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Revista Portuguesa

de

irurgia
II Série • N.° 24 • Março 2013

ISSN 1646-6918 Órgão Oficial da Sociedade Portuguesa de Cirurgia


INVESTIGAÇÃO EM CIRURGIA

Epidemiologia clínica:
história e fundamentos para a sua
compreensão
Henrique Barros

Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto

Uma disciplina científica é definida pelo seu ob- saúde, o conhecimento – seja de natureza biológica,
jecto de estudo e pelos seus métodos. Assim, a epide- social ou epidemiológica – é sempre insuficiente, e
miologia clínica pode ser descrita como a aplicação por isso apela para perguntas e estudos que não foram
ao individuo doente dos princípios e dos métodos da respondidas ou delineados, deixa espaço a explicações
epidemiologia. Enquanto a epidemiologia geral es- alternativas ou atitudes conflituais. Contudo, como
tuda a distribuição da ocorrência e determinantes dos escreveu Austin Bradford-Hill, há um momento em
estados de saúde e doença em populações humanas, que tem que se agir mesmo reconhecendo que há esse
a epidemiologia clinica ocupa-se especificamente da espaço de desconhecido, quer essas decisões sejam di-
prática clínica através do estudo da variação e dos de- rigidas à saúde de toda a população ou referentes ao
terminantes da evolução da doença. Por analogia com diagnóstico e ao tratamento de um doente individual.
a epidemiologia geral, que lida com os indivíduos en- Ao leitor menos familiarizado com a história da
quanto membros de um grupo, as populações alvo em epidemiologia e a evolução da ciência clínica, a epi-
epidemiologia clínica são grupos de indivíduos doen- demiologia clínica pode parecer como um fenómeno
tes. Mas este tipo de investigação tem como unidade de moda, relativamente recente. As publicações ini-
de observação o doente e não os seus leucócitos ou os ciais contendo no seu título estas palavras datam da
seus nucleótidos. primeira metade do século vinte mas, como sempre,
A clínica – circunscrita (mesmo que de modo re- as raízes podem ser procuradas muito longe no tempo
ducionista) ao que na prática da medicina vive da ob- porque há mais de dois milénios que os médicos se
servação directa do doente – para ser compreendida, debruçam sobre as questões do diagnóstico, do prog-
aprendida e exercida necessita de um referencial, pro- nóstico e da terapêutica, que quantificados e com-
gressivamente mais absoluto, a que podemos opera- parados entre grupos e contrastados com o conheci-
cionalmente chamar causa e processo de causalidade. mento etiológico – causal – constituem o edifício da
Tendo Karl Popper como referência podemos argu- moderna epidemiologia clínica.
mentar que nenhuma quantidade de informação des- A primeira aproximação científica à escolha de um
crevendo experiências passadas nos permitirá predizer tratamento data do século XVIII. James Lind, médico
com total segurança o resultado de um novo doente a bordo do Salisbury, usou seis grupos de dois ma-
particular. Também quando aplicado aos cuidados de rinheiros para comparar o efeito de seis tratamentos

