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Educación

FLACSO ARGENTINA
Facultad Latinoamericana de Ciencias Sociales

41
propuesta@flacso.org.ar
ISSN 1995- 7785
ARGENTINA

2014
Tempo de escolarização e civilidade da criança na
literatura brasileira,
por Magda C. Oliveira Sarat y Nubea Rodrigues Xavier,
Propuesta Educativa Número 41 – Año 23 – Jun. 2014 – Vol 1 – Págs 81 a 88
Tempo de escolarização e civilidade da criança na literatura
brasileira

Magda C. Oliveira Sarat


Nubea Rodrigues Xavier**

Rememorar a infância pode nos re- mente destacando o livro Sobre o tos infantis que foram discorridos na
meter a uma concepção do tempo Tempo1 – é possível compreender Literatura.
de ser criança diferente do que é de- que a reflexão sobre o tempo assim
terminado pelo calendário ou pelo como o processo civilizatório é de- A infância permeada pela escola-
relógio, o tempo cronos caracterís- terminante na formação da crian- rização é um tempo que promove
tico do universo adulto e das obri- ça/indivíduo que precisa aprender um processo de individualização
gações cotidianas. Tais lembranças, desde a mais tenra idade acerca de da criança, pois passa a vê-la não
geralmente, recaem nos espaços de seu funcionamento. Assim, o tempo somente como alguém que está em
convivência que foram vivenciados como um constructo social e cultu- uma determinada fase, mas como
em grupos sociais como a família, a ral tornou-se “a representação sim- uma categoria social importante e
escola, a igreja, os vizinhos, enfim, bólica de uma vasta rede de relações constituinte de um grupo que pre-
tempos de formação no qual esta- que reúne diversas sequencias de ca- cisa receber a formação adequada a
vam presentes elementos como a ráter individual, social ou puramente este. Tais características vão sendo
ludicidade, os aprendizados e todas físico”2 (Elias, 1998: 17). definidas “nas diversas infâncias que
as experiências de origem. se inventam em cada momento histó-

Portanto, rememorar se insere em


Tal pressuposto direciona esta re-
flexão que caminhará por dois as-
rico e social”3 (Khoan, 2003: 3).
81
uma história coletiva, ainda que pectos: o tempo de convivência fa- Neste aspecto, ao reconhecer as
lembrada individualmente, é re- miliar e o tempo escolar presentes diferentes representações da in-
sultado de experiências vividas em nas referências ao material empírico fância buscamos compreender a
determinado tempo e espaço, seja utilizado, qual seja as obras literárias construção do tempo escolar como

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na família, na escola, no bairro, na de Graciliano Ramos e José Lins do um fenômeno da escolarização das
cidade, no campo por fim, nos gru- Rego. crianças, considerado fundamental
pos de pessoas do qual a criança faz nas transformações acerca de suas
parte. Tais elementos são marcados A partir desses elementos, tenta- concepções. Pensando com Elias
por um processo histórico e cultural mos compreender a concepção de esse tempo se revela como espaço
através de um tempo cronológico infância e de criança sob a ótica da de controle e contenção das emo-
e envolve cultura e grupo social. individualização do sujeito e do pa- ções, dos comportamentos, dos
Neste contexto, levantamos a ques- pel da escola enquanto espaço de sentimentos e promove uma padro-
tão: Qual a concepção de crianças formação. Portanto, ao buscarmos nização de um processo de civilida-
brasileiras, uma vez formado parte imagens ou vestígios da concep- de que se constitui no interior da es-
de sua experiência de escolaridade ção de criança, infância e escola na cola e representa uma determinada
nas origens da formação do sistema Literatura Brasileira, encontramos cultura da escola.
educacional no início do século XX? inúmeras possibilidades de reflexão,
Tal educação pode ser percebida pois há uma variedade de gêneros e
nos fragmentos das obras literárias materiais que apontam pistas para
analisadas neste trabalho. compreensão da questão permitin- Sobre Tempo e Infância
do pensar tais temáticas como um
Ao recorrer a Elias (1998) em seus ininterrupto e lento processo de Para a criança o tempo representa
estudos sobre civilização, - inicial- civilização dos costumes e dos hábi- um símbolo social que é apresenta-

