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Condições predisponentes e
principais enfermidades de
teleósteos em piscicultura intensiva
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é maior em torno do meio dia, quando o pH, a temperatura e a amônia não ionizada atingem
suas maiores concentrações no tanque. As algas e as Nitrosomonas são as maiores consumidoras
de amônia.
Os peixes intoxicados com amônia apresentam anorexia e hiperexcitação. Em processos
crônicos freqüentemente se observa hiperplasia e hipertrofia do epitélio branquial como resposta
inespecífica. Ocorre aumento dos níveis de amônia no sangue e nos tecidos, levando ao aumento
do pH sangüíneo, distúrbios da osmoregulação, aumento do consumo de oxigênio pelos tecidos
e redução do transporte de oxigênio pelo sangue (Schwedler et al., 1985). O contato crônico
com níveis aumentados de amônia causa retardo do crescimento (Colt & Armstrong, 1979) e
torna os peixes mais susceptíveis às enfermidades devido ao estresse (Walters & Plumb, 1980)
O plâncton é o componente que mais contribui para a turvação da água, e o seu excesso,
pode causar redução da concentração de oxigênio dissolvido favorecendo a proliferação de agentes
com potencial patogênico; pode lesar o epitélio branquial dos peixes ou mesmo prejudicar o
processo respiratório. Por outro lado, a água excessivamente transparente favorece o crescimento
de plantas aquáticas no fundo dos viveiros que poderão desequilibrar o sistema devido à produção
de CO2. Deve-se tomar cuidado com águas excessivamente ricas em fitoplâncton (“muito verdes”),
pois durante a noite em vez delas fazerem fotossíntese e produzirem oxigênio, o consomem. Se
por alterações climáticas ocorre a morte repentina de fitoplâncton ocorre queda brusca de oxigênio
e mortalidade de peixes.
A temperatura da água é dependente da quantidade de radiação absorvida que se
transforma em energia calórica e se propaga por condução. Como a temperatura corporal dos
peixes é condicionada pela temperatura do ambiente aquático, ela exerce efeitos diretos ou indiretos
sobre a taxa de crescimento, alimentação e respiração, bem como sobre os mecanismos defesa do
organismo. Além disso, sabe-se que baixas temperaturas comprometem a saúde dos peixes podendo
facilitar infecções por bactérias oportunistas (Bisset, 1948, citado por Finn & Nielsen, 1971
a,b).
O potencial hidrogeniônico (pH) mais adequado às espécies de peixe de cultivo varia
entre 6,5 e 9,0 proporcionando o melhor desenvolvimento ponderal. Quando abaixo de 4,0
ou acima de 11,0 torna-se letal (Tucker, 1985). A inadequação ou as oscilações freqüentes de
pH determinam variações no equilíbrio osmótico das brânquias causando dificuldade
respiratória, irritações dérmicas, excesso de produção de muco, hemorragia e mesmo alto índice
de mortalidade.
A atividade metabólica dos próprios peixes ou outros organismos aquáticos produz ácidos
que, em sistemas fechados como os tanques de cultivo, tendem a se acumular gradualmente
reduzindo o pH. Quando igual a 5,5 é potencialmente estressante e, se mais baixo, é letal.
Peixes submetidos à redução brusca do pH apresentam tremores musculares,
hiperatividade, dispnéia, resposta aguda ao estresse e aumento da taxa de mortalidade. Se o
problema é crônico ocorre aumento da produção de muco e resposta crônica ao estresse.
O surgimento de distúrbios devidos ao pH alcalino são menos comuns do que os que
aparecem em pH ácido. Isso se deve ao fato de que os ácidos são contaminantes ambientais
muito mais comuns do que os álcalis. Peixes mantidos em pH alcalino por períodos longos
apresentam aumento da produção de muco branquial, hiperplasia e hipertrofia epitelial e pode
haver danos à córnea.
A supersaturação gasosa ocorre quando a pressão total de gases dissolvidos na água é
maior do que a pressão atmosférica ambiental. Tal situação pode ocorrer com oxigenação forçada
do ambiente aquático, particularmente nos tanques de transporte de alevinos ou em tanques
Condições predisponentes e principais enfermidades de teleósteos cultivados 3
pequenos de quarentena. Ao exame dos peixes verifica-se a presença de embolia gasosa de qualquer
vaso, que resulta em distúrbios circulatórios que variam da congestão ao infarto de diferentes
tecidos e/ou órgãos, incluindo pele, brânquias, olhos, vísceras e cavidade peritoneal. Nessa condição
a exoftalmia é resultado de embolia gasosa retrobulbar.
2. Efeitos do estresse
O equilíbrio do meio ambiente em seus variados parâmetros é essencial para a homeostase
dos seres que o habitam, permitindo seu crescimento saudável e sua reprodução. Em função do
seu código genético, os seres vivos, entre eles os peixes, são capazes de suportar apenas uma
estreita faixa de alterações ambientais, sem que o equilíbrio orgânico seja alterado. Quando o
estresse ambiental aumenta, os animais podem passar por alterações da homeostase que se traduzem
na adaptação a um novo patamar de equilíbrio, que faz com que possam suportar esse novo nível
de relação com o ambiente. Se as alterações do ambiente que se constituem em estresse forem
condizentes com a capacidade de adaptação o organismo poderá sobreviver, manifestando um
conjunto de sinais morfológicos, bioquímicos e fisiológicos, independentemente da espécie animal
considerada, seja de vertebrados terrestres ou aquáticos.
Em 1950, Selye definiu o estresse como sendo “a somatória das reações de determinado
organismo para tentar manter ou restabelecer seu metabolismo normal frente às agressões externas”.
Entretanto, para Brett (1958), o estresse é uma condição de enfermidade, pois é uma “situação
induzida por fatores ambientais, em que as reações de adaptação do animal ultrapassam os limites
da variação normal, perturbando o equilíbrio fisiológico e reduzindo suas possibilidades de
sobrevivência”. Esch et al. (1973) definiram o estresse como o “efeito de qualquer força responsável
pela quebra da homeostase ou estabilidade em qualquer nível de organização biológica”.
As alterações morfológicas, bioquímicas e fisiológicas resultantes do estresse constituem
o que Selye (1950) denominou de Síndrome Geral de Adaptação (SGA). Os eventos que compõe
a SGA incluem três fases: a) a fase de alarme na qual o organismo sente o estímulo estressante; b)
a de resistência, na qual o organismo sofre modificações na tentativa de se adaptar ao estresse,
atingindo um novo patamar de equilíbrio; c) a fase de exaustão, na qual o organismo perde a
capacidade de adaptação com quebra da homeostase orgânica. Então é a partir desse momento
que os animais sofrem profundas alterações fisiológicas e bioquímicas sobrevindo freqüentemente
as enfermidades parasitárias e infecciosas. Assim, segundo a definição de Selye (1950), o estresse
seria a causa das alterações e não sua conseqüência como definido por Brett (1958) e Esch et al.
(1973).