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em uso para o escorbuto, observando que foram os cação aleatória e pelas técnicas estatísticas associadas à
dois marinheiros cuja dieta incluiu laranjas e limões aleatorização, propostas pelo britânico Ronald A. Fi-
quem apresentou desaparecimento dos sintomas. No sher (1890-1962) e, embora mais indirectamente mas
século XIX, Pierre Charles Alexandre Louis 1787- de forma não menos fecunda, pelo pensamento de Se-
-1872, médico parisiense, contribuiu para o desenvol- wall Wright (1889-1988) e os conceitos de correlação
vimento do diagnóstico e do tratamento médico, pro- e passos causais. Os primeiros ensaios clínicos contro-
curando padronizar a redacção da história clínica e, se lados remontam a 1930, com o tratamento da tuber-
necessário, o relatório da autópsia. Colocando em evi- culose pela sanocrisina (um composto à base de ouro)
dência as características comuns de doentes equivalen- e da pneumonia lobar pelo soro anti-pneumocócico.
tes, para que pudesse quantificá-los, Louis identificou Em 1948, foi lançado o protótipo do ensaio clínico
novas entidades nosológicas, como a febre tifóide e aleatorizado moderno: o objectivo foi avaliar o efeito
demonstrou que a sangria no tratamento da pneumo- da estreptomicina no tratamento da tuberculose. Até
nia era bastante menos eficaz do que então os médi- cerca de 1940, a epidemiologia era a disciplina de
cos pensavam, contribuindo decisivamente para o seu base da saúde pública e, só depois da clínica. O termo
abandono. Louis influenciou a medicina em França, epidemiologia clínica foi utilizado pela primeira vez
Suíça Inglaterra e nos Estados Unidos da América, em 1938 por John R. Paul (1893-1971) no sentido da
sendo considerado o fundador da epidemiologia clí- aplicação de métodos epidemiológicos ao exercício da
nica. Outros médicos se notabilizaram, igualmente no medicina preventiva. A epidemiologia clínica tornou-
século XIX, no estudo quantitativo dos diagnósticos -se um ramo da medicina clínica pelo fim da década
ou dos tratamentos. Ao observar que a letalidade por de 60, quando o excessivo recurso aos fármacos e aos
febre puerperal era mais elevadas entre as parturientes testes laboratoriais começou a gerar desconforto no
assistidas por médicos (11,4%) do que entre aquelas seio da profissão médica. Os clínicos com formação
cujo parto era acompanhado por parteiras (2,7%) em epidemiologia sugeriram então que a disciplina
Ignaz Semmelweis (1818-1865) formulou a hipótese era essencial para orientar a avaliação diagnóstica e o
de isso se dever aos médicos circularem entre as salas tratamento sobre bases científicas (Feinstein, Sackett).
de autópsia e as de partos. Semmelweis pôs a sua hipó- O interesse pela epidemiologia clínica conheceu um
tese à prova pedindo aos médicos que ao sairem da sala novo êxito com a crise económica de 1975. O au-
da autópsia lavassem as mãos com água de Javel, dimi- mento dos custos da saúde exigiu que a decisão mé-
nuindo a mortalidade por febre puerperal para 1,3%. dica fosse tomada sobre bases claras e aumentou o
A epidemiologia clínica não conheceu um desen- interesse por métodos empíricos que permitiam, a
volvimento tão rápido quanto outras disciplinas mé- partir de critérios científicos, reduzir o desperdício em
dicas, como a fisiologia ou a patologia, e uma das exames e tratamentos inúteis e sobretudo prejudiciais.
razões prender-se-á com a mais lenta produção de Clínicos e epidemiologistas encontram assim um
conhecimento na área do diagnóstico médico e da te- terreno comum ao reconhecerem que:
rapêutica, seus objectos centrais. Os critérios de Koch – na maior parte das situações clínicas, e perante
(depois Koch-Henle e Evans) para o diagnóstico da um doente particular, são incertos o diagnóstico,
tuberculose podem ser considerados a primeira for- o prognóstico ou até a resposta à terapêutica
mulação das noções de sensibilidade («o bacilo deve instituída, havendo necessidade de os expressar
estar presente em todos os casos de doença») e especi- como probabilidades;
ficidade (« o bacilo não deve ser associar-se a qualquer – as probabilidades, quando referidas a cada
outra patologia») de um teste. A ideia de comparar doente individualmente, resultam da quantifica-
tratamentos e sobretudo mostrar se eram melhores ção da experiência prévia de grupos similares de
que não “fazer nada” foi servida pelo princípio de alo- doentes;