*Profesor del Programa de Postgrado, Facultad de Educación, Universidade Federal da Grande Dourados/
UFGD/Brazil. E-mail: magdaoliveira@ufgd.edu.br
**Maestra de la Secretaría del Educación de Mato Grosso do Sul/ SED/Brazil. E-mail: nubeaxavier@hotmail.com

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do juntamente com normas e regras Neste contexto, ao fazer compara- indivíduo no grupo. Nesse sentido,
que estão dispostas em um espaço ções entre diferentes civilizações destacamos a importância da apren-
temporal de meses, semanas, dias, observou que as sociedades esta- dizagem do tempo nas instâncias de
horas ou segundos, vinculadas às beleciam funções que organizavam escolarização, “tanto espaço quanto
suas atividades, como exemplo: hora o cotidiano e a atuação humana em o tempo escolar ensinam permitindo
de comer; dormir, banhar-se, associa- sociedade, desencadeando um nú- a interiorização de comportamentos
do inicialmente as atividades primá- mero de ações e atividades, que os e de representações sociais”7 (Vidal &
rias de cuidado e proteção, mas com conduzia a uma nova utilização do Faria Filho, 2005: 20).
o passar do tempo vão se tornando tempo como regente de sua ação.
complexas em outras atividades e Progressivamente o desenvolvi- Neste contexto, buscamos duas
aprendizagens como hora de ir à mento humano ficou mais depen- obras literárias que nos instigam a
escola, fazer as tarefas, hora de brin- dente das ferramentas elaboradas compreender a temática proposta.
car, de assistir televisão, entre outras. para medir o tempo, que caracteri- Uma obra memorialística e outra
Estes elementos, inicialmente, vão za as sociedades mais complexas, a autobiográfica escritas e publicadas
apresentar um cotidiano organizado criação do relógio representa uma na primeira metade do século, mas
e pronto para os pequenos, que de- estratégia da auto-regulação dos que descreviam um modelo escolar
verá ser aprendido e assimilado. comportamentos, atos, desejos, muito presente nos finais do século
emoções e experiências. Portanto, XIX e início do século XX, período da
Deste modo, individualmente este o tempo como símbolo social des- infância dos autores.
processo de internalização das nor- ta elaboração humana se estende
mas, regras e aprendizagens deno- ao indivíduo ao nascer, que deverá O modelo da escola presente nas
minado psicogênese por Elías, será se apropriar deste conhecimento. obras estava envolto em um conjun-
resultado de um processo de socio- Para isso, a escola é um dos espaços to de regras e normas que deveriam
gênese no plano social, portanto, sociais de aprendizagem regulada ser observadas, tornando a apren-
coletivo que vai sendo apresentado pelo tempo, pois sua organização dizagem formal um modo de con-
à criança e que está previamente esta firmada em período de ativida- formação dos comportamentos in-
pronto e organizado por seus pa- des específicas do chamado tempo fantis e fazendo a criança tornar-se
res mais velhos. Cada relação esta- escolar. aluno. Sobre essa discussão temos
82 belecida exigirá um tipo específico algumas investigações de autores
de controle e um tempo específico Tal tempo escolar poderá durar mui- da História da Educaçao8 apresen-
para se constituir. Conforme apre- tos anos para a criança – a escolariza- tados na bibliografia deste trabalho.
senta Elias, podemos dizer que as ção da infância na nossa sociedade Tal experiência, também, está pre-
concepções de infância foram sen- se constitui em torno de dez anos se sente em outros países da América
do construídas em um período de considerarmos a Educação Infantil e Latina, como é possível depreender,
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longa duração em um processo a ser os primeiros anos do Ensino Funda- por exemplo, na experiência Argen-
aprendido e imposto socialmente à mental. Portanto, esse tempo esco- tina que organiza seu sistema edu-
criança: lar é obrigatório como parte do seu cativo nacional incluindo as crianças
processo civilizatório de aprendiza- como parte de um projeto nacional
“Numa sociedade, o conceito de gem social e cultural pois “mesmo na de modernização. Segundo Carli
tempo não é objeto de uma apren- sociedade civilizada, nenhum ser hu- (2011: 39), “a partir de la obligato-
dizagem, em sua simples qualidade mano chega civilizado ao mundo e o riedad de la escuela pública (…), los
de instrumento de uma reflexão des- processo civilizador individual que ele niños entre los 6 y 14 años debían de-
tinada a encontrar seu resultado em obrigatoriamente sofre é uma função venir alumnos. En el imaginario de la
tratados de filosofia: ao crescer, com do processo civilizador social”5 (Elias, época, una generación escolarizada
efeito, toda criança vai-se familiari- 1994: 15). E, e estamos nomeando se convirtió en condición para la exis-
zando com o ‘tempo’ como símbolo criança o indivíduo que tem até 12 tencia de un país moderno”.
de uma instituição social cujo cará- anos incompletos, segundo o ECA6
ter coercitivo ela experimenta desde -Estatuto da Criança e do Adoles- As relações estabelecidas na escola
cedo”4 (Elías, 1998: 14). cente - Lei 8069/90. são parte das experiências sociais
vividas por todos os indivíduos em
Portanto um tempo de experiên- Deste modo, a escola também será o diferentes grupos e que representa
cias vividas no qual as crianças vão lugar de convívio com diversas nor- “uma dinâmica repleta de conflitos
aprendendo e se constituindo como mas de civilidade, de contenção das e tensões entre redes de indivíduos,
indivíduos. Elias (1998) apresenta o emoções, adequação de comporta- grupos e instituições interdependen-
tempo como um símbolo social que mento, controle e autocontrole de- tes”9 (Veiga, 2009: 19) que estão em
não existe em si mesmo, mas foi pro- terminando uma grande carga de permanente construção e são fun-
duzido e criado pelo homem, para aprendizagem de regras e normati- damentais na composição dos espa-
regular e constranger a si mesmo. zações importantes para a vida do ços de aprendizagem coletiva e in-

