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CAP.

1
Hoje tenho uma oliveira! Nunca tinha tido uma oliveira, sem contar com
o arbusto a que a minha mãe chama de oliveira. Sem contar porque, esse
arbusto é pequenino e não dá frutos mesmo apesar da sua luta pela
sobrevivência contra os ventos, chuvas e sal atlânticos. Esta é grande e anciã,
ostenta grandes galhos carregados da folhagem carnuda e flores miúdas, que
transformam tudo em branco e amarelo. Traz consigo a calma de séculos
conturbados, transmite esta calma com um ambiente de inquietação. Não
percebo se a inquietação será minha, se será novidade ou outra coisa
qualquer.

Na verdade, e confesso, esta árvore não é minha, eu apenas olho, observo


e tento entender o que é que a inquieta. Em alguns momentos de regresso á
realidade ditada, lembro-me de que é apenas uma árvore e não sente
inquietude.

Eu vim para a cidade com o intuito de ser melhor por dentro, eu aprendi
durante a minha vida em saber o que as pessoas necessitam de mim, mais do
que o quanto eu necessito delas. Aprendi a observar, pensar e agir, com isto
percebi que não seriam necessárias palavras, apenas ações que demonstrem
aquilo que penso.

Quando era pequena aprendi o valor do trabalho árduo para a obtenção de


objetivos, mas principalmente aprendi o valor da imaginação, aprendi a usar
os meus obstáculos como armas que me ajudem, se encontrar uma pedra vou
usá-la para caçar e matar a fome, se for um pau há de me ajudar a caminhar
e se for um buraco, lá enterrarei algum momento mais triste de mim. Para
isso é preciso aprender com tudo, com o que vejo, com o que ouço e com o
que sinto.
A minha mãe, Maria Magnólia, ensinou-me que posso ser tudo em que
acredito. “A força da fé é a maior que podes ter, Dulce!” disse-me ela quando
eu já não acreditava em nada nem em ninguém.

Ela é uma mulher cheia de surpresas, depois de quase criados 4 filhos e


netos a brotar a cada ano que passa, traz sempre consigo a jovialidade dos
seus 20 anos. Pelos conselhos sobre o que vestir, parece-me ter sido uma
jovem irreverente…pelo menos para a altura. Sei que cortou as suas saias
todas acima do joelho e andava toda updates sobre as modas que vinham lá
da américa “dubaixo”. No entanto, carrega uma vida rural quase de filha
única, seu único irmão Inocêncio foi para o Seminário em idade muito tenra,
e, de certeza que não queria sujar os seus livros de teorias com a terra do
quintal.

Magnólia adora somente a Deus, mas ama sem medida igual! Ama tal
como manda S. Paulo á terra de Coríntia, eles não o ouviram nem
entenderam o que ele queria dizer, mas ela sim! Ela percebeu que o amor não
é um verbo para ser escrito, mas para ser demonstrado.

Com ela aprendi que as ações valem mais do que mil palavras proferidas
com a maior das fés. A fé dela moveu todas as montanhas no meu caminho
deixando apenas restos dos obstáculos, que eu própria acreditava que
existiam. A sua ferocidade como mãe ensinou-me que tudo é feito com
suor…

Contaria com a sua sabedoria para uma melhor observação da oliveira,


nem que fosse para admitir que o seu arbusto não é uma oliveira, mas sim
uma grande sobrevivente de guerra exilada no Atlântico, por outro lado iria
rapidamente diagnosticar, com o seu olhar observador, a minha inquietação!
Provando assim que a árvore não sente inquietação e é apenas uma simples
árvore, mas grande!
Quando vim, vim para aprender! Mal sabia eu o que ainda tinha por
aprender. Aprendi que o prestigio é-nos dado pelo título ou por idade, o título
é dado a qualquer um que aprenda no seu próprio campo, e a idade todos a
terão. Mas o pior que aprendi foi que, o limite entre prestigio e respeito está
quase apagado. Por mim, o prestigio devia ser dado aqueles que o possuem
por titulo de inteligência e intelectualidade, e por isso merecem todo o
respeito. Mas o respeito vai muito além disso, este alarga-se a
todos…TODOS SEM EXCEPÇÃO!