Quando exposto ao agente agressor, o organismo desencadeia a SGA que representa um
conjunto de respostas endócrinas mediadas, entre outros, pelo eixo hipotálamo-pituitária-interrenal
no caso dos peixes ou hipotálamo-pituitária-adrenal no caso de mamíferos, culminando com a
hipersecreção de cortisol pelo tecido interrenal (ou adrenal), adrenalina e noradrenalina pelas
células cromafins (Mazeaud & Mazeaud, 1981). Essas respostas são consideradas primárias e
interferem na mobilização e utilização de reservas energenéticas e no equilíbrio hidromineral
(Eddy, 1981). Liberadas na circulação estas substâncias irão provocar os efeitos secundários do
estresse, dentre eles a depressão dos mecanismos de defesa devido a alta concentração de cortisol
circulante; distúrbios osmóticos com a retenção dos íons NA+ e Cl-, perda de K+, hiperglicemia,
aumento do metabolismo nitrogenado e da produção de tirosina; alterações do leucograma com
linfocitopenia e neutroflia. Como conseqüência da atividade simpática há contração esplênica e
aumento do ritmo respiratório e da pressão sangüínea.
4 Moraes & Martins
No caso dos peixes e da piscicultura o estresse está sempre presente como conseqüência
do manejo zootécnico a que os animais são submetidos e também graças ao desequilíbrio do
ambiente. De qualquer modo, as respostas ao estresse podem ser consideradas como alterações
do equilíbrio orgânico que colocam em risco a saúde dos animais (Wedemeyer, 1970, 1997).
Mas, dentre as respostas ao estresse, também são desencadeados fenômenos que permitem que o
organismo animal sofra a adaptação ao fator estressante e volte à sua condição normal uma vez
cessado o estímulo adverso (Robertson et al., 1987). Estímulos estressantes severos e de longa
duração podem resultar em desfalque das reservas de corticosteróides e como conseqüência,
acelerar a passagem do organismo à terceira fase da SGA, qual seja, a exaustão (Mazeaud et al.,
1977).
Vários indicadores são utilizados para avaliar a intensidade do estresse produzida por
variada gama de estímulos em peixes tais como a concentração plasmática de cortisol, de
catecolaminas, de glicose, de lactatos, de lipídios, de eletrólitos, proteínas, taxa de hemoglobina,
taxa de hematócrito, leucograma e de glicogênio hepático (Pickford et al., 1971abc; Mazeaud et
al., 1977; Tomasso et al., 1980; Davis & Parker, 1986; Robertson et al., 1987).
Variações na concentração de oxigênio dissolvido, do pH, da temperatura, da
salinidade, elevadas concentrações de amônia e de CO2, bem como a presença de poluentes e
o manejo zootécnico fazem parte de ampla variedade de situações ambientais capazes de induzir
o estresse em peixes (Wedemeyer,1969; Smart, 1981: Yadav & Akela, 1993; Alkahem, 1994).
Assim, o estresse é componente sempre presente nas atividades de manejo zootécnico,
particularmente quando exercido de forma inadequada introduzindo variáveis indesejáveis no
sistema aquático. A severidade do processo irá variar com o tipo e intensidade da ação do
agente estressante, com o tempo que o organismo permanece sob os efeitos estressantes e a
espécie de peixe considerada.
Peixes submetidos ao transporte com alta densidade populacional ou ao manejo com
rede de pesca, apresentam marcado aumento nos níveis plasmáticos de cortisol. Ocorrem variações
quanto ao tempo decorrido para a maior taxa de secreção quanto para os valores basais (Specker
& Schreck, 1980; Barton et al. 1980; Davis & Parker, 1986). Aplicações de estresse agudo
durante 30 segundos, três vezes no mesmo dia em O. tshawytscha, induzem resposta cumulativa
de cortisol (Barton et al., 1986). Todavia, falhas na resposta desse hormônio podem ocorrer
devido ao “feedback” negativo no hipotálamo, o qual suprime a secreção do hormônio
adrenocortotrófico (Fryer & Peter, 1977). Pacus submetidos ao estresse consecutivo de captura
apresentam falha na liberação do cortisol, embora apresentem hiperglicemia, linfopenia e
neutrofilia (Martins et al., 2000).
Qualquer que seja a origem do estresse os organismos atingidos tornam-se mais
susceptíveis às infecções e tal susceptibilidade relaciona-se com os altos níveis circulantes de
cortisol. Existem várias observações que evidenciam essa relação. A administração de cortisol
exógeno em trutas torna-as mais susceptíveis às infecções por Saprolegnia sp. e à furunculose
causada pela Aeromonas. salmonicida (Pickering, 1989; 1992). Trutas, O. mykiss submetidas ao
estresse de confinamento com pouca água, por 30 minutos, apresentam altos níveis de cortisol
circulantes e sofrem taxas elevadas de mortalidade ao desafio com A. salmonicida e Vibrio sp.
(Fevolden et al., 1991, 1992). A injeção de cortisol exógeno confirma esses resultados (Fevolden
& Roed, 1993).
Por outro lado, pacus submetidos ao estresse consecutivo de captura que apresentam
inibição da resposta do cortisol, sofrem incremento do acúmulo de células inflamatórias na bexiga
natatória injetada com carragenina (Martins, 2000; Martins et al., 2000).
Condições predisponentes e principais enfermidades de teleósteos cultivados 5
esverdeadas, bem como consistência friável. Pequenas estruturas circulares brancas na superfície
e parênquima hepáticos foram vistas com freqüência e, ao microscópio foram identificadas como
acúmulos de gordura. O exame microscópico de esfregaços de muco da superfície corporal,
nadadeiras e brânquias revelaram a presença de grande quantidade de bastonetes bacterianos
curtos e móveis. Após o isolamento bacteriano constatou-se a presença de bastonetes, Gram
negativos pertencentes à família das enterobactérias caracterizados bioquimicamente como sendo
Aeromonas caviae. O exame histopatológico revelou severa esteatose hepática, caracterizada pela
coloração específica para triglicerídios Sudam “black”. Pela análise do histórico da mortalidade e
ausência de outros patógenos concluiu-se que a ração oferecida apresentava excesso de gordura,
que provocando o fígado gordo predispôs os animais à infecção secundária e oportunista A.
caviae.
Os sinais são variados, ocorrendo perda de peso, necroses e granulomas em órgãos internos
como o fígado e os rins ou na pele. Geralmente aparecem úlceras na superfície do corpo e, no
caso de doença de longa duração, alterações ósseas (Figura 5).
Essa enfermidade é típica de manejo, alimentação e condições de higiene inadequados,
além da introdução de animais infectados. Neste caso indica-se a eliminação de todos peixes do
ambiente contaminado, seguida da higienização dos tanques, com esvaziamento, tratamento
com cal virgem e exposição ao sol para posterior repovoamento.
Pessoas que trabalham na criação devem ser examinadas por médico, visto tratar-se de
zoonose. Esta doença é relativamente freqüente em rãs cultivadas no Brasil, especialmente
reprodutores e os mesmos cuidados são necessários.
Clinostomum spp.
Cestoidea: Ligula intestinalis
Diphyllobothrium latum
Nematoda: Capilaria sp.