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Tempo de escolarização e civilidade da criança na literatura brasileira

dividual. Sobre a mesma discussão tava ausente das brincadeiras com sair do vigiar constante dos adultos
outros autores10 podem contribuir, as outras crianças, os meninos do e obtém a ‘felicidade’ de ser criança,
porém, no momento, não é o foco engenho. sem vigilância do seu comporta-
deste trabalho. mento. No texto narrativo a felici-
O menino Carlos, protagonista do dade se caracteriza por um tempo
romance, vive uma personagem longe do olhar adulto
que se distancia das outras crianças,
Sobre a Literatura pesquisada os chamados “moleques”, filhos dos Nesta obra, observamos que o tem-
escravos e empregados do enge- po do menino oscilava entre mo-
As obras literárias aqui são percebi- nho. Deste modo, o autor descreve mentos de brincadeiras, ludicidade
das como uma expressão produzida que em suas reflexões solitárias, as e tempo de reflexão das angústias
socialmente, por indivíduos ligados angústias e os conflitos intensifi- e incompreensões da infância, apre-
a interesses e motivações e consti- cam-se. Surge o medo da morte e, sentado pelo narrador/autor como
tuiu-se na perspectiva de compre- um constante questionamento in- uma imagem que expressava o sen-
ensão do processo escolar. Portan- terior sobre sua condição de crian- timento da infância vivida no perío-
to, a pesquisa bibliográfica parte ça - menino diferente dos demais - do quando se está criança. O autor
de uma análise histórica e social também por ser neto do senhor de apresenta no texto uma ínfima dife-
da educação brasileira, utilizando engenho o que lhe valia um cuidado rença entre suas brincadeiras e seus
o imaginário cultural produzido na marcado pela diferença e por certos pensamentos, como se não houves-
literatura – sabemos dos limites des- privilégios com os demais adultos, já se distinção entre tempos e espaços.
ta documentação que são textos fic- que era órfão e morava com os avós. O menino brincava ou refletia sobre
cionais da competência dos estudos suas aflições na mesma medida.
literários, no entanto, dado o seu ca- No romance há o questionamento
ráter testemunhal isto não impede do narrador-autor, sobre temáticas Na obra Infância de Graciliano Ra-
que sejam utilizados para pensar a que não são recorrentes nas crian- mos, o contexto histórico e social
construção histórica da infância, da ças como a solidão almejada por ele, descrito é a passagem do século
escolarização e da sociedade. o menino personagem dedica-se XIX ao XX, no interior dos estados
aos seus questionamentos interio- de Alagoas e de Pernambuco. O au-
Neste contexto, apresentamos as res. No excerto que descreve quan- tor narra um período de mudanças 83
obras Menino de Engenho11 de José do a menino Carlos está caçando na sua família que foge da seca, e
Lins do Rego e Infância12 de Graci- passarinhos: expressa no texto a passagem de
liano Ramos, escritas e publicadas uma economia agrária, - baseada no
respectivamente em 1932 e 1945. “Muitos chegavam, examinavam cultivo da cana de açúcar - para um
Na obra Menino de Engenho perce- tudo, punham o bico quase que período de ascensão do café, surgi-