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O julgamento clínico é o resultado de informa- A discussão extensa da epidemiologia clínica obriga,
ção fornecida pelos doentes, observações realiza- como foi dito, a percorrer três domínios fundamen-
das pelo médico ou medições com grau variado tais: o diagnóstico (e mais em particular o problema
de sofisticação tecnológica, executadas sobre os dos rastreios), o prognóstico e a terapêutica. Embora
indivíduos por exemplo, bioimpedância eléc- controverso, todo o largo campo dos ensaios clínicos
trica, pressão arterial, fracção de ejecção ventri- é por muitos considerado um capítulo da epidemio-
cular) ou tendo por base amostras de material logia clínica. Neste texto vamos limitar-nos a abor-
biológico (titulação de anticorpos no líquido ce- dar as questões da variabilidade e de um elemento
falorraquidiano, contagem de leucócitos séricos especial de toda a prática clínica e epidemiológica
ou doseamento de ferro em biópsia hepática), que é o conceito de normal e de como isso resulta das
sujeitas a erros aleatórios e sistemáticos que po- mensurações.
dem perturbar a apreensão da verdadeira essência Todas as informações obtidas por observação ou
do problema em análise induzindo procedimen- após intervenção clínica são classificáveis e tendem
tos desnecessários ou não apoiando a tomada de tradicionalmente a ser descritas como pertencendo a
medidas indispensáveis; dois grandes grupos que implicam valorização e trata-
– para diminuir a probabilidade de inferências er- mento estatístico diversificado: as informações “duras”
radas, a informação clínica – qualquer que seja ou objectivas e as informações “moles” ou subjectivas.
a sua natureza – deve ser cientificamente sólida, Os dados moles são os não quantificáveis, expressos
assegurando em cada momento o máximo con- geralmente por palavras, como a dor, a náusea os tini-
trolo do efeito de vieses ou do acaso. tos ou a intensidade de um sopro carotídeo. Os dados
A epidemiologia clínica aplica portanto métodos duros são dimensionais, mensuráveis por meios físi-
epidemiológicos à actividade clínica. Ajuda a olhar cos, como a pressão arterial ou a temperatura corpo-
de forma crítica a literatura científica, dá um signi- ral, obtidos objectivamente, passíveis de registo que
ficado particular ao facto da prática clínica ser domi- permite reavaliação. O seu atributo fundamental é a
nada pela relação médico-doente que, por definição, reprodutibilidade das observações. Há um sentido ge-
é única, e ajuda a colocar o doente individual na sua neralizado em considerar os dados duros como mais
comunidade de origem, o que o permite compreen- fiáveis e por isso tendem a ser preferidos para avaliar o
der simultaneamente como um ser único e enquanto efeito das intervenções. Contudo, com o curso crónico
membro de um grupo de indivíduos com os quais das patologias e a impossibilidade de atingir “curas”,
partilha algumas características, não só no sentido da tornou-se um desafio científico atraente transformar
abordagem epidemiológica de população que pode dados moles em informações progressivamente mais
ser descrita estatisticamente – de onde o doente vem objectivas. De um ponto de vista humano pode ser
– mas enquanto mais um membro dessa outra popu- tanto ou mais importante que mostrar um aumento
lação a que passa a pertencer – o daqueles que tam- de 2 gramas por litro na hemoglobina ser capaz de ob-
bém partilham a mesma sintomatologia ou doença. jectivar que o doente se sente “bem”, considera a me-
Situar o doente dentro da sua população de origem dicação “útil” ou a sua família está “feliz” com o curso
permite ao clínico formular um certo número de hi- da doença. Por isso, tem-se investigado muito no sen-
póteses sobre o diagnóstico, prever o efeito do trata- tido de “endurecer” dados moles, através da utilização
mento ou outras consequências da decisão médica e de escalas ou índices, como é já frequente dispor para
depois recalcular probabilidades a priori com base na medir a dor, a sintomatologia depressiva, a ansiedade
informação que vai sendo obtida, ou seja, condicio- ou as diferentes dimensões da qualidade de vida.
nadas, como ensina o teorema de Bayes, o centro do Independentemente da natureza das observações
pensamento probabilístico clínico. clínicas elas terminam a ser descritas ou reconhecidas