Rondonia rondoni
Spirocamallanus spp.
Phylometra sp.
Eustrongyloides sp.
Goezia spp.
Arthropoda Crustacea: Copepoda: Lernaea spp., Ergasilus spp.
Branchiura: Argulus spp., Dolops spp.
Dos parasitos acima citados, alguns são de ocorrência mais comum entre as pisciculturas
e pesque-pagues localizados na Região Nordeste do Estado de São Paulo, e potencialmente capazes
diminuir a produtividade na criação ou de gerar surtos de enfermidades, algumas com elevadas
taxas de mortalidade.
As células parasitadas ou que serviram como porta de entrada para o parasito apresentam-
se vacuolizadas, com picnose, e, nas adjacências da lesão, estão presentes neutrófilos, eosinófilos
e linfócitos (Figura 8). O desenvolvimento do trofonte na membrana basal causa o descolamento
do epitélio acomodando o parasito na superfície do corpo do peixe. Nas brânquias pode aparecer
grande número de cistos e as altas infestações induzem severa hiperplasia e hipertrofia epitelial e
de células mucosas, aumentando o contato célula a célula, reduzindo a superfície de trocas gasosas
e osmóticas. As extremidades das lamelas secundárias podem fundir-se internalizando o cisto do
parasito. Observa-se ainda edema subepitelial e infiltração inflamatória por mononucleares,
eosinófilos e neutrófilos, estes em menor número. Congestão dos capilares sinusóides e
telangiectasias em tais vasos também são achados freqüentes.
Resultados deste laboratório demonstram que há diferença quanto à resistência de
diferentes espécies de peixes ao parasito. O estudo comparativo com infestação experimental de
tambacus e piauçus com trofozoitos demonstrou que a primeira espécie é mais susceptível ao
protozoário (Souza et al., 2001).
Para o controle dessa parasitose normalmente são utilizados produtos tais como: formol
(10 a 15 mL m-3 dependendo da temperatura), sulfato de cobre (0,33 a 2,00 mg L-1 dependendo
da dureza da água) ou mesmo cloreto de sódio (40 a 60 g de cloreto de sódio m-3). Todavia, neste
último caso, banhos de curta duração com grande concentração de sal (um a três por cento) são
inviáveis em viveiros ou necessitam manipulação dos peixes, prática não recomendada quando
os animais já estão doentes. Na literatura são encontrados relatos de tratamento desta protozoose
com imunoestimulantes como a vitamina C em doses de 500 a 1.000 mg kg-1 de ração (Wahli et
al., 1998). Necessário lembrar de que está prática somente dará resultado se os animais ainda
estiverem se alimentando.
5.2. Tricodinídeos
Várias são as espécies de tricodinídeos que parasitam peixes, seja de água doce ou salgada,
incluindo-se a Trichodina, Tricodinella, Tripartiella, Paratrichodina, Hemitrichodina e espécies de
Vauchomia.
O protozoário é ciliado, arredondado tendo no centro do corpo um disco adesivo
circundado por uma coroa de dentículos (Figura 9). Seu tamanho varia com a espécie podendo
chegar a até 90 mm de diâmetro, tendo os menores cerca de 30 mm.
Em condições normais podem estar presentes nos tanques de cultivo outros organismos
aquáticos, como as larvas de anfíbios, que podem atuar como reservatórios do parasito (Lom &
Dyková, 1992). Todavia, em situações em que ocorre deterioração ambiental como a decomposição
de material orgânico que condiciona a redução do pH e do oxigênio dissolvido, os parasitos
passam a se proliferar. Essas condições também favorecem a multiplicação de algumas bactérias
tais como Aeromonas spp. e Flavobacterium columnare que freqüentemente estão associados à
parasitose.
O protozoário pode parasitar a superfície corporal, nadadeiras e brânquias dos peixes.
Estes se tornam debilitados, nadam na superfície da água, há excesso de produção de muco e, nas
zonas parasitadas, surgem petéquias e degeneração do epitélio, permitindo a entrada de bactérias
como a A. hydrophila ou Flavobacterium sp. ou de fungos como a Saprolegnia sp. (Lom, 1973).
Os movimentos rotatórios do protozoário e a sucção de células e tecidos para sua alimentação
produzem as lesões superficiais (Lom, 1993). Hiperplasia, hipertrofia e necrose da epiderme
além de erosão das nadadeiras também são achados comuns (Rogers & Gaines, 1975). A
tricodiníase freqüentemente apresenta-se como enfermidade de caráter crônico com morbidade
Condições predisponentes e principais enfermidades de teleósteos cultivados 13
e mortalidade médias ou baixas. Porém já foram relatados casos severos em cultivos intensivos de
tilápias em tanques-rede ou viveiros.
O controle da parasitose pode ser realizado com os mesmos produtos utilizados para I.
multifiliis, tendo-se novamente, o cuidado com a temperatura e a qualidade da água. A tricodiníase
há muito vem sendo combatida pelo Lapoa-Caunesp sem a adição de produtos químicos que
tragam prejuízos à saúde dos peixes, para o ecossistema do viveiro ou para a saúde humana.
Portanto, o acompanhamento sanitário da criação e aplicações estratégicas de 40 a 100 mg de
cloreto de sódio/L de água tem ação efetiva na sua eliminação.
5.6. Monogenea
Estes são ectoparasitos de peixes de água doce e salgada, freqüentemente encontrados
na superfície corporal e brânquias (Bychowsky, 1957; Rhode, 1993), que somam cerca de
1.500 espécies. Algumas delas comportam-se também como endoparasitos de peixes, quelônios
e anfíbios.
Esses parasitos tem forma alongada e achatada, são monoxênicos, isto é, tem ciclo de
vida direto, com exceção do Diplozoon sp., que tem necessidade de viver geminado a outro da
mesma espécie. O fato de serem monoxênicos facilita as grandes infestações, pois liberam ovos,
dos quais saem as larvas ciliadas denominadas oncomiracídios, que em poucas horas devem
encontrar o hospedeiro para não sucumbirem.
16 Moraes & Martins
7.1. Protozoários
As enfermidades causadas por protozoários manifestam-se freqüentemente após operações
de manejo em épocas frias do ano e outras situações estressantes (Ceccarelli et al., 1990; Thatcher
& Brites-Neto, 1994; Martins & Romero, 1996). Por outro lado, baixas temperaturas durante o
inverno, em regiões de clima temperado, podem retardar o desenvolvimento de epizootias uma
vez que prolongam o tempo para que várias espécies de parasitos completem o seu ciclo biológico,
transformando-se em formas infectantes. Desse modo, regiões onde o habitat mantém certa
constância na temperatura da água, como nas regiões intertropicais, as variações sazonais do
parasitismo como decorrência de variações de temperatura não são significativas (Bauer & Karimov,
1990). Entretanto o estresse como conseqüência da má qualidade do ambiente aquático, de
variações das características hidrológicas ou do manejo inadequado, atua como fator predisponente
para várias enfermidades parasitárias e infecciosas, mesmo em ambientes em que a variação da
temperatura da água é estreita. Assim esses fatores estão diretamente correlacionados com a
ocorrência de parasitoses nos peixes (Singhal et al., 1986; Ranzani-Paiva, 1997). Tilápias-do-
Nilo em cultivo extensivo submetidas a tais condições tem o comprometimento de seu mecanismos
de defesa (Bauer & Karimov, 1990) e sofrem epizootias, por exemplo, pelo I. multifiliis que pode
ou não estar associado à saprolegniose, resultando em severo quadro de mortalidade (Tavares-
Dias et al., 2001c). Do mesmo modo em ciprinídeos de cultivo intensivo, a associação de infecções
por monogenea, I. multifilis e tricodinídeos (Figueira & Ceccarelli, 1991) ou por Trichodina,
Argulus. e monogenea, estão relacionadas à baixa qualidade da água e das condições sanitárias
dos viveiros.