Surpreendeu-me, quando percebi que nada do que acreditava era


realidade. O respeito não era respeito, o amor não era amor, trabalho não é
trabalho, prestígio não é prestígio e a OLIVEIRA NÃO É UMA OLIVEIRA!

O meu pai, Afonso José, um dia disse-me: - “Quanto menos souberes,


mais aprenderás!” – ele queria dizer que na ignorância há sempre alguma
coisa a aprender. Nisto baseei a minha aprendizagem pela vida.
Rapidamente, perdi o interesse em papagaios que repetem ano após ano um
guião de ideia feitas. No meu entender, tudo me está facilitado no que toca a
conhecimento geral! Mas há que jogar este jogo, no qual não há regras, mas
sim consequências, que é a vida. Preciso conhecê-la, experimentá-la,
observá-la e aprender tudo antes de jogar – pensei eu!

Estudei-a tal como o meu querido papi me ensinou – “Dulce, o Homem


inteligente aprende com os seus maus feitos, o homem sábio aprenderá com
os feitos dos outros” – Com isto ele não queria dizer que deveria esperar e
ver outras obras serem concluídas, mas sim calcular bem os meus prós e
contras. Teria de pesquisar o que aconteceu a outros que ficaram debaixo dos
escombros das suas próprias obras, e saber que material usaram e porque foi
que lhes ocorreu tão triste sina.

Observei que alguns usaram a angústia, outros ambição, outros a tristeza,


e a melancolia do cansaço para seus alicerces, outros apenas desistiram ou
ficaram a ver as obras a crescer e depois desmoronar-se, sentindo apenas
pena do que vêm cair.

Observei também as construções que conheço que prevalecem acima dos


escombros e caos ao seu redor. Aqui encontrei maiores problemas, porque o
que se vê fora de 4 paredes não é o que se vê lá dentro, algumas casas
encontram-se de pé, mas no limiar da queda, continuam presas a memórias
do passado, são assoladas por fantasmas que enchem as casas de vento e
chuva, enquanto o construtor aguarda que esta caia em pó, como o passado.
Estas casas têm paredes, mas não têm janelas, não têm portas, não entra o sol
e não sai de lá ninguém…só memórias!

Mas casas como esta oliveira!? Existe só uma - a minha casa junto ao mar.
São fortes e resistentes! A suas raízes entram em solos diferentes, mas são
de natureza igual! São naturalmente imponentes sem o tentarem ser, ambas
passaram ventos fortes, chuvas e tempestades, que as moldaram a ter a forma
e força que hoje têm.

Os alicerces destas casas são feitos de suor, são alicerces que se curvam
com o vento, a chuva e o frio, mas nunca quebram. Eles não quebram, porque
são fruto de uma força conjunta de amor e proteção! Nas construções que
observei, sempre que desaparecia uma janela no esquecimento, era
construída outra mais forte, sempre aparecia um fantasma este era
transformado em memórias, em aprendizagens que saiam pela porta de
entrada com os construtores.

Estes construtores sabiam o que fazer em caso de decadência estrutural,


tinham que arregaçar as mangas e saber onde e como pregar os pregos, que
partes da construção deviam ser postas abaixo para que se torne mais forte,
e principalmente, sabiam quando tinha chegado a hora de partir para a
próxima construção.
Se calhar por esta oliveira não ser minha e ter passado por tantas
tempestades ao longo da sua história que eu desconheço, a minha curiosidade
por ela como se fosse minha, é a razão da sua inquietude.

Gosto dela, faz-me lembrar as construções que observei no jogo. Antes


tinha um poço, não é nada mau para quem tenha água potável. Mas eu trazia
comigo apenas água salgada que ficava lá parada.

6 de maio de 2017

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