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como normais ou anormais e com essa atitude corre- melhor qualidade, aumentando o número de amos-
-se um elevado risco de má-classificação. Como uma tras ou agindo de acordo com protocolos padroniza-
das tarefas fundamentais com que se depara um clí- dos. De um ponto de vista conceptual, importante
nico é distinguir o normal do anormal, para chegar a para a interpretação estatística e clínica, uma medi-
um diagnóstico ou instituir uma terapêutica, sendo ção pontual deve ser considerada como uma simples
esperado que separe as situações em que deve inter- amostra de uma população de medições possíveis na
vir daquelas em que não há qualquer acção a tomar qual está incluído o valor verdadeiro e à qual se deve
(sendo que também isso é uma atitude!), importa co- poder adicionar um intervalo de confiança.
nhecer o processo através do qual se chega à definição Podemos assim pensar a variabilidade na qual as-
de anormal e quais os problemas relacionados com as sentamos a medida do diagnóstico e do prognóstico
medições que lhe estão subjacentes. como um atributo que pode ser intra-individual e in-
A cada um dos atributos, características ou obser- ter-individual e que se quantifica através da Precisão,
vações dá-se a designação de variáveis pois mudam a qual dá conta da dispersão dos valores observados e
de um para outro indivíduo e até no mesmo sujeito depende da dimensão da amostra (uma média é esti-
em momentos distintos. As variáveis que caracterizam mada com maior precisão numa amostra de grande
os fenómenos clínicos são expressas em três escalas, dimensão do que numa amostra pequena) e o Viés,
de acordo com a sua natureza qualitativa ou quan- um erro metodológico que obsta a uma medida válida
titativa: nominais (grupo sanguíneo), muitas vezes do fenómeno estudado, qualquer que seja a dimensão
simplesmente dicotómicas (ausente, presente), ordi- da amostra. É importante distinguir imprecisão (ou
nais (classes de insuficiência cardíaca) ou intervalares erro aleatório) do viés (ou erro sistemático): uma me-
(contínuas – peso; discretas – paridade). Quanto ao dida pode ser válida e precisa, não válida mas precisa,
conteúdo, podem classificar-se como unidimensio- válida mas imprecisa e nem válida nem precisa, ou
nais (reflectem conceptualmente um só atributo como seja de uma total inutilidade.
propriedade única quantificável e medida com escala A definição de normal e anormal idealmente de-
singular – frequência cardíaca) ou multidimensionais veria poder corresponder a uma diferença clara en-
(combinação de diferentes variáveis unidimensionais tre saudáveis e doentes, como se para determinado
formando índices – APGAR, APACHE). Em qual- atributo pertencessem a populações verdadeiramente
quer dos casos, as medições destas variáveis estão su- distintas. Contudo, raros são os fenómenos clínicos
jeitas a erros – de natureza e complexidade diferente que podem ser categorizados de modo a obter uma
de acordo com as suas características – uns sistemáti- distinção nítida entre o normal e o anormal, isto é,
cos, que lhe afectam a validade e outros aleatórios que sem que haja uma zona cinzenta de sobreposição,
lhe podem perturbar a precisão. A variabilidade pode porque mesmo os chamados saudáveis têm inerente
depender da natureza do instrumento de medição, do variabilidade biológica. A comparação pressupõe um
caracter amostral do fenómeno observado (uma bióp- âmbito de normalidade, no qual se encontra o con-
sia renal fornece informação sobre uma pequena re- junto de valores observados em indivíduos suposta-
presentação do órgão a estudar e, mesmo avaliada sem mente saudáveis. É o caso da pressão arterial, da den-
qualquer erro, poderá não representar outras zonas, sidade mineral óssea ou da velocidade de sedimenta-
isto é, o facto de a amostra obtida ser normal não ga- ção. Nestas circunstâncias, o âmbito da normalidade
rante só por si que todo o rim seja normal, tornando é uma estatística descritiva, não um instrumento de
assim muito complexa a natureza do eventual erro diagnóstico, e corresponde essencialmente à cons-
de diagnóstico), do observador ou de características trução de um conceito de anormal como invulgar
biológicas (como nos ciclos circadianos), e pode ser ou pouco frequente. Outra separação resulta de de-
minimizada através da utilização de instrumentos de signar como anormal observações ou medições que