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be-se o declínio dos senhores de dentro do alçapão, e iam embora, mento da pequena indústria e do
engenho e de um regime político, bem senhores do que se preparava comércio que caracteriza as trans-
social e econômico que historica- para eles. Enquanto os canarinhos formações do início do século XX.
mente afeta os adultos e repercute vinham e voltavam, eu me metia
nas crianças no modo como apare- comigo mesmo, nos meus íntimos Os relatos de suas memórias perso-
cem na obra. O romance apresenta solilóquios de caçador. Pensava em nificam a experiência infantil, e des-
em meio às mazelas do mundo dos tanta coisa...”13 (Rego, 2009: 94). mistifica a imagem de inocência e
adultos uma criança que vive num de felicidade infantil, à medida que
contexto de grande diversidade Nesse fragmento há uma tentativa o autor vai descrevendo a experiên-
étnica e cultural, representada por em compreender o tempo na pers- cia da criança, a partir da indiferen-
um regime escravocrata. Em meio pectiva da criança, na imagem do ça, da dureza e das injustiças que
a conflitos étnicos, as relações fami- menino que “espera o pássaro” cair marcam as relações entre adultos e
liares oscilam entre afetividade e au- na armadilha, enquanto experimen- crianças descritas por ele.
toritarismo. Todos estes elementos ta a experiência do silêncio, do tem-
vão ajudar a constituir a percepção po ocioso, do tempo do ócio da es- No texto infância o tempo da crian-
da criança que sai do espaço familiar pera indeterminada, que o narrador ça ficava disposto em reflexões e
para a escola. apresenta. brincadeiras solitárias, o ambiente
das brincadeiras circulava entre o
A obra literária expressa momentos Percebemos que os momentos de ‘paiol’14, o ‘muro de tijolos de co-
em que percebemos o menino vi- introspecção do menino-narrador piar’15 e as ‘sombras da fazenda’16.
vendo diferentes experiências com é um tempo destinado somente a A brincadeira perpassava por coisas
o tempo, na medida em que o autor si mesmo em que desfruta deste simples da infância como o brincar
o apresenta como uma criança do- isolamento, sem a presença ou in- com os ‘seixos e ossos’17, de ‘cabra-
ente, que em grandes períodos es- tromissão dos adultos. Ele consegue cega’18, ou simplesmente, ‘sentar