O monitoramento de dados de pesque-pagues na região nordeste do Estado de São
Paulo demonstra que os protozoários de maior ocorrência são: I. multifiliis, tricodinídeos e P.
pillulare. (Tavares-Dias et al., 2.001a). Esses mesmos protozoários foram freqüentemente
20 Moraes & Martins
encontrados por Békési (1992) em pisciculturas do nordeste brasileiro. I. multifiliis está presente
em várias espécies como pacu, tilápia, carpa, curimbatá, tambaqui, tambacu e piauçu (Ceccarelli
et al.,1990; Eiras et al.,1995; Tavares-Dias et al., 2.001a). De acordo com Tavares-Dias et al.
(2.001a) a maior carga parasitária foi observada em piauçu e a menor em tilápia quando em
condições sanitárias satisfatórias e densidade populacional relativamente baixa.
O piauçu, pacu e a carpa albergam maior carga parasitária de tricodinídeos quando
comparados ao tambacu, matrinxã, tilápias rendali e do Nilo, sendo o pacu a espécie mais
susceptível. Nesta última espécie e em piauçu a infecção por tricodinídeos associada a monogenea
e/ou a I. multifilis provoca freqüentemente altas taxas de mortalidade (Tavares-Dias et al., 2.001a)
(Tabela 1).
Observações deste laboratório demonstram que as maiores ocorrências e cargas
parasitárias por P. pillulare, dentre as várias espécies de peixes supra-citadas, ocorrem em piauçu,
pacu e tambacu. Todavia são pouco freqüentes em matrinxã e raras em tilápia e carpa.
Sua ocorrência via de regra vem acompanhada de fatores pré-disponentes como alta
densidade populacional, excesso de matéria orgânica e alterações na temperatura da água,
sendo essa infecção associada a outras. Assim, tambacu, piauçu e pacu freqüentemente estão
infectados com P. pillulare e monogenea (Martins et al., 2000; Tavares-Dias et al., 2.001a)
(Figura 19).
No Brasil, a ocorrência
de P. pillulare foi observada
somente a partir de 1996, em
pisciculturas (Martins et al., 2000)
e em pesque-pagues a partir de
1997 (Tavares-Dias et al., 1999),
não havendo ainda registro dessa
parasitose em peixes de ambientes
naturais. Portanto, os devidos
cuidados devem ser tomados, no
sentido de evitar a disseminação
desse patógeno exótico para os rios
brasi-leiros, uma vez que a
piscicultura é o principal meio de
dispersão de parasitos para
ambientes naturais (Orsi &
Agostinho, 1999).
Em tambacu a presença
do P. pillulare é menor no
inverno e, em piauçu, no
outono e inverno. Na primavera
a carga parasitária aumenta
acompanhando a elevação da
Figura 19 - Variação sazonal da temperatura da água, ocorrência
temperatura. Em pacu as maiores
(A), precipitação pluviométrica e carga parasitária média do I. cargas parasitárias ocorrem
multifilis (B) em peixes examinados no período de abril de 1997 a durante o verão e as menores no
março de 1999, em “pesque-pagues” do município de Franca, SP. outono. Martins et al. (2000)
*=diferença significativa (P < 0,05) na ocorrência entre as estações verificaram que 73,3% dos casos
Condições predisponentes e principais enfermidades de teleósteos cultivados 21
Tabela 1 - Carga parasitária média e ocorrência (%) de protozoários em brânquias de 433 peixes necropsiados
no período de abril de 1997 a março de 1999, em “pesque-pagues” do município de Franca, São
Paulo.
P. mesopotamicus L. macrocephalus Tambacu B. cephalus T. rendall O. niloticus C. carpio
Hospedeiro
(N=73) (N=78) (N=37) (N=07) (N=02) (N=10) (N=04)
Carga Carga Carga Carga Carga Carga Carga
Parasitos
parasitária parasitária parasitária parasitária parasitária parasitária parasitária
% % % % % % %
*Copepoditos de L. cyprinacea
de infecção com altas taxas de mortalidade por P. pillulare ocorrem no outono e inverno, com
temperaturas entre 17 e 24oC. O ciclo de vida desse parasito pode ser completado em 10 a 14
dias quando a temperatura varia entre 23 e 25oC. A elevada freqüência de parasitos em diferentes
espécies de hospedeiros indica sua inespecificidade, sendo comum em sistemas desequilibrados,
particularmente quando há excesso de matéria orgânica em decomposição com reduzida
concentração de oxigênio (Pojmanska & Chabros, 1993; Martins et al., 2000).
Com relação à inter-
ferência sazonal os resultados deste
laboratório demonstram que em
piauçu, pacu e tambacu as
infecções por I. multifiliis
ocorrem no outono e inverno,
quando há repovoamento dos
viveiros. Todavia em tilápia
ocorre somente nos meses de
outono, demonstrando a influên-
cia sazonal. Em piauçu o maior
número de parasitos ocorre no
outono indicando que o I.
multifiliis manifesta-se mais
freqüentemente após o manejo
dos peixes, em particular no
período de baixas temperaturas
(Ceccarelli et al. 1990; Thatcher
& Brites-Neto, 1994; Martins &
Romero, 1996). As condições
ótimas de temperatura para o
Figura 20 - Variação sazonal da temperatura da água, ocorrência
parasito completar seu ciclo, em
(A), precipitação pluviométrica e carga parasitária média do P.
pillulare (B) em peixes examinados no período de abril de 1997 a
habitat de clima temperado, varia
o
março de 1999, em “pesque-pagues” do município de Franca, SP. de 20 a 25 C (Meyer, 1974;
*=diferença significativa (P < 0,05) na ocorrência entre as estações. Francis-Floyd & Noga, 1994;
22 Moraes & Martins
7.2. Metazoários
Neste país, existem registros de diversos parasitos metazoários com potencial patogênico
para os peixes, destacando-se os mixosporídeos do gênero Myxobolus e Henneguya, monogenea e
o crustáceo L. cyprinacea (Ceccarelli et al.,1990; Figueira & Ceccarelli, 1991; Békési, 1992;
Martins et al., 1997, 1999ab).
