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Por uma literatura sem adjetivos Maria Teresa Andruetto strapugio Carmem Cacciacarro ° pulo do gato Por uma literatura sem adjetivos” * Lido na Jornada de Lert Inf oven Faculad de Flosofia y Letras Universidad de ends Aires duende Aes, 5 de uo de 2008, Aare no tem sent se nio cosiderar (ues dirgea wna sociedad da qual seu discus salient, Tomei como referencia para minhas reflexdes, como 0 priprio titulo anuncia, aquele texto que Juan José Sac intitulou *Uma literatura sem atributos" porque alguns de seus pontos me fizeram pensar na relacao, sempre inguietante para mim, entre a litera a literatura tao somente, a para criancas PARA QUE SERVE A rIeGhO? Para que serve a ficglo? Tem alguma utilidade, alguma funcionalidade na formagio de uma pessoa, em nosso «aso, de uma crianga, ou sea, justamente de uma pessoa em formagio? Todos nis, homens ¢ mulheres, vamos 40 dicionario para saber sobre as palavras, aos livros de ciéncia para saber de ciéncia, aos jornais ¢ as revis~ las para ler as noticias da atualidade e aos cattazes de "Juan José Sue (937-2008) esrtor argentino, No origina: Una ‘twa sn arb. bv] cinema para saber 0$ filmes que esto passando, Mas para onde vamos quanelo queremos saber sobre nds, ‘mesmos? Nés, 0s leitores, vamos a ficcio para tentar ‘compreender, para conhecer algo mais acerca de nos sas contradigdes, nossas misérias ¢ nossas grandczas, cou seja, acerca do mais profundamente humano. £ por essa razio, ceio eu, que a narrativa de ficgio continua, cexistindo como produto da cultura, porque vem para nos dizer sobre nés de um modo que as ciéncias ou as estatsticas ainda néo podem fazer. Uma narrativa & ‘uma viagem que nos remete ao territério de outro ow de outros, uma maneira, entéo, de expandir os limites de nossa experiéncia, tendo acesso a um fragmento de mundo que nao € 0 nosso. Reflete unta necessiclade muito humana: a de nda nos contentarmos em viver tuma tinica vida e, por isso, o desejo de suspender um pouco 0 transeurso monocérdio da propria existéncia para ter acesso a outras vidas ¢ outros mundos poss veis, 0 que produz, par um lado, certo descanso ante a fadiga de viver e, por outro, o acesso a aspectos sutis do humano que até entao nos haviam sido alheios. Assim, as fiogdes que lemos so construgio de mundos,instala~ tempo e nesse espaca” em que vivemos. Uma natrativaficcional & portanto, um atifcio, algo, por sua propria esséncia, Iiberado de sua condiclo utilitria, um texto no qual io de “outro tempo” € de “outro espaco" “ness as palavras fazem outta cosa, deixaram de ser funcionais, ‘como deixaram de sélo 06 gestos no teatro, as imagens no cinema, os sons na miisica, para buscar, através des- sa construgio, algo que nao existia, um objeto auténo~ mo que se agrega a0 real. A ficgdo, cuja virtualidade & 2 vida, & um artficio cuja leitura ou escuta interrom= pe nossas vidas e nos obriga a perceber outras vidas ‘que jf foram, que S30 passado, posto que sao narradas. Palavra que dhega pelo que diz, mas também pelo que no dlc, pelo que nos dz ¢ pelo que diz de nis, tudo que facilta o caminho até 0 assombro, a comocio, o descobrimento do humano particular, mundos imaginérios que dei- xam surgir 0 que cada um traz como texto interior © permitem compartilhar os textos/mundos pessoais com 6s textos/mundos dos outros. Possiblidade de criar um, lunpesse, de esgueirar-se, por um momento, da pesada fecha do real que, indefectivelmente, nos atravess, para Imaginar outros rote LUM OLIAR SOBRE 0 MUNDO A obra de um escritor no pode ser definida por suas intengées, mas por seus resultados. Se hé algo em. comum entre os bons escritores de diferentes épocas & justamente que eles tém pouco em comum uns com os ‘outros ¢, 8s vezes, até se diferenciam fortemente ou se ‘opdem francamente uns aos outros. Surge, entao, uma primeira certeza: um bom escrlor € um esctitor diferente de outros escritores, Alguém que, pela propria esséncia lo que faz atenta contra a uniformidade que tende a se impor, resist, por assim dizer, ao global: alguém preo- ccupado em perseguir uma imagem do mundo ¢ cons truir com ela uma obra que pretenda universalizar sua ‘experiencia. Olhando, eno, para 0 mals privado € pes Soa, & como um escritor pode se tomar universal esse ‘0 sentido que tém as conhecidas palavras de Tolst6: “pinta tua aca pitas o mundo. criacio nasee, pots do particular qualquer que seja a particularidade que, ‘como ser humano, eaiba a quem escreve, € € 0 foo No pequeno que permite, por meio do metaférico, infer fo vasto mundo, olhanda muito do pouco, como quer © preceto clissic, Assim, buscando uma forma jnteligivel tallamente condensada para as innagens que pers

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