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à janela da casa e observar a mata vasta como presumi”23 se percebe foi representado por horas intermi-
balançando as pernas’19. Não po- a consciência do espaço, depois de náveis de aprendizagem com o pai e
dia ter brinquedos industrializados visto com distanciamento, pois o au- a necessidade de adaptação que im-
como os ricos, mas contentava-se tor o está descrevendo como adulto, põe à criança um tempo que ainda
em ‘engenhar bonecos de barro’20. é possível perceber que a escola não estava aprendendo a compreender.
O que estava a sua volta era o mun- era tão grande como a lembrança.
do adulto “feito caixa de brinquedo, Podemos dizer que ao crescermos O tempo contado pelo cronos o tem-
os homens reduzidos ao tamanho de temos a sensação de que a ‘nossa po do relógio, do adulto e do traba-
um polegar de crianças”21 (Ramos, mãe’, nos parecia maior do que ela lho, está representado por horas
2009: 108). realmente é. Tal experiência pode intermináveis na escola. Tais horas
ser usada para descrever essa noção percebidas pelo menino como um
Neste contexto, as brincadeiras, a lu- do espaço. período de perda, que se arrastava
dicidade, a imaginação dos meninos por um tempo angustiante e sem
ou das crianças nas duas obras, “In- A aprendizagem do menino estava sentido. As lições tomadas em con-
fância” e “Menino de Engenho” acon- vinculada a um tempo de sofrimen- junto com a palmatória, levavam o
teciam entre pequenos objetos, to e angústia. O tempo de aprender menino a questionar a severidade
espaços estreitos, sombras esqueci- parece instituído como período di- do processo de aprendizagem e a
das, suspiros dos bichos, brinquedos recionado por normas e regras, san- necessidade de aprender e se ade-
feitos de gravetos e restos. Os meni- ções, castigos físicos e psicológicos quar a esse novo momento da vida,
nos-personagens desejavam viver produzindo cicatrizes. a escola. Os códigos instituídos no
suas infâncias, em um tempo onde processo de aprender impunham
eram continuamente convocados A imagem da escola apresentada na medo e vergonha, o relógio, o uni-
à responsabilidade e as exigências obra de Graciliano é caracterizada forme, o livro, a palmatória estes ele-
dos adultos que se efetivava nas co- como castradora e severa, espaço mentos simbólicos formalizavam o
branças e obrigações, concretas de no qual se impunham às crianças modelo civilizador escolar e faziam
um tempo cronológico considerado amarras, austeridade e incompre- parte da cultura da escola.
o “tempo do aprender”. ensão. O processo de escolarização
representa uma mudança dos tem- Na obra de José Lins do Rego temos
84 pos, do ser criança para o ser aluno e um retrato de uma escola menos
aprender. A escola teria a responsa- castradora em relação à descrição
Tempo e Processo Civilizador Es- bilidade de transformar os meninos na obra de Graciliano Ramos. Entre-
colar em “Infância” e “Menino de e seus momentos de liberdade em tanto, com a mesma característica
Engenho” alunos trocando bruscamente para de adestração e institucionalização
um período de escolarização. do tempo escolar em oposição ao
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Na obra, Infância de Graciliano Ra- tempo de brincar. No obra o menino


mos, o ambiente escolar é carac- A escola, o exercício da escrita e Carlos percebe a escola por uma au-
terizado pela grandiosidade e a leitura representada por Graciliano sência de significados e como lugar
lembrança do tamanho da escola. Ramos se entrecruza por dois ele- de castigos e limites. O autor relem-
A imaginação do menino retrata mentos temporais: o passado e o bra que “ficava eu horas a fio sentado
a entrada no mundo destinado às presente. O passado percebido no na sala de costura, com a carta de abc
crianças, mas que fora construído momento quando ele aprendeu a na mão, enquanto por fora da casa eu
por adultos. As carteiras, o quadro, a escrever, e como ele diz foi “cons- ouvia o rumor da vida que não me dei-
sala, os materiais didáticos e o pro- trangido pelas leis da gramática”24, xavam levar [...] e as letras não me en-
fessor eram como ‘gigantes em terra pelos castigos físicos e a humilhação travam na cabeça”25 (Rego, 2009: 94).
de anões’22. Tudo na escola se mos- da infância. E o segundo momento,
trava estranho e diferente na me- no presente, quando o autor adulto Observa-se que quando ficava a
mória do menino que lembra. Neste foi constrangido pelas leis da polí- caçar passarinhos, a tomar banho
fragmento ele descreve. cia, e perdeu a liberdade, foi preso no rio ou a correr junto com os me-
político, em função da sua escrita e ninos do engenho, o fator tempo
Interessante perceber neste frag- suas posições contundentes e sub- não é apresentado como uma pre-
mento, um aspecto da representa- versivas aos olhos dos algozes. ocupação, pois nesse momento ele
ção de mundo da criança com rela- apenas desfrutava e divertia-se com
ção ao espaço físico. Na percepção O processo de alfabetização do atividades na qual estava envolvido.
infantil, o espaço é sempre maior menino em Graciliano demonstra Contudo, na hora/tempo do apren-
quando se é criança, pois o menino o quanto às emoções relacionadas dizado com a cartilha, aparece uma
está em desvantagem por ser me- ao medo e a vergonha estiveram representação de tempo como se
nor que o mundo preparado para presentes e foram implacáveis no fossem ‘horas a fio’ que vai pesando
ele. No texto “com certeza não era aprendizado do menino. O tempo e enredando o menino no limite cro-