As observações deste laboratório indicam que pacu e piauçu, dentre outras espécies,
podem ser as mais susceptíveis às infecções por monogenea, pois apresentam as maiores cargas
parasitárias (Tavares-Dias et al., 2001b). Altas taxas de parasitismo por monogenea são fortes
indicadores de condições sanitárias precárias e da má qualidade da água (Thatcher & Brites-
Neto, 1994; Noga, 1996).
As altas taxas de densidade populacional e de alimentação (Francis-Floyd & Noga, 1994)
podem causar aumento na concentração de amônia, de nitrito e de matéria orgânica, reduzindo
a quantidade de oxigênio dissolvido favorecendo a enfermidade (Thatcher & Brites-Neto, 1994;
Noga, 1996). Por isso, é de fundamental importância a boa qualidade da água na prevenção de
surtos epizoóticos.
No mesmo levantamento acima referido, 29,3% dos espécimes examinados estavam
parasitados por monogenea, 9,7% por crustáceos e 1,6% por mixosporídeos. Monogenea, P.
Condições predisponentes e principais enfermidades de teleósteos cultivados 23
Mixosporídeos __ 7,0 __ __ __ __ __ __ __ __
Monogenea 920,8 ± 1841,0 71,0 190,0 ± 146,0 40,0 293,5 ± 233,0 13,0 240,4 ± 57,3 18,2 31,4 ± 20,4 12,8
Copepoditos* 9,0 ± 11,6 6,0 12,0 ± 11,3 7,0 8,7 ± 5,4 9,0 __ __ __ __
Tabela 3 - Carga parasitária média e ocorrência (%) de parasitos metazoários em 207 peixes necropsiados
no “pesque-pague” 2RB, período de abril de 1997 a março de 1999, no município de Franca,
São Paulo.
P. mesopotamicus L. macrocephalus T. rendalli O. niloticus C. carpio
Hospedeiros Tambacu (N=17)
(N=29) (N=49) (N=01) (N=03) (N=04)
Carga Carga Carga Carga Carga Carga
Parasitos
Parasitária parasitária parasitária parasitária parasitária parasitária
% % % % % %
Mixosporídeos __ 6,0 __ __ __ __ ____ __ ____ __ __ __
4600,7 ± 285,2 ± 644,2 ± 31,0 ± 31,0 ±
Monogenea 87,0 79,0 10,0 29,0 ± 0,0 14,3 1,0 37,0
10327,4 344,6 951,7 0,0 43,3
L. cyprinacea 2,0 ± 0,0 2,1 __ __ __ __ __ __ __ __ __ __
Copepoditos* 10,3 ± 4,2 10,0 6,7 ± 5,4 15,0 __ __ __ __ __ __ __ __
*Copepoditos de L. cyprinacea
Estudo comparativo indica que entre tambacu, tambaqui, carpa e pacu, este último foi
o mais susceptível à infecção por M. colossomatis e H. piaractus (Martins et al., 1999a). Resultados
similares foram descritos por Békési (1992). Outros autores referem-se à ocorrência desse
parasitismo com alta intensidade nas brânquias de pacu (Figueira & Ceccarelli, 1991; Eiras et
al., 1995; Martins et al., 1997; Eiras et al. 1998; Martins et al., 1999 a). Cargas parasitárias
elevadas também são observadas em tambacu (Martins et al. 1999b) e carpa (Figueira & Ceccarelli,
1991; Yokoyama et al., 1996), criados em cultivo intensivo (Tabelas 2.3).
Os parasitos de peixes cultivados podem originar-se de outros peixes introduzidos na
criação, assim como de outros animais silvestres associados aos corpos de água. As aves piscívoras
atraídas para os tanques de cultivo podem atuar como vetores e transmitir agentes patógenos de
um tanque para outro, entre diferentes pisciculturas ou mesmo do meio silvestre para cultivos
24 Moraes & Martins
(Muzzall, 1995), sendo os esporos de mixosporídeos um dos melhores exemplos desse fenômeno.
Observações de Martins et al. (1998) relatam que tambacus cultivados foram infectados por M.
colossomatis cuja fonte de infecção foram lambaris Astyanax bimaculatus Linnaeus, 1758
(Characidae) silvestres. A enfermidade manifestou-se após o repovoamento da represa de engorda
e foi favorecida pelo transporte inadequado de alevinos e superpopulação do tanque. Além disso,
o sistema de abastecimento de água era oriundo de córrego que passava por diversas propriedades
e estava repleto de lambaris infectados. Estes foram considerados como a fonte de infecção, uma
vez que na propriedade de origem dos alevinos não havia ocorrência do parasito (Martins et al.,
1998).
Resultados deste laboratório demonstram que todos os teleósteos examinados durante
dois anos, mostraram-se infectados por monogenea, em particular o piauçu, pacu, carpa e a
tilápia. As maiores ocorrências e cargas parasitárias por A. penilabiatus ocorreram em pacu,
enquanto a tilápia do Nilo com eles conviventes apresentou-se pouco infectada mostrando a alta
especificidade parasitária do parasito. Observações semelhantes realizadas em pacu e carpa foram
descritas por vários autores no Brasil e em outros países (Békési 1992; Eiras et al. 1995; Martins
& Romero 1996; Singhal et al., 1986; Pojmanska & Chabros, 1993). Algumas espécies
demonstram alterações mínimas de incidência e intensidade de ocorrência durante o ano. Outras
evidenciam alterações mínimas de ocorrência, mas alterações marcantes de intensidade de infecção.
Outras exibem grande alteração
em ambos, muitas vezes com
período de ausência no
hospedeiro. O padrão de
ocorrência e intensidade de
infecção podem estar relacionados
em maior ou menor grau aos
efeitos de fatores abióticos como
a concentração de oxigênio e
temperatura da água ou a fatores
bióticos como a espécie hospe-
deira, seu comportamento,
migrações, imunidade, estado
hormonal ou à interação de todos
esses fatores além do estado
nutricional do hospedeiro
(Tavares-Dias et al., 2001b)
(Figura 22).
As observações deste
laboratório mostram que
copepoditos de L. cyprinacea estão
presentes nas brânquias de pacu,
tambacu e piauçu, mas a maior
Figura 22 - Variação sazonal da temperatura da água, ocorrência ocorrência foi neste último. As
(A), precipitação pluviométrica e carga parasitária média de
formas adultas de L. cyprinacea
Monogenea (B) em peixes examinados no período de abril de 1997
a março de 1999, em “pesque-pagues” do município de Franca,
foram observadas apenas em pacu
São Paulo. *=diferença significativa (P < 0,05) na ocorrência entre e tambacu, sendo esse último
as estações hospedeiro o portador das maiores
Condições predisponentes e principais enfermidades de teleósteos cultivados 25
cargas parasitárias. As tilápias e carpas não estavam parasitadas (Tavares-Dias et al., 2001b). Estudos
similares relatam alta ocorrência de L. cyprinacea em pacu e tambacu (Martins & Romero 1996),
C. carpio e Ctenopharyngodon idella Valenciennes (Cyprinidae) (Fortes et al., 1998). Peixes que
possuem escamas menores como o pacu são menos susceptíveis a Lernaea enquanto espécies com
escamas maiores como carpa capim, o matrinxã e carpa comum teriam maior susceptibilidade
(Ceccarelli, 1988). As observações deste laboratório indicam o contrário (Tavares-Dias et al., 2001b).