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habitualmente se associam a doença, incapacidade ou ção das medições. Essas medições subsequentes serão
morte. Finalmente, o anormal pode ser reconhecido estimativas mais rigorosas do valor verdadeiro, que se
como uma medição passível de modificação por tra- poderia obter por intermédio de múltiplas medições
tamento, embora este conceito implique a dependên- no mesmo doente – uma realidade impraticável. As-
cia de circunstâncias temporais e até locais pois o que sim, faz todo o sentido repetir uma prova que surge
hoje não é tratável pode passar a sê-lo ou pode haver com um valor anormal, embora saibamos que quanto
modificações no limiar de anormal de acordo com a mais extremo for o valor inicial menos provável será
alteração das indicações para tratar, como aconteceu que uma medição seguinte seja normal.
com a pressão arterial ou a hiperglicemia. Este fenómeno é importante para a decisão diag-
Na prática clínica corrente, quando o médico se nóstica ou terapêutica inicial porque o médico sub-
depara com um resultado anormal, por exemplo um mete o seu doente a diversos testes clínicos (sinais,
colesterol sérico elevado, tende a pedir a sua repeti- sintomas, testes de laboratório, imagiologia) que
ção. Muitas vezes o segundo valor é normal. Perante sendo imperfeitos, para os interpretar, exigem que
esta situação, muito frequente na rotina clínica, como se conheça a sua validade, ou seja, a sua capacidade
valorizar os resultados? Porque é que isto acontece? para classificar os indivíduos comparativamente à
Admitindo que ambas medições são obtidas por pro- realidade, quantificável como sensibilidade, especi-
cessos tecnicamente correctos, a segunda medição ficidade e preditividade. Mas uma aproximação se-
vale “mais” que a primeira? Ao decidir repetir a prova, melhante é a que devemos seguir na avaliação dos
o clínico está de facto a seleccionar indivíduos que resultados de qualquer intervenção pois a melhoria
apresentam valores mais extremos numa distribuição observada pode não reflectir um efeito real mas sim-
e, por razões puramente estatísticas de variação alea- plesmente a situação estatística dependente da selec-
tória, pode esperar-se que apresentem valores menos ção e estar sujeita ao mesmo fenómeno de regressão
extremos em medições subsequentes. Este fenómeno para a média.
é conhecido como regressão para a média e a sua de- O contributo da epidemiologia clínica atravessa
signação deve-se a Francis Galton, que desenvolveu todo o processo da relação médico-doente e tem um
uma técnica para investigar a relação entre a altura papel fundamental na análise de decisão clínica tendo
dos filhos e a dos pais, tendo observado que se fosse fornecido as chaves metodológicas para o movimento
escolhido um grupo de progenitores com uma dada da chamada medicina baseada na evidência. No en-
altura média, a média das alturas dos filhos era mais tanto, são conceitos simples que seguram o edifício
próxima da altura média da população que da dos da epidemiologia clínica e que se aplicam – sem que
pais, ou seja, os pais altos tendiam a ser mais altos sempre nos apercebamos disso – na actividade diária.
que os filhos. Galton designou esta constatação como Abre-se agora um caminho mais na avaliação da va-
regressão para a mediocridade, significando com isso riabilidade da prática clínica que importa acrescentar
um movimento em direcção à média, e hoje designa- – a epidemiologia dos cuidados médicos e a forma
-se como regressão para a média esse fenómeno pura- como lida com os diferentes cuidados disponíveis,
mente estatístico resultante da selecção de um valor como descrito por Wenberg: “necessários” – o conhe-
determinado do preditor e da relação imperfeita entre cimento mostra que funcionam melhor que qualquer
as variáveis. alternativa, e os benefícios excedem as desvantagens;
Doentes que são seleccionados (por exemplo após “sensíveis à preferência” – há mais que uma opção e
uma determinação da pressão arterial) por apresen- os resultados variam com elas (exemplo, rastreio de
tarem um resultado mais alto ou mais baixo que os cancro da próstata); “sensíveis ao fornecimento” – não
limites esperados, em média, tenderão a situar-se mais específico de tratamento mas da forma como se lida
próximo do centro da distribuição se houver repeti- com a doença.

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10 – J E Wennberg. Tracking Medicine. New York, Oxford University Press, 2010, 319 p.

Correspondência:
HENRIQUE BARROS
e-mail: henriquepbarros@gmail.com

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