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nológico e produtivista da atividade apontando que o processo civiliza- sua insubmissão a partir das fugas,
escolar. dor determinado pela escola deter- transgressões, resistências, nega-
minava as relações entre adultos e ção do estudo, portanto, a necessi-
A criança-personagem consegue crianças e dirigiam as mudanças nos dade institucional de implementar
compreender o tempo cronológi- comportamentos. castigos e práticas repressoras. Um
co como um tempo de trabalho no exemplo perceptível é a neces-
qual se obrigar a aprender, a realizar Deste modo, o processo de esco- sidade de construção dos muros
leituras, tarefas que fazem parte de larização impôs um novo ritmo ao redor da escola na tentativa de
sua obrigação como aluno que vai ao modo lúdico da criança, pois o separá-la da rua como medida de
a escola para aprender conteúdos, brincar, antes percebido como algo segurança. Sobre a questão alguns
que a primeira vista lhe parece in- processual e natural no cotidiano autores como Gouvea (2007); Lopes;
significante e desnecessário. O tem- da criança; tornou-se fixo e direcio- Faria Filho; Fernandes (2007) e Vago
po/trabalho é marcado pela ausên- nado por um ritmo escolar regulado (2007) entre outros, apontam que a
cia da brincadeira e pela dedicação pelo tempo cronológico. Na esco- escola impunha a criança amarras
as longas horas de aprendizagem, la, a criança teve que aprender e que a restringiam.
percorrendo sofríveis e incompre- adaptar-se ao ‘momento do brincar’,
ensíveis lições diárias que quando que agora é dirigido por um tempo Neste contexto, inspirado em Elias
não aprendidas resultavam em cas- demarcado, o recreio que foi institu- (1993), podemos dizer que estamos
tigos e humilhações. O ato e o tem- ído pela escola como período único imersos em uma rede de interde-
po de aprender estão, neste caso, para a brincadeira. pendências, na qual todos os indiví-
marcados pelo medo apanhar. Há, duos participam de instituições que
portanto, que se considerar - histori- O tempo escolar impunha e impõe tem modelos de comportamento a
camente - neste período era faculta- ainda hoje na experiência de toda serem constituídos, portanto, con-
da a escola o uso de castigos físicos criança, se considerarmos o fator trolados, autocontrolados e dire-
como forma de correção às crianças tempo. Ou seja, o brincar tem hora cionados pelo grupo social. Pois, a
que as frequentava. Nas memórias para começar e para terminar de necessidade de criar mecanismos
de Menino de engenho, de José Lins acordo com uma convenção dirigida de controle social é mediada e or-
do Rego, o tempo é percebido como e regulada pelos adultos. A criança ganizada pelos próprios indivíduos,
um “tempo perdido”‘ nas horas da precisa adaptar-se e compartimen- no sentido de organizar e disciplinar 85
lição. Esta perda era algo que o me- tar seu período escolar em tempo a convivência entre os grupos. A es-
nino não aceitava, pois, conjectura- de brincadeira; tempo de estudos e cola será uma destas instituições de
va que poderia estar se divertindo, tempo de conviver. Tais instituições educação formal dos pequenos.
brincando longe das regras e do foram sendo apreendidas e ressig-
controle dos adultos. nificadas a partir de símbolos que Deste modo ao buscar as entrefaces