Dados recentes indicam que nos peixes examinados na região nordeste do Estado de
São Paulo, o parasitismo por Argulus sp. foi baixo, ocorrendo somente em piauçu e pacu (Tavares-
Dias et al., 2001b) coincidindo com as observações de Martins & Romero (1996). Entretanto,
em carpas de pisciculturas do nordeste do Brasil, há diagnóstico de elevado percentual de infestação
(Békési, 1992). Infestação elevada por parasitos do gênero Argulus é mais comum em peixes
jovens, mantidos em tanques de cultivo com alta densidade populacional (Campbell, 1971) e
baixa qualidade de água e condição sanitária, além de alta temperatura (Singhal et al., 1986a;
Tomec et al., 1995).
Em pacu, tilápia do Nilo, piauçu e tambacu a ocorrência de monogenea não sofreu
influência sazonal significativa durante dois anos de monitoramento. Todavia a infecção esteve
presente durante todo o tempo de observação. A carga parasitária de monogenea em pacu e em
piauçu foi menor nos meses de inverno e aumentou na primavera e verão acompanhando a
variação da temperatura. No
híbrido tambacu, a infecção
ocorreu nos meses de outono e
primavera, mas não no inverno e
verão (Tavares-Dias et al., 2001b).
Esses resultados corroboram
parcialmente as observações de
Meyer (1974) em que a ocorrên-
cia desses helmintos é observada
mais freqüentemente nos meses
de primavera e verão (Figura 23).
De acordo com Eiras
(1994) a maior parte das espécies
de monogenea tem padrão de
infecção anual bem definido. Há
incremento da ocorrência e do
número de parasitos no verão,
redução nos meses frios e é
mínimo na primavera. Outras se
afastam nitidamente desse
comportamento, apresentando
valores elevados durante todo o
ano. Nesse caso os parasitos tem
Figura 23 - Variação sazonal da temperatura da água, ocorrência características especiais do ciclo
(A), precipitação pluviométrica e carga parasitária média de
vital, que permitem processos de
Monogenea (B) em peixes examinados no período de abril de 1997
a março de 1999, em “pesque-pagues” do município de Franca,
infecção reincidentes e contínuos.
São Paulo. *=diferença significativa (P < 0,05) na ocorrência entre O fator temperatura é também
as estações importante para o ciclo biológico
26 Moraes & Martins
Tabela 4 - Ocorrência de agentes com potencial patogênico diagnosticados em peixes cultivados de diferentes
espécies atendidos no LAPOA-CAUNESP durante o período de 1993 a 1998, apresentados por
ordem decrescente de ocorrência.
Agente Ocorrência
%
Monogenoidea (Anacanthorus penilabiatus, Ancyrocephalinae e outros) 36,6
Ichthyophthirius multifiliis 29,5
Bactérias 20,0
Piscinoodinium pillulare 18,0
Fungos 17,0
Copepoditos de Lernaea cyprinacea 15,2
Adultos de Lernaea cyprinacea 13,0
Trichodina sp. 9,9
Agentes não identificados 8,1
Ichthyobodo necator 4,8
Henneguya piaractus e H. leporinicola 4,1
Chilodonella sp. 2,0
Myxobolus colossomatis, Myxobolus sp. 1,3
Crustáceos Branchiura (Dolops sp. e Argulus sp.) 1,3
Nematóides (Eustrong ylides sp, Rondonia rondoni e outros) 1,3
Epistylis sp. 1,0
Digenéticos 0,7
Cestóides (Proteocephalidae) 0,5
Crustáceos isópodes 0,5
Tabela 5 - Principais espécies de peixes examinadas e ocorrência de agentes com potencial patogênico
diagnosticados durante o período de 1993 a 1998.
Agente Espécie e núm ero de peixes infectados
Pacu Tam baqui Tam bacu Piauçu Matrinxã Tilápia Carpa Bagre
Bacteria 19 10 34 2 4 8 3 4
Fungos 16 14 36 3 2 1 2
I multifiliis 22 12 45 2 3 4 2 3
Trichodina sp. 19 2 9 5 1 5 2 1
Chilodonella sp. 1 2
Epistylis sp. 1 2 1
I. necator 7 2 8 4
P pillulare 12 6 47 7 2
H. piaractus e
23 4 1
H. leporinicola
M. colossomatis 13 2 1
Monogenoidea 76 19 70 18 5 13
L cyprinacea* 13 7 39 14 1 7
Branchiura 3 1 5
Nematoides 1 1 1
Digenéticos 1
Cestoides 1
*Copepoditos e adultos de L. cyprinacea.
Com exceção dos casos de L. cyprinacea que comprometiam mais gravemente a superfície
corporal dos peixes, nos outros casos os principais órgãos afetados foram as brânquias, embora
houvesse também a parasitose da superfície corporal. Hiperplasia e hipertrofia de células
Condições predisponentes e principais enfermidades de teleósteos cultivados 29
9. Zoonoses
O termo zoonose é utilizado para designar as doenças de animais que são contagiam o
homem. Na literatura podem também ser observados dois outros conceitos: antropozoonose, as
doenças do homem que são adquiridas a partir dos animais e zooantroponose que são as doenças
de vertebrados adquiridas do homem. O conceito de zoonose envolve o homem, um outro
vertebrado, um artrópode ou um molusco, os quais constituem-se em hospedeiros intermediários,
o agente etiológico da doença e o meio ambiente onde a vida se desenvolve. À este conjunto dá-
se o nome de biocenose. Por outro lado, se o homem é essencial para o ciclo biológico dos
helmintos, dá-se o nome de euzoonose ou zoonose verdadeira e, quando o homem é apenas um
elo acidental dá-se o nome de parazoonose.
As doenças provocadas por helmintos envolvem representantes do Filo Platyhelminthes,
que são vermes achatados dorso-ventralmente, de corpo mole, freqüentemente alongado, alguns
com ventosas externas, ganchos ou acúleos e do Filo Nematoda, vermes cilíndricos, de corpo
alongado, cutícula resistente e estruturas bucais como papilas ou dentes que dependem da espécie
e função. Os Platyhelminthes podem ser divididos em três classes: Monogenea, essencialmente
ectoparasitos com exceção de Polystoma que ocorre na bexiga urinária de anfíbios; Digenea
conhecida também como Trematoda, vermes em forma de “folha” e Cestoidea, vermes em forma
30 Moraes & Martins
de “fita”. Uma das características mais importantes destas duas últimas classes é o envolvimento
de hospedeiros intermediários para o desenvolvimento dos helmintos.
A ocorrência dessas zoonoses está diretamente relacionada ao hábito alimentar do ser
humano, ou seja, o consumo de peixes e anfíbios contendo formas larvais de parasitos que podem
desenvolver-se no ser humano ou ter o comportamento do tipo “larva migrans”. Nos últimos anos
tem aumentado o número de casos de doenças que são transmitidas dos peixes para o homem,
principalmente com novos hábitos de consumo de carne de peixe crua (sashimi, sushi) ou “ceviche”.
