, modelo de
processo, adaptação de software educativo e especificação formal.

Natal Anacleto Chicca Junior


Professor assistente do Instituto UFC Virtual na Universidade Fe-
deral do Ceará. Doutorando em Design na Universidade Federal
de Pernambuco. Concluiu graduação em Design Gráfico (antigo
Comunicação e Expressão Visual) e Mestrado em Arquitetura e
Urbanismo ambos pela Universidade Federal de Santa Catarina.
Tem experiência na área de Comunicação e Programação Visual,
Design Gráfico, Animação e Ilustração atuando principalmente
nos seguintes temas: ilustração, jogos digitais, animação, comu-
nicação visual, realidade virtual, educação à distância, ambien-
tes virtuais de aprendizagem e interface gráfica. Hoje atua com
Prototipagem Digital, principalmente voltado a impressão 3D por
síntese aditiva a partir de filamento.
Neil Armstrong Rezende
Possui graduação em Bacharelado Em Ciências da Computação
pela Universidade Estadual do Ceará (1992) e mestrado em In-
formática pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
(1996). Tem experiência na área de Ciência da Computação, com
ênfase em Computação Gráfica. Formado também em Audiovi-
sual pelo Instituto Dragão do Mar. Diretor e autor de vários curta
metragens, a maioria em Animação. Coordenou alguns grupos de
pesquisa na UFC na área de jogos educativos, a exemplo os pro-
jetos AVAL (Ambientes virtuais para Aprendizado de Línguas) e
PADCT. Fundou o grupo Lunárticos, que nos últimos anos produ-
ziu cerca de 400 minutos de desenho animado para TV e Cinema.
Roteirista, Produtor e Diretor cinematográfico, produziu e dirigiu
2 séries para TV e orientou a formação de vários grupos de pes-
quisa e desenvolvimento. Em suas disciplinas, diversos vídeos e
curtas foram produzidos sob sua orientação. Lançou o romance
“Última Fortaleza: Semente de Heróis”, ficção cientifica, e atual-
mente é Professor Assistente II da Universidade Federal do Ceará.

Priscila Barros David


Doutora em Educação pela Universidade Federal do Ceará (2010) e
Mestre em Psicologia Cognitiva pela Universidade Federal de Per-
nambuco (2004). É especialista em Informática Educativa (2001)
e Bacharel em Computação pela UFC (2000). Priscila é professora
do Bacharelado em Sistemas e Mídias Digitais da UFC e dos Cur-
sos de Graduação a Distância do Sistema Universidade Aberta do
Brasil, atuando na área de Metodologias e Tecnologias Aplicadas
à Educação a Distância. No Instituto UFC Virtual, coordena a For-
mação Inicial de Tutores a Distância, dentro do Setor de Processos
Pedagógicos. Desenvolve pesquisas interdisciplinares que congre-
gam as áreas de Educação, Psicologia, Linguística e Tecnologias,
as quais investigam o estabelecimento de interações contingentes
em processos educacionais a distância e o desenvolvimento de ma-
teriais didáticos digitais numa perspectiva dialógica e crítica. Seus
estudos são fortemente inspirados no referencial teórico de Paulo
Freire e na Teoria Sociocultural de Lev Vygotsky. Realizou sua pes-
quisa de Pós-Doutorado na University of California, Santa Barbara
(UCSB) em Etnografia Interacional e Análise do Discurso. Coor-
denou o Projeto Universal N° 482704/2013-6 do CNPq, intitulado:
Desenvolvimento de Ontologias com Base no Sistema de Análise
de Interações Contingentes para a Implementação de Avaliações
Formativas em Fóruns de Discussão. Atualmente, é professora do
Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Univer-
sidade Federal do Ceará.

Robson Carlos Loureiro


Graduado em Pedagogia pela Universidade Federal do Rio Gran-
de do Sul (1984), Mestre em Educação com área de dedicação
vinculada a avaliação de softwares educativos pela Universidade
Federal do Ceará (1998) e Doutor em Educação pela Universida-
de Federal do Ceará (2010) com o foco de estudos na avaliação
e nas relações interpessoais em comunidades virtuais de apren-
dizagem. Foi professor e coordenador de Educação a Distância
e assessor da Vice Reitoria de Graduação da Universidade de
Fortaleza. Atualmente é professor adjunto da Universidade Fe-
deral do Ceará - Instituto UFC Virtual. Tem experiência na área
de educação, com ênfase em análise de Coesão em Comunidades
Virtuais de Aprendizagem. Hoje tem se dedicado ao estudo das
relações no espaço pós-orgânico virtual, à filosofia da tecnologia,
narrativas e a formação de professores para atuar com as Tecno-
logias Digitais da Informação e Comunicação. Coordena o Setor
de Avaliação do Instituto UFC Virtual e está Coordenador Peda-
gógico da Universidade Aberta do Brasil. Atua na formação de
docentes e licenciandos para a utilização das TDIC na docência,
prática de interdisciplinaridade, transdisciplinaridade e multirefe-
rencialidade aplicadas à docência.

Sibele Silva Castro


Bacharel em Sistemas e Mídias Digitais pela Universidade Federal
do Ceará (UFC), estudou Mídias Digitais (BSC Digital Media) na
University of Portsmouth, na Inglaterra. Atualmente trabalha como
designer gráfico na Leme Digital. Tem experiência na área de Co-
municação Visual, Mídias Digitais, Design de Interação, Design
de Interfaces, Design Gráfico, Web Design, Editoração Gráfica,
Marketing Digital, Web Design e Comunicação e Tecnologias apli-
cadas à Educação. Trabalhou como pesquisadora e designer gráfico
por dois anos no grupo PROATIVA (Grupo de Pesquisa e Produção
de Ambientes Interativos e Objetos de Aprendizagem) no Instituto
UFC Virtual - UFC onde era bolsista de Iniciação Científica PI-
BIC/CNPq. Além disso, já atuou como diretora de marketing da
Container Digital Jr, como diretora de arte da Rastro (Agência de
Publicidade da Universidade Federal do Ceará), como designer de
interface no Departamento de Computação da UFC e como desig-
ner gráfico na empresa Tera Comunicação.

Ticianne de Gois Ribeiro Darin


Atualmente é Professora do Bacharelado em Sistemas e Mídias Di-
gitais, na Universidade Federal do Ceará, ministrando disciplinas
relacionadas a Interação Humano-Computador, Design de Interfa-
ces e de Interação e História do Design. Tem experiência na área de
Ciência da Computação, com ênfase em Interação Humano-Com-
putador, atuando principalmente nos seguintes temas: Avaliação de
IHC, Design de Interação, Psicologia Cognitiva e Multimídia. Pos-
sui graduação em Telemática pelo Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia do Ceará (2009) e mestrado em Ciências da
Computação pela Universidade Federal do Ceará (2011).
Vicenzo Lucas Fernandes Pegado
Procurou dar à sua formação acadêmica o caráter mais multidis-
ciplinar possível, buscando sempre adquirir habilidades transfe-
ríveis entre áreas distintas. Para tanto, cursou as faculdades de
Física (UFC), Ciências Biológicas (UFC), Arquitetura (UNI-
FOR), Filosofia (UECE) e Ciências da Computação (KAIST).
Atualmente é estudante de graduação em Sistemas e Mídias Di-
gitais, na Universidade Federal do Ceará, e coordena dois gru-
pos de estudos na área de Design de Jogos. Seus maiores inte-
resses são em pesquisas e desenvolvimento de tecnologias inte-
rativas multimídia, com enfoque em jogos analógicos e digitais.

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