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marcam esse tempo, o sino, o reló- entre literatura, história da criança
gio, a ordem do adulto ensinando o e história da escola, podemos ob-
sentido e a existência do tempo. servar que o processo de distan-
Tempos finais ciamento entre adultos e crianças,
Juntamente com esse aprendizado, como elemento de privatização das
A proposta de analisar as obras lite- nas obras literárias, ‘os meninos- relações, foi um marco importante
rárias foi no sentido de buscar ele- personagens’, tinham que aprender na constituição da individualização
mentos de uma cultura escolar que os comportamentos sociais aprova- da criança, da existência social da
faz parte da vida de todas as crian- dos. Deste modo, meninos descritos infância e da conformação da escola
ças. A partir da escola temos pos- como desregrados/desregulados como modelo social de aprendiza-
sibilidade de apreender aspectos iam à escola para serem ‘conser- gem. As crianças saíram da condição
sociais que podem ser percebidos tados’, ou seja, para adaptarem-se do espaço privado familiar para o
em elementos como: o tratamento aos padrões corretos e adequados um espaço público institucional re-
dispensado por adultos às crianças ao seu grupo. Caberia à escola tal presentado pela escola, na qual são
no ambiente escolar; as relações im- responsabilidade de conduzir, pre- vistas como aprendizes, alunos em
plicadas diretamente nos modelos parar, se preciso fosse reprovar, pu- um ambiente organizado para esse
de comportamento para a criança; nir, mas tornar a criança um sujeito fim. O processo de escolarização foi
o tempo dispensado para o apren- civilizado que pudesse conviver em imprescindível na separação entre
dizado de atividades; as atividades sociedade. adultos e crianças e na constituição
de coerção e castigos; o tempo da de uma civilidade desejada e espe-
brincadeira e o lugar das normas, As obras literárias Menino de Enge- rada, especialmente, no período
regras e práticas disciplinares; entre nho e Infância apresentam inúme- apresentado.
outros. Tais elementos são presentes ros exemplos de contravenção por
nas análises das obras em questão, parte dos meninos que exercitavam Portanto, as crianças passam de um

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tempo livre, considerando a brinca- zação permeados por um tempo adequadamente em todas as situa-
deira, para um tempo regulado no elaborado pelos adultos em que a ções e o uso das regras de civiliza-
espaço temporal da escola. Assim, o escola, em determinados períodos, ção, formam um estrutura de nor-
relógio aparece como a personifica- funcionou como um instrumento mas e instintos de acordo com os
ção do tempo e o trabalho passa a civilizador, disciplinador, contendo preceitos escolares.
fazer parte da vida da criança e do os instintos das crianças, dentro dos
seu cotidiano. preceitos sociais. As práticas peda-
gógicas, o templo dispensado para
Assim, a infância é determinada a aprendizagem, para o cuidado Recibido el 12 de abril de 2012
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Veiga, C. G. (2009), “O processo escolarizador da infância em Minas Gerais (1835-1906): geração, gênero, classe social e etnia”,
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Paulo, Contexto.

Vidal, D. G., Faria Filho, L. M. de (2005), As lentes da história: estudos de história e historiografia da educação no Brasil, São Paulo,
Autores Associados.

Propuesta Educativa, Año 23 Nro. 41, pág. 81 a 88, Junio 2014


Tempo de escolarização e civilidade da criança na literatura brasileira

Notas

1 obre o tempo.
2 A representação simbólica se amplia de acordo com a rede de relações que reúne inúmeras sequências de caráter individual,
social ou simplesmente físico.
3 Sobre essa temática temos os trabalhos dos historiados tenemos los trabajos Phillipe Ariès em seu clássico ‘História Social
da Criança e da Família’ pioneira na discussão da inserção social e do surgimento histórico do sentimento da infância e da
concepção decriança na Modernidade.
4 O indivíduo, para crescer, aprender a interpretar os sinais temporais utilizados em sua sociedade e orientar o seu comporta-
mento com base nelas.
5 Estatuto da Criança e do Adolescente.
6 Ainda na sociedade civilizada, nenhum ser humano chega pronto ao mundo e o processo civilizador individual que é instituí-
se obrigatoriamente acaba por ocasionar mudanças em função do processo civilizador social.
7 As formas como sucedem a aquisição do conhecimento e das habilidades pudem ser compreendidas além dos limites da
escola, identificando seu modo de pensar e atuar de acordo com a nossa sociedade.
8 Acerca dessa questão ver: Veiga, 2010; Gouvea, 2009; Kuhlmann Jr., 2002; Oliveira y Sarat, 2009, entre outros nesta bibliogra-
fia.
9 Uma dinâmica repleta de conflitos e tensões entre as redes de indivíduos, grupos e instituições interdependentes.
10 Sobre os processos de escolarização na Argentina destacamos também as pesquisas de Kaplan (1997) Kaplan e Orce (2009);
Carli (2002); e Sandra Szir (2006), entre outros. Veja na bibliografia desta pesquisa.
11 A obra literária Menino de engenho é uma autobiografia sobre a sua infância, escrita em 1932, por José Lins ou o Zé Lins, em
que seu personagem, um menino narra sua história dos quatro aos doze anos de idade, no engenho de cana de açúcar, em
Pernambuco. A narrativa, não é uma obra destinada às crianças, mas trazem em seu bojo as perspectivas, angústias, melan-
colia e tristezas da infância dos fins do século XIX e início do século XX. 87
12 A obra Infância de Graciliano Ramos, escrita em 1945, em que descreve um contexto histórico e social da passagem do século
XIX ao XX, no interior de Alagoas e de Pernambuco. Em que narra o seu período de mudanças da sua família, que fugindo da
seca, demonstra a passagem de uma economia agrária, fundamentada no cultivo da cana de açúcar, na ascensão do café, na
pequena indústria e no comércio.