9.1. Digenea
A opistorquíase ou clonorquíase tem como agente etiológico Opisthorchis (=Clonorchis)
sinensis, também chamado verme do fígado, que pertence à família Opisthorchiidae. Muito comum
nos países asiáticos onde atinge de 15 a 70% de infecção no homem, dependendo da região. Em
gatos, cães e outros mamíferos reservatórios pode chegar a até 100% de infecção. O helminto
adulto é parasito natural de cães, gatos, raposa e suínos. O homem constitui-se em hospedeiro
acidental. Os parasitos adultos vivem nos ductos biliares, vesícula biliar e ductos pancreáticos
(Noble & Noble, 1964).
Os ovos são eliminados no ambiente a partir das fezes dos animais contaminados, entre
os quais se inclui o homem, são ingeridos por moluscos, principalmente gastrópodes, em que as
larvas ciliadas denominadas miracídios eclodem no tubo digestivo, penetram na parede visceral
e se transformam em esporocistos e rédias. Aproximadamente após dois meses a cercária madura
que tem aproximadamente 0,2 mm deixa o molusco e procura o segundo hospedeiro intermediário,
o peixe. Quando em contato com o peixe susceptível, em poucos minutos as cercárias perdem
sua cauda e penetram nos tecidos dando início ao processo de encistamento. Nos peixes, as agora
denominadas metacercárias, amadurecem em aproximadamente seis semanas.
Quando os peixes contendo metacercárias encistadas são ingeridos pelo homem ou outro
hospedeiro definitivo o ciclo pode se completar. Após a passagem pelo estômago, juntamente
com o suco gástrico, as metacercárias encistam no duodeno ou intestino sob os efeitos da tripsina.
Experimentos com coelhos demonstraram que as metacercárias podem alcançar o fígado de 10 a
40 horas após sua ingestão. A postura dos ovos pode ocorrer três a quatro semanas após a infecção.
Uma grande variedade de peixes pode ser infectada sendo que os ciprinídeos são os mais
comuns, tais como a carpa capim (Ctenopharyngodon idella), carpa cabeça grande (Aristichthys
nobilis) e carpa prateada (Hypophthalmichthys molitrix). O ciclo é mantido pela contaminação
fecal de viveiros e tanques de piscicultura adubados com fezes dos hospedeiros definitivos. No
homem os sintomas mais comuns são náuseas, dores abdominais, edemas e diarréia, sendo que
as lesões causadas dependem do grau de parasitismo e da freqüência de infecção.
Outro membro dessa classe e pertencente à família Heterophyidae é a Phagicola longa,
conhecido como parasito intestinal de cães, gatos e raposas no Egito, Grécia, Havaí, Israel e
América do Sul. A partir daqueles hospedeiros definitivos e também garças, socós e pelicanos, os
ovos são liberados no ambiente aquático e ingeridos por um molusco em que se desenvolvem os
estágios de esporocisto e rédia. Quando chegam à cercária deixam o molusco e procuram o
segundo hospedeiro intermediário, um peixe. Os peixes mais susceptíveis às metacercárias são os
mugilídeos, tais como a tainha (Mugil cephalus e M. curema), onde se transformam em
metacercárias e permanecem encistadas até que o hospedeiro definitivo se alimente do peixe
contaminado (Conroy, 1986). Na América do Sul as metacercárias foram isoladas a partir do
baço, coração, fígado, mesentério e músculo de mugilídeos, podendo chegar a 72,4% de infecção
no Perú e 100% na Venezuela e Brasil, especialmente na região de Cananéia. O primeiro caso
Condições predisponentes e principais enfermidades de teleósteos cultivados 31
que se tem registro no Brasil ocorreu em 1990 provocando cólicas abdominais, formação de
gases e diarréia que, ao que tudo indica foi facilmente tratada com anti-helmínticos normalmente
utilizados. Observações recentes revelaram a presença de Phagicola sp. encistada nas brânquias
de tilápias vermelhas cultivadas e pacu manteiga Myleus tiete de grandes reservatórios.
9.2. Cestoidea
Diphyllobothrium latum (=Dibothriocephalus latus), helminto da família
Diphyllobothriidae causador da difilobotríase no ser humano (Revenga, 1993). Em hamsters
pode atingir até 30 cm e no homem até 15 metros de comprimento por 10 a 20 mm de largura.
Na região anterior, o escólex é típico de pseudofilídeo com bótrios é desprovido de ventosas ou
acúleos. Os ovos de forma elipsoidal, de casca fina, ligeiramente operculados, são liberados no
ambiente aquático juntamente com as fezes de hospedeiros definitivos (mamíferos que se
alimentam de peixes). Em aproximadamente 10 dias desenvolve-se o embrião sendo liberada
uma oncosfera ciliada, o coracídio, que pode sobreviver na água por um a dois dias dependendo
da temperatura. Neste período deve ser ingerido por um crustáceo copépodo planctônico (Cyclops,
Diaptomus e outros) que constitui-se no primeiro hospedeiro intermediário. Em aproximadamente
14 dias desenvolve-se outro estágio denominado procercóide. Quando o copépodo infectado é
ingerido por um peixe planctônico, o procercóide chega até a cavidade visceral dando início ao
desenvolvimento que culminará no estágio de plerocercóide.
O plerocercóide de coloração branca ou creme pode ser encontrado em diversos órgãos
do peixe, inclusive músculos, com tamanho aproximado de até cinco centímetros. Se o peixe
contendo os plerocercóides é ingerido por mamíferos (homem, cão, gato, urso), as larvas são
liberadas durante o processo digestivo e amadurecem, podendo produzir novos ovos após três a
quatro semanas. Outra possibilidade é a ingestão do peixe infectado por outro peixe carnívoro.
Neste caso, os plerocercóides alcançarão também a cavidade do peixe predador.
Nos peixes os plerocercóides podem viver durante anos, sendo que no homem existem
evidências de até 25 anos. A sintomatologia pode ser confundida com outras verminoses como
náusea, diarréia, cólicas e anemia, podendo em casos severos ocorrerem conseqüências neurológicas
relacionadas a deficiência de vitamina B12. Peixes como a perca e a truta podem albergar
plerocercóides de D. dendriticum, os quais situam-se no estômago, cavidade visceral, cecos pilóricos
e gônadas. A grande quantidade de helmintos presentes na cavidade e gônadas pode inviabilizar
a reprodução destes animais.
Outra doença muito conhecida é a esparganose, provocada pelos plerocercóides de
Spirometra mansonoides. Os ovos são liberados no meio aquático juntamente com as fezes do
hospedeiro definitivo, geralmente um felídeo. Na água, desenvolve-se o coracídio que será ingerido
pelo primeiro hospedeiro intermediário, um microcrustáceo, geralmente o Cyclops, alcançando a
fase de procercóide. O segundo hospedeiro intermediário constituído por anfíbios, cobras ou
alguns mamíferos adquirem a parasitose ingerindo o crustáceo contaminado. Após a ingestão, a
larva procercóide atravessa a parede intestinal e migra para o tecido subcutâneo ou músculo
desenvolvendo-se em plerocercóide ou espargano. Finalmente, quando os anfíbios ou répteis
contendo plerocercóides são ingeridos por cães ou gatos, desenvolvem o verme adulto completando
o ciclo. O homem pode adquirir a parasitose por ingestão acidental do microcrustáceo, ingestão
de carne crua ou mal cozida de rãs, cobras ou mamíferos contendo o espargano.
Nos anfíbios podem se localizar nos músculos esqueléticos, sobre o tronco, extremidades
posteriores e na cavidade visceral, causando danos aos tecidos por pressão mecânica e interferência
na alimentação impedindo o desenvolvimento normal de girinos.
32 Moraes & Martins
9.3. Nematoda
O espirurídeo Gnathostoma spinigerum causador da conhecida gnatostomíase no ser
humano tem ocorrido na Ásia, no México e mais raramente, nos Estado Unidos, sendo os
principais focos localizados no Japão e Tailândia.
Na natureza, os parasitos adultos são encontrados no estômago de felídeos selvagens,
gatos e cães domésticos, nos quais forma cistos gástricos. Os ovos são então liberados juntamente
com as fezes no meio aquático formando o primeiro estágio larval em aproximadamente sete
dias. Pode penetrar ativamente ou ser ingerido por um microcrustáceo copépodo (Cyclops), no
qual desenvolve-se em L2. Enguias, bagres, rãs e cobras ingerem o crustáceo contendo a larva
infectante que se desenvolvem em L3. A partir da penetração na parede do estômago destes
hospedeiros, ocorre o encistamento da larva L3 no músculo esquelético, podendo existir um
grande número de segundos hospedeiros intermediários. O homem não sendo o hospedeiro
adequado desenvolve “larva migrans” cutânea, resultando em lesões na pele e nos músculos
esqueléticos, podendo chegar às vísceras e meninges. A infecção humana dá-se a partir da ingestão
de carne de peixe crua ou mesmo de outros hospedeiros intermediários contaminados.
Existem atualmente cerca de 200 espécies de anisaquídeos descritas, sendo que os gêneros
Anisakis, Pseudoterranova (=Phocanema, Porrocaecum, Terranova) e Contracaecum (Heterocheilidae)
podem causar doenças no ser humano, sendo chamados de “verme do bacalhau” ou “da foca”. A
anisaquíase (Cheng, 1976; Barros, 1994) foi pela primeira vez diagnosticada em 1955, na Holanda,
em paciente com dores abdominais. Peixes de importância econômica como bacalhau, “halibut”,
arenque, salmão e lula, com exceção do marlim e do atum são os principais hospedeiros
intermediários do nematóide. Os helmintos adultos podem estar presentes no golfinho, baleia,
leão marinho e foca, de onde são liberados os ovos juntamente com as fezes para desenvolverem-
se no ambiente marinho. Quando as larvas eclodem são ingeridas por crustáceos eufausiídeos
como por exemplo o “krill” e atingem o estágio L3. Os peixes adquirem a parasitose ao ingerirem
os crustáceos infectados. Nos peixes encontram-se alojados no mesentério, vísceras, músculo ou
cavidade visceral podendo alcançar 10 a 25 mm. Pseudoterranova presente no bacalhau pode
chegar a mais de 60 mm de comprimento. A rápida evisceração dos peixes evita que as larvas
migrem para a musculatura. Nos peixes a presença das larvas pode causar compressão e danos
mecânicos nos órgãos internos, sendo que em bacalhau observou-se também diminuição do
fator de condição.
No homem problemas intestinais, náuseas, vômitos, coceiras no esôfago e hemorragias
são os principais sintomas da doença. Muitas vezes a remoção do parasito é realizada por
endoscopia.
Outro anisaquídeo importante é o gênero Thynnascaris, diferente do Contracaecum por
suas características taxonômicas. O ciclo de vida não é completamente conhecido podendo envolver
vários tipos de hospedeiros intermediários sendo diversos estudos realizados com T. aduncum
(Norris & Overstreet, 1976)
Os ovos são liberados juntamente com as fezes de peixes e mamíferos que constituem-se
nos hospedeiros definitivos. No substrato ocorre a passagem de L1 para L2 livre-natante. Esta
Condições predisponentes e principais enfermidades de teleósteos cultivados 33
última é ingerida por hospedeiros paratênicos (ou de transporte) como invertebrados bentônicos
(copépodos e decápodos), moluscos, poliquetos ou peixes, nos quais desenvolve-se a larva L3.
Nos hospedeiros paratênicos as larvas ocupam o mesentério, o hepatopâncreas ou o músculo
dependendo da larva e do hospedeiro. O estágio L4 desenvolve-se então no hospedeiro definitivo,
peixe, ave ou mamífero.
Experimentos mostraram que as larvas de Thynnascaris morrem após 30 a 60 minutos
de exposição a solução de cloreto de sódio a 20%. Quando mantidas a temperatura de -20oC
muitas larvas sobrevivem após quatro horas, morrendo somente 12 horas após o resfriamento. À
temperatura de 0oC permaneceram vivas por duas semanas. A inoculação de larvas em coelhos e
cães não foi suficiente para que a doença evoluísse. Todavia os nematóides mortos quando ingeridos
podem provocar reação alérgica.
A medida profilática que evite a contaminação por tais helmintos consiste em evitar o
consumo de carne de peixes ou anfíbios crua ou mal cozida, particularmente quando a procedência
é desconhecida ou que apresentem histórico de importantes transmissores de parasitoses para o
ser humano.
de cortisol que inibe a formação do gigantócitos no mesmo modelo acima referido. Esse fato indica
que os animais estão com suas respostas de defesa deprimidas e, portanto, mais sensíveis às agressões
do meio ambiente. Quando os animais estressados por alta densidade populacional são alimentados
com ração contendo 100 e 450 mg de vitamina E/kg de ração a quantidade de gigantócitos formados
na lamínula assemelha-se ao observado no grupo controle, não estressado e não suplementado. Esse
fato indica que a vitamina E ameniza, pelo menos em parte, os efeitos nocivos do estresse, tornando
mais eficientes as respostas de defesa de peixes nessa condição (Belo, 2002).
A vitaminas C e E são agentes antioxidantes mas o mecanismo pelo qual estimulam a
formação de macrófagos policariontes ou outras resposta de defesa orgânica não é conhecida.
e) Cuidados com o instrumental de manejo
Periodicamente, dependo do uso, todo o instrumental utilizado no manejo deve ser
cuidadosamente higienizado por lavagem com água e sabão e desinfetados com em banhos de
formalina comercial diluída a 5%, por cinco minutos. Uma solução de 10% de sal também tem-
se mostrado eficaz.
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Condições predisponentes e principais enfermidades de teleósteos cultivados 41
Figura 6 - Fotomicrografia dp
protozoário Ichthyophthirius multifiliis,
Giemsa, x 400. Observar núcleo em
forma de ferradura.
Condições predisponentes e principais enfermidades de teleósteos cultivados 43