DOSSIER / ENTREVISTA / ARTÍCULOS / RESEÑAS


13 Muchos llegaban, examinaban todo, casi ponían el pico dentro de la trampa, y se marchaban, muy señores de lo que se pre-
paraba para ellos. Mientras los canaritos venían y volvían, yo me metía en mí mismo, en mis íntimos soliloquios de cazador.
Pensaba en tantas cosas...Seguramente no era amplia, como presumí.
14 Granero o pañol.
15 Muro de ladrillos.
16 Sombras de la hacienda.
17 Piedras y huesos.
18 Gallina ciega.
19 Sentarse frente a la ventana de la casa y observar la mata moviéndose las piernas.
20 Ingeniar muñecos de barro.
21 Como una caja de juguetes, los hombres reducidos al tamaño de un pulgar de niños.
22 Gigantes en tierra de enanos.
23 Seguramente no era amplia, como presumí.
24 Constreñido por las leyes de la gramática.
25 Yo me quedaba varias horas sentado en la sala de costura, con el impreso de abc en la mano, mientras afuera yo oía el ruido
de la vida que no me dejaban tener [...] y las letras no me entraban en la cabeza.

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Magda C. Oliveira Sarat y Nubea Rodrigues Xavier

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Resumen Abstract Resumo
Este artículo es un fragmento de un This search is an excerpt about a Este artigo é um recorte de uma pes-
estudio ya concluido de maestría completed master’s research have quisa de mestrado concluída que
DOSSIER / ENTREVISTA / ARTÍCULOS / RESEÑAS

que tiene por objetivo comprender as an objective to understand civi- tem como objetivo compreender o
el carácter civilizatorio de la escuela lizing character of the school from caráter civilizador da escola a partir
a partir de un elemento importante: an important element, the time, de um elemento importante que é o
el tiempo, aquí discutido desde las observed from the theories Norbert tempo, discutido aqui á luz das teo-
teorías de Norbert Elias. Tal estudio Elias. This article analyses of litera- rias de Norbert Elias. Tal pressuposto
se basa en el análisis bibliográfico ture and literary search “Menino de ancorou-se na análise bibliográfi-
y literario de las obras “Menino de engenho” by José Lins do Rego and ca e literária das obras de “Menino
Engenho” de José Lins do Rego e “Infância” by Graciliano Ramos. The de Engenho” de José Lins do Rego
“Infância” de Graciliano Ramos. El study shows the perceptions of child- e “Infância” de Graciliano Ramos.
trabajo aborda las percepciones de hood and children’s schooling in the O estudo trata das percepções de
infancia y escolarización del niño mid-nineteenth and twentieth cen- infância e escolarização da criança
a mediados de los siglos XIX y XX, turies, this period in literary essays em meados dos séculos XIX e XX,
período presente en las obras litera- understands the “school time” as período presente nas obras literárias
rias, y busca comprender el “tiempo an element standardization of rules, e procura compreender o “tempo
escolar” como elemento de norma- enforcement of orders and civiliza- escolar” como elemento de norma-
lización de reglas, de imposición de tion proposal for children in certain tização de regras, de imposição de
normas y como proyecto civilizato- social groups. normas e como projeto civilizatório
rio para niños en determinados gru- para crianças em determinados gru-
pos sociales. pos sociais.

Palabras clave Keywords Palavras chave


Niñez - Literatura - Proceso Civiliza- Childhood - Literature - Civilizing Infância - Literatura - Processo Civili-
torio - Tiempo en la escuela Process – School time zador - Tempo Escolar

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